Acórdão Nº 0302705-96.2015.8.24.0075 do Terceira Câmara de Direito Público, 11-02-2020

Número do processo0302705-96.2015.8.24.0075
Data11 Fevereiro 2020
Tribunal de OrigemTubarão
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Cível n. 0302705-96.2015.8.24.0075, de Tubarão

Relator: Desembargador Júlio César Knoll

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. EQUÍVOCO NO RECONHECIMENTO DO AUTOR DO DELITO. PRECARIEDADE NA IDENTIFICAÇÃO DO DENUNCIADO POR CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS. ILEGITIMIDADE DO REQUERENTE PARA FIGURAR NO POLO PASSIVO DO PROCESSO CRIMINAL. OMISSÃO ESPECÍFICA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO. DEVER DE INDENIZAR INARREDÁVEL. QUANTUM FIXADO EM R$ 3.000,00 (TRÊS MIL REAIS). CRITÉRIO DE RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. SENTENÇA REFORMADA, NO PONTO. CONSECTÁRIOS LEGAIS. INVERSÃO DA VERBA SUCUMBENCIAL. RECURSO CONHECIDO E ACOLHIDO.

"evidente que a deflagração da ação penal em desfavor de quem não cometeu o respectivo crime gera efetivo abalo a honra e a moral do acusado, ao passo que teve o seu nome atribuído a um crime que jamais praticou" (TJSC, Apelação Cível n. 2013.000891-0, de São José, rel. Des. Sérgio Roberto Baasch Luz, Segunda Câmara de Direito Público, j. 25-11-2014).

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0302705-96.2015.8.24.0075, da comarca de Tubarão Vara da F. Púb. E. Fisc. A. do Trab. e Reg. Púb. em que é Apelante Paulo Renato Gomes Onofre e Apelado Estado de Santa Catarina.

A Terceira Câmara de Direito Público decidiu, por votação unânime, conhecer e acolher o apelo, para condenar o Estado de Santa Catarina ao pagamento de indenização por danos morais, no montante de R$ 3.000,00 (três mil reais), e, de ofício, adequar os consectários legais. Invertem-se os ônus sucumbenciais. Custas na forma da lei.

O julgamento, realizado no dia 11 de fevereiro de 2020, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Jaime Ramos, com voto, e dele participou a Exma. Sra. Desa. Sônia Maria Schmitz.

Funcionou como representante do Ministério Público o Dr. Plínio César Moreira.

Florianópolis, 11 de fevereiro de 2020.

Desembargador Júlio César Knoll

Relator

RELATÓRIO

Perante a Vara da Fazenda Pública, Execução Fiscal, Acidentes do Trabalho e Registros Público da comarca de Tubarão, Paulo Renato Gomes Onofre, devidamente qualificado, promoveu, com fundamento nos permissivos legais, através de procurador habilitado, ação de indenização, em desfavor do Estado de Santa Catarina.

Relatou, em apertada síntese, que, no dia 19-2-2015, foi intimado através da Carta Precatória n. 0000066-77.2015.8.24.0044, para comparecer a uma audiência na 2ª Vara Criminal da comarca de Tubarão.

Afirmou, em suma, que estranhou a situação, pois nunca praticou nenhum delito neste município, por isso procurou um advogado para saber qual era o mérito.

Disse que, foi informado que tratava-se do fato da prisão, ocorrida em 22-11-2014, pelos delitos de tráfico de drogas e associação ao tráfico, nos autos n. 0010861-83.2014.8.24.0075.

Ressaltou que, desconhecia os fatos, porém desconfiou de seu primo, Weslen Gomes Becker, fato que se confirmou ao ver a foto no indiciado.

Arguiu que, a negligência da autoridade policial na identificação da pessoa, vem lhe causando problemas.

Por fim, sustentou que faz jus a indenização pelos danos morais sofridos.

Pugnou, ainda, a exclusão dos sistemas da segurança pública de qualquer anotação em seu nome referente ao Auto de Prisão em Flagrante n. 471.14.00193.

Recebida, registrada e autuada a inicial, o Estado de Santa Catarina foi citado.

No prazo legal, apresentou resposta, via contestação, na qual refutou os argumentos expostos na prefacial.

Ato contínuo, o MM. Juiz de Direito, Paulo da Silva Filho, julgou o feito, a saber (fls. 549-562):

JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE, os pedidos formulados nos autos da presente AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS, processo nº 0302705-96.2015.8.24.0075, ajuizada por PAULO RENATO GOMES ONOFRE, em face do ESTADO DE SANTA CATARINA, todos devidamente qualificados nos autos. Em decorrência, CONDENO a parte ré ESTADO DE SANTA CATARINA ao cumprimento da OBRIGAÇÃO DE FAZER consistente na exclusão dos sistemas da segurança pública de qualquer anotação em nome do requerente referente ao Auto de Prisão em Flagrante n. 471.14.00193. Por fim, RESOLVO O MÉRITO da presente demanda, com fundamento no art. 487, inc. I (Acolher), do Código de Processo Civil. Ante a sucumbência recíproca, CONDENO a parte ré ao pagamento dos honorários advocatícios da parte autora, os quais fixo em R$ 1.000,00 (mil reais), nos termos do art. 85, § 8º, do NCPC, tendo em vista a singeleza da causa. Ao tempo em que CONDENO a parte autora ao pagamento dos honorários advocatícios da parte ré, os quais fixo em R$ 1.000,00 (mil reais), bem como ao pagamento das custas processuais na proporção de 50%. Contudo, SUSPENDO a exigibilidade de tal verba em relação à parte autora, pelo prazo previsto no art. 98, § 3º, NCPC, eis que lhe foram deferidos os benefícios da Justiça Gratuita. Sem custas processuais pela parte ré, por força do disposto no art. 33 da LCE nº 156/97 c/c LCE nº 161/97. Publique-se. Registre-se. Intime-se. Em conformidade com o art. 496, § 3º, inc. II, NCPC, decorrido o prazo para recurso, DEIXO de remeter os autos ao Tribunal de Justiça de Santa Catarina para reexame da sentença, eis que o valor da condenação, inobstante ilíquida a sentença, não alcançará 500 salários mínimos.

Inconformado, a tempo e modo, o autor interpôs recurso de apelação.

Nas suas razões, repisou os fatos narrados na exordial e pleiteou a reforma da decisão singular, com a procedência do pedido indenizatório.

Apresentadas as contrarrazões, os autos foram remetidos à douta Procuradoria-Geral de Justiça, oportunidade em que a Dra. Eliana Volcato Nunes, lavrou parecer manifestando-se pela desnecessidade de intervenção do mérito.

Após, vieram-me conclusos.

Este é o relatório.

VOTO

A insurgência voluntária apresentou-se tempestiva e satisfez os demais requisitos legais, motivo pelo qual merece ser conhecida.

Trata-se de apelação cível, interposta pelo autor, Paulo Renato Gomes Onofre, em desfavor de sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na presente ação indenizatória, ajuizada em desfavor do Estado de Santa Catarina.

In casu, o ora apelante busca ser reparado, civilmente, pelo dano moral sofrido, em razão de ter sido intimado para comparecer em uma audiência, na 2ª Vara Criminal da comarca de Tubarão, embora não tenha cometido nenhum delito.

Dito isso, teve que comparecer à audiência, momento em que reconheceu a pessoa que havia sido presa, como seu primo, Weslen Gomes Becker.

Necessário, neste momento, trazer a colação, o que preleciona a respeito a doutrina de Humberto Theodoro Júnior:

"Não há um dever de provar, nem à parte assiste o direito de exigir a prova do adversário. Há um simples ônus, de modo que o litigante assume o risco de perder a causa se não provar os fatos alegados e do qual depende a existência do direito subjetivo que pretende resguardar através da tutela jurisdicional. Isto porque, segundo máxima antiga, fato alegado e não provado é o mesmo que fato inexistente." (Curso de Processo Civil, Forense, 1994, 9ª ed., v. II, p. 257).

Cumpre discorrer que, a responsabilidade civil da Administração Pública possui natureza objetiva, sabidamente arrimada na teoria do risco administrativo, dada a dicção do artigo 37, § 6º, da Constituição Federal, do qual aqui destaco:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

§ 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

Segundo essa teoria, o dano sofrido pelo indivíduo deve ser visualizado como consequência do funcionamento do serviço público, não importando se esse funcionamento foi bom ou mau.

Leciona Sérgio Cavalieri Filho:

"A teoria do risco administrativo importa atribuir ao Estado a responsabilidade pelo risco criado pela sua atividade administrativa. Esta teoria, como se vê, surge como expressão concreta do princípio da igualdade dos indivíduos diante dos encargos públicos. É a forma democrática de repartir os ônus e encargos sociais por todos aqueles que são beneficiados pela atividade da Administração Pública. Toda lesão sofrida pelo particular deve ser ressarcida, independentemente de culpa do ente público que a causou. O que se tem de verificar é, apenas, a relação de causalidade entre a ação administrativa e o dano sofrido pelo administrado.

[...]

Com efeito, a teoria do risco administrativo, embora dispense prova da culpa da Administração, permite ao Estrado afastar a sua responsabilidade nos casos de exclusão do nexo causal - fato exclusivo da vítima, caso fortuito, força maior e fato exclusivo de terceiro" (Programa de Responsabilidade Civil, 9 ed. São Paulo: Atlas, 2010. p. 243).

Assim, são três os pressupostos capazes de configurar a responsabilidade civil da Administração Pública, quais sejam, o fato administrativo, o dano e, por fim, a existência de nexo de causalidade entre o fato e o dano.

De outro norte, como excludentes da responsabilidade, a jurisprudência e doutrina pátria assinalam como sendo: a inexistência de causalidade entre a conduta da administração e o dano ocorrido; a culpa exclusiva da vítima ou de terceiro e; o caso fortuito ou a força maior.

Quanto a isso, apesar de ser a regra, nem sempre a responsabilidade do Estado por atos omissivos da administração pública dependerá da prova da culpa, vale dizer, nem sempre será subjetiva.

Em se tratando de conduta omissiva do agente público, a questão da reparação gera divergência, vindo este Tribunal a aplicar, comumente, a Teoria da Falta do Serviço, razão por que...

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