Acórdão Nº 0302486-64.2018.8.24.0015 do Primeira Câmara de Direito Público, 05-04-2022

Número do processo0302486-64.2018.8.24.0015
Data05 Abril 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0302486-64.2018.8.24.0015/SC

RELATOR: Desembargador PEDRO MANOEL ABREU

APELANTE: JOAO PEDRASSANI (Espólio) (EMBARGANTE) ADVOGADO: JEISON FRANCISCO MEDEIROS (OAB SC022523) ADVOGADO: CARLOS LEONARDO SALVADORI DIDONÉ (OAB SC009830) APELANTE: ESTADO DE SANTA CATARINA (EMBARGADO) REPRESENTANTE LEGAL DO APELANTE: LEO SERGIO PEDRASSANI (Inventariante) APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Cuida-se de apelação cível interposta pelo ESTADO DE SANTA CATARINA em objeção à sentença que acolheu os embargos de terceiro propostos pelo ESPÓLIO DE JOÃO PEDRASSANI para desconstituir penhora efetivada sobre bem imóvel, nos autos da execução fiscal que aquele move em face de Comercial Pedrassani Ltda.

O decisum objurgado, ao identificar que a transferência do imóvel ocorreu antes mesmo do ajuizamento das execuções fiscais, descartou a suposta ocorrência de fraude à execução, determinando o levantamento da penhora efetivada. Ao arremate, condenou o embargado nos ônus sucumbenciais, com suporte no princípio da causalidade, arbitrando os honorários advocatícios em R$2.000,00(dois mil reais), com espeque no art. 85, §8º, do CPC.

Em sua insurgência, o Estado de Santa Catarina reedita os argumentos lançados em contestação, reforçando a tese de que está configurada nos autos hipótese de fraude à execução, uma vez que a transferência imobiliária ocorreu entre empresas do mesmo grupo familiar, cujo sócio majoritário era a mesma pessoa.

Em sede de contrarrazões, o apelado pugnou pela manutenção do decisum.

O embargante/apelado também apresentou recurso adesivo, porfiando pela reforma da sentença no ponto em que arbitrou os honorários advocatícios, requerendo a fixação, segundo os critérios do art. 85, §3º, do Código de Processo Civil.

Houve contrarrazões pela manutenção dos honorários advocatícios fixados na sentença, sob a justificativa de que o ente público não deu causa à penhora de imóvel de terceiro, uma vez que o bem está registrado na serventia imobiliária em nome da executada.

Este é o relatório.

VOTO

De pronto, adianta-se, o recurso do Estado de Santa Catarina não convence.

A insurgência formulada nos embargos de terceiro deu-se em razão da penhora judicial, perfectibilizada nos autos da Execução Fiscal n. 0003912-25.1997.8.24.0015, ter recaído sobre imóvel transferido antes do protocolo da execução fiscal.

Pela clareza e objetividade com que abordou os fatos evidenciados na hipótese, colhe-se da bem lançada sentença da lavra da Dra. Dominique Gurtinski Borba Fernandes:

A parte embargante alegou que o imóvel em discussão foi transferido para a empresa Transportes Pedrassani muito antes da citação na execução fiscal. Ainda, afirmou que a única ação em que fora citada antes da alienação dos bens de uma empresa para outra estava garantida por bem oferecido a penhora e aceito pelo Estado, ora embargado. Sustentou, ademais, que a CDA que instrui a execução fiscal que originou a constrição sobre o imóvel está quitada, o que geraria a extinção daquela ação e consequentemente levantamento da penhora realizada.

O Estado, por sua vez, argumentou que estaria configurada a fraude à execução, porquanto a transferência do imóvel se deu entre empresas do mesmo sócio (João Pedrassani).

Sobre a fraude à execução trata o artigo 185 do Código Tributário Nacional. O referido dispositivo teve sua redação modificada em 2005 e, uma vez que a alienação do imóvel ocorreu em 1996, deve ser aplicado conforme a redação de outrora, que assim dispunha:

Art. 185. Presume-se fraudulenta a alienação ou oneração de bens ou rendas, ou seu começo, por sujeito passivo em débito para coma Fazenda Pública por crédito tributário regularmente inscrito como dívida ativa em fase de execução.

Parágrafo único. O disposto neste artigo não se aplica na hipótese de terem sido reservados pelo devedor bens ou rendas suficientes ao total pagamento da dívida em fase de execução. (Grifou-se)

Com a entrada em vigor da Lei Complementar n.º 118 a partir de 09.06.2005, o mencionado artigo passou a ostentar o seguinte teor:

Art. 185. Presume-se fraudulenta a alienação ou oneração de bens ou rendas, ou seu começo, por sujeito passivo em débito para coma Fazenda Pública, por crédito tributário regularmente inscrito como dívida ativa.

Parágrafo único. O disposto neste artigo não se aplica na hipótese de terem sido reservados, pelo devedor, bens ou rendas suficientes ao total pagamento da dívida inscrita. (Grifou-se)

Portanto, a alienação engendrada até 09.06.2005 exigia a prévia citação do devedor para que caracterizasse fraude à execução. Por outro lado, se a transmissão fosse praticada a partir de 09.06.2005, data de início da vigência da Lei Complementar n.º 118/2005, bastaria a inscrição em dívida ativa para a configuração da fraude.

Esse é o entendimento do STJ:

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVODE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C,DO CPC. DIREITO TRIBUTÁRIO. EMBARGOS DE TERCEIRO. FRAUDE À EXECUÇÃO FISCAL. ALIENAÇÃO DE BEM POSTERIOR À CITAÇÃO DO DEVEDOR. INEXISTÊNCIA DE REGISTRO NO DEPARTAMENTO DE TRÂNSITO-DETRAN. INEFICÁCIA DO NEGÓCIO JURÍDICO. INSCRIÇÃO EM DÍVIDA ATIVA. ARTIGO 185 DO CTN, COM A REDAÇÃO DADA PELA LC N.º 118/2005. SÚMULA 375/STJ. INAPLICABILIDADE. [...] 9. Conclusivamente: (a) a natureza jurídica tributária do crédito conduz a que a simples alienação ou oneração de bens ou rendas, ou seu começo, pelo sujeito passivo por quantia inscrita em dívida ativa, sem a reserva de meios para quitação do débito, gera presunção absoluta (jure et de jure) de fraude à execução (lei especial que se sobrepõe ao regime do direito processual civil); (b) a alienação engendrada até 08.06.2005 exige que tenha havido prévia citação no processo judicial para caracterizar a fraude de execução; se o ato translativo foi praticado a partir de 09.06.2005, data de início da vigência da Lei Complementar n.º 118/2005, basta a efetivação da inscrição em dívida ativa para a configuração da figura da fraude; (c) a fraude de execução prevista no artigo 185 do CTN encerra presunção jure et de jure, conquanto componente do elenco das "garantias do crédito tributário"; (d) a inaplicação do artigo 185 do CTN, dispositivo que não condiciona a ocorrência de fraude a qualquer registro público, importa violação da Cláusula Reserva de Plenário e afronta à Súmula Vinculante n.º 10, do STF. [...] (grifou-se) (REsp n. 1.141.990/PR, rel. Min. Luiz Fux, Primeira Seção, j. 10-11-2010) (Grifou-se)

No caso em apreço, a transferência dos imóveis da parte executada para a Transportes Pedrassani ocorreu em 05.12.1996 (pp. 21-22), por meio da 6ª alteração contratual, ou seja, antes do ajuizamento das execuções fiscais apensas. Portanto, quando efetivada a penhora sobre o imóvel em discussão (pp. 211 dos autos 0003912-25.1997.8.24.0015), o bem já pertencia à Transportes Pedrassani.

A exceção é a execução fiscal de n. 0001792-77.1995.8.24.0015, porquanto nessa houve a citação da executada (Comercial Pedrassani) em 06.03.1991 (p. 19 daqueles autos) e, portanto, discutível a aplicação do art. 185 do CTN em sua redação original.

Ocorre que, além de a referida ação não ser aquela que originou a constrição sobre o imóvel, nela foi oferecido bem à penhora, suficiente para garantir a execução, com o que o Estado concordou (pp. 162-167). Desse modo, mesmo com a citação da parte executada, não se pode falar em fraude à execução, uma vez que o parágrafo único...

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