Acórdão Nº 0303279-03.2018.8.24.0015 do Quinta Câmara de Direito Civil, 14-12-2021

Número do processo0303279-03.2018.8.24.0015
Data14 Dezembro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0303279-03.2018.8.24.0015/SC

RELATOR: Desembargador LUIZ CÉZAR MEDEIROS

APELANTE: BANCO BRADESCO S.A. (RÉU) ADVOGADO: MARTA SALETE SCOLARI PILLON CIPRIANI (OAB SC015853) APELADO: NERI KRAILING (AUTOR) ADVOGADO: JONATHAN WERKA (OAB SC020585) APELADO: AUREA DE LOURDES KRAILING (AUTOR) ADVOGADO: JONATHAN WERKA (OAB SC020585)

RELATÓRIO

Por refletir fielmente o contido no presente feito, adoto o relatório da r. sentença (evento 82, SENT1):

"1. Nery Krailing e Aurea de Lourdes Krailing ingressaram com ação de usucapião. Alegaram que exercem a posse mansa, pacífica e ininterrupta, por mais de 20 anos, do imóvel urbano com área total de 400 m² (quatrocentos metros quadrados), situado na Rua João Tomaschitz, n. 366, bairro Tricolin, município de Canoinhas/SC. Diante disso, requereram a procedência do pedido, visando a aquisição do domínio e a transcrição do título no Registro de Imóveis competente. Com a inicial, juntaram procuração e documentos.

Citados nos documentos 130, 134 e 136 os confrontantes do imóvel e seus cônjuges. Os réus incertos e eventuais interessados foram regularmente citados por edital (documentos 128 e 154). Por fim, foram intimadas as Fazendas Públicas Federal, Estadual e Municipal, as quais não manifestaram interesse na lide.

No evento 21, o Banco Bradesco S.A. apresentou contestação. No mérito, alegou que conforme o instrumento particular de venda e compra de bem imóvel com pacto adjeto de alienação fiduciária em garantia e outras avenças, firmado em 15/09/1988 entre o banco réu e Daniel de Brito e sua esposa, o imóvel objeto da presente demanda, conforme matrícula n. 3.853 do Cartório de Registro de Imóveis de Canoinhas/SC, tornou-se garantia de hipoteca. Disse que a formalização do pacto celebrado entre as partes, bem como o registro da hipoteca em favor do banco réu, devidamente registrada e inclusa na matrícula do imóvel, torna o bem oponível erga omnes, razão pela qual a aludida propriedade torna-se indiscutível. Ao final, pugnou pela improcedência do pedido formulado.

O Ministério Público apresentou manifestação sem adentrar o mérito (evento 76)".

Acresço que a Togada a quo julgou procedente o pedido, por meio da sentença cujo dispositivo segue transcrito:

"3. DIANTE DO EXPOSTO, JULGO PROCEDENTE o pedido formulado na inicial, com fundamento no art. 487, I, do CPC, para declarar, com amparo no art. 1.241 do Código Civil, a propriedade de Nery Krailing e Aurea de Lourdes Krailing sobre o imóvel urbano descrito na inicial, conforme mapa e memorial descritivo juntados aos autos (docs. 33 e 35, evento 14).

Condeno a parte ré ao pagamento das custas processuais e de honorários advocatícios, os quais fixo em 15% sobre o valor atualizado da causa, na forma do art. 85, § 2º do CPC.

P.R.I.

Após o trânsito em julgado, expeça-se mandado para inscrição no Cartório de Registro de Imóveis da Comarca, na forma do art. 226 da Lei 6.015/1973.

Em seguida, arquivem-se os autos".

Irresignado, BANCO BRADESCO S.A. interpôs apelação, na qual alegou, em síntese, que: a) nos idos de setembro de 1988 o imóvel objeto dos autos foi dado como garantia hipotecária ao "Instrumento Particular de Venda e Compra de Bem Imóvel com Pacto Adjeto de Alienação Fiduciária em Garantia e outras avenças, firmado [...] entre o Banco Réu e o Sr. Daniel de Brito e sua esposa"; b) houve formalização do pacto e registro da hipoteca na matrícula do imóvel o que "torna o bem oponível erga omnes, razão pela qual a aludida propriedade torna-se indiscutível; c) buscou recuperar o crédito concedido na transação imobiliária, tendo, inclusive, arrematado o bem nos idos de 2000, quando ainda estavam pendentes ações judiciais discutindo aquele negócio jurídico; e, por fim, d) a posse do imóvel transmitida aos autores/apelados, à revelia do banco credor, constituiu ato de clandestinidade incapaz de gerar o cumprimento dos requisitos para a procedência do pedido de usucapião (evento 90, APELAÇÃO1).

Intimados (eventos 95 e 96), os apelados apresentaram contrarrazões, alvitrando a impossibilidade de conhecimento do reclamo por deserção e ofensa ao princípio da dialeticidade. Requereram a condenação do banco recorrente ao pagamento de multa por litigância de má-fé, por interpor recurso manifestamente protelatório e, em caso de análise do mérito recursal, que seja ele desprovido, mantendo-se incólume a sentença guerreada (evento 99, CONTRAZAP1).

Na sequência, os autos ascenderam a esta Corte para julgamento.

Lavrou parecer pela Douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Basílio Elias De Caro, que deixou de opinar acerca do mérito do reclamo (evento 20, PROMOÇÃO1).

VOTO

1 Questões preliminares

1.1 Os recorridos aventaram a impossibilidade de conhecimento do reclamo por suposta deserção.

Sem razão.

A guia para recolhimento do preparo recursal foi gerada automaticamente quando do protocolo da apelação (evento 90, APELAÇÃO1 e evento 91, GUIAS DE CUSTAS1), no dia 4.3.2021, em conformidade com o procedimento admitido pelo sistema eproc.

Já o registro de pagamento, também emitido de forma automática pelo sistema, dá conta de que houve a quitação do preparo no dia 5.3.2021 (evento 97, CUSTAS1), antes mesmo do vencimento do boleto, este aprazado para o dia 14.3.2021 (evento 93, OUT1).

Dessa forma, não há falar em deserção no caso dos autos, haja vista a clara demonstração de quitação do preparo recursal.

1.2 A parte recorrida sustenta, ainda, que falta dialeticidade ao recurso, porquanto nessa peça processual apenas reproduziram-se as argumentações da contestação.

Verifica-se, entretanto, que o apelo impugna os argumentos expostos no decisório recorrido (embora não de todo adequadamente, como se verá), observando-se que a repetição da tese que fundamentou a defesa não implica ofensa à referida premissa, desde que consiga demonstrar o interesse recursal.

Este é o entendimento da Corte Superior:

"AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL. APELAÇÃO. REQUISITOS. REPETIÇÃO DOS ARGUMENTOS DA CONTESTAÇÃO. APTIDÃO PARA REBATER OS FUNDAMENTOS DA DECISÃO ATACADA. PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE OBSERVADO.

1. Na linha dos precedentes desta Corte, a reprodução, na apelação, dos argumentos já lançados na petição inicial ou na contestação não é, em si, obstáculo bastante para negar conhecimento ao recurso.

2. No caso dos autos, o que se percebe é que, o Recorrente fundamentou sua irresignação e manifestou de forma clara seu interesse na reforma da sentença, rebatendo os fundamentos do julgamento prolatado pela instância de origem, não prejudicando Princípio da Dialeticidade Recursal.

3. A Agravante não trouxe nenhum argumento capaz de modificar a conclusão do julgado, a qual se mantém por seus próprios fundamentos.

4. Agravo Regimental improvido" (AgRg no AREsp n. 175.517/MS, Min. Sidnei Beneti).

Assim, preenchidos os requisitos explicitados no art. 1.010 do Código de Processo Civil, a preliminar levantada em contrarrazões deve ser afastada.

1.3 Presentes, pois, os pressupostos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade recursal, o reclamo merece ser conhecido, passando-se, desta forma, à respectiva análise.

2 Trata-se de recurso por intermédio do qual se discute o acerto da sentença que julgou procedente a pretensão autoral, declarando a aquisição da propriedade do imóvel descrito na inicial em favor de NERI KRAILING e AUREA DE LOURDES KRAILING.

No caso em apreço, conforme se dessume do caderno processual, está-se diante de usucapião extraordinária, decorrente de posse qualificada, em razão do incontroverso estabelecimento da moradia dos autores no imóvel usucapiendo.

Acerca dessa modalidade, preconiza o Código Civil:

"Art. 1.238. Aquele que, por quinze anos, sem interrupção, nem oposição, possuir como seu um imóvel, adquire-lhe a propriedade, independentemente de título e boa-fé; podendo requerer ao...

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