Acórdão Nº 0302010-61.2016.8.24.0026 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 30-09-2021

Número do processo0302010-61.2016.8.24.0026
Data30 Setembro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0302010-61.2016.8.24.0026/SC

RELATOR: Desembargador LUIZ ZANELATO

APELANTE: COMEXPORT TRADING COMÉRCIO EXTERIOR LTDA (EMBARGADO) ADVOGADO: Fabio Zacharias Noto (OAB PR045127) APELADO: MANNES LTDA (EMBARGANTE) ADVOGADO: Ricardo Luis Mayer (OAB SC006962) ADVOGADO: PAULO LUIZ DA SILVA MATTOS (OAB SC007688)

RELATÓRIO

Comexport Trading Comércio Exterior LTDA., atual denominação de Trop Comércio Exterior Ltda., interpôs recurso de apelação cível da sentença proferida pelo juízo da 1ª Vara da comarca de Guaramirim, que acolheu os embargos à execução e julgou extinta a ação de execução, na forma do art. 487, I, do CPC/2015.

Na origem, cuida-se de embargos à execução opostos por Mannes Ltda contra Trop Comércio Exterior Ltda., argumentando, em síntese, que a ação de execução deve ser extinta, pois fundamentada em títulos protestados irregularmente, na medida que as duplicatas protestadas por indicação não foram enviadas aos embargantes, além disso, argumenta a falta de identificação adequada no recebimento das mercadorias contido nas notas fiscais. Ao final, pugnou pelo acolhimentos dos embargos para julgar extinta a execução (evento 1/1G).

Em juízo de admissibilidade da demanda, o magistrado de origem recebeu a petição inicial e atribuiu-lhe o efeito suspensivo, concedeu a gratuidade da justiça à embargante e determinou a manifestação da parte adversa (evento 4/1G).

A embargada apresentou impugnação (evento 7/1G), alegando, em resumo, que: (a) não há dúvidas quanto ao caráter executivo dos títulos que embasam a execução; (b) as duplicatas foram devidamente protestadas, inclusive, encaminhou notificação extrajudicial para que a devedora efetuasse o pagamento; (c) as mercadorias foram entregues, conforme comprovam os documentos acostados às fls. 44-51 da ação de execução.

Intimado o administrador judicial da empresa recuperanda (evento 9/1G), deixou o prazo transcorrer in albis.

A embargada, agora denominada Comexport Trading Comercio Exterior Ltda, pugnou pelo prosseguimento do feito (evento 12/1G).

Na data de 30-4-2020, o juiz da causa, Dr. Rogério Manke, prolatou sentença nos seguintes termos (evento 19/1G):

Ante o exposto, com fulcro no artigo 487, I, do Código de Processo Civil, acolho os pedidos formulados nos presentes embargos à execução movidos por Mannes Ltda contra Trop Comercio Exterior Ltda. e, consequentemente, julgo extinta sem resolução de mérito a execução n. 0301671-39.2015.8.24.0026 com base no artigo 485, VI, do Código de Processo Civil.

Tendo em vista que a sucumbência, condeno a embargada ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios da parte adversa, estes últimos que fixo em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa, com espeque no artigo 85, § 2º, do Código de Processo Civil.

Translade-se cópia da presente aos autos da execução 0301671-39.2015.8.24.0026/SC.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Oportunamente, arquivem-se.

Irresignada, a parte embargada-exequente interpôs recurso de apelação (evento 25/1G), sob os fundamentos, em síntese, de que: (a) conforme demonstram as notas fiscais que instruem a ação de execução, há os aceites e assinatura de recebimento das mercadorias, inclusive com o carimbo do almoxarifado da empresa apelada; (b) ausente qualquer documento no qual a empresa devedora informe a falta de recebimento das mercadorias; (c) a ausência de manifestação acerca da notificação extrajudicial também demonstra o recebimento das mercadorias, pois, do contrário, a devedora teria se manifestado; (d) a inércia da recorrida diante das cobranças recebidas demonstra que não só recebeu as mercadorias, como reteve as duplicatas originárias; (e) a embargante não demonstrou que não recebeu as mercadorias, existindo prova em sentido contrário, pois devem ser consideradas válidas as assinaturas contidas nos canhotos; (f) as duplicatas originárias foram retidas pela embargante, razão do protesto por indicação; (g) as triplicatas é que foram anexadas ao processo, e não as duplicatas originárias, o que afasta a tese de que os títulos não foram retidos pela devedora; (h) o Superior Tribunal de Justiça entende que "a retenção das duplicatas deve ser presumida em face da entrega da mercadoria, cabendo ao devedor a prova da devolução"; (i) exigir que o credor comprove a retenção das duplicatas é exigir prova negativa; (j) a emissão das triplicatas em nada prejudica o protesto por indicação, pois somente foram anexadas ao processo para demonstrar a existência de retenção. Ao final, pugnou pelo provimento do recurso para, em reforma da sentença, rejeitar os embargos à execução.

Intimada, a parte apelada ofereceu contrarrazões (evento 32/1G), requerendo a manutenção da sentença e o desprovimento do recurso.

O recurso ascendeu ao Tribunal de Justiça e foi distribuído a esta relatoria por sorteio.

Este é o relatório.

VOTO

1. Exame de admissibilidade

Inicialmente, registra-se que se trata de recurso de apelação interposto contra sentença prolatada sob a égide do Código de Processo Civil de 2015, motivo pelo qual é este diploma processual que disciplina o cabimento, o processamento e a análise do presente recurso, haja vista o princípio tempus regit actum (teoria do isolamento dos atos processuais).

Anota-se, também, que não houve a intimação da Procuradoria-Geral de Justiça, tendo em vista não se vislumbrar qualquer das hipóteses dos incisos do art. 178 do CPC, bem como o entendimento do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que "a Lei de Falência e Recuperação de Empresas não exige a atuação obrigatória do Ministério Público em todas as ações em que empresas em recuperação judicial figurem como parte" (REsp 1536550/RJ, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 08/05/2018, DJe 11/05/2018).

Feitas estas digressões, conheço do recurso de apelação porque presentes os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade.

2. Fundamentação

Cuida-se de apelação cível interposta da sentença que acolheu os embargos à execução e julgou extinta a ação de execução, na forma do art. 487, I, do CPC/2015.

Insurge-se a empresa embargante-exequente sob a alegação de que os títulos são líquidos, certos e exigíveis, inexistindo qualquer irregularidade no protesto por indicação das duplicatas, além de haver prova nos autos quanto ao recebimento das mercadorias pela parte devedora.

Nos termos da Lei n. 5.474/68, consiste a duplicata em título de crédito causal emitido pelo vendedor, com lastro em contrato de compra e venda mercantil ou de prestação de serviços, encaminhado ao comprador que, ao dar o aceite ou assinar, obriga-se a pagar no prazo ajustado.

Por sua vez, o protesto de títulos é disciplinado pela Lei n. 9.492/97, de 10-09-1997, que define competência, regulamenta os serviços concernentes ao protesto de títulos e outros documentos de dívida, e dá outras providências, cujo teor, dentre outras disposições, prevê que a duplicata é protestável por falta de aceite, devolução, ou pagamento, consoante disposto no art. 21, que segue transcrito:

Art. 21. O protesto será tirado por falta de pagamento, de aceite ou de devolução.[...];§ 3º Quando o sacado retiver a letra de câmbio ou a duplicata enviada para aceite e não proceder à devolução dentro do prazo legal, o protesto poderá ser baseado na segunda via da letra de câmbio ou nas indicações da duplicata, que se limitarão a conter os mesmos requisitos lançados pelo sacador ao tempo da emissão da duplicata, vedada a exigência de qualquer formalidade não prevista na Lei que regula a emissão e circulação das duplicatas. (grifou-se).

Com efeito, o caput do art. 13 da Lei n. 5.474/1968 estabelece que "a duplicata é protestável por falta de aceite de devolução ou pagamento", e o seu § 1º assenta que "por falta de aceite, de devolução ou de pagamento, o protesto será tirado, conforme o caso, mediante apresentação da duplicata, da triplicata, ou, ainda, por simples indicações do portador, na falta de devolução do título". (grifou-se).

É de se compreender, assim, que o protesto da duplicata pode ser feito, em qualquer hipótese, mediante simples indicações do credor, com a dispensa de exibição do título de crédito, por meio físico, em cartório.

Sobre o tema, Fábio Ulhôa Coelho leciona:

Com a desmaterialização do título de crédito, tornaram-se as indicações a forma mais comum de protesto. A duplicata, hoje em dia, não é documentada em meio papel. O registro dos elementos que a caracterizam é feito exclusivamente em meio eletrônico e assim são enviados ao banco, para fins de desconto, caução ou cobrança. O banco, por sua vez, expede um papel, denominado "guia de compensação", que permite ao sacado honrar a obrigação em qualquer agência, de qualquer instituição no país. Se não ocorrer o pagamento, atendendo às instruções do sacador, o próprio banco remete, ainda em meio...

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