Acórdão Nº 0302988-96.2019.8.24.0005 do Terceira Câmara de Direito Comercial, 25-11-2021

Número do processo0302988-96.2019.8.24.0005
Data25 Novembro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0302988-96.2019.8.24.0005/SC

RELATOR: Desembargador RODOLFO TRIDAPALLI

APELANTE: PLACIDA DA SILVA (AUTOR) ADVOGADO: LEANDRO SCHIEFLER BENTO APELADO: BANCO DAYCOVAL S.A. (RÉU) ADVOGADO: RONALDO GOIS ALMEIDA (OAB RS056646)

RELATÓRIO

Da ação

Adota-se o relatório da sentença recorrida (Evento 49), em atenção aos princípios da celeridade e economia processual, por retratar com fidedignidade o trâmite processual no primeiro grau, in verbis:

Trato de ação restituição de valores com indenização por dano moral interposta por Placida da Silva em face do Banco Daycoval S.A., alegando, em síntese, que contratou empréstimo consignado com a parte ré, cujo pagamento se daria através de descontos mensais em seu benefício previdenciário, mas foi surpreendida com a dedução de Reserva de Margem Consignável (RCM) de cartão de crédito, o que não tinha a intenção de contratar.

Salientou que não pretendeu contratar a modalidade de cartão de crédito, desejando apenas a contratação de empréstimo consignado comum.

Informou ainda que a parte ré apenas simulou contrato de empréstimo de cartão de crédito consignado e sequer oportunizou a escolha da porcentagem que seria reservada e que os descontos mensalmente efetuados em seu benefício previdenciário não abatem o saldo devedor, porque cobrem tão somente os juros e encargos do cartão, tratando-se, pois, de dívida impagável. Acrescentou que sequer recebeu o cartão de crédito para uso e que, caso o tenha recebido, não o desbloqueou.

Diante de tais argumentos, requereu (i) a procedência dos pedidos para que seja declarada inexistente a contratação de empréstimo consignado via cartão de crédito com RCM, e condenada a instituição bancária requerida à restituição em dobro dos descontos realizados mensalmente nos últimos cinco anos, bem como ao pagamento de indenização por danos morais na quantia de 50 (cinquenta) salários mínimos; (ii) a inversão do ônus da prova; e, (iii) a concessão do benefício da assistência judiciária gratuita.

A inicial foi valorada e veio aparelhada com os documentos de fls. 18-22.

Designada audiência de conciliação e deferido o benefício da justiça gratuita (fls. 23-24).

Citada (fl. 28), a instituição bancária (Banco Pan S.A) apresentou contestação (fls. 30-47) e, de plano, argumentou a sua ilegitimidade passiva.

A parte autora manifestou (fl. 66) sua pretensão em extinguir o feito sem resolução de mérito em face do Banco Pan S.A., por conseguinte, havendo o prosseguimento do feito contra o Banco Daycoval.

Em decisão (fl. 72) foi realizada a substituição do polo passivo para Banco Daycoval, designando nova audiência conciliatória.

Citada (fl. 84) a instituição bancária ofereceu contestação (fls. 86-111), alegando que o contrato realizado entre as partes não é de empréstimo consignado em parcelas fixas mensais, mas de cartão de crédito consignado em folha de pagamento, não se tratando de venda casada.

Arguiu a legalidade na contratação, tendo a parte autora consentido. Além disso, informou que ao firmar contrato para emissão de cartão de crédito a autora solicitou e autorizou a realização do saque, sendo o valor acordado entre as partes transferido para sua conta.

Defendeu a licitude da reserva da margem consignável via cartão de crédito, bem como a desnecessidade da inversão do ônus probatório e a inexistência de danos morais.

Requereu a improcedência dos pedidos contidos na exordial e a produção de provas.

Juntou documentos (fls. 112-163).

A audiência conciliatória foi cancelada (fl. 164), face o desinteresse de ambas as partes.

A parte autora apresentou réplica em fls. 165-169, rebatendo os argumentos alinhavados em sede de contestação, bem como reiterando as teses esposadas na inicial.

Vieram os autos conclusos.

É o breve relatório.

Da sentença

A Juíza de Direito, Dra. BERTHA STECKERT REZENDE, da 1ª Vara Cível da Comarca de Balneário Camboriú, julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais, nos seguintes termos:

Ante o exposto, forte o art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos iniciais formulados por Placida da Silva em face do Banco Daycoval S.A., para o fim de:

a) DECLARAR inexistente a relação jurídica exclusivamente com relação ao cartão de crédito com RMC, com o consequente cancelamento do referido cartão;

b) DETERMINAR que a parte requerida proceda à conversão do contrato "cartão de crédito consignado" para "empréstimo consignado", tendo como valor atual o decorrente do montante originalmente repassado à parte autora, subtraída a quantia total dos descontos já efetivadas de RMC, sem qualquer acréscimo de encargo moratório, ressaltando-se que as condições desse novo contrato, notadamente o número de prestações, deverão ser recalculadas, levando-se em conta o percentual máximo consignável;

c) CONDENAR o Banco Daycoval S.A a restituir os valores indevidamente descontados da aposentadoria da parte autora, corrigidos monetariamente pelo INPC e com a incidência de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, ambos contados desde o desconto de cada parcela, permitida a COMPENSAÇÃO com eventual saldo devedor;

d) CONDENAR o Banco Daycoval S.A ao pagamento de R$ 3.000,00 (três mil reais) a título de indenização por danos morais, incidindo juros moratórios de 1% ao mês, a partir do evento danoso e correção monetária pelo INPC a partir da presente data, permitida a COMPENSAÇÃO dos valores concernentes ao dano moral com o montante usufruído a título de empréstimo no caso de existência de saldo devedor.

e) CONDENAR a parte ré ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, os quais fixo em 10% do valor atualizado da causa. (Evento 49).

Opostos Embargos de Declaração pela Instituição Financeira (Evento 54), foram eles rejeitados (Evento 61).

Da Apelação de PLÁCIDA DA SILVA

Inconformada com a prestação jurisdicional, a autora PLÁCIDA DA SILVA, interpôs recurso de Apelação (Evento 55), aduzindo, em síntese, que ao ser ludibriada com a forma de contração proposta pelo Banco Apelado, faz jus a: a) nulidade do contrato de RMC e não conversão para outra modalidade; b) indenização em dobro do montante devido; e c) majoração do quantum da indenização do dano moral.

Da Apelação do BANCO DAYCOVAL S/A

Também inconformado, o réu BANCO DAYCOVAL S/A, interpôs recurso de Apelação (Evento 70). Preliminarmente, sustenta o cerceamento do direito de defesa em função da falta de oitiva do depoimento pessoal da parte autora. No mérito, sustenta, em síntese, que a lide versa sobre a existência de suposto dano, desamparada de qualquer meio de prova, não sendo argumento suficiente para ensejar a alteração do contrato firmado, devendo a demanda ser julgada improcedente pela falta de comprovação do fato constitutivo do direito.

Aduz que a Autora não foi ludibriada na contratação, pois anuiu com todas as informações prestadas no instrumento contratual.

Defende a inexistência de qualquer defeito no negócio jurídico, devendo ser mantido o contrato nos termos pactuados, sob pena de violar o princípio da boa-fé contratual, pois a Autora busca apenas eximir-se das responsabilidades assumidas.

Sustenta a legalidade do saque mediante a utilização do cartão de crédito consignado, conforme prevê a Lei n. 10.820/2003, com alterações dadas pela Lei n. 13.172/2015. Ainda, argumenta que a margem para empréstimos consignados já havia sido consumida, tornando o cartão de crédito o único meio viável para conseguir os valores sacados.

Com relação ao dano moral, alega não estar caracterizada qualquer agressão aos direitos da personalidade do consumidor. Caso mantida a condenação, requer subsidiariamente a minoração do valor fixado, com base nos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

Alega, ainda, o descabimento da repetição do indébito, visto que os descontos decorreram de contratação legítima e, caso mantida a condenação, sejam os honorários arbitrados em percentual sobre a condenação e não sobre o valor da causa.

Requer, nesses termos, a reforma da sentença para julgar improcedentes os pedidos iniciais.

Das contrarrazões

Devidamente intimados, o Réu apresentou contrarrazões de Apelação no Evento 73 e a Autora no Evento 76.

Após, vieram os autos conclusos.

Este é o relatório.

VOTO

I - Da admissibilidade

O recurso preenche os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, razão pela qual merece ser conhecido.

II - Do julgamento conjunto dos recursos

a) Da preliminar de cerceamento de defesa

Em preliminar, o Apelante argui a ocorrência de cerceamento de defesa e nulidade da sentença. Isto porque o pedido de oitiva da parte autora não foi analisado pelo Juízo a quo, e, por conseguinte, a demanda foi julgada parcialmente procedente.

Com a máxima vênia, a preliminar não merece prosperar.

Analisando os autos, verifico que a prova documental é suficiente para solucionar a controvérsia.

Nesse passo, entendo desnecessária a produção de outras provas pela Instituição Financeira - audiência de instrução e julgamento, com a oitiva do depoimento pessoal da parte autora - de modo que a sentença não deve ser anulada, mantendo o regular prosseguimento da lide.

Por oportuno, cito da jurisprudência desta Corte de Justiça:

APELAÇÃO...

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