Acórdão Nº 0303058-63.2019.8.24.0054 do Quarta Câmara de Direito Civil, 23-09-2021

Número do processo0303058-63.2019.8.24.0054
Data23 Setembro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0303058-63.2019.8.24.0054/SC

RELATOR: Desembargador SELSO DE OLIVEIRA

APELANTE: CELESC DISTRIBUIÇÃO S.A. (RÉU) APELADO: ADEMIR VIGNOLLI (AUTOR)

RELATÓRIO

A bem dos princípios da celeridade e da economia processual adota-se o relatório elaborado na sentença, verbis (evento 37 - SENT1):

Trata-se de ação de reparação de danos materiais movida por ADEMIR VIGNOLLI, devidamente qualificado nos autos, em face de CELESC DISTRIBUIÇÃO S.A, também qualificada.

Aduziu o autor ter sofrido danos materiais em razão de falha no fornecimento de energia elétrica sob responsabilidade da ré, com a perda de qualidade em parte da sua safra de fumo.

Apontou que para realizar o processo de secagem de fumo é utilizado o sistema de estufa do tipo "ar forçado", sistema eletrônico de secagem amplamente utilizado pelos fumicultores na região, e que nos dias apontados na exordial, houve a interrupção do fornecimento de energia por horas, impedindo então o necessário e adequado processo de secagem.

Apresentou nos autos laudo técnico (evento 1) indicando que sofreu danos materiais no importe de R$ 23.850,00 de prejuízo.

A ré apresentou contestação, na qual impugnou o laudo apresentado pelo autor, ante sua elaboração unilateral.

Houve réplica.

Foi realizada a perícia judicial, tendo sido oportunizado a ambas partes a apresentação de quesitos e a manifestação nos autos.

O magistrado Rafael Goulart Sardá assim decidiu a lide:

Diante do exposto, resolvo o mérito (art. 487, I, do CPC) e JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido contido na inicial para condenar a ré a indenizar a parte autora no valor de R$18.011,25, a título de danos materiais, devendo este valor ser corrigido monetariamente desde a data do fato, pelo INPC, e acrescido de juros de mora de 1% ao mês a partir da citação válida nos autos.

Em vista da sucumbência reduzida da parte autora, condeno a ré ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios, estes que fixo em 10% (dez por cento) do valor da condenação (art. 85, § 2º do NCPC).

Transitado em julgado, pagas eventuais custas, arquivem-se os autos.

Publique-se, intimem-se.

Apelou a concessionária (evento 44 - APELAÇÃO1) reiterando as teses da contestação, sobretudo no que diz com a) a unilateralidade e parcialidade do laudo que acompanhou a exordial; b) a necessidade de realização de média ponderada entre as produções das safras anteriores e da safra reclamada, com fins a apurar se houve variação considerável na quantidade de fumo comercializada pelo autor; c) a possibilidade de instalação de gerador de energia na unidade consumidora, como meio de mitigar o próprio prejuízo; d) a ausência de demonstração do dano material alegado, dada a imprestabilidade do laudo que instruiu a petição inicial; e) o aumento da carga instalada na unidade do recorrido e a ausência de atualização dos dados cadastrais junto à sua base de dados, o que impossibilita a adequação da rede de abastecimento à demanda, e caracteriza culpa exclusiva do consumidor; f) o cumprimento de todas as metas estabelecidas pelo poder concedente e o adimplemento das obrigações previstas no contrato de concessão firmado perante a ANEEL, tendo-se por adequado o serviço prestado; g) a ausência de preenchimento os pressupostos à configuração da sua responsabilidade, por ter a interrupção do serviço decorrido de fenômenos da natureza, resultando configurado o caso fortuito ou a força maior; h) a inaplicabilidade do Código Consumerista e a impossibilidade de inversão do ônus da prova, vez que o autor não figura como consumidor final da energia ao utilizar a energia para curagem do fumo. Enfim, pretende que sobre eventual condenação recaiam juros de mora e correção monetária a partir da decisão, e não de cada laudo ou evento danoso. Defende, ainda, a existência de sucumbência recíproca.

Contrarrazões pelo autor no evento 51 - CONTRAZAP1, defendendo a manutenção da sentença.

VOTO

No Conflito de Competência nº 1002243-95.2016.8.24.0000, de relatoria do desembargador Newton Trisotto, julgado em 5/4/2017, assim ficou decidido:

Na vigência desse ato regimental compete às Câmaras de Direito Civil processar e julgar recurso originário de causa em que a pretensão consiste na reparação de danos, ainda que decorrentes de má prestação de serviço de energia elétrica.

Também se pronunciou a Câmara de Agravos Internos em Recursos Constitucionais e Conflitos de Competência, no Conflito de Competência nº 0005636-74.2018.8.24.0000 (relator o desembargador Moacyr de Moraes Lima Filho, j. 28/9/2018), assentando: "Destarte, tratando-se de recurso atinente à reparação civil por danos materiais em face de concessionária de serviço público, a competência é de uma das Câmaras de Direito Civil deste Tribunal".

Outrossim, dispõe o artigo 372 do atual Regimento Interno deste Tribunal de Justiça de Santa Catarina, em vigor desde 1º/2/2019: "Os processos distribuídos de acordo com as normas de competência anteriores à entrada em vigor deste regimento interno não serão redistribuídos, salvo disposição contrária ou nas hipóteses do art. 43 do Código de Processo Civil".

Não se fazendo presentes quaisquer das ressalvas previstas no artigo 43 do CPC, a competência está bem fixada.

1 Admissibilidade

A sentença foi prolatada e publicada sob a égide do Código de Processo Civil de 2015, à luz do qual o caso será apreciado, consoante o Enunciado Administrativo nº 3 do Superior Tribunal de Justiça.

O recurso é tempestivo e o comprovante de recolhimento do preparo encontra-se acostado no evento 49 - CUSTAS1.

Preenchidos os pressupostos de admissibilidade, o recurso deve ser conhecido.

2 Aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor

Argumenta a apelante não incidir o Código Consumerista à espécie, porque o uso de energia elétrica pelo autor se dá no processo de cura e secagem do fumo (incremento da atividade), de modo que não pode ser considerado consumidor final do serviço.

Dispõe o artigo 2º do CDC: "Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final".

A despeito dessa conceituação legal, o STJ admite a aplicação da chamada Teoria Finalista Temperada e/ou Mitigada, autorizando a incidência dos preceitos consumeristas "nas hipóteses em que a parte (pessoa física ou jurídica), embora não seja propriamente a destinatária final do produto ou do serviço, apresenta-se em situação de vulnerabilidade ou submetida a prática abusiva" (AgRg no AREsp 415.244/SC, rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, j. 7/5/2015).

In casu, o autor cultiva fumo em pequena propriedade rural, inclusive tendo declarado não reunir condições de custear as despesas sem prejuízo do próprio sustento e de sua família, pelo que foi agraciado com o benefício da gratuidade.

Assim, de um lado se tem o apelado...

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