Acórdão Nº 0302817-37.2018.8.24.0018 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 10-12-2020

Número do processo0302817-37.2018.8.24.0018
Data10 Dezembro 2020
Tribunal de OrigemChapecó
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Cível n. 0302817-37.2018.8.24.0018, de Chapecó

Relator: Desembargador Luiz Zanelato

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATOS BANCÁRIOS AJUIZADA NA VIGÊNCIA DO CPC/2015. CRÉDITO DE CAPITAL DE GIRO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA.

RECURSO DOS AUTORES.

PROTEÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. DEVEDORA PRINCIPAL PESSOA JURÍDICA. VALOR EMPREGADO NO INCREMENTO DE SUA ATIVIDADE PRODUTIVA. NÃO ENQUADRAMENTO DA AUTORA NO CONCEITO DE CONSUMIDORA FINAL. TEORIA FINALISTA. INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO DE CONSUMO. AUSÊNCIA, AINDA, DA CONDIÇÃO DE HIPOSSUFICIÊNCIA E VULNERABILIDADE ENTRE AS CONTRATANTES. PRETENSÃO REJEITADA.

IMPUGNAÇÃO À FORMA DE COMPOSIÇÃO DA TAXA DE JUROS REMUNERATÓRIOS PACTUADA. CONTRATOS COM PREVISÃO EXPRESSA DE INCIDÊNCIA MENSALMENTE DO ENCARGO COMPOSTO POR UMA TAXA DE JUROS PRÉ-FIXADA CUMULADA COM A TAXA DE VARIAÇÃO DO CERTIFICADO DE DEPÓSITO INTERBANCÁRIO - CDI. INSURGÊNCIA QUE NÃO MERECE ACOLHIMENTO. UTILIZAÇÃO DO CDI COMO INDEXADOR DA TAXA DE JUROS REMUNERATÓRIOS QUE É POSSÍVEL NOS CONTRATOS BANCÁRIOS, CONSOANTE MAIS RECENTE POSIÇÃO FIRMADA PELA CORTE SUPERIOR DE JUSTIÇA, AO JULGAR O RESP N. 1.781.959/SC. PEDIDO ALTERNATIVO PARA LIMITAR A TAXA DE JUROS REMUNERATÓRIOS PELA MÉDIA DE MERCADO ACASO MANTIDA A UTILIZAÇÃO DO CDI. INVIABILIDADE. ÍNDICE DOS JUROS REMUNERATÓRIOS (SOMATÓRIO DA TAXA FIXA COM A VARIAÇÃO PERCENTUAL DO CDI NO RESPECTIVO PERÍODO) QUE EM NENHUM DOS MESES DE VIGÊNCIA DOS CONTRATOS IMPUGNADOS ULTRAPASSOU DEMASIADAMENTE AS CORRESPONDENTES TAXAS MÉDIAS DE MERCADO DIVULGADAS PELO BANCO CENTRAL, PRATICADAS EM OPERAÇÕES DA MESMA NATUREZA. SENTENÇA ESCORREITA NO PONTO E, ASSIM, MANTIDA PARA PERMITIR A INCIDÊNCIA DAS TAXAS DE JUROS REMUNERATÓRIOS FIXADAS NOS CONTRATOS.

TARIFA DE CADASTRO - TC. COBRANÇA PERMITIDA ÚNICA VEZ, NO INÍCIO DA RELAÇÃO CONTRATUAL, DESDE QUE PREVISTA EXPRESSAMENTE NO CONTRATO. OBSERVÂNCIA DA SÚMULA N. 566/STJ. COBRANÇA DA TARIFA DE CADASTRO PRESENTE NOS TRÊS AJUSTES EM REVISÃO NOS AUTOS. ABUSIVIDADE DA COBRANÇA RECONHECIDA NAS CONTRATAÇÕES MAIS RECENTES. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA NO PONTO.

REPETIÇÃO DE INDÉBITO. CONSTATAÇÃO DE COBRANÇA ABUSIVA DE TARIFAS TARIFAS CONTRATUAIS QUE AUTORIZA A DEVOLUÇÃO DOS VALORES INDEVIDOS EVENTUALMENTE PAGOS, DE FORMA SIMPLES, COM CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA.

ÔNUS SUCUMBENCIAIS. PROVIMENTO PARCIAL DO RECURSO DOS AUTORES QUE POUCO REPERCUTIU SOBRE A PROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS DA AÇÃO, CONFERINDO ÊXITO MÍNIMO À PARTE DEMANDANTE. MANUTENÇÃO DA RESPONSABILIDADE PELOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS QUE DEVE SE MANTER CONFORME FIXADO NA SENTENÇA, QUE CONDENOU OS AUTORES AO PAGAMENTO DA INTEGRALIDADE DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS.

HONORÁRIOS RECURSAIS. INAPLICABILIDADE DIANTE DO ACOLHIMENTO PARCIAL DO RECURSO DOS AUTORES.

RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0302817-37.2018.8.24.0018, da comarca de Chapecó 2ª Vara Cível em que é/são Apelante(s) Schumann Móveis e Eletrodomésticos Ltda (Em Recuperação Judicial) e outros e Apelado(s) Banco Semear S/A.

A Primeira Câmara de Direito Comercial decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e dar-lhe provimento parcialmente para, em reforma parcial da sentença: (i) declarar a ilegalidade da cobrança da tarifa de cadastro nas Cédula de Crédito Bancário - Capital de Giro n. 9907305 e n. 9907504; e (ii) condenar a instituição financeira à repetição de indébito, na forma simples, dos valores indevidos e eventualmente pagos, acrescidos os valores com correção monetária, pelo INPC/IBGE, a contar da data de cada desembolso, e juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, desde a citação. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Excelentíssimo Senhor Desembargador Guilherme Nunes Born, e dele participaram os Excelentíssimos Senhores Desembargadores Mariano do Nascimento e José Maurício Lisboa.

Florianópolis, 10 de dezembro de 2020.

Desembargador Luiz Zanelato

Relator


RELATÓRIO

Schumann Móveis e Eletrodomésticos Ltda (Em Recuperação Judicial) e outros interpuseram recurso de apelação cível (fls. 322-348) em face da sentença de fls. 302-318, que, proferida pelo juízo da 2ª Vara Cível da comarca de Chapecó, julgou improcedentes os pedidos formulados pela parte autora, ora apelante, em ação de revisão de contrato bancário ajuizada em face do Banco Semear S/A.

Cuida-se, na origem, de ação de revisional aforada em 21-03-2018 por Schumann Móveis e Eletrodomésticos Ltda (Em Recuperação Judicial), André Leonardo Schumann e Mariele Vivian, contra Banco Semear S/A, tendo por objetivo a revisão de três Cédulas de Crédito Bancário firmadas entre as partes, os quais afirmam estarem eivados de abusividades e ilegalidades referentes à utilização do CDI como fator de correção monetária, índice que, quando aplicado com a taxa de juros previstas nos ajustes em discussão, conduz à cobrança de encargos abusivos. Afirmam, ainda, ser inexigível a cobrança da tarifa de cadastro (TC). Sustentam que, diante da cobrança de encargos abusivos, a instituição financeira ré deve ser condenada ao pagamento de repetição de indébito em seu favor. Pedem a aplicação do código consumerista pugnando pelo afastamento das cláusulas reputadas abusivas e a devolução do valor que consideram ter pago a maior.

Devidamente citada, a parte demandada apresentou contestação (fls. 145-158), na qual alegou, preliminarmente, a ausência de interesse de agir dos demandantes. No mérito, defendeu a legalidade dos contratos entabulados entre as partes, os quais afirma não possuírem encargos abusivos. Argumenta ser plenamente possível a utilização da CDI como índice de correção monetária; que as taxas de juros cobradas não são abusivas, e que não houve a cobrança de TAC em relação aos ajustes em debate, bem como que é incabível a sua condenação a repetição de indébito na forma dobrada. Por fim, pugnou pela total improcedência dos pedidos iniciais (fls. 145-158).

Réplica às fls. 283-301, na qual os autores reafirmaram os termos da inicial, pugnando pela procedência da demanda.

Sobreveio sentença de mérito prolatada em 23-04-2019 pela magistrada Nádia Inês Schmidt, da 2ª Vara Cível da comarca de Chapecó, que julgou improcedentes os pedidos formulados na inicial, o que se deu nos seguintes termos (fls. 302-318):

3. ANTE O EXPOSTO, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos efetuados por Schumann Móveis e Eletrodomésticos Ltda (em recuperação judicial), André Leonardo Schumann e Mariele Vivian em face de Banco Semear S.A, resolvendo o feito, com exame do mérito, com esteio no art. 487, inciso I do Código de Processo Civil.

Condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios de 10% sobre o valor da causa, atualizado monetariamente pelo INPC a contar do ajuizamento, ao patrono da parte requerida, observada a natureza da matéria o trabalho realizado (CPC, art. 85, § 2°).

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Transitada em julgado, arquivem-se os autos definitivamente com as

baixas de estilo.

Interposta a presente apelação pelos autores (fls. 322-348), sustentam, em suas razões recursais, que: a) é necessária a análise do caso à luz das normas do Código de Defesa do Consumidor; b) deve ser reconhecida a impossibilidade de utilização de CDI como fator de correção monetária; c) deve ser reconhecida a abusividade da taxa de juros cobradas com a aplicação da CDI; d) o banco deve ser condenado à repetição de indébito dos valores indevidamente cobrados; e) deve ser afastada a cobrança da taxa denominada TC.

Em contrarrazões (fls. 354-361), a parte apelada defendeu a legalidade das cláusulas estipuladas no contrato, pugnando, assim, pela manutenção da decisão de primeiro grau e o desprovimento do recurso.

Os autos ascenderam a este egrégio Tribunal de Justiça, vindo-me às mãos por sorteio (fls. 363-365).

Este é o relatório.


VOTO

1. Do juízo de admissibilidade

Inicialmente, registra-se que a demanda foi ajuizada já na vigência do Código de Processo Civil de 2015, de sorte que é este o diploma processual que deverá disciplinar o cabimento, o processamento e a análise do presente recurso, tendo vista o princípio tempus regit actum (teoria do isolamento dos atos processuais).

Dito isto, tem-se que o recurso deve ser conhecido porquanto presentes os requisitos de admissibilidade, razão pela qual passa-se à análise das teses recursais.

2. Da Fundamentação

2.1 Da aplicação do Código de Defesa do Consumidor

Inicialmente, registra-se que a tese da recorrente quanto à aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor não merece prosperar.

Sobre o tema destaca-se que, realmente, não se pode caracterizar a pessoa jurídica como destinatária final quando constatado que o fornecimento de crédito se destina ao incremento da atividade produtiva. Em casos tais, a jurisprudência da Corte Superior de Justiça encontra posição firmada no sentido de se excluir a incidência do Código de Defesa do Consumidor, dada a inexistência de relação de consumo.

Aqui, importante mencionar que não se desconsidera que no polo ativo da ação, juntamente à pessoa jurídica Schumann Móveis e Eletrodomésticos LTDA, figuram-se duas pessoas físicas. Contudo, a empresa autora é a devedora principal das Cédulas de Crédito em discussão nos autos, enquanto os demais autores são apenas os avalistas (fls. 55-67).

No mais, a realidade dos autos não aponta uma desproporção de forças entre as contratantes, não tendo a empresa recorrente demonstrado que se encontrava em condição de vulnerabilidade ou de hipossuficiência em relação à instituição financeira recorrida.

Neste sentido, destaca-se a posição firmada pela Corte Superior de Justiça:

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. OFENSA AO ART. 535, II, DO CPC. NÃO OCORRÊNCIA. CONTRATO DE ABERTURA DE CRÉDITO EM CONTA-CORRENTE FIRMADO COM PESSOA JURÍDICA. CAPITAL DE GIRO. APLICAÇÃO DO CDC AFASTADA. PRECEDEN...

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