Acórdão Nº 0302647-03.2015.8.24.0008 do Segunda Câmara de Direito Civil, 23-09-2021

Número do processo0302647-03.2015.8.24.0008
Data23 Setembro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0302647-03.2015.8.24.0008/SC

RELATOR: Desembargador RUBENS SCHULZ

APELANTE: NATURAL IMPORTS ALIMENTOS EIRELI (AUTOR) APELANTE: REDE CHECK SERVICOS EIRELI (RÉU) APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Cajusul Alimentos Ltda. ajuizou a presente "ação regressiva de cobança c/c indenizaçâo por danos morais" em face de Rede Check Serviços Ltda. Sustentou, em síntese, que firmou um contrato de prestação de serviços para acesso a banco de dados de informações comerciais em 27 de janeiro de 2009. Relatou que o sistema possibilita ter acesso aos dados cadastrais de forma totalmente online ou por telefone com o intuito de inibir a atuação dos estelionatários e fraudadores. Contou que foi acionada na justiça, nos autos n. 008.14.601165-7, por Dalto Eduardo dos Santos, por negativação indevida nos órgãos de proteção ao crédito. Narrou que, contudo, não mantinha relações comerciais com referida pessoa, autor daquela demanda, razão pela qual buscou informações com a ré, momento em que informaram-lhe que a negativação havia ocorrido a partir de seu cadastro no sistema. Aduziu que, todavia, não realizou referido registro desabonador. Explanou que após ser citada na ação judicial, tentou fazer a baixa no sistema, porém sem lograr êxito, já que a negativação não havia sido feita por ela. Informou que após ser condenada naqueles autos, acabou fazendo acordo e pagando a Dalto Eduardo dos Santos, autor daquela ação, o valor de R$ 7.000,00 (sete mil reais). Asseverou a responsabilidade da empresa ré no dever de indenizar. Por essas razões, pleiteou a inversão do ônus da prova; a procedência dos pedidos, para condenar a empresa ré ao ressarcimento do montante de R$ 12.000,00 (doze mil reais) referente ao valor pago no processo n. 008.14.601165-7 somados com os honorários advocatícios contratuais, condenar a parte ré ao pagamento de indenização por dano moral em valor a ser arbitrado pelo Juízo e condenar a ré ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios. Por derradeiro, juntou documentos (Evento 1).

Restou deferida a inversão do ônus da prova (Evento 7).

Citada, a parte ré apresentou contestação, alegando que a negativação foi realizada pela autora, já que contratou o serviço, bem como que a autora disseminou a senha de acesso ao sistema multiplataforma para diversos funcionários. Defendeu a inexistência do dever de indenizar. Assim, pleiteou pelo julgamento de improcedência dos pedidos. Juntou documentos (Evento 19).

Houve réplica (Evento 23).

Conclusos os autos, sobreveio sentença, em que a magistrada a quo julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais, para (i) condenar a parte ré ao pagamento de indenização por dano material no valor de R$ 7.000,00 (sete mil reais) e juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a partir da citação e correção monetária pelo INPC, a partir do efetivo desembolso; e (ii) condenar ambas as partes ao pagamento das custas processuais, pro rata, e honorários advocatícios, estes fixados por apreciação equitativa no valor de R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais) (Evento 29).

Irresignadas, ambas as partes interpuseram recurso de apelação.

Em suas razões recursais, a empresa autora pretende a reforma da sentença para julgar procedente o pedido de ressarcimento do valor desembolsado a título de honorários advocatícios contratuais e para condenar a parte ré ao pagamento de indenização por dano moral, repisando as alegações expostas na petição inicial. Por fim, pugna pela majoração dos honorários advocatícios (Evento 36).

A parte ré, por sua vez, objetiva a reforma da sentença para julgar improcedente o pedido de indenização por dano material. Inicialmente, aduz que o Código de Defesa do Consumidor não é aplicável ao caso, fundamentando que "a Apelada não faz parte da cadeia de consumidor final a atividade que desempenha e para a qual contratou em 2009 os serviços da Apelante". Afirma que a negativação do autor daquela ação (n. 008.14.601165-7) foi originada pela parte autora. Por fim, requer o afastamento da justiça gratuita concedida à empresa autora. Subsidiariamente, requer a minoração do quantum indenizatório (Evento 41).

Apresentadas as contrarrazões (Eventos 46 e 48), ascenderam os autos a esta eg. Corte de Justiça.

Este é o relatório.

VOTO

Presentes os requisitos objetivos e subjetivos de admissibilidade, conhece-se do recurso e passa-se ao exame do seu objeto à luz das disposições do Código de Processo Civil de 2015, tendo em vista que a sentença recorrida foi publicada já na sua vigência.

Como visto, ambas as partes interpuseram recurso de apelação. Assim, por ordem de prejudicialidade, analisa-se, primeiramente, as razões do recurso da parte ré. Na sequência, caso remanesça a necessidade, serão apreciadas as questões vertidas no recurso da parte autora.

1 RECURSO DA RÉ

1.1 APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

Inicialmente, a empresa ré alega que o Código de Defesa do Consumidor não é aplicável ao caso. Para tanto, afirma que a empresa autora não é destinatária final - e, portanto, consumidora - dos serviços prestados, o que obstaculizaria, inclusive, a inversão do ônus da prova.

Adianta-se, razão não lhe assiste.

É inquestionável que a relação jurídica existente entre as partes tem natureza consumerista, atraindo, assim, as normas do Código de Defesa do Consumidor.

O art. 2º do Código de Defesa do Consumidor dispõe que "consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final".

Sobre o conceito de destinatário final, a doutrina esclarece:

Destinatário final é aquele destinatário fático e econômico do bem ou serviço, seja ele pessoa jurídica ou física. Logo, segundo esta interpretação teleológica, não basta ser destinatário fático do produto, retirá-lo da cadeia de produção, levá-lo para o escritório ou residência - é necessário ser destinatário final econômico do bem, não adquiri-lo para revenda, não adquiri-lo para uso profissional, pois o bem seria novamente um instrumento de produção cujo preço será incluído no preço final do profissional que o adquiriu. Neste caso, não haveria a exigida "destinação final" do produto ou do serviço (MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIN, Antonio Herman V.; MIRAGEM, Antonio. Comentários ao código de defesa do consumidor. 4. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013. p. 115).

Nesse viés, segundo a orientação jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça, em regra, para se caracterizar o consumidor, "não basta ser, o adquirente ou utente, destinatário final fático do bem ou serviço: deve ser também o seu destinatário econômico, isto é a utilização deve romper a atividade econômica para o atendimento de necessidade pessoal, não podendo ser reutilizado, o bem ou serviço, no processo produtivo, ainda que de forma indireta" (Resp. 476428/SC, rela. Mina. Nancy Andrighi, Terceira Turma, j. 19-4-2005).

A Corte Superior tem, contudo, reconhecido a necessidade de, em situações específicas, abrandar o rigor do critério subjetivo do conceito de consumidor, para admitir a incidência das normas do microssistema protetivo a determinados consumidores profissionais, desde que demonstrada sua vulnerabilidade técnica, jurídica ou econômica. Esse fenômeno - abrandamento da teoria finalista - tem sido denominado, pela doutrina e jurisprudência, de teoria finalista mitigada ou aprofundada.

Sobre o tema, colhe-se julgado do Superior Tribunal de Justiça:

CONSUMIDOR. DEFINIÇÃO. ALCANCE. TEORIA FINALISTA. REGRA. MITIGAÇÃO. FINALISMO APROFUNDADO. CONSUMIDOR POR EQUIPARAÇÃO. VULNERABILIDADE.

1. A jurisprudência do STJ se encontra consolidada no sentido de que a determinação da qualidade de consumidor deve, em regra, ser feita mediante aplicação da teoria finalista, que, numa exegese restritiva do art. 2º do CDC, considera destinatário final tão...

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