Acórdão Nº 0302706-41.2017.8.24.0001 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 21-10-2021

Número do processo0302706-41.2017.8.24.0001
Data21 Outubro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0302706-41.2017.8.24.0001/SC

RELATOR: Desembargador MARIANO DO NASCIMENTO

APELANTE: ZOLEMA SANTOS LEAO (EMBARGANTE) APELANTE: ADAIR SPAGNOL (EMBARGANTE) APELANTE: ALMERI LUCIA PAPINI SPAGNOL (EMBARGANTE) APELADO: BANCO DO BRASIL S.A. (EMBARGADO)

RELATÓRIO

Trata-se de Embargos à Execução oposto por Zolema Santos Leão, Adair Spagnol e Almeri Lúcia Papini Spagnol em face de Banco do Brasil.

A execução, em questão, diz respeito à Cédula Rural Pignoratícia nº 40/08243-1, emitida em 3-12-2013, envolvendo a quantia de R$ 651.360,68 (seiscentos e cinquenta e um mil, trezentos e sessenta reais e sessenta e oito centavos), tendo sido garantida por meio de aval (evento 1, doc. 3).

Na exordial, a parte embargante sustentou, em síntese, a ausência de demonstrativo de débito "apto e hábil"; a nulidade da cédula rural pignoratícia por desvio de finalidade; a ilegitimidade passiva dos avalistas, diante da nulidade da garantia prestada; a necessidade da juntada dos contratos pretéritos. No mérito, alegou, em suma, a possibilidade de incidência das normas consumeristas, viabilizando a revisão do contrato, no tocante à cobrança da comissão de permanência, seguro agrícola e seguro penhor (evento 1).

Recebidos os embargos, não houve a concessão de efeito suspensivo, sendo determinada a intimação do embargado (evento 22).

Ofertada impugnação (evento 25) e réplica (evento 29), sobreveio sentença (evento 40), rejeitando os embargos, condenando a parte embargante ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, estes fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da condenação.

Inconformada, a parte embargante interpôs recurso de apelação aduzindo, em síntese: a) que a não juntada dos contratos pretéritos cerceou seu direito de defesa, haja vista que impediu a comprovação do desvio de finalidade da cédula; b) a nulidade do aval prestado por pessoa física em cédula rural; c) ausência de demonstrativo de débito apto a instruir a demanda; d) a ilegalidade da cláusula que instituiu a cobrança da comissão de permanência; e) a abusividade da contratação do seguro agrícola e do seguro penhor rural; f) a nulidade da multa moratória; g) faz jus a repetição/compensação em dobro. Ao final requereu o provimento do recurso, com a redistribuição dos ônus da sucumbência (evento 60).

Apresentadas as contrarrazões (evento 67), ascenderam os autos a esta Corte e vieram-me conclusos.

É o relatório.

VOTO

Trata-se de recurso de apelação interposto pela parte devedora/embargante em face da sentença que julgou improcedente os embargos à execução oposto em face da Casa Bancária.

Presentes os pressupostos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade recursal, conheço do recurso.

Do cerceamento de defesa

Alega parte recorrente que teve seu direito de defesa cerceado, diante do julgamento antecipado da lide, indeferindo seu pedido de exibição, pela casa bancária, dos contratos e extratos anteriores à emissão do título, os quais, segundo afirma, eram essenciais para comprovar "que o crédito não foi empregado para custeio de atividade agrícola, mas apenas para quitar dívidas anteriores de natureza não rural" (evento 60, p. 3).

Razão, todavia, não lhe assiste.

Diferentemente do alegado, não há indícios de que a aludida cédula foi celebrada com intuito diverso do disposto no pacto, o qual, consistia, expressamente: "Orçamento de aplicação do crédito - O crédito deferido destina-se ao custeio de LAVOURA DE SOJA, a ser formada no(s) imóvel(eis) Rural Sit. Sesmaria Várzea da Cruz, município de Rosário do Oeste -MT, no período agrícola de setembro/2015 a agosto/2016, numa área de 380,0ha [...]" (evento 1, doc. 3, p. 1, da expropriatória).

Tem-se, portanto, que o crédito foi destinado ao custeio agrícola, recaindo sobre os embargantes a responsabilidade pela devida utilização do numerário.

Sobre o tema, o Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento no sentido de que "a emissão de cédula de crédito rural para quitar débitos anteriores do emitente não nulifica a cártula como título executivo, não havendo que se falar em desvio de finalidade"(AI no AREsp 946.792/PR, rel. Min. Maria Isabel Gallotti, j. 23-5-2017).

O que significa dizer que, ainda que comprovado o propalado desvio de finalidade, tal fato não afastaria a exigibilidade do valor perseguido na expropriatória.

E, por conseguinte, não há cerceamento de defesa a ser reconhecido, sobretudo porque não houve qualquer prejuízo na defesa da parte recorrente, haja vista que lhe foi possível impugnar o débito e os valores supostamente cobrados a maior, mediante simples análise do instrumento contratual.

Em situação análoga à presente, já se decidiu:

APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. CÉDULA RURAL PIGNORATÍCIA. SENTENÇA DE PARCIAL PROVIMENTO. INSURGÊNCIA DA PARTE EMBARGANTE.PRELIMINARES.ALEGAÇÃO DE CERCEAMENTO DE DEFESA. CÉDULA RURAL PIGNORATÍCIA QUE PREVÊ A LIBERAÇÃO DO CRÉDITO PARA O CUSTEIO DE LAVOURA. ALEGADO DESVIO DE FINALIDADE, POIS OS VALORES TERIAM SIDO USADOS PARA PAGAMENTO DE DÉBITOS PRETÉRITOS E DE TERCEIRA PESSOA. MESMO QUE TIVESSE SIDO COMPROVADO TAL TEMA, ISSO NÃO AFETARIA A HIGIDEZ DO TÍTULO EXECUTIVO. PRECEDENTES DO STJ E DESTE TRIBUNAL.[...](TJSC, Apelação n. 0302336-28.2018.8.24.0001, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Guilherme Nunes Born, Primeira Câmara de Direito Comercial, j. 17-06-2021).

Assim, rejeito a preliminar de cerceamento de defesa.

Da inaptidão do demonstrativo de débito

Ainda, a parte recorrente defende que "a planilha juntada nos autos, além de ser unilateral e não se referir a qualquer conta corrente, é insuficiente a demonstrar os encargos incidentes sobre a operação, prejudicando o exercício do contraditório e da ampla defesa dos apelantes" (evento 50, p. 5).

Quanto à suposta inaptidão do demonstrativo de débito, sabe-se que "o demonstrativo tem por função proporcionar ao devedor a compreensão da evolução da dívida, a fim de que possa exercer o direito ao contraditório e a ampla defesa; e ao Juiz, a verificação da existência de qualquer discordância entre os valores do débito pleiteado e os efetivamente devidos" (Apelação Cível n. 2009.073113-3, Rel. Des. Dinart Francisco Machado, j. em 24/11/2015)" (TJSC, Apelação n. 0004120-37.2012.8.24.0062, de São João Batista, rel. Cinthia Beatriz da Silva Bittencourt Schaefer, Primeira Câmara de Direito Comercial, j. 04-08-2016).

E, no caso concreto, denota-se que veio aos autos da execução (evento 1, doc. 4) a planilha de evolução do débito, indicando todos os detalhes da operação (taxa de juros, encargos da mora, período contemplado) o qual se mostra hábil a demonstrar, de forma robusta, o desenvolvimento da dívida contraída, com objetivo de dar clareza ao montante devido e, consequentemente, atribuir ao instrumento a certeza e a liquidez necessárias.

Em casos análagos, destaca-se:

CÉDULA RURAL HIPOTECÁRIA. EMBARGOS À EXECUÇÃO. PARCIAL PROCEDÊNCIA. APELO DA PARTE EMBARGANTE-EXECUTADA.CERCEAMENTO DE DEFESA. TESE REJEITADA. FEITO QUE SE ENCONTRA INSTRUÍDO PARA O SEU DESLINDE, COM O ARCABOUÇO PROBATÓRIO NELE AMEALHADO. O instituto do julgamento antecipado da lide não ocasiona cerceamento de defesa; ao contrário, evita a produção de atos dispensáveis para a resolução da demanda, notadamente quando o feito está instruído com documentos suficientes para o deslinde da questão.INEXIGIBILIDADE DA CÉDULA RURAL HIPOTECÁRIA POR AUSÊNCIA DE ASSINATURA DE TESTEMUNHAS. DESNECESSIDADE TESE REJEITADA. TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL. ARTIGOS 10, 20 E 41 DO DECRETO-LEI Nº 167/67.A Cédula Rural Hipotecária possui caráter de título executivo extrajudicial, conferido de forma expressa pelos artigos 10, 20 e 41, do Decreto-Lei nº 167/1967. Sendo assim, é desnecessária a assinatura de duas testemunhas.DEMONSTRATIVO DE DÉBITO QUE PREENCHE OS PRESSUPOSTOS DO ART. 798, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPC. PREAMBULAR RECHAÇADA.INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. DESNECESSIDADE.Demonstra-se desnecessária a inversão do ônus da prova se todos os documentos necessários ao julgamento da lide estão exibidos nos autos. [...](TJSC, Apelação n. 0301059-63.2018.8.24.0037, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Gilberto Gomes de Oliveira, Terceira Câmara de Direito Comercial, j. 29-10-2020).

Ainda:

APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. CÉDULA RURAL PIGNORATÍCIA. EMBARGOS REJEITADOS. INSURGÊNCIA DO EMBARGANTE. PRELIMINARES. ALEGADA NULIDADE DA EXECUÇÃO ANTE A AUSÊNCIA DE DEMONSTRATIVO DE DÉBITO DETALHADO. NÃO PROCEDÊNCIA. DEMONSTRATIVO APRESENTADO PELO CREDOR SUFICIENTE PARA GARANTIR A AMPLA DEFESA DO DEVEDOR. PREFACIAL AFASTADA. [...] (TJSC, Apelação Cível n. 0301643-78.2018.8.24.0022, de Curitibanos, rel. Soraya Nunes Lins, Quinta...

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