Acórdão Nº 0302419-24.2018.8.24.0040 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 13-05-2021

Número do processo0302419-24.2018.8.24.0040
Data13 Maio 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 0302419-24.2018.8.24.0040/SC



RELATOR: Desembargador LUIZ ZANELATO


APELANTE: CELINA SERAFIM DOS PASSOS (AUTOR) ADVOGADO: Stephany Sagaz Pereira (OAB SC035218) ADVOGADO: GUSTAVO PALMA SILVA (OAB SC019770) APELADO: CREFISA SA CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS (RÉU) ADVOGADO: MILTON LUIZ CLEVE KUSTER (OAB SC017605)


RELATÓRIO


CELINA SERAFIM DOS PASSOS interpôs recurso de apelação da sentença proferida pelo juízo da 2ª Vara Cível da comarca de Laguna, que julgou improcedentes os pedidos formulados na petição inicial (Evento 31 dos Autos Originários).
Na origem, CELINA SERAFIM DOS PASSOS propôs ação revisional em face de CREFISA SA CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS, sob o argumento de que, em 7 de abril de 2016, celebrou com a ré o Contrato de Empréstimo Pessoal n. 030400041842, o qual entende possuir cláusulas abusivas, tais como juros remuneratórios acima da média de mercado, além da cobrança de juros não previstos, causando-lhe abalo moral. Requereu a concessão da justiça gratuita, a declaração de nulidade da cláusula de juros remuneratórios, a repetição do indébito em dobro, a homologação do laudo pericial, a condenação da ré à indenização por danos morais, e a inversão do ônus da prova à luz do Código de Defesa do Consumidor (Evento 1 dos Autos Originários).
Ao receber a inicial, considerando que a demandante propôs outras demandas da mesma natureza contra a demandada, o juízo de origem determinou o apensamento dos feitos ns. (I) 0302417-54.2018.8.24.0040, (II) 0302423-61.2018.8.24.0040, (III) 0302422-76.2018.8.24.0040; (IV) 0302421-91.2018.8.24.0040, (V) 0302420-09.2018.8.24.0040; (VI) 0302419-24.2018.8.24.0040 e (VII) 0302418-39.2018.8.24.0040 (Evento 3 dos Autos Originários).
Citada, a ré apresentou contestação, suscitando, preliminarmente, a inépcia da petição inicial, a conexão das ações, e impugnou a pretendida gratuidade judiciária. No mérito, defende a legalidade das cláusulas contratuais, destacando que as taxas de juros são estipuladas de acordo com o risco do tipo de operação. Postula, ao final, a improcedência dos pedidos do pleito autoral (Evento 17 dos Autos Originários).
Réplica apresentada no Evento 26.
Na data de 3 de abril de 2020, o juiz da causa, Dr. Eduardo Passold Reis, prolatou sentença de improcedência, cujo dispositivo segue transcrito:
Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados na inicial, nos termos do art. 487, I, do Código de Processo Civil, porque inviável o pleito revisional e por não haver danos a indenizar ou valor a devolver à parte demandante.
CONDENO a parte autora ao pagamento das custas e dos honorários processuais, os quais arbitro em R$1.000,00, ficando suspensa a exigibilidade da condenação em razão da justiça gratuita outrora deferida. Intimem-se. Publique-se. Registre-se.
Transitada em julgado, arquive-se. (Evento 31 dos Autos Originários).
Irresignada, a parte autora interpôs recurso de apelação, sustentando, inicialmente, que faz jus ao benefício da justiça gratuita. Na sequência, assevera que (a) "a taxa adotada pela financeira extrapola em muito os referencias do Banco Central do Brasil, de modo a ser necessária a sua adequação"; (b) "no julgamento do REsp n. 1061530/RS, foi determinado que 'o reconhecimento da abusividade nos encargos exigidos no período da normalidade contratual (juros remuneratórios e capitalização) descaracteriza a mora'. Logo, tendo em vista a necessidade de adequação do pacto à taxa média de mercado, deve-se ser afastado os efeitos da mora"; e (c) "diante da falha na prestação do serviço do réu, o dano moral é claro em face da postura desrespeitosa e abusiva da empresa, da sensação de vergonha, impotência e revolta infligida ao cliente que, sem opção para solução do problema, é levada a buscar patrono e ingressar com demanda judicial a fim de ver atendido seu pleito" (Evento 37 dos Autos Originários).
Foram apresentadas as contrarrazões (Evento 44 dos Autos Originários).
Ao aportar no Tribunal de Justiça, o recurso foi distribuído a esta relatoria por prevenção (Evento 9).
É o relatório

VOTO


1. Exame de admissibilidade
A análise do mérito do recurso tem repercussão no juízo de sua admissibilidade, de modo que o exame se dá de forma conjunta a seguir.
2. Fundamentação
2.1. Juros remuneratórios
Em atenção ao teor da sentença, deflui que o magistrado equacionou a insurgência autoral nos seguintes termos:
I. Do preceito revisional:
Alega a requerente que as cláusulas que estabelecem os juros oriundos do contrato de empréstimo consignado do Banco réu são abusivas e em desconformidade com a médica indicada pelo Banco Central do Brasil, o que gera sua nulidade e necessidade de revisão dos valores.
No entanto, razão não assiste à parte autora, tendo em vista que em observância aos documentos de fls. 68 e 69, bem como os de fls. 186-190, houve a inadimplência e/ou atraso no pagamento, sendo perfeitamente aceitável a incidência de juros.
Nesses termos, fundamenta-se que é assentado o entendimento de que a "estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade" (súmula 382 do STJ).
O mútuo é uma operação econômica e sua análise deve se dar em premissas econômicas. É comum entre os juristas a tentativa de análise multidisciplinar em temas em que esta análise é incabível ou temerária. O resultado é um tratamento assistemático da questão, com periclitação à previsibilidade das operações e à segurança jurídica. A utilização de critérios sociológicos ou antropológicos, e mesmo de cariz assistencial ou humanitário tem transformado questões baseadas em operações econômicas simples e de origem milenar, em esquemas matemáticos complexos e fontes de discussões homéricas.
É comum a crítica de outras Ciências à Ciência Jurídica à sua lógica fuzzy. E, justiça seja feita, não estão errados os detratores da Ciência Jurídica nesse ponto. Os juristas dizem, argumentam e o pior, decidem, sem dados concretos; baseiam-se em paradigmas antes postos, em estruturas pré-concebidas,em esquemas de retórica argumentativa sem atenção ao fundo da questão.
[...]
A partir de uma lógica fuzzy, confundem-se origem, misturam-se conceitos, mesclam-se de modo inimaginável características, sem atentar eminentemente à centralidade das operações em discussão. A reviravolta de marcado viés "social" na interpretação de contratos e na inumerável possibilidade de sua revisão é um exemplo bastante icônico e historicamente bem próximo dessa realidade.
O jurista, ao decidir, esquece-se que contratos sempre foram - desde as priscas eras do escambo até o moderno contrato eletrônico - operações econômicas. E como operações econômicas, pois, eles devem ser tratados. O dirigismo judicial e o intervencionismo, por menor que seja, nesse caso, além de ofender conceitos clássicos de Economia, apresenta efeitos deletérios. A fluidez e a inconsistência das decisões, e sobretudo, seu caráter ideológico por vezes permissivo e compassivo implicam em incerteza e em porosidade nefasta à visão sistêmica dos institutos legais.
Cotejando estas premissas com a realidade do feito em discussão, no caso submetido à análise, ficou sobejamente comprovada a licitude do comportamento do requerido, pois a dívida é decorrente do contrato de prestação de serviços financeiros havido entre as partes,...

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