Acórdão Nº 0302395-88.2015.8.24.0011 do Quinta Câmara de Direito Civil, 01-12-2020

Número do processo0302395-88.2015.8.24.0011
Data01 Dezembro 2020
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 0302395-88.2015.8.24.0011/SC



RELATOR: Desembargador LUIZ CÉZAR MEDEIROS


APELANTE: JUANITO DA CUNHA (AUTOR) ADVOGADO: PAULO DA SILVEIRA MAYER (OAB SC019063) APELADO: EXPRESSO TRUCK - CLUBE DE BENEFICIOS AO CAMINHONEIRO (RÉU) ADVOGADO: CINTIA SOUZA DOS SANTOS (OAB MG133023)


RELATÓRIO


Por refletir fielmente o contido no presente feito, adoto o relatório da r. sentença (ev. 95 do primeiro grau):
"JUANITO DA CUNHA, devidamente qualificada na exordial, ajuizou a presente ação de cobrança c/c lucros cessantes e indenização por danos morais em face de EXPRESSO TRUCK - CLUBE DE BENEFICIOS AO CAMINHONEIRO.
Alegou a parte autora, em síntese, que é proprietária do veículo/caminhão M. Benz/1938, placa KEJ5460, cor branca, ano 2001, chassi 9BM6931961B288481, que é segurado pela ré, com cobertura de até R$ 129.000,00 por danos materiais decorrentes de acidente de trânsito. Afirmou que no dia 15.4.2014, por volta das 15h15min, o veículo, conduzido pelo Sr. Moacir Morais, sofreu um acidente e, por isso, acionou a ré. Porém, esta se negou a realizar o pagamento, o que teria gerado prejuízos ao autor que deixou de auferir lucro com os fretes realizados com o veículo em questão. Requereu, então, a edição de provimento judicial para condenar a ré ao pagamento das despesas do conserto do veículo, no valor de R$ 53.662,00, em lucros cessantes e em indenização por danos morais. Além disso, requereu a inversão do ônus da prova e a produção de todos os meios de prova. Juntou documentos com a inicial.
Houve emenda da inicial (Evento 8).
A parte requerida, citada (Evento 46), apresentou contestação (Evento 49), oportunidade em que alegou, em síntese, que possui um contrato de proteção veicular com o autor e foi realizada sindicância no local do acidente e o perito constatou que o veículo estava acima da velocidade máxima permitida. Disse que solicitou o tacógrafo para verificar a velocidade do veículo, que foi entregue pelo autor. Entretanto, o perito verificou que o tacógrafo não pertencia ao veículo, pois havia divergências na distância percorrida e no horário de deslocamento. Impugnou a inversão do ônus da prova. Requereu a improcedência do pedido. Em caso de condenação, requereu a fixação dos danos materiais no valor do orçamento apresentado pela ré e a fixação dos danos morais de acordo com a proporcionalidade e razoabilidade. Juntou documentos.
Houve réplica (Evento 53).
As partes foram intimadas para especificar as provas pretendidas (Evento 55).
O feito foi saneado, afastada a incidência do Código de Defesa do Consumidor e designada audiência de instrução (Evento 63).
Em audiência de instrução, a conciliação foi inexitosa e as partes desistiram da produção de prova oral que seria produzida no ato (Evento 74).
A testemunha Wanderlei Sena Nuvem foi ouvida por carta precatória (Evento 85).
As partes apresentaram alegações finais por memoriais (Eventos 89 e 90).
Vieram-me os autos conclusos.
É o relatório".
Acresço que o Togado a quo julgou improcedentes os pedidos, por meio da sentença cujo dispositivo segue transcrito:
"Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados por JUANITO DA CUNHA em face de EXPRESSO TRUCK - CLUBE DE BENEFICIOS AO CAMINHONEIRO.
Condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios em favor do procurador da requerida, os quais fixo em 10% sobre o valor da causa (art. 85, §2º, do CPC).
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Transitada em julgado, cumpridas as formalidades legais e pagas eventuais custas, arquivem-se os autos com as baixas e cautelas devidas".
Irresignado, Juanito da Cunha interpôs apelação, na qual alega, preliminarmente, que ao caso se aplica o Código de Defesa do Consumidor.
No mérito, arguiu que não tem conhecimento acerca da suposta entrega de tacógrafo errado e que o Boletim de Ocorrência não faz qualquer menção a excesso de velocidade, sendo esta afirmação feita apenas pelo regulador de sinistro contratado pela ré.
Sustentou que "a Recorrida, ilicitamente, não cumpriu com suas obrigações securitárias, deixando de pagar a indenização dos danos causados no veículo do Recorrente" (fl. 6).
Defendeu o ressarcimento dos lucros que deixou de auferir, bem como reparação de ordem moral (ev. 102 do primeiro grau).
Intimada, a apelada apresentou contrarrazões, pugnando pela manutenção da sentença (ev. 107 do primeiro grau), com o que os autos ascenderam a esta Corte para julgamento

VOTO


1 Presentes os pressupostos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade recursal, o reclamo merece ser conhecido, passando-se, desta forma, à respectiva análise.
2 Ab initio, ao contrário do que alega o apelante, cabe esclarecer que ao caso não se aplica o Código de Defesa do Consumidor.
A ré, ora recorrida, muito embora atue como tal, não se enquadra legalmente como companhia de seguros, pois é, de fato, entidade associativa, sem fins lucrativos, que disponibiliza aos seus associados um sistema mutualista, com a finalidade de resguardar os interesses dos proprietários de veículos que representa, conforme se retira de seu estatuto social (ev. 49, inf. 63, fl. 2 dos autos de origem).
Sobre as associações de ajuda mútua, retira-se da doutrina:
"Constituem-se de um grupo de pessoas que se dispõem a proteger determinado prejuízo, a fim de que sua repercussão se atenue pela dispersão dos valores vertidos em favor de coletividade restrita. Forma-se uma entidade de auxílio mútuo para o qual contribuem todos os integrantes em benefício dos sócios atingidos pelo infortúnio." (VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: contratos em espécie. 16ª ed. São Paulo: Atlas, 2016. p. 443).
"Contudo, preceitua o Enunciado n. 185 CJF/STJ, aprovado na III Jornada de Direito Civil, que 'a disciplina dos seguros do Código Civil e as normas de previdência privada que impõe a contratação exclusivamente por meio de entidades legalmente autorizadas não impedem a formação de grupos restritos de ajuda mútua, caracterizados pela autogestão'. O enunciado refere-se ao seguro-mútuo, cuja possibilidade é reconhecida e cujo conceito consta do próprio enunciado. No entanto, é preciso ressaltar que as sociedades de seguros mútuos, reguladas pelo Decreto-lei 2.063/1940, não se confundem com as companhias seguradoras, pois naquelas os segurados não contribuem por meio de prêmio, mas sim por meio de quotas necessárias para se protegerem de determinados prejuízos por meio da dispersão do evento danoso entre seus vários membros." (TARTUCE, Flávio. Direito Civil: teoria geral dos contratos e contratos em espécie. 11ª ed. rev. atual. ampl. Rio de Janeiro: Forense ,2016. p. 673).
Com efeito, a relação entre o recorrente e a associação, não se enquadra como de consumo.
Nesse sentido, mudando-se o que deve ser mudado:
"AÇÃO DE NULIDADE DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS ABUSIVAS - IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO - SEGURO MÚTUO MANTIDO POR ASSOCIAÇÃO DE PRODUTORES DE FUMO - INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO DE CONSUMO - INAPLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - NECESSIDADE DE SE OBSERVAR O PRINCÍPIO PACTA SUNT SERVANDA - SENTENÇA MANTIDA. [...]" (AC n. 2004.035366-6, Des. Jaime Luiz Vicari) [sem grifos no original].
Assim, a presente demanda não será analisada sob a ótica consumerista.
3 Compulsando-se os autos, verifica-se que restou incontroverso que o autor aderiu ao grupo segurado.
Durante a utilização do bem assegurado, no dia 15.4.2014, na rodovia BR-282, o motorista perdeu o controle do caminhão, que saiu da pista e tombou, ocasionando o sinistro, conforme o BO n.83176903, elaborado pela Polícia Rodoviária Federal (ev. 1, inf. 8 do primeiro grau).
Comunicado o evento à ré, esta promoveu Regulação...

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