Acórdão Nº 0302884-59.2019.8.24.0020 do Sexta Câmara de Direito Civil, 03-11-2020

Número do processo0302884-59.2019.8.24.0020
Data03 Novembro 2020
Tribunal de OrigemCriciúma
ÓrgãoSexta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Cível n. 0302884-59.2019.8.24.0020

Relator: Desembargador Stanley Braga

APELAÇÃO CÍVEL E RECURSO ADESIVO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. FALHA NO REGISTRO DE PAGAMENTO DE FATURA DE ÁGUA. SUSPENSÃO DO FORNECIMENTO DE ÁGUA PELA CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DE AMBAS AS PARTES. CONTA QUITADA EM CASA LOTÉRICA. ERRO NA DIGITAÇÃO DO CÓDIGO DE BARRAS QUE NÃO PODE SER ATRIBUÍDO À DEMANDANTE. PRECEDENTE. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA DEMANDADA. DANO MORAL. AUTORA QUE COMPROVADAMENTE PAGOU ANTECIPADAMENTE A FATURA E, MESMO ASSIM, LHE FOI CESSADO O ABASTECIMENTO. DEVER DE INDENIZAR MANTIDO. VALOR DA INDENIZAÇÃO ARBITRADO EM R$ 5.000,00 (CINCO MIL REAIS). POSSIBILIDADE DE MINORAÇÃO PARA R$ 3.000,00 (TRÊS MIL REAIS, QUANTIA QUE, À LUZ DOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE, DA PROPORCIONALIDADE, DA ADEQUAÇÃO, MOSTRA-SE ADEQUADA AO CASO CONCRETO. PRECEDENTE DESTA CORTE. MAJORAÇÃO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS, FIXADOS EM 10% (DEZ POR CENTO). ART. 85 DO CPC/2015. INSUBSISTÊNCIA. DEMANDA DE BAIXA COMPLEXIDADE E EM CONSONÂNCIA COM O ZELO DO PROFISSIONAL. SENTENÇA MANTIDA. APELO DA RÉ CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO E RECURSO ADESIVO DA AUTORA CONHECIDO E DESPROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0302884-59.2019.8.24.0020, da comarca de Criciúma (1ª Vara Cível), em que é Apte/RdoAd Companhia Catarinense de Águas e Saneamento CASAN e Apda/RteAd Armelinda Comin Mezari.

A Sexta Câmara de Direito Civil, em sessão extraordinária virtual, decidiu, por votação unânime conhecer do apelo da ré e dar-lhe parcial provimento e conhecer do recurso adesivo da autora e negar-lhe provimento. Custas legais.

O julgamento, realizado nessa data, foi presidido pela Exma. Sra. Desa. Denise Volpato e dele participou o Exmo. Sr. Des. André Carvalho e o Exmo. Sr. Des. André Luiz Dacol.

Florianópolis, 3 de novembro de 2020.

Desembargador Stanley Braga

Relator


RELATÓRIO

Nos termos da decisão de Primeiro Grau (fls. 100-104), mudando o que deve ser mudado:

"Armelinda comin Mezari, qualificada nos autos, ajuizou ação de indenização por danos morais em face de Companhia Catarinense de Águas e Saneamento - CASAN, igualmente qualificada, aduzindo, em síntese, que teve interrompido, indevidamente, o abastecimento de água em sua residência, uma vez que sempre pagou as faturas recebidas com antecedência. Desconhecendo a razão do corte e em contato com a ré, a autora foi cientificada de que a fatura com vencimento em 17-1-2018 estava em aberto, motivo pelo qual lhe foi cessado o fornecimento. Aduz ter quitado prontamente - em duplicidade - a referida fatura, a fim de ver restaurado seu serviço de abastecimento. Logo, pugna pela condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais, tendo em vista se tratar de serviço essencial.

Pedido de gratuidade da justiça.

Valorou a causa e acostou documentos (fls. 7-15).

Recebida a inicial e concedida a benesse, foi determinada a citação da ré (fl 16).

Devidamente citada, a ré apresentou defesa, na forma de contestação, aduzindo, em síntese, que, quando do pagamento da fatura pela autora em casa lotérica, o código de barras foi digitado erroneamente e por este motivo não houve identificação da quitação pela concessionária ré. Sustenta, ainda, que a autora recebeu carta informando acerca de pendência no sistema, mas manteve-se inerte, caracterizando culpa recíproca. Por fim, pugna pela denunciação à lide da Caixa Econômica Federal, responsável pelo processamento dos pagamentos, bem como a remessa dos autos à Justiça Federal para processamento e julgamento dos autos, com a improcedência dos pedidos inaugurais, tendo em vista que os fatos ocorridos não passaram de mero aborrecimento não indenizável.

Acostou documentos (fls. 33-89).

Sobreveio réplica (fls. 93-98)."

O litígio foi assim decidido na instância de origem:

"Isso posto, julgo procedente o pedido formulado por Armelinda Comin Mezari na ação de indenização por danos morais em face de Companhia Catarinense de Águas e Saneamento - CASAN, para o fim de condenar a ré ao pagamento da quantia de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a título de indenização por danos morais, devidamente corrigido (INPC) desde a publicação da sentença e acrescidos de juros de mora de 1% (um por cento) desde o ato ilícito (9-4-2018), nos termos do art. 487, inc. I, do Código de Processo Civil.

Condeno, ainda, a ré ao pagamento das despesas processuais e dos honorários advocatícios, estes fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da condenação, ex vi do § 2º do art. 85 do CPC."

A ré apresentou embargos de declaração (fl. 109), ao argumento de que a sentença foi omissa, porquanto deixou de analisar o pedido de denunciação à lide em relação a Caixa Econômica Federal. Assim, requereu o acolhimento dos aclaratórios e a remessa dos autos à Justiça Federal.

O magistrado singular rejeito os embargos declaratórios asseverando "ainda que de fato omissa no ponto indicado, o Superior Tribunal de Justiça já sedimentou entendimento de que é inadmissível a figura da denunciação da lide nos processos em que envolvam direito do consumidor, notadamente quando este manifesta-se contrariamente ao pedido" (fls. 114-115).

Foi interposto recurso de apelação cível (fls. 119-132) por Companhia Catarinense de Águas e Saneamento CASAN, ocasião em que defendeu, em síntese: a) a ausência de responsabilidade civil em razão de culpa exclusiva de terceiro (funcionária da casa lotérica digitou erroneamente o código de barras da fatura); b) a denunciação da lide à Caixa Econômica Federal com a remessa dos autos à Justiça Federal; c) a ausência de ilícito civil indenizável, ao argumento de que a autora sequer passou 24h (vinte e quatro horas) sem o abastecimento; e d) alternativamente, pretendeu a minoração da condenação que lhe foi imposta na origem.

A acionante apresentou contrarrazões às fls. 136-144 e, de igual, interpôs recurso adesivo (fls. 145-149), no qual pretendeu somente a majoração da indenização a título de danos morais a ela concedida e dos honorários devidos ao seu procurador.

Resposta ao apelo adesivo às fls. 154-160.

Regularmente preparado o apelo da Casan (fls. 131-132) e dispensado a autora das custas, a tempo e modo, ascenderam os autos a este superior grau de jurisdição.

Este é o relatório.


VOTO

Da admissibilidade:

Presentes os pressupostos legais, o recurso é conhecido.

Do julgamento:

Por questão de ordem, os recursos serão apreciados em conjunto, dada a parcial convergência das razões apresentadas.

Preliminares:

Não foram suscitadas preliminares.

Mérito:

Da denunciação da lide:

Postula a recorrente Companhia Catarinense de Águas e Saneamento - CASAN a denunciação à lide em face da Caixa Econômica Federal, ao argumento de que há entre a concessionária e a instituição financeira contrato de prestação de serviços, no qual objetiva viabilizar a cobrança das faturas.

Alega que, no referido contrato, há a previsão de responsabilidade legal da CEF para com a legitimidade da transação, motivo pelo qual, pugna pela remessa dos autos à Justiça Federal, nos moldes da Sumula 150 do Superior Tribunal de Justiça ("compete à Justiça Federal decidir sobre a existência de interesse jurídico que justifique a presença, no processo, da União, suas autarquias ou empresas públicas").

No entanto, a pretensão não pode prevalecer, porquanto a demanda tem natureza consumerista, e, como já assinalado pelo Superior Tribunal de Justiça em tese firmada pela Corte de Uniformização, no julgamento do REsp 1.165.279-SP,

[...] é incabível a denunciação da lide nas ações indenizatórias decorrentes da relação de consumo seja no caso de responsabilidade pelo fato do produto, seja no caso de responsabilidade pelo fato do serviço (arts. 12 a 17 do CDC) [...] (Informativo de jurisprudência n. 481).

E, fulminando, sobre o tema, Nelson Nery Júnior leciona que:

"Denunciação da lide. O instituto da denunciação da lide, por ser um complicador processual por excelência, é incompatível com o objetivo traçado pelo CDC de fornecer proteção rápida e eficaz a toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final, e a mais ninguém. (JTJ 148/205)." (Código Civil Anotado e legislação extravagante. 2 ed. rev. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 981).

Colhe-se da jurisprudência:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. SUSPENSÃO NO ABASTECIMENTO DE ÁGUA. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. RECLAMO DA CONCESSIONÁRIA. PLEITO DA RÉ DE DENUNCIAÇÃO À LIDE À INSTITUIÇÃO FINANCEIRA RESPONSÁVEL PELA COBRANÇA DE FATURAS DE ÁGUA. INTERVENÇÃO DE TERCEIROS, EM REGRA, INADMISSÍVEL EM AÇÕES TRATADAS À LUZ DE RELAÇÃO CONSUMERISTA, MORMENTE TRATANDO-SE DE FATO DA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. OBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS DA CELERIDADE DO PROCESSO E DA ECONOMIA PROCESSUAL. NÃO INCIDÊNCIA, ADEMAIS, DA EXCEÇÃO DO ARTIGO 101, II, DA LEI 8.078/90. TERCEIROS QUE NÃO SE ENQUADRAM COMO SEGURADORES. DECISÃO MANTIDA. ALMEJADO AFASTAMENTO DO DEVER DE INDENIZAR SOB O ARGUMENTO DE EXCLUSÃO DA RESPONSABILIDADE CIVIL POR ENGANO JUSTIFICÁVEL E AUSÊNCIA DE MÁ-FÉ. DESCABIMENTO. AUTOR QUE, NÃO OBSTANTE TER QUITADO SUA FATURA DE ÁGUA EM TEMPO, TEVE SUSPENSO POR DOIS DIAS SEU ABASTECIMENTO. REQUERIDA QUE TENTA ATRIBUIR CULPA PELA SUSPENSÃO DO SERVIÇOS AO BANCO QUE RECOLHEU O PAGAMENTO DO DÉBITO (AGENTE ARRECADADOR). IMPOSSIBILIDADE. CULPA "IN ELIGENDO" VERIFICADA. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO EVIDENCIADA. INEXISTÊNCIA DE QUALQUER EXCLUDENTE DE RESPONSABILIDADE. DEVER DE INDENIZAR CONFIGURADO. DANO MORAL. ABALO PRESUMIDO EM RAZÃO DA SUSPENSÃO NO FORNECIMENTO DO SERVIÇO ESSENCIAL. SITUAÇÃO QUE EXTRAPOLA O MERO DISSABOR. CONDENAÇÃO MANTIDA. QUANTUM INDENITÁRIO. ESTIPÊNDIO QUE DEVE ADSTRIR-SE AO VIÉS PEDAGÓGICO DA COMPENSAÇÃO PECUNIÁRIA. MINORAÇÃO DO MONTANTE PARA...

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