Acórdão Nº 0302703-34.2014.8.24.0020 do Primeira Câmara de Direito Público, 24-11-2020

Número do processo0302703-34.2014.8.24.0020
Data24 Novembro 2020
Tribunal de OrigemCriciúma
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Público
Classe processualRemessa Necessária Cível
Tipo de documentoAcórdão


Remessa Necessária Cível n. 0302703-34.2014.8.24.0020, de Criciúma

Relator: Desembargador Luiz Fernando Boller

REMESSA NECESSÁRIA.

AÇÃO POPULAR.

SUPOSTA EXISTÊNCIA DE IRREGULARIDADES NA APROVAÇÃO DA OBRA DE CONSTRUÇÃO DE SHOPPING CENTER.

REEXAME QUE MERECE SER CONHECIDO EM PARTE, APENAS PARA ANÁLISE DA TESE DA NECESSIDADE DE FISCALIZAÇÃO DO ÓRGÃO AMBIENTAL ESTADUAL, VISTO QUE AS DEMAIS PROPOSIÇÕES JÁ FORAM EXAMINADAS POR ESTE ÓRGÃO JULGADOR FRACIONÁRIO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO.

REQUERENTE QUE NÃO CONSEGUIU DEMONSTRAR O INÍCIO DO CURSO HÍDRICO CANALIZADO.

IRRELEVÂNCIA DA TESE PERTINENTE À LOCALIZAÇÃO DO IMÓVEL ENTRE DOIS MUNICÍPIOS, PARA CARACTERIZAÇÃO DO DEVER FISCALIZATÓRIO DO IMA.

DECISÃO MANTIDA.

REMESSA OFICIAL PARCIALMENTE CONHECIDA E DESPROVIDA.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Remessa Necessária Cível n. 0302703-34.2014.8.24.0020, da 2ª Vara da Fazenda da comarca de Criciúma, em que é Autor o Ministério Público do Estado de Santa Catarina e Réus Almeida Júnior Shopping Center S/A, FAMCRI-Fundação do Meio Ambiente de Criciúma, Pavei Construtora Ltda., Shopping Center das Nações Empreendimentos S/A e Vip Motel Ltda.-EPP.

Em Sessão Ordinária por videoconferência, a Primeira Câmara de Direito Público decidiu, por maioria de votos, conhecer parcialmente do reexame necessário e negar-lhe provimento. Custas legais.

Participaram do julgamento, realizado nesta data, os Excelentíssimos Senhores Desembargadores Paulo Henrique Moritz Martins da Silva e Pedro Manoel Abreu. Funcionou como representante do Ministério Público o Procurador de Justiça Jacson Corrêa.

Florianópolis, 24 de novembro de 2020.



Desembargador LUIZ FERNANDO BOLLER

Presidente e Relator

Documento assinado digitalmente


RELATÓRIO

Cuida-se da remessa necessária de sentença prolatada pelo magistrado Pedro Aujor Furtado Júnior - Juiz de Direito titular da 2ª Vara da Fazenda da comarca de Criciúma -, que nos autos da Ação Popular n. 0302703- 34.2014.8.24.0020, ajuizada por Agnello Delfino da Rosa contra Almeida Júnior Shopping Center S/A, Shopping Center das Nações Empreendimentos S/A, Vip Motel Ltda.-EPP, Pavei Construtora Ltda. e FAMCRI-Fundação do Meio Ambiente de Criciúma, decidiu a lide nos seguintes termos:

Cuida-se de ação popular ajuizada por Agnello Delfino da Rosa em face de Almeida Junior Shopping Centers S/A, Shopping Center das Nações Empreendimentos S/A, Vip Motel Ltda EPP, Pavei Construtora Ltda, Fundação do Meio Ambiente de Criciúma - FAMCRI e Município de Criciúma, aduzindo, em síntese, a existência de irregularidades na aprovação da obra de construção do empreendimento Shopping das Nações, ante o desrespeito aos recursos hídricos existentes na área (curso d'água e nascentes), supressão de vegetação, obras de terraplanagem sem autorização dos órgãos competentes, emissão de licenças ambientais por órgão incompetente e contaminação do solo e água subterrânea por resíduos tóxicos.

[...]

Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE o pedido exordial, nos termos do art. 487, I, do CPC.

Sem custas nem honorários, nos termos do art. 5º, LXXIII, da Constituição Federal.

Em reexame necessário (art. 19 da Lei n. 4.717/65). (fls. 834/851)

Conquanto intimadas, as partes deixaram fluir in albis o prazo para oferecimento de recurso voluntário (fl. 855).

Em Parecer da Procuradora de Justiça Gladys Afonso, o Ministério Público opinou pelo conhecimento e provimento do reexame necessário (fls. 867/874).

Na Sessão Ordinária acontecida em 24/11/2020, tendo tomado parte na decisão, além deste Relator, os Desembargadores Pedro Manoel Abreu e Paulo Henrique Moritz Martins da Silva, esta Câmara decidiu, por maioria de votos, conhecer em parte da remessa e desprovê-la, restando o signatário designado para a lavratura do aresto (fl. 922).

Em apertada síntese, é o relatório.


VOTO

A presente actio alçou a este Areópago por força da disposição contida no art. 19 da Lei Federal n. 4.717/65, o qual dispõe que a "sentença que concluir [...] pela improcedência da ação está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal".

Assim, passo a aferir a validade do veredicto, que, em sua essência, merece ser mantido por sua própria racionalidade e jurídicos fundamentos.

Ab initio, avulto que o caso em prélio não é novidade em nossa Corte, diante do julgamento do Agravo de Instrumento n. 0142100-47.2014.8.24. 0000, em que se entendeu por bem afastar a nulidade das licenças ambientais concedidas pela FAMCRI.

E em razão de tal insurgência, o reexame em questão deve ser parcialmente conhecido - apenas para adentrar acerca da tese de que o imóvel objeto situa-se entre dois municípios, ensejando a fiscalização do órgão ambiental estadual -, porque as demais matérias debatidas na actio objeto, já foram especificamente combatidas no aludido recurso de agravo.

Ainda, não vislumbro ser o caso de suspender o processo por conta da existência de "suposto" corpo hídrico no imóvel, pois o Tema 1.010 do STJ ensejou a suspensão de inúmeros processos que dizem respeito ao distanciamento de edificações de rios e cursos d'água naturais, e no caso em tela, como apontou o Desembargador Pedro Manoel Abreu na Ação Civil Pública n. 0006898-38.2014.8.24.0020 -, "o curso d'água em questão foi canalizado".

Quanto ao mérito - por consubstanciar circunstância análoga que merece idêntica solução -, abarco integralmente a intelecção professada pelo notável Desembargador Jorge Luiz de Borba na supra referida Ação Civil Pública, que reproduzo, justapondo-a em meu voto, nos seus precisos termos​, como ratio decidendi:​


[...] confere-se, como aliás já se enfatizou na transcrição supra, que esta Câmara, em 30-1-2015, ao apreciar o Agravo de Instrumento n. 2014.045575-8, de relatoria do Exmo. Sr. Des. Carlos Adilson Silva, em julgamento que contou com a participação dos Exmos. Srs. Des. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva e Paulo Ricardo Bruschi, reclamo esse interposto à decisão de indeferimento do pedido de antecipação da tutela, bem delineou os motivos pelos quais, até aquele momento do trâmite do feito originário, não havia prova de dano ambiental.

O aresto foi assim ementado no excerto aqui pertinente:

AGRAVO POR INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PRETENSÃO QUE OBJETIVA DESCONSTITUIR AS LICENÇAS AMBIENTAIS CONCEDIDAS PARA A IMPLANTAÇÃO DE SHOPPING CENTER. ALEGADA EXISTÊNCIA DE NASCENTES E CURSOS D'ÁGUA NO TERRENO E, DE CONSEGUINTE, ÁREAS DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE.

[...]

II - MÉRITO RECURSAL. [...]

LICENCIAMENTO AMBIENTAL NO QUAL SE CONCLUIU PELA INEXISTÊNCIA DE NASCENTES E CURSOS D'ÁGUA NO TERRENO. DECLARAÇÕES E RELATÓRIO TÉCNICO OBTIDOS EM INQUÉRITO CIVIL QUE SÃO INCAPAZES DE REFUTAR AS CONCLUSÕES DO PARECER HIDROGEOLÓGICO APROVADO PELO CORPO TÉCNICO DA FAMCRI. ESTUDO REALIZADO COM BASE EM ANÁLISES DE CAMPO E SONDAGENS DO SOLO. METODOLOGIA QUE CONFERE MAIOR PRECISÃO DO QUE A INTERPRETAÇÃO DE FOTOS AÉREAS. NÍVEL DO LENÇOL FREÁTICO BAIXO DEMAIS PARA POSSIBILITAR O AFLORAMENTO DE NASCENTES E OLHOS D'ÁGUA. ELEVADO GRAU DE SEGURANÇA DAS CONCLUSÕES DE QUE O ACÚMULO DE ÁGUA NO TERRENO PROVÉM DE CHUVAS E DE ESGOTO, E NÃO DE FONTE NATURAL. NÃO INCIDÊNCIA DAS ÁREAS DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE PREVISTAS NO ART. 4°, I E IV, DA LEI Nº 12.651/2012.

As alegações do Ministério Público acerca da existência de águas no terreno, tanto no passado quanto no presente, foram devidamente debatidas no licenciamento ambiental, sendo a hipótese afastada mediante fundamentos técnicos razoáveis e com elevado grau de certeza, segundo se infere das assertivas do autor do estudo hidrogeológico e dos agentes públicos responsáveis pela apreciação técnica. É forçoso admitir que a metodologia utilizada no estudo hidrogeológico em referência, com análises de campo que envolveram, inclusive, sondagens do solo, conjugada com a especialidade técnica do profissional e sua aprovação pelo corpo técnico da FAMCRI, são fatores que nitidamente conferem a possibilidade de se chegar a conclusões muito mais precisas e seguras do que o mero relato de leigos ou a interpretação de fotos aéreas.

Com efeito, as nascentes e os olhos d'água originam-se do lençol freático e os cursos d'água, por sua vez, de nascentes. Os documentos acostados pelo agravante não indicam a altura do lençol freático onde se localizariam as alegadas nascentes, tampouco apontam de que nascentes adviriam os cursos d'água identificados nas fotografias aéreas. Embora seja possível, de cima, enxergar a existência histórica de corpos hídricos, não se verificam suas origens, se natural ou artificial, ou ainda se proveniente de chuvas.

Assim, emerge dos autos remota possibilidade de os acúmulos de água se enquadrarem nas definições dos bens ambientais e suas respectivas áreas de preservação permanente previstas no art. 4°, I e IV, da Lei nº 12.651/2012.

[...]

RECURSO NÃO PROVIDO (sublinhou-se).

Transcrevem-se os fundamentos do voto, nos aspectos ora relevantes:

3 - Da existência de áreas de preservação permanente nos imóveis

Alegou o agravante a invalidade do licenciamento ambiental em análise por desconsiderar a existência de áreas de preservação permanente em decorrência de nascentes e cursos d'água incidentes sobre o imóvel. Aduz que esses corpos hídricos teriam sido descaracterizados por obras clandestinas de drenagem do solo realizadas entre os anos de 2004 e 2005, razão de não terem sido constatados nos estudos técnicos que instruíram o procedimento licenciatório.

Também, no ponto, não merece prosperar o agravo.

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