Acórdão Nº 0302978-71.2018.8.24.0010 do Terceira Câmara de Direito Público, 19-04-2022

Número do processo0302978-71.2018.8.24.0010
Data19 Abril 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0302978-71.2018.8.24.0010/SC

RELATOR: Desembargador JAIME RAMOS

APELANTE: ESTADO DE SANTA CATARINA (RÉU) APELADO: LUIZ EDUARDO FLORIANO (AUTOR)

RELATÓRIO

Na Comarca de Braço do Norte, Luiz Eduardo Floriano ajuizou "ação de obrigação de fazer com pedido de antecipação de tutela" contra o Estado de Santa Catarina, objetivando que o ente público demandado seja obrigado ao fornecimento do medicamento Xolair.

Alega a parte autora que "é portador de doença grave, qual seja, asma alérgica grave, CID 10 J 45.0"; que, após o uso das alternativas terapêuticas ofertadas pelo SUS, a indicação médica foi a de que o tratamento com a medicação "Xolair (omalizumabe)" "é a única chance de controlar adequadamente a gravíssima doença do REQUERENTE, que pode muito facilmente levá-lo a morte"; que não obteve êxito nas tentativas de receber tal fármaco pela via administrativa; que não possui condições financeiras aptas ao custeio do tratamento prescrito

Requereu a concessão da justiça gratuita, a "a antecipação de tutela, para determinar ao REQUERIDO que forneça o medicamento Xolair, 4 ampolas mensais, de forma permanente e contínua, sob pena de SEQUESTRO DE VALORES" e, ao final, que seja julgada totalmente procedente a pretensão inicial apresentada, confirmando-se o pedido de liminar postulado.

Garantida a justiça gratuita à parte autora, o pedido de liminar foi deferido, "para o fim de ordenar que o Estado de Santa Catarina forneça gratuitamente, no prazo de 10 (dez) dias, o medicamento Xolair (omalizumabe) 150mg indicados no receituário médico de fls. 23 (encaminhe-se cópia), necessário para a eficiência do tratamento receitado à Requerente, na quantidade que for preciso".

Citada, a parte ré apresentou contestação, alegando que o direito perseguido na inicial é inexistente, na medida em que há política pública disponível para o tratamento das patologias que acometem o autor, por meio de alternativas terapêuticas diversas, motivo pelo qual não pode ser privilegiado pela escolha do seu tratamento com fármaco não contemplado pelo SUS; que a medicação solicitada não está padronizada pelo SUS; que há necessidade de prova da hipossuficiência financeira do autor e sua família. No final, requereu a improcedência da demanda.

A parte autora apresentou réplica à contestação.

Saneando o feito, determinou-se a produção de prova pericial médica, a qual foi apresentada nos autos.

Com vista dos autos, o representante do Ministério Público manifestou-se pela procedência do pedido inaugural.

Posteriormente, foi proferida sentença que julgou procedente o pedido autoral para determinar que o Estado forneça o tratamento médico requerido pelo paciente.

Inconformado, o Estado apelou alegando que a sentença deve ser anulada e os autos remetidos à Justiça Federal, porque a União deve ser incluída no polo passivo da lide.

Com as contrarrazões, em seguida, os autos foram encaminhados à douta Procuradoria-Geral de Justiça que, no parecer da lavra do Exmo. Sr. Dr. César Augusto Grubba, manifestou-se no sentido de desprover o recurso.

VOTO

Trata-se de recurso de apelação interposto pelo Estado de Santa Catarina contra a sentença que, nos autos da "ação de obrigação de fazer com pedido de antecipação de tutela" proposta contra si por Luiz Eduardo Floriano, julgou procedente o pedido inicial para determinar "determino ao réu o fornecimento do medicamento Xolair à parte autora, na quantidade e na forma prescrita nos autos, enquanto perdurar a necessidade de tratamento", mantendo "inalterados os efeitos da liminar concedida".

O Estado alega em suas razões recursais que a União deve ser inclusa no polo passivo da lide, porquanto responsável pelo medicamento requerido na vestibular e, consequentemente, o processo remetido à Justiça Federal.

Razão lhe assiste.

Isso porque, o art. 23, inciso II, da CF/88, estabelece a competência concorrente da União, Estados e Municípios no que tange a saúde e assistência pública, razão pela qual a responsabilidade, entre os integrantes do sistema, é solidária.

Além disso, a Lei Federal n. 8.080/90, estabelece serem solidárias todas as esferas do Poder Público para o cumprimento das obrigações relativas à saúde. Ainda, o art. 15, da referida lei, dispõe que o Sistema Único de Saúde delegou aos Estados da Federação a administração dos recursos orçamentários e financeiros destinados à saúde. Por sua vez, o art. 17, inciso VIII, atribui competência "à direção estadual do Sistema Único de Saúde (SUS)" para "em caráter suplementar, formular, executar, acompanhar e avaliar a política de insumos e equipamentos para a saúde" (inciso VIII), sem afastar a legitimidade passiva do Município, dado que, consoante o art. 18, compete "à direção municipal do Sistema de Saúde (SUS) .... V - dar execução, no âmbito municipal, à política de insumos e equipamentos para a saúde" do que se pode concluir, mais uma vez, que a responsabilidade relativa aos cuidados com a saúde da população é solidária, incluindo também a União.

Nesse contexto, o Supremo Tribunal Federal adotou posicionamento de que o tratamento médico adequado aos necessitados se inserem no rol dos deveres do Estado, é de responsabilidade solidária dos entes Federados, conforme denota-se do entendimento firmado em sede de repercussão geral no Recurso Extraordinário n. 855.178 (Tema 793), veja-se:

"Tema 793 - Os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde, e diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro" (tese firmada em 23.05.2019).

Não obstante, ao julgar e rejeitar os embargos declaratórios opostos contra o acórdão relativo ao mencionado Tema, redefiniu os termos da tese acerca da responsabilidade solidária dos entes federativos no dever de prestar saúde aos necessitados, especialmente quanto à obrigação da União.

No acórdão relatado pelo Min. Edson Fachin, que proferiu o voto vencedor, já que o Relator originário, Min. Luiz Fux, foi vencido, datado de 16.04.2020, manteve-se o entendimento de solidariedade referente à obrigação do fornecimento de medicamentos pelos entes públicos, porém se determinou o direcionamento, pela autoridade judicial, do cumprimento ao ente responsável conforme as regras de repartição de competência para fornecimento de medicamento ou tratamento:

"CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. AUSÊNCIA DE OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE. DESENVOLVIMENTO DO PROCEDENTE. POSSIBILIDADE. RESPONSABILIDADE DE SOLIDÁRIA NAS DEMANDAS PRESTACIONAIS NA ÁREA DA SAÚDE. DESPROVIMENTO DOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. "1. É da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal que o tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, porquanto responsabilidade solidária dos entes federados. O polo passivo pode ser composto por qualquer um deles, isoladamente, ou conjuntamente. "2. A fim de otimizar a compensação entre os entes federados, compete à autoridade judicial, diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, direcionar, caso a caso, o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro. "3. As ações que demandem fornecimento de medicamentos sem registro na ANVISA deverão necessariamente ser propostas em face da União. Precedente específico: RE 657.718, Rel. Min. Alexandre de Moraes. 4. Embargos de declaração desprovidos.

No resumo do referido acórdão, apresentado pelo próprio Ministro redator, foram definidas as premissas que envolvem a questão:

"1. O presente voto, ao dispor dos eminentes pares e das partes na íntegra, expressa fundamentação nos termos do inciso IX do art. 93 da Constituição da República Federativa do Brasil, e se contém em aproximadamente 44 páginas."A síntese e a conclusão podem ser apresentadas, sem prejuízo da...

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