Acórdão Nº 0302238-39.2018.8.24.0067 do Terceira Câmara de Direito Público, 23-02-2021

Número do processo0302238-39.2018.8.24.0067
Data23 Fevereiro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 0302238-39.2018.8.24.0067/SC



RELATOR: Desembargador JAIME RAMOS


APELANTE: INSTITUTO DE PREVIDÊNCIA DO ESTADO DE SANTA CATARINA - IPREV (AUTOR) APELADO: GRASIANE BITTENCOURT VIERA (RÉU)


RELATÓRIO


Na Comarca de São Miguel do Oeste, o Instituto de Previdência do Estado de Santa Catarina - IPREV ajuizou "ação de cobrança" em face de Grasiane Bittencourt, objetivando a condenação da requerida ao pagamento das contribuições previdenciárias não vertidas durante o período em que gozou de licença sem vencimentos para tratar de assuntos particulares.
Alegou que a requerida era servidora pública do Estado de Santa Catarina, lotada na Secretaria de Educação no Município de Água Doce; que durante o período de afastamento em licença sem remuneração deixou de efetuar o recolhimento da Contribuição Previdenciária devida ao IPREV no período de setembro/2012 a janeiro/2015; que, nos termos do § 3º do art. 4º, da LCE nº 412/08, o servidor licenciado permanece filiado, ou seja, permanece com a qualidade de segurada do RPPS/SC, devendo, portanto, obrigatoriamente recolher a contribuição previdenciária durante esse período; que, realizada a apuração do montante devido, a ré foi notificada para o pagamento em 11-05-17, tendo impugnado por entender que não é devido, já que não almeja a utilização do referido tempo para a aposentadoria; que foi realizado um novo cálculo, excluído o período em que se operou a decadência, sendo que o débito ficou no importe de R$ 20.247,30 (vinte mil, duzentos e quarenta e sete reais e trinta centavos), atualizado até 10/08/2018. Ao final, postulou a procedência do pedido com a condenação da requeria ao pagamento do valor de R$ 20.247,30 (vinte mil duzentos e quarenta e sete reais e trinta centavos).
Devidamente citada, a requerida apresentou contestação, arguindo, preliminarmente, incompetência territorial, pois prestou serviços junto à Secretaria de Estado de Educação no Município de Água Doce/SC. No mérito, sustentou que ficou afastada em licença sem remuneração no período de setembro/2012 a janeiro/2015, sendo que durante o período de afastamento contribuiu diretamente para o INSS - Instituto Nacional do Seguro Social, pois é funcionária do SENAR, não podendo ser compelida ao pagamento de duas contribuições; que enquanto ficou afastada sem remuneração não tinha como efetuar o pagamento das contribuições, pois não havia salário para a base de cálculo; que somente poderia ser compelida a realizar o recolhimento se desejasse que tal período de licença fosse aproveitado para fins de aposentadoria, o que não é o caso; que as licenças dos servidores públicos constituem causas de suspensão do vínculo com o Ente Federado e, nessa condição, o cidadão não perde a sua condição de ocupante de cargo de provimento efetivo; que deve ser aplicado o princípio da não cumulatividade; que não tem a obrigação de efetuar o pagamento, porquanto é indevida a cobrança. Pugnou pela improcedência do pedido.
A autarquia apresentou réplica à contestação.
Na sequência, a MMa. Juíza de Direito, ao sentenciar o feito, inscreveu na parte dispositiva da decisão:
Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE o pedido, com fundamento no art. 487, I, do CPC/2015, formulado por IPREV - Instituto de Previdência do Estado de Santa Catarina em face de Grasiane Bittencourt.
Diante da sucumbência, condeno a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios, estes fixados em 10% sobre valor atualizado da causa, nos termos do artigo 85, §3º, I, do Código de Processo Civil.
Em relação às custas processuais, isenta a parte autora (LC 161/97),
Publique-se. Registre-se. Intime-se. Oportunamente, arquive-se.
Inconformada, o IPREV interpôs recurso de apelação em que repisou os termos expostos na exordial, acrescentando que deve ser observado o princípio da irretroatividade da lei tributária haja vista que a alteração do art. 4°, § 4°, da LC n. 412/2008, pela LC n. 662, de 11/12/2015, que tornou facultativo o recolhimento da contribuição previdenciária não se aplica ao presente caso, pois a lei vigente no momento do fato gerador (concessão da licença em setembro/2012) tornava compulsória sua exigência. Argumentou que "o entendimento firmado pela sentença trará sérias consequências à aposentadoria da parte autora, pois o afastamento do servidor em licença para tratar de interesses particulares, sem o recolhimento da contribuição previdenciária, gera a interrupção na prestação do serviço público, o que afasta a aplicação da Orientação Normativa do Ministério da Previdência Social nº 02, de 31 de março de 2009". No final, requereu o provimento do recurso para, "com fundamento na legalidade, e consoante determinação expressa da LCE n. 412/2008 e amparo no art. 149, § 1º da CF, art. 4º da EC 20/98, art. 12 da Lei n. 8.213/91, art. 1° da Lei n° 9.717, de 27 de novembro de 1998, e art. 111, II, do CTN", "ser reformada a sentença para que seja julgada procedente a demanda".
Com as contrarrazões, os autos ascenderam a esta Corte de Justiça

VOTO


Trata-se de recurso de apelação interposto pelo Instituto de Previdência do Estado de Santa Catarina - IPREV, contra a sentença que, nos autos da "ação de cobrança" ajuizada em face de Grasiane Bittencourt, julgou improcedente o pedido inicial com que buscava a condenação da apelada ao pagamento das contribuiçoes previdenciárias não vertidas enquanto a servidora estava sob licença sem remuneração para tratar de interesse particular.
Defende a autarquia apelante que a contribuição previdenciária, na qualidade de contribuição compulsória, é sempre devida, estando o servidor em atividade ou usufruindo de licença para tratamento de interesse particular, visto que a exação assenta-se no princípio contributivo e solidário do regime previdenciário, em manter o equilíbrio financeiro e atuarial, além do fato de o vínculo do servidor estatal com o Regime Próprio permanecer ativo (fato gerador do tributo) e que a lei também não faculta a possibilidade de contribuir somente com a cota do segurado. Argumenta, ainda, que deve ser observado o princípio da irretroatividade da lei tributária haja vista que a alteração do art. 4°, § 4°, da LC n. 412/2008, pela LC n. 662, de 11/12/2015, que tornou facultativo o recolhimento da contribuição previdenciária não se aplica ao presente caso, pois a lei vigente no momento do fato gerador (concessão da licença em setembro/2012) considerava compulsória sua exigência.
Pois bem.
O compulsar dos autos revela que a demandada, servidora estadual, usufruiu de licença sem remuneração para tratar de assuntos particulares, afastando-se de seu cargo efetivo na Secretaria de Estado da Educação, no período de setembro de 2012 a janeiro de 2015, em que não recolheu as contribuições previdenciárias ao IPREV.
Na época da licença sem remuneração da apelada a legislação aplicável não previa a possibilidade de o servidor optar por não recolher as contribuições previdenciárias durante o período em que esteve afastado de suas funções. Pelo contrário, estava previsto que o servidor que goza de licença sem remuneração tinha que se manter obrigatoriamente vinculado ao Regime Próprio de Previdência Social do Estado de Santa Catarina (RPPS/SC) e, por consequência, deveria proceder ao recolhimento das contribuições previdenciárias, e, não o fazendo, o ente previdenciário poderia exigir opagamento dos respectivos valores, inclusive por meio de ação de cobrança.
Efetivamente, o art. 3°, parágrafo único, da Lei Complementar Estadual n. 36/1991, vigente até junho de 2008 (quando, sobre o tema, passou a viger a LCE n. 412/2008), previa o seguinte:
Art. 3º Aos Chefes dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, ao Presidente do Tribunal de Contas do Estado e ao Procurador Geral de Justiça é facultado conceder a seus servidores licença sem remuneração, para tratar de assuntos de interesse particular, pelo prazo de até 06 (seis) anos.
Parágrafo único - Durante a licença de que trata o "caput" deste artigo, o servidor fica obrigado a contribuir para o Instinto de Previdência do Estado e para o fundo de aposentadoria ou qualquer outro órgão que vier a substituí-los. (grifou-se).
Por sua vez, a Lei Complementar Estadual n. 412/2008, no § 4º do art. 4º, na redação original, previu o seguinte:
"Art. 4º Os segurados definidos no art. 3º, XXV, desta Lei Complementar, são obrigatoriamente filiados ao RPPS/SC, quando integrantes:"I - do Poder Executivo, neste incluídas suas autarquias e fundações;"II - do Poder Judiciário; III - do Poder Legislativo;"IV - do Ministério Público;"V - do Tribunal de Contas."[...]"§ 3º Permanece filiado ao RPPS/SC, mediante contribuição previdenciária, o segurado que estiver afastado de suas funções, quando:"I - cedido ou à disposição para outro órgão ou entidade da administração direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios;"II - afastado ou licenciado, temporariamente, do cargo e de suas funções;"III - no exercício de mandato eletivo, nas condições previstas em lei."§ 4º Para manter a qualidade de segurado do RPPS/SC nos casos de afastamento ou de licenciamento dos cargos ou das funções exercidos, sem remuneração ou subsídio, o segurado deverá obrigatoriamente efetuar o recolhimento mensal das suas contribuições previdenciárias e da parte patronal, estabelecidas no art. 17 desta Lei Complementar." (grifou-se).
O dispositivo retro foi alterado pela Lei Complementar Estadual n. 662, de 11.12.2015, inaplicável ao caso por ser posterior ao período de contribuições previdenciárias que o IPREV pretende recolher nestes autos. A nova redação, embora inaplicável ao caso, porque posterior ao período de gozo da licença sem remuneração da demandada, é a seguinte:
§ 4º Para manter a qualidade de segurado do RPPS/SC,...

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