Acórdão Nº 0302780-24.2018.8.24.0175 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 29-10-2020

Número do processo0302780-24.2018.8.24.0175
Data29 Outubro 2020
Tribunal de OrigemMeleiro
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Cível n. 0302780-24.2018.8.24.0175, de Meleiro

Relator: Desembargador Luiz Zanelato

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESTITUIÇÃO DE VALORES E DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS AJUIZADA NA VIGÊNCIA DO CPC/2015. CRÉDITO OBTIDO POR MEIO DE SAQUE EM CARTÃO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNADA. AUTORA QUE PRETENDE A DECLARAÇÃO DE INVALIDADE DA OPERAÇÃO COM BASE EM VÍCIO NA AUTONOMIA DA VONTADE, SUSTENTANDO, PARA TANTO, TER SIDO LUDIBRIADA COM A PACTUAÇÃO DE CARTÃO, QUANDO, NA VERDADE, PRETENDIA APENAS A CONTRATAÇÃO DE EMPRÉSTIMO PESSOAL CONSIGNADO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA QUE ACOLHE O PEDIDO SUCESSIVO PARA CONVERTER O CONTRATO FIRMADO ENTRE AS PARTES PARA EMPRÉSTIMO PESSOAL CONSIGNADO, DETERMINANDO O RECÁLCULO DO SALDO DEVEDOR E E CONDENA OS LITIGANTES AO PAGAMENTO DE SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA.

RECURSO DA AUTORA.

ALEGADA A IRREGULARIDADE E INVALIDADE DO CONTRATO FIRMADO ENTRE AS PARTES. TESE QUE SE MOSTRA DISSOCIADA DOS ELEMENTOS PROBATÓRIOS CONTIDOS NOS AUTOS. DISPONIBILIZAÇÃO DE SAQUE DE VALOR EM CARTÃO DE CRÉDITO, COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC) EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO, QUE NÃO EQUIVALE À VENDA CASADA, AINDA QUE O CONSUMIDOR NÃO UTILIZE O CARTÃO PARA PAGAMENTO DE DESPESAS, SEJA PORQUE O CARTÃO DE CRÉDITO NÃO TEM SEU USO RESTRITO A COMPRAS EM ESTABELECIMENTOS COMERCIAIS, SEJA PORQUE A OPERAÇÃO DE SAQUE SE ENCONTRA PREVISTA NA LEI N. 10.820/03, E REGULADA PELA INSTRUÇÃO NORMATIVA INSS/PRES N. 28/08 EM RELAÇÃO A APOSENTADOS E PENSIONISTAS DO REGIME GERAL DA PREVIDÊNCIA SOCIAL.

AUTORA QUE, AO TEMPO DA CONTRATAÇÃO, TINHA SEIS EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS COMPROMETENDO A SUA MARGEM CONSIGNÁVEL PARA EMPRÉSTIMO PESSOAL. CIRCUNSTÂNCIA QUE APONTA O CONHECIMENTO DA DEMANDANTE ACERCA DA IMPOSSIBILIDADE DE FIRMAR NOVOS EMPRÉSTIMOS PESSOAIS CONSIGNADOS, POSSUINDO COMO ALTERNATIVA PARA A OBTENÇÃO DO CRÉDITO APENAS A MARGEM CONSIGNÁVEL DE 5% (CINCO POR CENTO), DESCRITA NA LEGISLAÇÃO, PARA UTILIZAÇÃO EXCLUSIVA POR MEIO DO CARTÃO DE CRÉDITO (ARTIGO 6º, § 5º, I, DA LEI N. 10.820/03).

CONTRATO FIRMADO ENTRE AS PARTES, NO MAIS, QUE EXPÕE DE FORMA CLARA E PRECISA A NATUREZA, CARACTERÍSTICAS E FORMA DE COBRANÇA DA OPERAÇÃO CONTRATADA, ALERTANDO O CONTRATANTE ACERCA DA INCIDÊNCIA DE ENCARGOS SOBRE A DIFERENÇA DE VALOR EXISTENTE ENTRE O PAGAMENTO TOTAL DA FATURA E O PAGAMENTO MÍNIMO CUJA COBRANÇA É CONSIGNADA. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO DEVER DE INFORMAÇÃO.

CONSUMIDORA QUE ANUIU EXPRESSAMENTE COM A ADESÃO AO CARTÃO DE CRÉDITO E COM A CONTRATAÇÃO DE SAQUE COM PAGAMENTO MÍNIMO DA FATURA MEDIANTE CONSIGNAÇÃO EM SEU BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO, NÃO PODENDO ALEGAR, PORTANTO, VÍCIO DA VONTADE E AUSÊNCIA DE INTENÇÃO DE CONTRATAÇÃO DA MODALIDADE DE CRÉDITO UTILIZADA, TANTO MAIS QUANDO, CONQUANTO RECEBESSE MENSALMENTE AS FATURAS DO CARTÃO QUE APONTAVAM O PAGAMENTO MÍNIMO REALIZADO DE FORMA CONSIGNADA, APENAS VEIO A QUESTIONAR O NEGÓCIO JURÍDICO TRÊS ANOS APÓS SUA REALIZAÇÃO.

CONTRATO FIRMADO ENTRE AS PARTES QUE, TENDO OBSERVADO OS DITAMES DA LEI N. 10.820/03 E DA INSTRUÇÃO NORMATIVA INSS/PRES N. 28/08, E SE MOSTRANDO, PORTANTO, REGULAR. SENTENÇA QUE CONVERTEU O CONTRATO FIRMADO ENTRE AS PARTES PARA EMPRÉSTIMO PESSOAL CONSIGNADO QUE, CONTUDO, DEVE SER MANTIDA, PORQUANTO VEDADA A "REFORMATIO IN PEJUS".

DANOS MORAIS. ALEGAÇÃO DE QUE OS DESCONTOS PROCEDIDOS, RECONHECIDOS INDEVIDOS, ENSEJAM O DEVER DE INDENIZAR DE FORMA "IN RE IPSA". SIMPLES DESCONTO INDEVIDO NÃO GERA A PRESUNÇÃO DO DEVER DE INDENIZAR. NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DOS DANOS MORAIS SOFRIDOS. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO, NA PETIÇÃO INICIAL, DE SITUAÇÃO EXCEPCIONAL ESPECÍFICA QUE TENHA CAUSADO ABALO ANÍMICO AO DEMANDANTE. NECESSIDADE DA PRESENÇA DO DANO EXTRAPATRIMONIAL E DO NEXO DE CAUSALIDADE COM A CONDUTA IMPUTADA AO RÉU. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO A DIREITO DA PERSONALIDADE DA AUTORA QUE JUSTIFIQUE O DEVER DE INDENIZAR. MERO DESCONTENTAMENTO. NÃO COMPROVAÇÃO DE FATO QUE TENHA REPERCUTIDO DE MANEIRA GRAVE E LESIVA À DIGNIDADE DA AUTORA, CAPAZ DE CONFIGURAR ABALO MORAL.

HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS. AFASTAMENTO DAS TESES RECURSAIS QUE IMPÕE A MAJORAÇÃO DA SUCUMBÊNCIA A QUE CONDENADA NA ORIGEM A AUTORA, ORA RECORRENTE. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 85, § 11, DO CPC/2015. EXIGIBILIDADE DA VERBA QUE, TODAVIA, SE MANTÉM SUSPENSA, POR GOZAR A AUTORA DO BENEFÍCIO DA JUSTIÇA GRATUITA.

RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0302780-24.2018.8.24.0175, da comarca de Meleiro Unidade Regional de Direito Bancário do Litoral Sul Catarinense em que é/são Apelante(s) Carmen Eronita da Silva Marques e Apelado(s) Banco Agibank.

A Primeira Câmara de Direito Comercial decidiu, por votação unânime, conhecer e negar provimento ao recurso da autora, mantendo a sentença de parcial procedência dos pedidos da ação, com acréscimo de honorários recursais, cuja exigibilidade, todavia, permanece suspensa, por ser a autora beneficiária da gratuidade da justiça.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Excelentíssimo Senhor Desembargador Guilherme Nunes Born, e dele participaram os Excelentíssimos Senhores Desembargadores Mariano do Nascimento e José Maurício Lisboa.

Florianópolis, 29 de outubro de 2020.

Desembargador Luiz Zanelato

Relator


RELATÓRIO

Carmen Eronita da Silva Marques interpôs recurso de apelação cível (fls. 158-176) em face da sentença de fls. 141-154, que, proferida pelo juízo da Unidade Regional de Direito Bancário do Litoral Sul Catarinense da comarca de Meleiro, julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na "Ação de Restituição de Valores c/c Indenização por Danos Morais" por ela ajuizada em face da instituição financeira apelada, Banco Agibank.

Cuida-se, na origem, de ação de restituição de valores c/c indenização por danos morais aforada em 16-11-2018 por Carmen Eronita da Silva Marques, na qual pede o reconhecimento da inexistência de contratação de empréstimo consignado na modalidade de cartão de crédito, bem como a condenação da instituição financeira ao ressarcimento dos valores indevidamente descontados de seu benefício previdenciário, e a condenação ao pagamento de danos morais, em razão da inexistência de contratação de reserva de margem consignada em seu benefício previdenciário, para contratação de cartão de crédito não solicitado.

À fl. 34 foi concedida a gratuidade da justiça requerida pela demandante e indeferida a antecipação dos efeitos da tutela.

Devidamente citado (fl. 38), o Banco Agibank apresentou contestação (fls. 40-50), na qual defendeu, inicialmente, a regularidade da contratação realizada entre as partes. Afirmou, neste sentido, que a parte autora tinha total ciência da natureza e forma de cobrança da operação pactuada, a qual se encontrava descrita de forma clara e expressa no contrato, desprovido de qualquer irregularidade, não possuindo a demandante, diversamente do que alega, a intenção de contratar empréstimo pessoal consignado no lugar do saque via cartão de crédito, tendo em vista que ao tempo da contratação sequer possuía margem consignável além daquela disponível para uso no cartão, sendo esta modalidade de crédito, que não constitui venda casada, a única operação viável para a concessão do valor perseguido. Destacou que a operação de saque via cartão de crédito com margem consignável e o empréstimo pessoal consignado tratam-se de operaçãos distintas, com natureza e características diversas, sendo incabível, por isso, a conversão da operação em crédito pessoal consignado. Argumentou que, inexistindo irregularidades no contrato, ausente o ato ilícito ensejador de dano moral indenizável. Pugnou pela improcedência da demanda. Juntou o contrato firmado com a parte autora e comprovante de disponibilização do valor sacado do cartão de crédito.

Manifestação à contestação às fls. 66-83, na qual a autora, rebatendo os argumentos da parte adversa, reitera os termos da inicial, pugnando pela procedência da demanda.

Sobreveio sentença de mérito prolatada em 23-05-2019 pelo magistrado Marciano Donato, da Unidade Regional de Direito Bancário do Litoral Sul Catarinense da comarca de Meleiro, que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados pela autora, o que se deu nos seguintes termos (fls. 141-154):

JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados por Carmen Eronita da Silva Marques em desfavor de AGIPLAN Financeira S/A. Crédito, Financiamento e Investimentos, para, acolhendo o pedido subsidiário e com amparo no artigo 6º, incisos III e V do Código de Defesa do Consumidor, determinar que a instituição financeira requerida proceda, no prazo de 30 (trinta) dias, a readequação dos termos do contrato de "Cartão de Crédito Consignado"conforme parâmetros acima elencados.

Ainda, JULGO EXTINTO o processo com resolução de mérito, na forma do artigo 487, I, do Código de Processo Civil

Frente a sucumbência recíproca, CONDENO as partes ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais), a serem partilhados no percentual de 50% (cinquenta por cento) para cada uma, à luz do artigo 85, § 8º, do Código ce Processo Civil - sobretudo por se tratar de demanda de pouca complexidade, com reduzido número atos processuais e sem instrução do processo -, corrigidos monetariamente a partir da publicação desta sentença e acrescidos de juros de mora após o trânsito em julgado.

Por ser beneficiária da gratuidade da justiça (p. 34), fica suspensa exigibilidade dos ônus sucumbenciais em relação à parte requerente.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Oportunamente, arquivem-se.

Inconformada, a autora interpôs recurso de apelação (fls. 158-176), em que sustenta, inicialmente, (1.1) a invalidade do contrato firmado entre as partes. Neste sentido, informa que foi ludibriada pela casa bancária, tendo contratado, sem seu conhecimento e consentimento, crédito disponibilizado por meio de saque em cartão de crédito com reserva de...

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