Acórdão Nº 0303328-24.2016.8.24.0012 do Quinta Câmara de Direito Público, 06-07-2021

Número do processo0303328-24.2016.8.24.0012
Data06 Julho 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 0303328-24.2016.8.24.0012/SC



RELATOR: Desembargador VILSON FONTANA


APELANTE: ESTADO DE SANTA CATARINA APELANTE: ADAMI SA MADEIRAS RÉU: OS MESMOS


RELATÓRIO


Trata-se de apelações interpostas pelo Estado de Santa Catarina e por Adami S.A. Madeiras contra a sentença pela qual o Juízo da 2ª Vara Cível da Comarca de Caçador julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados pela empresa em ação tributária que visa a nulidade das Notificações Fiscais n. 136030057652 e 136030054874, somando o valor total de R$ 542.864,92.
O Juízo de origem reconheceu a decadência dos débitos de ICMS lançados com referência anterior a 19 de abril de 2008, mas negou procedência ao pedido quanto à causa de fundo - o direito de creditamento do imposto destacado sobre bens de uso e consumo utlizados no processo industrial e não incorporados à mercadoria.
O Estado de Santa Catarina defende que não houve decadência, pois na hipótese de creditamento indevido de imposto o instituto é regido pelo art. 173, inciso I, do CTN.
A empresa autora, por outro lado, argumenta em preliminar que houve cerceamento de defesa, visto que era necessária perícia para esclarecer a natureza dos materiais e seu enquadramento como insumos de produção. Diz que houve também cerceamento de defesa no próprio lançamento, pois o "Anexo "J que compõe notificações estaria incompleto e obscuro.
No mais, sustenta que houve ofensa à coisa julgada administrativa, tendo em vista que o Fisco Estadual anteriormente autorizou o aproveitamento de créditos de ICMS decorrentes das mesmas mercadorias.
Quanto à questão de fundo, sustenta que os requisitos definidos no IRDR n. 0045417-78.2011.8.24.0023/50000 para a apropriação do crédito são extralegais e ofendem o princípio da não-cumulatividade, e que utiliza os materiais em questão (telas, feltros e instrumentos de corte) no processo produtivo, de modo que há direito ao creditamento.
Diz ainda que, diante daquele entendimento é necessário instaurar incidente de inconstitucionalidade a fim de declará-la expressamente quanto ao art. 20, § 3º, inciso I, da Lei Complementar n. 87/96.
Suscita também a confiscatoriedade da multa em questão, equivalente a 75% do valor do tributo, porque se trata apenas de apropriação de créditos em tese indevidos e não sonegação fiscal propriamente dita.
Por fim, questiona a distribuição dos honorários de sucumbência, defendendo ainda que seria o caso de adotar apreciação equitativa, pois não há proveito econômico mensurável.
Intimado, o Estado não apresentou contrarrazões (Evento 59).
Não houve contrarrazões pela empresa autora.
Este é o relatório

VOTO


Esta Câmara de Direito Público teve a oportunidade de tratar da matéria em questão envolvendo inclusive a empresa autora desta ação e em recursos de contornos idênticos vindos de ambas as partes, nas apelações n. 0006806-89.2011.8.24.0012 e 0300107-62.2018.8.24.0012, as duas de relatoria do Ilutre Des. Hélio do Valle Pereira.
No último precedente referenciado, o acórdão traz a seguinte ementa:
TRIBUTÁRIO - ICMS - CREDITAMENTO - BENS DE USO E CONSUMO OU PRODUTOS INTERMEDIÁRIOS - DIFERENCIAÇÃO IRRELEVANTE - ESCRITURAÇÃO DO IMPOSTO PAGO NA AQUISIÇÃO DOS MATERIAIS INDEVIDA - DECADÊNCIA - TRIBUTO SUJEITO A LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO.1. A jurisprudência desde Tribunal de Justiça se consolidou no sentido de exigir (para fins de creditamento) a incorporação dos produtos intermediários no bem manufaturado. Não basta a relação com a finalidade empresarial, mas os tais insumos devem compor (no sentido literal da palavra) a mercadoria. Foi o definido no IRDR 0045417-78.2011.8.24.0023/50000, julgado pelo Grupo de Câmaras de Direito Público.Malgrado haja controvérsia sobre o enquadramento dos materiais adquiridos, a diferenciação, na espécie, é irrelevante. Há limitador temporal do art. 33, I, da Lei Kandir, quanto aos bens de uso e consumo. Do mesmo modo, os insumos indicados pela acionante não atendem aos pressupostos firmados no incidente vinculante.2. A decadência dos tributos sujeitos a lançamento por homologação é regulada simultaneamente pelos arts. 150, § 4°, e 173 do CTN. As regras não se excluem. Aplicam-se a duas situações distintas, respectivamente: feito pagamento em valor inferior ao merecido, os cinco anos para lançar fluem do fato gerador (art. 150, § 4°); não antecipado nenhum pagamento, vale a regra comum, correndo os mesmos cinco anos do primeiro dia do exercício financeiro seguinte (art. 173, inc. I).O pensamento de mantém (a incidência do art. 150, § 4º) mesmo quando a diferença decorra de creditamento tido posteriormente por irregular pelo Fisco (na linha do pensamento atual do STJ).Será aplicável, de todo modo, sempre o art. 173, inc. I (regime mais enérgico) quando houver má-fé.3. Deu-se glossa sobre o creditamento de ICMS na aquisição de mercadorias que não permitiam tal faculdade. A autora destaca que, mesmo com a escrituração, houve o pagamento do imposto, ainda que eventualmente considerado a menor; linha não contestada diretamente pelo Fisco. Aplica-se a modalidade especial (art. 150, § 4°), o que conduz ai reconhecimento da decadência sobre parte do interregno criticado.4. Recursos do Estado desprovido e do particular parcialmente provido para ajustar a verba honorária, que deverá corresponder à porção do insucesso de cada parte. (Apelação Cível n. 0300107-62.2018.8.24.0012, de Caçador, rel. Hélio do Valle Pereira, Quinta Câmara de Direito Público, 04-08-2020).
Pede-se vênia, então, para transcrever os precisos fundamentos do voto, que adota-se aqui como razões de decidir:
1. A demandante indica a nulidade da sentença.
A tese é de que houve cerceamento de defesa em vista da negativa de realização da prova pericial por meio da qual se demonstraria que "os materiais notificados são necessários ao processo produtivo da mesma".
A empresa defende que os bens dos quais busca se creditar não podem ser classificados como de uso e consumo, mas insumos relevantes ao seu processo produtivo. Nessa condição, o direito ao creditamento não exige que esses componentes integrem o produto final; a mera pertinência direta com sua atividade fim já garante a escrituração.
Essa discussão, todavia, não exige um incursionamento fático. Saber se incide a condicionante é uma controvérsia preponderantemente de direito - isso é, ainda que a tipologia lhe fosse favorável, remanesceria avaliar o tal pressuposto legal (parte integrante da mercadoria produzida).
Em outros termos, o laudo pericial era mesmo dispensável porque apenas possibilitaria uma análise parcial da questão e que não resolve integralmente o problema de fundo. Quer dizer, com o estudo se poderia até comprovar que os componentes eram empregados no processo de manufatura, mas ainda assim faltaria demonstrar a integração física ao produto final.
2. A empresa atua na transformação de madeira desde o reflorestamento até produto final (celulose, embalagens, papel, papelão e pasta de madeira) e diz que o tributo relativo aos itens de manutenção e peças de reposição glossados são essenciais à atividade.
Deveras, a classificação do fisco quanto aos materiais foi equivocada: não se trata de bens destinados ao uso e consumo, mas insumos, atrelados ao processo produtivo. Nesse caso, a estreita afinidade com a cadeia produtiva, sem os quais a continuidade da atividade fica comprometida, já viabiliza o creditamento.
Antes, porém, um esclarecimento: tenho a discussão sobre o enquadramento das mercadorias como ociosa. Ao fim de tudo, como se verá, ao particular não é permitida a escrituração do crédito. Ainda que por razões distintas, a faculdade que o contribuinte diz possuir não subsiste.
A Fazenda Pública insiste que os bens adquiridos são de uso e consumo por não estarem diretamente relacionados com o objeto da produção e por isso o aproveitamento do ICMS encontra-se obstando pelo limitador temporal a que se refere o art. 33, I, da Lei Kandir (referendado pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, v. g. REsp 1.281.952, rel. Min. Og Fernandes): "somente darão direito de crédito as mercadorias destinadas ao uso ou consumo do estabelecimento nele entradas a partir de 1o de janeiro de 2020".
Pelo que foi dito - o Anexo J que listava os itens glossados não veio aos autos - a pertinência com a atividade até poderia ser empolgada - e qui falo muito hipoteticamente.
Há, contudo, um obstáculo preponderante.
Ainda que fossem considerados de fato produtos intermediários, a atual jurisprudência deste Tribunal de Justiça se consolidou no sentido de exigir para fins de creditamento a necessidade de incorporação dos materiais no produto final. Em outros termos, não basta a relação com a finalidade empresarial, mas os tais insumos devem ser consumidos inteiramente no processo e compor (no sentido literal da palavra) a mercadoria manufaturada.
Isso é que restou definido no IRDR 0045417-78.2011.8.24.0023/5000, julgado pelo Grupo de Câmaras de Direito Público, ocasião em que se firmou a seguinte tese: "O creditamento do ICMS incidente sobre a aquisição de produtos intermediários empregados no processo produtivo, na vigência da Lei Complementar n. 87/96, depende da comprovação de seu consumo imediato e integral, além de sua integração física ao produto".
(A matéria, é verdade, tinha tratamento oscilante nesta Corte, tanto que em demanda na qual se abordou questão muito próxima à presente a deliberação seguiu por caminhos distintos. É a AC 0007841-21.2010.8.24.0012, interposta pela recorrente e que versava sobre outras infrações objeto da mesma notificação fiscal aqui contestada. Não há, todavia, como se adotar o mesmo entendimento na espécie, já que a tese firmada no incidente é vinculante.)
Eis o que consta no voto do relator, eminente Desembargador Luiz Fernando Boller, que liderou a posição prevalente - o Tema 10 deste Tribunal de Justiça:
Passando à análise do objeto específico deste...

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