Acórdão Nº 0302152-10.2019.8.24.0075 do Quarta Câmara de Direito Comercial, 04-05-2021

Número do processo0302152-10.2019.8.24.0075
Data04 Maio 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 0302152-10.2019.8.24.0075/SC



RELATOR: Desembargador JOSÉ CARLOS CARSTENS KOHLER


APELANTE: FAZENDA ITAPEVA COMERCIO, NEGOCIOS IMOBILIARIOS E EXTRACAO LTDA (AUTOR) APELANTE: BANCO BRADESCO S.A. (RÉU) APELADO: OS MESMOS


RELATÓRIO


Banco Bradesco S.A. e Fazenda Itapeva Comércio, Negócios Imobiliários e Extração Ltda. interpuseram Apelações Cíveis (Evento 32 e Evento 39, respectivamente) contra a sentença prolatada pela Magistrada oficiante na 2ª Vara Cível da Comarca de Tubarão - doutora Lara Maria Souza da Rosa Zanotelli - que, nos autos da "ação de revisão de cláusulas contratuais" n. 0302152-10.2019.8.24.0075, detonada pelo segundo em face do primeiro, julgou parcialmente procedentes os pedidos inaugurais, cuja parte dispositiva restou vazada nos seguintes termos:
DISPOSITIVO
Ante o exposto, com fulcro no art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados por FAZENDA ITAPEVA LTDA. EPP. contra BANCO BRADESCO S.A., para tão somente promover as seguintes adequações no contrato de abertura de limite de cheque especial vinculado à conta-corrente n. 25300-6, mantida junto a agência 352 do banco réu:
a) Limitar os juros remuneratórios ao equivalente ao triplo da média de mercado divulgada pelo BACEN para a espécie de contratação (cheque especial de pessoas jurídicas), em cada mês de apuração, no período compreendido entre abril de 2009 e dezembro de 2013 e no mês de maio de 2016, salvo se a taxa aplicada for inferior, caso em que deverá prevalecer em benefício do consumidor;
b) Obstar a incidência capitalizada de juros;
c) Aplicar o INPC como fator de correção monetária, em substituição a qualquer outro que tenha sido aplicado pela instituição financeira;
d) Afastar os efeitos da mora, ficando vedada a incidência de encargos moratórios até a verificação de existência de saldo devedor nos termos desta sentença e eventual inércia da consumidora em efetuar o pagamento da quantia correta, após cientificada de eventual débito.
Condeno o réu à devolução dos valores eventualmente cobrados em excesso, calculados com base na presente decisão, após compensação com os débitos existentes.
Considerando a sucumbência recíproca, condeno a parte autora ao pagamento de 30% das custas e despesas processuais, bem como honorários de advogado do procurador da parte adversa, estes fixados em 30% de R$ 4.000,00 (quatro mil reais) e, condeno a parte ré ao pagamento de 70% das custas e despesas processuais e honorários de advogado do procurador da parte adversa, estes fixados em 70% de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), com amparo no art. 85, § 8º, do CPC.
PUBLIQUE-SE. REGISTRE-SE. INTIMEM-SE.
(Evento 25, autos de origem)
Em suas razões recursais, o Banco almeja, em síntese: a) pela impossibilidade da revisão contratual; b) a legalidade dos juros remuneratórios pactuados; c) a legalidade da cláusula que prevê a capitalização dos juros; c) a inaplicabilidade do INPC como fator de correção monetária, devendo ser aplicada a TR; d) a inexistência de valores a serem restituídos; e d) a impossibilidade de descaracterização da mora.
Por sua vez, o Consumidor ventila: a) a Magistrada de origem não considerou abusiva a taxa de juros remuneratórios aplicada referente ao mês de agosto de 2015, entretanto, "comparando as duas taxas, denota-se que o índice aplicado pela casa bancária no mês de agosto de 2015 suplanta em mais de 75% a.m. (setenta e cinco por cento ao mês) a taxa média de mercado divulgado pelo Banco Central"; b) a necessidade de reforma quanto ao patamar limitador da taxa de juros remuneratórios, uma vez que a Magistrada entendeu que a limitação fosse realizada "ao equivalente ao triplo da média de mercado divulgada pelo BACEN", ao passo que o entendimento desta Corte Estadual é a limitação da taxa ao índice divulgado pelo Banco Central; c) a ilegalidade na cobrança cumulada da comissão de permanência com os demais encargos; e d) a inversão dos ônus sucumbenciais frente o decaimento mínimo dos pedidos.
Empós, com as contrarrazões (Eventos 45 e 46), os autos foram distribuídos para esta relatoria por sorteio (Evento 1, autos de segundo grau).
É o necessário escorço

VOTO


Primeiramente gizo que, uma vez preenchidos os requisitos de admissibilidade, os Recursos são conhecidos.
Esclareço, por oportuno, que a decisão recorrida se subsome ao regramento processual contido no CPC/2015, porquanto a publicidade do comando judicial prolatado pelo Estado-Juiz se deu em 4-12-20, isto é, já na vigência do novel Código Adjetivo Civil.
1 Do Reclamo da Ré
1.1 Da possibilidade de revisão contratual
A Instituição Financeira advoga pela inaplicabilidade do CDC, impossibilidade de relativização do princípio do pacta sunt servanda e reforça a necessidade de obediência à força obrigatória dos contratos.
De início, impende assinalar ser inconteste a aplicação do Pergaminho Consumerista às relações de consumo que envolvam instituições financeiras, restando a matéria inclusive sumulada pelo Superior Tribunal de Justiça, através do verbete n. 297, in verbis: "O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras".
Em face dessa aplicabilidade, tem-se a possibilidade da revisão das cláusulas contratuais abusivas ou que coloquem em situação amplamente desfavorável o consumidor, conforme preceitua o art. 51, inciso IV, da Lei n. 8.078/90, merecendo frisar-se que essa revisão não viola os princípios do pacta sunt servanda, autonomia da vontade e ato jurídico perfeito que, por serem genéricos, cedem espaço à norma específica prevista no art. 6º, inciso V, do Código de Defesa do Consumidor.
Nesse diapasão, cai por terra o argumento de que o cumprimento do contrato seria obrigatório por ter sido firmado livremente pelas Partes, sem qualquer erro, coação ou abuso.
Impende enfatizar, por outro lado, que a viabilidade de modificação das cláusulas pelo juiz não significa que tal tarefa possa ser realizada de ofício, conclusão que se extrai da leitura conjunta dos arts. 2º, 128, 460 e 515, todos do Cânone Processual Civil.
Aceitar o inverso, ou seja, que o magistrado analise a validade de cláusulas contratuais sem provocação dos contratantes fora das hipóteses legais, é permitir que ele atue como procurador de uma das partes, o que é inconcebível e afronta os princípios da inércia - art. 2º do CPC - e dispositivo - arts. 128, 460 e 515, todos do CPC.
Esse entendimento é o atualmente esposado pelo Superior Tribunal de Justiça, senão confira-se: "[...] Em homenagem ao método dispositivo (CPC, Art. 2º), é defeso ao juiz rever de ofício o contrato para, com base no Art. 51, IV, do CDC anular cláusulas que considere abusivas (EREsp 702.524/RS)." (REsp n. 767052/RS, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, j. 14-6-07).
Colocando uma pá de cal na quaestio, o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula n. 381, que reza: "Nos contratos bancários, é vedado ao julgador conhecer, de ofício, da abusividade das cláusulas".
E em decisão proferida pela Ministra Nancy Andrighi no REsp. n. 1.061.530/RS, apreciado em 22-10-08, no julgamento das questões idênticas que caracterizam a multiplicidade de recursos, restou assentada a impossibilidade de atuação de ofício na revisão dos contratos bancários. Veja-se:
ORIENTAÇÃO 5 - DISPOSIÇÕES DE OFÍCIO
É vedado aos juízes de primeiro e segundo graus de jurisdição julgar, com fundamento no art. 51 do CDC, sem pedido expresso, a abusividade de cláusulas nos contratos bancários. Vencidos quanto a esta matéria a Min. Relatora e o Min. Luis Felipe Salomão.
Como se vê, o CDC é aplicável ao caso concreto, o que significa dizer que a revisão de cláusulas contratuais poderá ocorrer, entretanto somente mediante provocação da parte, o que, na hipótese, ocorreu por meio da interposição de embargos à execução, em que foram apontados os pontos da avença supostamente abusivos, tornando possível o seu enfoque.
1.2 Da capitalização dos juros
A Casa Bancária também aduz pela legalidade da capitalização mensal dos juros.
Adianto que sem razão.
Acerca do tema há posicionamento proclamado pela "Corte da Cidadania" em sede de julgamento repetitivo no Recurso Especial n. 973.827/RS, de relatoria da Ministra Maria Isabel Gallotti, julgado em 8-5-12, com o seguinte teor:
3. Teses para os efeitos do art. 543-C do CPC:
- 'É permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano em contratos celebrados após 31.3.2000, data da publicação da Medida Provisória n. 1.963-17/2000 (em vigor como MP 2.170-36/2001), desde...

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