Acórdão Nº 0302473-70.2015.8.24.0015 do Quinta Câmara de Direito Público, 27-02-2020

Número do processo0302473-70.2015.8.24.0015
Data27 Fevereiro 2020
Tribunal de OrigemCanoinhas
ÓrgãoQuinta Câmara de Direito Público
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Cível n. 0302473-70.2015.8.24.0015, de Canoinhas

Relator: Desembargador Hélio do Valle Pereira

MEIO AMBIENTE - POLÍCIA MILITAR AMBIENTAL - ÓRGÃO EXECUTOR DE ACORDO COM A LEI ESTADUAL 14.675/09 - AMPLO PODER DE FISCALIZAÇÃO - COMPETÊNCIA AINDA PARA APLICAR SANÇÕES E EM PRIMEIRA INSTÂNCIA ADMINISTRATIVA APRECIAR EVENTUAL DEFESA DO INFRATOR - MULTA - JULGAMENTO QUE NÃO INCORREU EM CERCEAMENTO DE DEFESA OU OFENSA AO PROCESSO LEGAL - DEGRADAÇÃO AMBIENTAL COMPROVADA - VALORAÇÃO, PORÉM, QUE DEPENDE DE PRÉVIO LAUDO DE CONSTATAÇÃO - SENTENÇA CONFIRMADA.

1. O Código Estadual do Meio Ambiente (Lei 14.675/09) definiu, na linha da Lei 9.605/98, que a Polícia Militar Ambiental é órgão executor em conjunto com o Instituto do Meio Ambiente. Atua em nome do Estado de Santa Catarina e possui amplo poder de fiscalização, podendo aplicar sanções e até firmar termo de compromisso - neste caso com auxílio técnico da entidade estadual (IMA). Essa tarefa inclui também o ônus de na primeira instância administrativa apreciar a eventual defesa apresentada pelo infrator, pois é possível se retirar da referida norma interpretação de que ambos (o órgão estadual e o instituto do meio ambiente) atuam de forma coordenada e que estão gabaritados para o julgamento - não se tratando de atuação meramente coadjuvante da corporação militar ambiental -, apenas se exigindo que tal veredicto se dê por aquele que realizou concretamente a fiscalização. Precedentes do TJSC.

2. Não há cerceamento de defesa ou ofensa ao processo legal pelo fato de Conselheiro Substituto do Conselho Estadual do Meio Ambiente ter dado parecer (no sentido de que fossem realizadas diligências) e o relator sorteado, entendendo por desnecessárias as providências, ter na sequência proferido diretamente seu voto e submetido ao julgamento pelo Consema - notadamente quanto tais determinações nem sequer poderiam interferir, como de fato não interferiram, na conclusão final: houvera mesmo vazamento de óleo diesel, conforme imagens fotográficas, prova testemunhal, fiscalização in loco e admissão pelo proprietário do estabelecimento (o aqui recorrente).

3. Não há discricionariedade no campo punitivo, ou se haveria de reconhecer que seria dado ao agente público aplicar e medir sanções ao sabor da conveniência e oportunidade - e, pior ainda, com extremas limitações ao controle jurisdicional.

Reprimenda em processo administrativo decorrente de infração ambiental envolve juízo de valor próximo, se não equivalente, àquele do âmbito penal. As sanções devem ser dosadas fundamentadamente. A prática de um fato, em tese, punível com multa, não leva necessariamente a esse resultado, muito menos se permite que não sejam expostas razões concretas quanto ao valor da sanção - o que não foi seguido na situação concreta, pois a legislação taxativamente impõe, nos casos de lançamento de resíduos ou substâncias oleosas, que para tanto haja prévio laudo de constatação.

4. Recurso e remessa necessária desprovidos.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0302473-70.2015.8.24.0015, da comarca de Canoinhas 2ª Vara Cível em que é Apelante Acácio Alberto Petry e Apelado o Estado de Santa Catarina.

A Quinta Câmara de Direito Público decidiu, por unanimidade, conhecer e negar provimento ao recurso e à remessa. Custas legais.

Participaram do julgamento, realizado nesta data, os Excelentíssimos Senhores Desembargadores Denise de Souza Luiz Francoski e Vilson Fontana.

Florianópolis, 27 de fevereiro de 2020.

Desembargador Hélio do Valle Pereira

Presidente e relator


RELATÓRIO

Adoto o relatório da sentença do Juiz Luiz Carlos Cittadin da Silva:

Acacio Alberto Petry ajuizou ação anulatória de débito cumulada com antecipação de tutela em face do Estado de Santa Catarina. Alegou que foi autuado por infração ambiental em 10.4.2010, com proposição do pagamento de multa no valor de R$ 50.000,00, em razão de suposta infração ambiental prevista nos arts. 70 e 72, II, da Lei 9.605/1998 e 2º, 3º, II, e 62, V, do Decreto 6.514/2008. Sustentou que o processo administrativo ambiental desrespeitou princípios fundamentais, caracterizando cerceamento de defesa e inobservância do processo legal, o que compromete sua validade. Arguiu também a ocorrência de prescrição, incompetência da autoridade julgadora e nulidade da multa, bem como afirmou que a responsabilidade ambiental no âmbito administrativo é subjetiva e que inexistiu relação entre os resultados das análises e o rompimento do flexível da bomba de combustível, de modo que não houve dano ambiental. Diante disso, requereu a concessão de antecipação de tutela, a fim de que fosse suspensa a exigibilidade da multa. Ao final, postulou o acolhimento da arguição de prescrição, incompetência da autoridade julgadora e nulidade do procedimento administrativo e da multa, com a confirmação da liminar.

Indeferido o pedido de antecipação de tutela (fls. 249-252).

O réu apresentou contestação às fls. 264-298, na qual sustentou a imprescritibilidade do dano ambiental, a ausência de prescrição intercorrente, a competência da Polícia Militar Ambiental para a aplicação de penalidades por infrações ambientais e a inexistência de cerceamento de defesa e afronta ao devido processo legal. Afirmou que não há nulidade no acórdão do CONSEMA e que a multa aplicada é legal, bem como que a responsabilidade administrativa ambiental é objetiva. Pugnou pela improcedência dos pedidos formulados.

Réplica às fls. 988-993.

O Ministério Público entendeu desnecessária sua intervenção (fls. 1016-1017).

Realizada audiência de instrução e julgamento (fl. 1046), oportunidade em que foram ouvidas 4 testemunhas.

Alegações finais às fls. 1048-1055 e 1056-1064, com o decurso do prazo para manifestação do Ministério Público (fl. 1067).

Adito que Sua Excelência deu pela procedência parcial nestes termos:

DIANTE DO EXPOSTO, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados por Acacio Alberto Petry em face do Estado de Santa Catarina, com fundamento no art. 487, I, do CPC, para declarar a nulidade da DARE referente à multa aplicada no processo administrativo ambiental 21600.2010.16046, emitida no valor de R$ 50.000,00, e determinar que o montante devido a título de multa simples seja fixado conforme o laudo de constatação, de acordo com a dimensão do dano decorrente da infração e a gradação do impacto, com posterior emissão de nova DARE.

Ante a sucumbência recíproca, condeno as partes ao pagamento das custas processuais na proporção de 2/3 para a parte autora e 1/3 para a parte ré. Fixo honorários advocatícios em 10% sobre o valor atualizado da causa, na forma do art. 85, §§ 2º e 3º, do CPC, a serem rateados na mesma proporção das custas.

O Estado de Santa Catarina é isento de custas (art. 33 da LCE 156/1997).

P.R.I.

Sentença sujeita à remessa necessária (art. 496, I, do Código de Processo Civil).

O particular recorre. Reitera que a Polícia Militar Ambiental não é competente para julgar processos administrativos, mas apenas para emitir auto de infração conforme consta do Termo Aditivo 01 do Convênio 12.013/2009-8, celebrado entre a Secretaria de Estado de Desenvolvimento Sustentável, Fatma e PMA - cujo acordo confere à segunda entidade a exclusividade nessa aplicação. Traz precedente sobre o aspecto.

Sob outro ângulo reforça que houve cerceamento de defesa. Relata que após recebimento de seu recurso administrativo pelo Conselho Estadual do Meio Ambiente - Consema os autos foram remetidos para o relator João Batista Lins Coutinho, não para a Conselheira Cláudia como constou da sentença. A partir daí afirma que o primeiro foi quem elaborou parecer, solicitando que os autos fossem remetidos para a Fatma a fim de sanar questões de ordem jurídica, ali também indicando que o relatório emitido pela instituição continha diversos defeitos. Ocorre que sem justificativa alguma a medida foi descumprida; ignorada, a Conselheia Cláudia lavrou novo parecer mantendo o auto de infração - tudo em seu prejuízo, pois não se permitiu, nos termos do Regimento Interno do Consema, a realização de diligências, inclusive nem sequer tendo sido feito menção ao relatório anterior. Aliás, o acórdão respectivo tampouco fez constar os membros presentes e os correspondentes votos, salienta. Dito de outro modo, o parecer emitido pela Conselheira deve ser declarado nulo para todos os efeitos.

Quanto ao conteúdo do auto de infração em si, defende que sua testemunha revelou a ausência de relação entre o vazamento de óleo diesel constatado na vistoria em abril de 2010 e a suposta contaminação presente nas amostras coletadas em fevereiro do mesmo ano - a própria Fatma, a propósito, emitiu relatório dando conta de que dois meses antes não havia vazamento, de modo que eventual contaminação de lençol freático ocorreria, quando muito, em torno de um ano após o derramamento. Para que não fiquem dúvidas adverte que a Licença Ambiental de Operação (LAO), emitida poucos meses depois, não foi tampouco alterada, o que afasta alguma sorte de aumento da degradação ambiental, salientando ainda que muito menos houve contaminação da rede pluvial ("bueiro").

Em contrarrazões o Estado de Santa Catarina defendeu a manutenção da sentença.

O Ministério Público negou interesse no feito.

VOTO

1. O primeiro argumento do apelante diz respeito à (in)competência da Polícia Militar Ambiental para julgar o processo administrativo correspondente ao auto de infração lavrado.

A tese não cativa.

A Lei que instituiu a Política Nacional do Meio Ambiente (6.938/81) dispôs quanto aos órgãos seccionais que constituem o Sisnama - Sistema Nacional do Meio Ambiente:

Art 6º - Os órgãos e entidades da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios, bem como as fundações instituídas pelo Poder Público, responsáveis pela proteção e melhoria da qualidade ambiental, constituirão o Sistema...

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