Acórdão Nº 0302515-80.2019.8.24.0015 do Terceira Câmara de Direito Comercial, 10-11-2022

Número do processo0302515-80.2019.8.24.0015
Data10 Novembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0302515-80.2019.8.24.0015/SC

RELATOR: Desembargador RODOLFO TRIDAPALLI

APELANTE: RAQUEL LOPES PEREIRA (AUTOR) ADVOGADO: RICARDO AUGUSTO BALSALOBRE (OAB SC051089) APELANTE: BANCO BMG S.A (RÉU) ADVOGADO: RENATO CHAGAS CORREA DA SILVA (OAB SC047610) APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Da ação

Adoto o relatório da sentença recorrida (Evento 36), em atenção aos princípios da celeridade e economia processual, por retratar com fidedignidade o trâmite processual no primeiro grau, in verbis:

Raquel Lopes Pereira ajuizou ação declaratória de inexistência de débito e nulidade contratual c/c restituição de valores, com pedido de tutela de urgência e indenização por dano moral contra Banco BMG S/A.

Sustentou que realizou contratos de empréstimo consignado junto ao banco réu, sendo informada que o pagamento seria realizado com descontos mensais diretamente do seu benefício. Todavia, meses após a celebração do empréstimo, constatou a implementação de um empréstimo com Reserva de Margem para Cartão de Crédito Consignado em seu extrato de pagamento. Então entrou em contato com o réu e foi informada de que não se tratava de um empréstimo consignado "normal", mas sim de um empréstimo consignado pela modalidade de cartão de crédito, que deu origem à constituição da reserva de margem consignável (RMC).

Afirmou que não teve a intenção de contratar cartão de crédito consignável, nem houve qualquer informação relativa ao cartão, sendo que nunca recebeu cartão, faturas ou quaisquer outros objetos ou documentos que justificassem a cobrança do referido serviço. Destacou que os descontos realizados pelo réu no seu benefício cobrem apenas os juros e encargos mensais do cartão, não havendo redução da dívida, o que torna o débito impagável.

Pugnou pela concessão de tutela de urgência para determinar que o réu se abstenha de reservar margem consignável do seu benefício previdenciário e, ao final, requereu a procedência da ação, com a declaração da inexistência da contratação de empréstimo consignado da RMC e da reserva de margem consignável, bem como a condenação do réu a restituir em dobro os valores descontados a título de RMC. Ainda, postulou a condenação do réu ao pagamento de indenização por danos morais, das custas processuais e honorários advocatícios. Com a inicial, juntou documentos (pp. 32/38).

A decisão de pp. 76/79 indeferiu o pedido liminar, procedeu a inversão do ônus da prova e deferiu os benefícios da justiça gratuita à parte autora.

O réu apresentou contestação às pp. 85/93, aduzindo, em síntese, que a parte autora estava ciente da assinatura e contratação de cartão de crédito consignado, e não de empréstimo consignado, como alegado. Arguiu, ainda, que o autor expressamente solicitou e assinou o "TERMO DE ADESÃO CARTÃO DECRÉDITO CONSIGNADO BANCO BMG E AUTORIZAÇÃO PARA DESCONTO EMFOLHA DE PAGAMENTO".

Asseverou a legalidade da modalidade de cartão de crédito com reserva de margem consignável, razão pela qual os descontos são devidos. Sustentou a inexistência de dano moral e a impossibilidade de restituição em dobro dos valores descontados, requerendo, por fim, a improcedência da demanda. Acostou documentos às pp. 94/130.

A parte autora apresentou réplica (pp. 135/138).

Vieram os autos conclusos para sentença.

Brevemente relatado, decido.

Da sentença

A Juíza de Direito, Dra. LILIANE MIDORI YSHIBA MICHELS, da 1ª Vara Cível da Comarca de Canoinhas, julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais, nos seguintes termos (Evento 36):

Ante o exposto, julgo parcialmente procedentes os pedidos formulados por Raquel Lopes Pereira contra Banco BMG S/A, com fulcro no art. 487, I, do Código de Processo Civil, para:

a) conceder a tutela provisória requerida, uma vez que preenchidos os requisitos ensejadores da medida (art. 300 do CPC) e, em consequência, determinar que o réu se abstenha de efetuar a reserva de margem consignável (RMC) e empréstimo sobre a RMC, sob pena de multa mensal no valor de R$ 300,00 (trezentos reais), para a qual fixo como limite o montante de R$ 3.000,00 (três mil reais);

b) declarar a nulidade das contratações dos cartões de crédito com Reserva de Margem Consignável - RMC e, por consequência, determinar o cancelamento do cartão de crédito contratado;

c) determinar a adequação do contrato de cartão de crédito para contrato de empréstimo consignado, no valor obtido pela parte autora através dos saques, tendo por base os encargos definidos pelo Banco Central do Brasil para tal modalidade de empréstimo, na data da contratação, e a devida compensação, na forma simples, dos valores descontados indevidamente a título de RMC, o que deverá ser oportunamente apurado através de liquidação de sentença;

d) determinar a repetição do indébito em favor da parte autora, na forma simples, acaso verificado em liquidação de sentença que os valores objeto do empréstimo foram integralmente quitados, restando crédito em favor da parte autora, incidindo sobre tais valores correção monetária pelo INPC/IBGE a contar de cada desembolso, além de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a contar da citação.

e) condenar a parte ré ao pagamento, em favor da parte autora, da importância de R$ 2.000,00 (dois mil reais), a título de indenização por danos morais, com a incidência de correção monetária pelo INPC, a contar da data da publicação da presente sentença, e de juros de mora na monta de 1% ao mês, a partir do evento danoso, no caso, a data do primeiro desconto indevido - débito em folha (10/11/2017 - p. 100).

Em razão da sucumbência mínima da parte autora, condeno a parte ré ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios, estes que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, nos termos do artigo 85, §2º, do CPC.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Da Apelação da Autora

A Autora manejou recurso de Apelação com intuito de reforma da sentença para condenar o Banco à repetição do indébito, em dobro, bem como majorar a indenização por danos morais e os honorários advocatícios (Evento 41).

Da Apelação da Instituição Financeira

Também inconformado com a prestação jurisdicional, o BANCO BMG S.A. interpôs recurso de Apelação (Evento 46).

Aventa a necessidade de intimação da parte autora para que informe se tem conhecimento do ajuizamento da ação, sob a alegação de prática de conduta temerária ante o reiterado ajuizamento de ações praticamente idênticas pelo seu procurador. Subsidiariamente, requer a expedição de ofícios à Ordem de Advogados do Brasil, ao Ministério Público e à Autoridade Policial para que sejam apurados os indícios de infrações disciplinares e ocorrência de conduta típica, além de postular a condenação do causídico em litigância de má-fé.

Alega a legalidade do contrato celebrado. Aduz que o contrato de cartão de crédito consignado com possibilidade de saque é suficientemente claro e preciso ao identificar a modalidade que está se contratando, os mecanismos de pagamento e a cobrança dos débitos correspondentes.

Acrescenta que os documentos anexados aos autos demonstram que o contrato não dá margem a interpretação equivocada, pois existe autorização expressa da Autora para o desconto em folha de pagamento.

Assevera que inexistente a prática de ato ilícito, sendo indevida a condenação por dano moral. Ainda, sustenta que a situação fática descrita não caracteriza abalo moral indenizável, uma vez que o dano alegado sequer foi comprovado.

Ao final, requer o provimento do Apelo, para reconhecer a validade da contratação.

Das contrarrazões

Devidamente intimadas, as partes apresentaram contrarrazões (Eventos 52 e 55).

Os autos ascenderam ao Tribunal de Justiça.

Com a distribuição, vieram-me conclusos.

Este é o relatório.

VOTO

I - Da admissibilidade

Os recursos preenchem os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, razão pela qual merecem conhecimento.

II - Do julgamento conjunto dos recursos

Trata-se de Apelações Cíveis interpostas por RAQUEL LOPES PEREIRA e por BANCO BMG S.A., ambos contra a sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na presente ação condenatória.

a) Da intimação da parte Autora

O BANCO BMG S.A requer a intimação da Autora para que informe se tem conhecimento do ajuizamento da demanda, sob a alegação de prática de conduta temerária ante o reiterado ajuizamento de ações praticamente idênticas pelo seu procurador. Subsidiariamente, pleiteia a expedição de ofícios à Ordem de Advogados do Brasil, ao Ministério Público e...

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