Acórdão Nº 0302907-05.2015.8.24.0033 do Segunda Câmara de Direito Civil, 12-11-2020

Número do processo0302907-05.2015.8.24.0033
Data12 Novembro 2020
Tribunal de OrigemItajaí
ÓrgãoSegunda Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Cível n. 0302907-05.2015.8.24.0033, de Itajaí

Relator: Desembargador Rubens Schulz

APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. TERCEIRO USUÁRIO DO PROVEDOR DE HOSPEDAGEM DA PARTE RÉ QUE UTILIZAVA INFORMAÇÕES NÃO AUTORIZADAS DA AUTORA EM BATE PAPO DE RELACIONAMENTO. AUTORA QUE RECEBIA LIGAÇÕES DE HOMENS PARA ENCONTROS. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA QUE DETERMINOU O CUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÕES E JULGOU IMPROCEDENTE O PLEITO DE CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. RECURSOS DE AMBAS AS PARTES.

RECURSO DA PARTE RÉ. ALMEJADO O RECONHECIMENTO DA SUFICIÊNCIA DOS DADOS FORNECIDOS DURANTE O TRÂMITE PROCESSUAL. PLEITEADO O AFASTAMENTO DAS OBRIGAÇÕES RELACIONADAS AO BLOQUEIO DO USUÁRIO NAS PÁGINAS DA WEB E AO FORNECIMENTO DO CONTEÚDO DAS CONVERSAS. TESES ACOLHIDAS. PARTE RÉ QUE, DE FATO, CUMPRIU COM A OBRIGAÇÃO DE FORNECIMENTO DO IP - INTERNET PROTOCOL DO USUÁRIO FRAUDADOR E DA APRESENTAÇÃO DA SEGUNDA DENÚNCIA REALIZADA PELA AUTORA NO SITE DA RÉ. ORDEM CUMPRIDA NOS LIMITES DA CAPACIDADE DO RÉU. AFASTAMENTO DA OBRIGAÇÃO DE FORNECER O CONTEÚDO DAS CONVERSAS DO USUÁRIO FRAUDADOR NAS "SALAS" DE BATE PAPO E DE BLOQUEAR O INGRESSO DO USUÁRIO NAS PÁGINAS DA INTERNET SOB ADMINISTRAÇÃO DA PARTE RÉ. ADEMAIS, PARTE AUTORA QUE REPASSOU INFORMAÇÕES INSUFICIENTES À PARTE RÉ PARA O CUMPRIMENTO DAS OBRIGAÇÕES DETERMINADAS EM SENTENÇA. SENTENÇA REFORMADA. REDISTRIBUIÇÃO DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS.

RECURSO DA AUTORA. REQUERIMENTO DE CONDENAÇÃO DA PARTE RÉ AO PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. INSUBSISTÊNCIA. PARTE AUTORA QUE NÃO LOGROU ÊXITO EM COMPROVAR SITUAÇÃO EXCEPCIONAL EM DECORRÊNCIA DO FATO OBJETO DE ANÁLISE DA PRESENTE DEMANDA, ÔNUS QUE LHE INCUMBIA, NOS TERMOS DO ART. 373, I, DO CPC. INEXISTÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DO COMETIMENTO DO ATO ILÍCITO PELA PARTE RÉ. MERO DISSABOR. DEVER DE INDENIZAR NÃO CONFIGURADO. SENTENÇA MANTIDA.

RECURSOS CONHECIDOS, SENDO O RECURSO DA PARTE RÉ PROVIDO E DA AUTORA DESPROVIDO. FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS RECURSAIS. SUSPENSA A EXIGIBILIDADE, CONTUDO, DIANTE DO DEFERIMENTO DA JUSTIÇA GRATUITA À AUTORA.

- "Para a configuração do dano moral o sofrimento de quem se diz ofendido deve ultrapassar a linha da normalidade, atingindo sobremaneira a reputação, a honra ou a integridade moral do indivíduo e o seu comportamento psicológico. Não merece indenização o simples desagrado, a irritação ou o aborrecimento do outro diante de situação cotidiana ou de mero inadimplemento contratual no qual não se verificou nenhuma abusividade suscetível de causar à parte grave constrangimento" (TJSC, Apelação Cível n. 0300040-58.2017.8.24.0004, rel. Des. Sebastião César Evangelista).

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0302907-05.2015.8.24.0033, da comarca de Itajaí (3ª Vara Cível), em que é Apte/Apdo Juliana Reis Moraes dos Santos e Apdo/Apte Universo On Line SA.

A Segunda Câmara de Direito Civil decidiu, por votação unânime, conhecer e negar provimento ao recurso de apelação interposto pela autora; dar provimento ao apelo da ré, para afastar as obrigações impostas à ré no sentido de apresentar o conteúdo das conversas e outras informações relevantes, assim como bloquear o ingresso do usuário em páginas, sites ou similares sob sua administração; redistribuindo-se os ônus sucumbenciais, os quais deverão recair integralmente sobre a parte autora, mantendo-se, no mais, o valor dos honorários advocatícios arbitrados na decisão objurgada (R$ 500,00) em favor do patrono da parte ré. Por fim, fixam-se honorários recursais em favor do patrono da parte ré equivalentes a 20% (vinte por cento) do valor a esse título arbitrado em sentença. Suspensa a exigibilidade, contudo, do pagamento dos ônus sucumbenciais e dos honorários recursais diante do deferimento da justiça gratuita à autora. Custas legais.

Participaram do julgamento, realizado nesta data, o Exmo. Sr. Des. Rubens Schulz, presidente com voto, a Exma. Sra. Desa. Rosane Portella Wolff e o Exmo. Sr. Des. Monteiro Rocha.

Florianópolis, 12 de novembro de 2020.

Desembargador Rubens Schulz

Relator


RELATÓRIO

Juliana Reis Moraes dos Santos ajuizou a presente "ação de reparação de danos morais c/c obrigação de fazer e pedido de tutela antecipada, inversão do ônus da prova e exibição de documentos" em face de Uol - Universo On-line S/A. Sustentou, em síntese, que "vem sendo abordada das mais variadas formas (SMS, Whatsapp, telefone, etc.), por diversos homens que relatam tê-la conhecido através de um site de relacionamentos, do tipo chat, denominado Bate Papo UOL, sob responsabilidade/administração da Ré". Relatou que, no entanto, é casada e mãe de família, afirmando jamais ter participado de chats deste teor, até porque "os horários em que as conversas se dão são exatamente os do seu expediente de trabalho, onde é proibido e não há acesso à tais ferramentas". Asseverou que, após tantos constrangimentos e tentativas de descobrir o motivo das mensagens e ligações, conseguiu encontrar a causa para o que estava acontecendo ao "conversar com alguns destes homens que, sensibilizados, lhe contaram sobre horários e outros detalhes das conversas, especialmente de que se tratava de um perfil falso, com dados compatíveis aos reais, inclusive telefone e endereço". Asseverou que ao descobrir a situação, de imediato, notificou a empresa ré por 3 (três) vezes, mediante uma ferramenta disponibilizada no próprio site chamado "Uol Denúncias", mas que, no entanto, os transtornos não cessaram, uma vez que "além de não fornecer os dados do usuário criminoso para que a Autora pudesse informar a autoridade policial, ainda deixou de bloquear tal usuário". Por essas razões, pleiteou, em sede de antecipação de tutela, a determinação à parte ré de identificação do Internet Protocol-IP do terceiro responsável pela utilização do perfil falso com suas informações, assim como a apresentação do conteúdo das conversas, dentre outros esclarecimentos e que a empresa ré procedesse ao bloqueio do ingresso do perfil falso em qualquer página, site ou outros de sua responsabilidade, principalmente no chat; a inversão do ônus da prova; a procedência dos pedidos, para a determinação de exibição dos documentos e informações pela parte ré, bem como o bloqueio do ingresso do falso usuário em qualquer site de relacionamentos ou do bate papo sob administração da empresa ré e a condenação da ré ao pagamento de indenização por dano moral no valor sugerido de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais). Por derradeiro, juntou documentos (fls. 1-65).

Por despacho, foram deferidas a antecipação dos efeitos da tutela e a justiça gratuita (fls. 66-69).

Citada, a empresa ré apresentou contestação, argumentando, em suma, que não possui responsabilidade sobre o conteúdo publicado "em seus produtos interativos, enfatizando que tal conteúdo não é revisado ou fiscalizado pelo réu UOL". Relatou que, não obstante, disponibiliza uma página de acesso para a realização de denúncias em situações como estas. Sustentou que a autora não demonstrou informações aptas a auxiliar na identificação do usuário infrator, impossibilitando o seu reconhecimento. Argumentou, igualmente, a impossibilidade de realizar o bloqueio pleiteado pela autora, porquanto não há como ter acesso ao usuário. Defendeu a inexistência dos pressupostos ensejadores do dever de indenizar, pleiteando pelo julgamento de improcedência da demanda. Subsidiariamente, requereu a fixação do quantum indenizatório em patamar condizente com o princípio da vedação ao enriquecimento ilícito e proporcional ao caso. Por fim, juntou julgado do Superior Tribunal de Justiça (fls. 89-140).

Na sequência, a empresa ré noticiou a interposição de agravo de instrumento contra a decisão interlocutória que deferiu a tutela de urgência pleiteada pela autora, requerendo a concessão do efeito suspensivo (fls. 143-163). No entanto, o recurso foi inadmitido (fls. 165-169).

Houve réplica (fls. 172-192).

Em despacho, o magistrado a quo determinou a manutenção da decisão interlocutória de deferimento da tutela de urgência, para cumprimento pela empresa ré, no prazo de 10 (dez) dias, sob pena de multa diária (fls. 193-194).

Em decisão interlocutória, foi deferida o requerimento de produção de prova oral, designando dia para a audiência (fl. 244).

Realizada a audiência, a tentativa de conciliação restou inexitosa, sendo ouvida a testemunha Sabrina Gonçalves Moretto (fls. 251-252).

Conclusos os autos, sobreveio sentença na qual o magistrado a quo julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais, para (i) determinar que a empresa ré identifique o IP - Internet Protocol do terceiro criador do perfil falso em nome da autora; (ii) apresentar o conteúdo das conversas e outras informações relevantes; (iii) bloquear o ingresso em páginas, sites ou similares sob sua administração e responsabilidade, especialmente o bate papo em questão; (iv) exibir o conteúdo da segunda denúncia realizada pela autora sob o protocolo n. 230851748315604, no prazo de 15 (quinze) dias; e (v) diante da sucumbência recíproca, condenar as partes ao pagamento das custas processuais em 50% (cinquenta por cento) cada e fixar os honorários advocatícios devidos ao patrono da parte autora em R$ 1.200,00 (mil e duzentos reais) e ao advogado da empresa ré em R$ 500,00 (quinhentos reais). Suspensa a exigibilidade, contudo, diante do deferimento da justiça gratuita à autora (fl. 68).

Apontando omissão no decisum, a parte ré opôs embargos de declaração que, contudo, foram rejeitados (fls. 325-327).

Irresignadas, ambas as partes interpuseram recurso de apelação.

A autora, em suas razões recursais, objetiva a condenação da parte ré ao pagamento de indenização por dano moral, sob o fundamento de que foi vítima de um crime, assim como que a conduta da empresa ré é negligente e imprudente no que se refere à ausência de exigência de...

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