Acórdão Nº 0303067-09.2017.8.24.0082 do Sexta Câmara de Direito Civil, 09-08-2022

Número do processo0303067-09.2017.8.24.0082
Data09 Agosto 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSexta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0303067-09.2017.8.24.0082/SC

RELATOR: Desembargador ANDRÉ LUIZ DACOL

APELANTE: ANDRE NICACIO ADVOGADO: WILSON DA SILVA PEREIRA (OAB SC021519) APELADO: MARCIO LUZ SCHAEFER ADVOGADO: JOAO JOSE RAMOS SCHAEFER (OAB SC016700) ADVOGADO: NELSON LUIZ SCHAEFER PICANCO (OAB SC015716)

RELATÓRIO

Em atenção aos princípios da celeridade e economia processuais, adota-se o relatório da sentença, transcrito na íntegra, por refletir com fidelidade o trâmite processual na origem:

Trata-se de uma ação indenizatória com pedido de tutelas de urgência proposta por MÁRCIO LUZ SCHAEFER em face de ANDRÉ NICÁCIO. O Autor é sócio fundador da empresa Estaleiro Schaefer Yachts, e contratou o Réu em 2007 para trabalhar na empresa, onde trabalhou até o final de agosto de 2016. Em dezembro de 2016, o Réu moveu uma ação trabalhista contra a empresa (fls. 9/20), na qual relata ter sido alvo de brincadeiras relacionadas a sua intimidade por parte de seus colegas atribuindo tal ocorrência a escutas ou grampos que teriam sido instalados em seus telefones pela empresa. O Autor afirma que trata-se de um delírio do Réu, pois a empresa não tem nenhum interesse em espiar a vida privada dos empregados, a par de que uma interceptação telefônica só seria possível mediante autorização judicial. Avisado por colegas, o Autor tomou conhecimento de que o Réu estaria fazendo publicações com ofensas e ameaças contra a sua pessoa no facebook, proferindo vários xingamentos, e chamando o autor de assasino; sonegador de impostos; afirmando que o autor contratou policial para investigá-lo e matá-lo; sugere que o Autor teria envolvimento com drogas; acusa o Autor de ter sabotado um barco para prejudicá-lo; ofende o pai do Autor e mandou mensagem para a esposa do Autor com ameaças (fls. 21/36). Alega o Autor, que o Réu está sofrendo de algum tipo de distúrbio psicológico. Requer a condenação do Réu ao pagamento de indenização por danos morais a ser arbitrado por esse MM. Juízo. Com a inicial, juntou documentos de fls. 9/36.

Deferida a tutela de urgência de medida cautelar de fls. 41/42.

Designada audiência de conciliação, restou inexitosa. (fl. 50)

Devidamente citado, o Réu apresentou resposta em forma de contestação de fls. 52/64, alegando que a rescisão sem justa causa do contrato de trabalho agravou o seu estado de saúde. Como é de conhecimento deste juízo, o requerido foi recolhido junto ao sistema prisional em 05/03/2018, através de prisão em flagrante (fls. 65/86) posteriormente convertida em prisão preventiva, pois adentrou na empresa do requerido, mantendo seu filho como refém. Foi realizado laudo médico, no qual foi constatado doença psiquiátrica crônica - transtorno delirante, com sintomas esquizofrênicos (fls. 188/192). Portanto, quando das suas publicações no facebook, o mesmo não detinha noção de seus atos, dada a doença crônica e sem cura, motivo pelo qual deve ser considerado inimputável. Coma resposta, juntou documentos de fls. 65/220.

Houve réplica de fls. 224/227.

Vieram aos autos conclusos.

Sobreveio sentença (evento 42, SENT62, origem), a qual julgou a lide nos seguintes termos:

ANTE O EXPOSTO, a teor do art. 487, I do CPC, ACOLHO os pedidos formulados por Márcio Luz Schaefer, e, em consequência, CONDENO o requerido ao pagamento de R$ 10.000,00 (dez mil reais) referentes a indenização a titulo de dano moral. O valor deve ser corrigido pela correção monetária do INPC desde o arbitramento e juros de mora de 1% do evento danoso.

Conforme o art. 85, §2° do CPC, condeno o réu ao pagamento das custas e honorários advocatícios, estes no valor de 10% sobre o valor da condenação. Suspensa a exigibilidade ao réu, a teor do art. 98, § 3º do CPC.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Observadas as formalidades legais, arquiva-se.

Opostos aclaratórios pela parte ré (evento 47, EMBDECL66, origem), os quais foram rejeitados ao evento 50, DEC69 da origem.

Inconformada, a parte ré interpôs recurso de apelação (evento 53, APELAÇÃO72, origem). Em suas razões, asseverou a ausência dos pressupostos necessários a sua responsabilização, diante da presença de doença mental incapacitante e inimputabilidade. Caso mantida a condição de semi-imputável, arguiu a ausência de abalo anímico em decorrências das publicações em rede social e, sucessivamente, a necessidade de redução da verba indenizatória arbitrada na origem.

Ao final, pugnou pela reforma da sentença e procedência do recurso interposto, a fim de julgar integralmente improcedente a pretensão autoral ou, sucessivamente, minorar a verba indenizatória para patamar condizente com as peculiaridades do caso concreto, sugerindo o importe de R$ 3.000,00 (três mil reais).

Contrarrazões ao evento 59, PET77 da origem.

Vieram os autos conclusos.

VOTO

1. Compulsando os autos, observo a presença de todos os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade (intrínsecos: cabimento, interesse recursal, legitimidade recursal, inexistência de fato extintivo do direito de recorrer; e extrínsecos: regularidade formal, tempestividade), razão por que conheço do recurso.

2. Inicialmente, a parte apelante aponta a ausência dos pressupostos ensejadores do dever de indenizar, diante da excludente de responsabilidade oriunda do reconhecimento da inimputabilidade decorrente de doença mental incapacitante (transtorno delirante) no âmbito do juízo criminal (autos n. 0003327-11.2018.8.24.0023).

A fim de lograr êxito em tal pleito, sustenta que o laudo médico apresentado nos autos (evento 17, INF34, origem) não teria o condão de afastar a inimputabilidade admitida na esfera penal, assim como não conduziria ao enquadramento do apelante no conceito sui generis previsto pelo art. 4º do Código Civil.

Por fim, julga que "reconhecida a inimputabilidade em sentença criminal transitada em julgado, justo e necessário seja também afastada a condenação cível em danos morais, que somente agravará os já severos problemas de saúde do Apelante, o qual não agiu conscientemente com intenção de prejudicar o Apelado".

Sem razão.

Infere-se que o Código Civil é suficientemente claro ao esclarecer a diferenciação entre os absolutamente incapazes, quais sejam, os menores de dezesseis anos (art. 3º), e os considerados relativamente incapazes, com destaque para "aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua vontade", nos termos do art. 4º, III, da norma civilista.

Em complemento, retira-se do artigo 928 da norma supracitada que "O incapaz responde pelos prejuízos que causar, se as pessoas por ele responsáveis não tiverem obrigação de fazê-lo ou não dispuserem de meios suficientes".

Logo, em se tratando de incapaz, não há qualquer normativa destinada a afastar eventual dever reparatório por prejuízos causados a outrem, salvo se verificada no caso concreto alguma excludente da...

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