Acórdão Nº 0303223-14.2016.8.24.0023 do Terceira Câmara de Direito Público, 22-02-2022

Número do processo0303223-14.2016.8.24.0023
Data22 Fevereiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0303223-14.2016.8.24.0023/SC

RELATOR: Desembargador SANDRO JOSE NEIS

APELANTE: INOVALE EMPREENDIMENTOS LTDA APELADO: INSTITUTO DO MEIO AMBIENTE DE SANTA CATARINA APELADO: MUNICÍPIO DE ZORTEA

RELATÓRIO

Cuida-se de ação ordinária para reconhecimento do direito de edificar, declaração de nulidade de auto de infração e termo de embargo c/c pedido de antecipação de tutela em caráter liminar ajuizada por Innovale Empreendimentos Ltda. em face da Fundação do Meio Ambiente - FATMA e do Município de Zortéa, objetivando a procedência do pleito para reconhecer o direito de edificar pela autora com respeito ao projeto apresentado e validado pelo Alvará 06/2015, com a consequente declaração de nulidade do Auto de Infração nº 4074-D e Termo de Embargo 2439-D da ré Fundação do Meio Ambiente - FATMA.

O pedido liminar foi indeferido (Evento 17).

A Fundação do Meio Ambiente - FATMA apresentou contestação (Evento 30).

Houve réplica (Evento 34).

O Ministério Público manifestou-se pela improcedência do pedido (Evento 58).

O Município de Zortea apresentou contestação (Evento 77).

Houve réplica (Evento 82).

Na sequência, sobreveio a sentença que julgou improcedente o pleito exordial, "pois não foram reconhecidas irregularidades cometidas pelos entes públicos no tocante à legislação ambiental no contorno estadual e municipal, extinguindo o processo, com resolução do mérito, na forma do art. 487, I, do Código de Processo Civil, consolidando a decisão de pp. 154-157 que indeferiu a liminar" (Evento 91).

Inconformada, a empresa Innovale Empreendimentos Ltda. interpôs o presente recurso de apelação. Sustenta, preliminarmente, a nulidade da sentença, por cerceamento de defesa, sob o argumento de que ao proferir a sentença, o magistrado deixou de designar e realizar a audiência de instrução e julgamento para oitiva de testemunhas, conforme requerido.

Aduz a apelante que o imóvel em comento está inserido em área urbana consolidada, o que permite a aplicabilidade da Lei de Parcelamento do Solo Urbano, motivo pelo qual entende que a decisão da apelada, em exigir o recuo de 30 (trinta) metros estabelecido pelo Código Florestal, afrontou o princípio da razoabilidade e proporcionalidade.

Houve contrarrazões (Evento 11).

Ato contínuo, os autos ascenderam a esta Corte de Justiça e foram remetidos à Procuradoria-Geral de Justiça, a qual, em parecer da lavra do Procurador de Justiça Murilo Casemiro Mattos, manifestou-se pelo conhecimento e parcial provimento do recurso de apelação, para que seja aplicada a Lei de Parcelamento do Solo Urbano e a Lei n. 569/2017, ante a comprovação de que o imóvel da apelante encontra-se em área urbana consolidada.

É o relatório.

VOTO

1. Da admissibilidade

Presentes os pressupostos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, conheço dos recursos.

2. Do cerceamento de defesa

No que se refere à preliminar arguida quanto a suposta ocorrência de cerceamento de defesa, em razão da não realização de audiência de instrução e julgamento, registre-se que não deve prosperar, porquanto, como cediço, dentro do princípio da persuasão racional adotada pelos artigos 370 e 371 do Código de Processo Civil, cabe ao Magistrado, como presidente da instrução processual, a apreciação da conveniência e/ou necessidade, ou não, de realização de provas no feito, inexistindo, pois, obrigação de sempre ordenar a produção daquelas postuladas pela parte, especialmente quando claramente inútil ao deslinde da questão, como é o caso dos autos, circunstância que lhe transfere o poder discricionário de dispensar as demais provas, por desnecessárias ou, ainda, quando puderem ser substituídas por outros elementos probatórios (art. 464 do Código de Processo Civil).

Sobre o assunto, aliás, leciona Moacyr Amaral Santos:

"Ao juiz é concedido o poder de formar livremente a sua convicção quanto à verdade emergente dos fatos constantes dos autos. Quer dizer que o juiz apreciará e avaliará a prova dos fatos e formará a sua convicção livremente quanto à verdade dos mesmos. A convicção, que deverá ser motivada, terá que se assentar na prova dos fatos constantes dos autos e não poderá desprezar as regras legais, porventura existentes, e as máximas de experiência" (Primeiras Linhas de Direito Processual Civil, vol. 2, Editora Saraiva, 1997, p. 78).

Neste sentido, "o STJ tem pacificado o entendimento no sentido de que não há 'falar em cerceamento de defesa quando o conjunto probatório já existente nos autos se faz suficiente para o convencimento do magistrado.' (REsp 1641349/RJ, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, DJe 15/03/2017)" (STJ, AgInt no MS 19.977/DF, Relator: Min. Sérgio Kukina, 1ª Seção, j. 13/12/2017).

Atente-se que, no caso concreto, é plenamente possível se inferir dos autos a existência de elementos suficientes à formação do convencimento do Magistrado, especialmente por se tratar apenas de matéria de direito, em que os fatos estão devidamente comprovados pela prova documental amealhada ao feito.

Logo, sem razão no ponto.

3. Do mérito

3.1 Dos fatos

A apelante alega ser desarrazoada a exigência do Órgão Ambiental, consistente no respeito ao recuo de 30 (trinta) metros da margem de corpo hídrico existente nas proximidades do imóvel situado no lote número 01 (um), da quadra "C", do Loteamento São João, de Duas Pontes, no Município de Zortéa, para concessão de licença e/ou alvará.

O autor afirma, ainda, que quando adquiriu o terreno promoveu consulta de viabilidade técnica, obteve alvará de construção e liberação pelo CREA, e iniciou uma edificação. Relatou, outrossim, que sofreu sanção de multa do órgão ambiental, sob o argumento de que teria edificado em área de preservação permanente, criando obstáculo à regeneração da vegetação nativa, e por isso também o embargo da obra.

Disse que vem sofrendo prejuízos com a paralisação da obra e que a construção não avança sobre área de preservação permanente, pois "está em lote urbano constante de loteamento devidamente aprovado há mais de 3 décadas", nos termos da Lei Federal 6.766/79.

Do que veio aos autos, especialmente do próprio Plano de Recuperação da área, mencionado pelo autor, dá conta de que, ao menos em parte da gleba, "existe a mata nativa em APP e o próprio curso d'água" (Evento 1 - Informação 23).

Da lavratura do auto de infração, por seu turno, observa-se que se deu pelo uso indevido da área de preservação permanente e por dificultar a regeneração natural de florestas ou de outras formas de vegetação nativa, tendo sido embargada a área para evitar a continuidade da infração.

O Relatório de Fiscalização n. 052/2015/GEFIS (Evento 30 - Informação 44), especifica que se constatou no local da infração a implantação de canteiro de obras e que o terreno faz divisa com o Rio dos Porcos, devendo guardar recuo de trinta (30) metros de área de preservação permanente (APP).

Desse modo, a controvérsia cinge-se em averiguar qual distanciamento mínimo dos corpos hídricos deve ser observado para edificações localizadas em imóveis de área urbana...

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