Acórdão Nº 0302147-38.2015.8.24.0039 do Primeira Câmara de Direito Civil, 08-12-2022

Número do processo0302147-38.2015.8.24.0039
Data08 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0302147-38.2015.8.24.0039/SC

RELATOR: Desembargador FLAVIO ANDRE PAZ DE BRUM

APELANTE: BRUNO LUERSEN SA AGRO PASTORIL ADVOGADO: FELYPE BRANCO MACEDO (OAB SC025131) APELADO: ANTONIO ALCELI RIBEIRO ADVOGADO: JOÃO ALTANIR DUARTE JUNIOR (OAB SC032592)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível interposta por Bruno Luersen S/A Agro Pastoril, contra sentença prolatada pelo Juízo de Direito da 2ª Vara Cível da Comarca de Lages que, nos autos da "Ação de reintegração de posse c/c pedido de perdas e danos e cominação de pena em caso de novo esbulho" n. 0302147-38.2015.8.24.0039, ajuizada contra Antonio Alceli Ribeiro, julgou improcedentes os pedidos formulados, condenando-o ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, arbitrados em 20% sobre o valor da causa (Evento 65, E1).

Em suas razões (Evento 70), Bruno Luersen S/A Agro Pastoril asseverou ter restado comprovada a prévia delimitação, demarcação (pro diviso) e fechamento da área área objeto de negociação no ano de 1976, caracterizando a composse pro diviso. Assim, ressaltou que a medição foi realizada antes da escritura e de comum acordo entre a então cedente e seus herdeiros, vez que, do contrário, não teria havido o negócio jurídico.

Ademais, fez ilações sobre o caso concreto, salientando ser "incontroverso que a Recorrente "não tomou para si" de forma ilegal a área em tela e que exerceu por 37 anos a posse exclusiva e ininterrupta após a aquisição onerosa da meação da Sra Darci Couto de Moraes, cuja delimitação da terra e traçado das cercas foi definida de comum acordo entre as partes preteritamente em 1976", pugnando, ao final, pela reforma da sentença, com a procedência dos pedidos formulados na inicial.

Conquanto devidamente intimado, o réu deixou fluir in albis o prazo para apresentar contrarrazões (evento 74).

Ascenderam, assim, os autos a esta Corte de Justiça.

Recebo-os conclusos.

É o relatório.

VOTO

O recurso é tempestivo e preenche os demais pressupostos de admissibilidade, razão por que dele se conhece.

De início, impende destacar que a presente demanda é conexa aos autos n. 0017224-34.2013.8.24.0039, igualmente julgado nesta data, no qual se discute a validade e eficácia da cessão de meação firmada entre o Bruno Luersen e a viúva meeira Darci de Couto Ribeiro, bem como do processo administrativo de unificação de matrículas e retificação de áreas.

A solução do aludido litígio influencia diretamente no deslinde desta ação, motivo porque transcreve-se parte da decisão naqueles autos proferida, eis que igualmente analisou a alegada posse exercida pela empresa ora apelante.

Da celeuma retratada em ambos os autos, denota-se que Darci Couto Ribeiro, viúva meeira, e Bruno Luersen firmaram entre si uma "cessão onerosa de direitos hereditários" no ano de 1976, sob a égide, portanto, do Código Civil de 1916, através de escritura pública, referente a uma gleba de terras com área de 67.250,00m² (Evento 1/INF5). No ano de 1986, aludido bem foi integralizado ao patrimônio da empresa ré Bruno Luersen S/A Agro Pastoril (evento 1/INF10).

Quanto à alegada ineficácia da aludida cessão de direitos, atente-se ser inaplicável ao caso as disposições sobre a temática previstas no atual Código Civil, porquanto, como já mencionado, entabulado na vigência da legislação anterior, a qual não tratou especificamente sobre a cessão de direitos hereditários, motivo por que, em casos tais, aplicava-se o regramento atinente às cessões de crédito, nos termos do art. 1.078 então vigente.

Neste contexto, impende destacar a inexistência de qualquer dispositivo legal ou circunstância fática hábeis a macular a validade da transação avençada. Noutro viso, conforme bem pontuado pelo Magistrado a quo nos autos n. 0017224-34.2013.8.24.0039, "pacífica era a compreensão que a herança, quanto a posse e domínio, até a data da partilha, era indivisível (art. 1.580), de modo que se compreendia como ineficaz tão somente a parte da cessão que recaísse sobre bem determinado. Em casos tais, válida a cessão, mas excluía-se a indicação de bem determinado, passando ela a incidir sobre os direitos que o herdeiro viesse a auferir quando da partilha".

Neste contexto, conquanto não se olvide que a cessão de direitos hereditários, via de regra, não deve recair sobre um bem determinado, vez que a herança é uma universalidade de bens, unitária e indivisível até a partilha, igualmente não se há olvidar que, no caso concreto, infere-se dos autos ter havido entre as partes não uma cessão hereditária, mas sim da meação da viúva.

Não bastasse, atente-se que o espólio era composto apenas da terra objeto do litígio, razão por que de nenhum modo se há falar em nulidade, tampouco ineficácia do negócio sub judice, haja vista ter englobado a totalidade dos direitos da meeira sobre o único bem da herança. É o que se extrai do documento carreado ao evento 1/INF5, segundo o qual, "[...] pela Outorgante Cedente, por seu representante legal me foi dito que, mediante a quantia de Dez mil cruzeiros (Cr$ 10.000,00), que neste ato o representante legal da Cedente recebeu das mãos do Cessionário, em moeda corrente, para prestação de conta com a Outorgante, pelo que lhe dá plena e geral quitação desse recebimento, preço certo, ajustado e contratado, cede e transfere ao mesmo Outorgado, toda a meação que vai lhe caber no arrolamento ou partilha dos bens deixados por seu finado esposo Sebastião Joaquim Ribeiro, cuja meação se constitui em uma gleba de terras de campos e matos, sem reserva alguma, com a área superficial de Sessenta e sete mil duzentos e cincoenta metros quadrados (67.250m2), situada na Fazenda Linda Vista, municipio de São José do Cerrito, comarca de Lages transcrita no Cartório do 2º Oficio do Registro de Imóveis desta comarca sob o nº 15.530, em comum com outros [...]".

Por conseguinte, diante da incontestável manifestação de vontade da viúva meeira em ceder a sua meação sobre o único bem da herança, insubsistente a alegada nulidade ou ineficácia do negócio jurídico.

Noutro viso, impende destacar, para melhor compreensão dos fatos, que Bruno Luersen S/A Agro Pastoril promoveu administrativamente a retificação e unificação de algumas áreas no Registro de Imóveis competente, dentre elas a que está sub judice, resultando na matrícula n. 8.552, totalizando uma gleba de terra de 226.736,00m² (evento 1/INF12).

Parte da área que integrava a nova matrícula n. 8.552 foi desapropriada pela Rio Canoas, cuja indenização foi adimplida ao então proprietário registral, Bruno Luersen S/A Agro Pastoril que, no ponto, sustentou na demanda conexa que "os Requerentes não possuem direito à qualquer participação porquanto a área que ficou sob sua posse não alcançava a margem do Rio Caveiras, conforme divisão ocorrida em 1976".

Neste contexto, já adentrando ao presente apelo, não merece guarida a assertiva no sentido de ter restado comprovada a prévia delimitação, demarcação (pro diviso) e fechamento da área quando da negociação no ano de 1976, ao argumento de que a medição foi realizada antes da escritura e de comum acordo entre a então cedente e seus herdeiros, vez que o contrário se denota dos autos, haja vista o acervo probatório amealhado evidenciar que a meação objeto da cessão em momento algum foi delimitada.

A propósito, o excerto da escritura pública retromencionado expressamente estabelece que a outorgante "cede e transfere ao mesmo Outorgado, toda a meação que vai lhe caber no arrolamento ou partilha dos bens deixados por seu finado esposo Sebastião Joaquim Ribeiro, cuja meação se constitui em uma gleba de terras de campos e matos, sem reserva alguma, com a área superficial de Sessenta e sete mil duzentos e cincoenta metros quadrados (67.250m2), situada na Fazenda Linda Vista, municipio de São José do Cerrito", inexistindo, qualquer comprovação a respeito da alegada demarcação da área.

Assim, apesar da demandada alegar em suas razões recursais que "deixou o julgador de considerar que somente houve intenção de retomar a posse após 37 anos do uso exclusivo da área em tela pela empresa", fato é que a gleba objeto do litígio é bastante extensa, a qual inclusive faz divisa com outras áreas de sua...

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