Acórdão Nº 0303342-47.2017.8.24.0020 do Quarta Turma de Recursos - Criciúma, 25-09-2018

Número do processo0303342-47.2017.8.24.0020
Data25 Setembro 2018
Tribunal de OrigemCriciúma
Classe processualRecurso Inominado
Tipo de documentoAcórdão



ESTADO DE SANTA CATARINA

PODER JUDICIÁRIO

QUARTA TURMA DE RECURSOS


Recurso Inominado n. 0303342-47.2017.8.24.0020, de Criciúma

Relator: Juiz Edir Josias Silveira Beck

AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C RESSARCIMENTO DE VALORES. MUNICÍPIO DE CRICIÚMA. BENEFÍCIO DENOMINADO BOLSA ATLETA. LEI MUNICIPAL N. 3.448/97 SUPOSTAMENTE REVOGADA PELA LEI COMPLEMENTAR MUNICIPAL N. 96/2013. DIREITO AO RECEBIMENTO DO BENEFÍCIO PELO PERÍODO INICIALMENTE PREVISTO EM LEI. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS. RECURSOS CONHECIDOS E PROVIDO APENAS O DA PARTE AUTORA.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Inominado n. 0303342-47.2017.8.24.0020, da comarca de Criciúma, em que são recorrentes/recorridos Município de Criciúma e Jonathan Izabel.

ACORDAM, em Quarta Turma de Recursos, à unanimidade, conhecer dos recursos e dar provimento ao interposto pela parte autora, negando aquele interposto pelo Município.

VOTO

No respeitante à reprisada alegação de inconstitucionalidade da Lei Municipal nº 3.448/97 e revogação desta norma pela Lei Complementar nº 96/2013, de se transcrever, como razões de fundamento, parte da sentença do ilustrado Dr. Pedro Aujor Furtado Júnior:

"(...) Definido que a parte autora faz jus ao bolsa-atleta, repito, nos termos da então vigente Lei Municipal n. 3.448/97, cumpre analisar os demais tópicos da defesa do município (afastando-os naturalmente) apenas para que não se alegue omissão.

II - Inconstitucionalidade da LM n. 3.448/97, por vício de iniciativa:

O argumento do Município é de que a alínea "d", do inciso II, do art. 31, da Lei Orgânica do Município, determina que a "concessão de subvenções e auxílios" é de "iniciativa privativa do Prefeito", enquanto a LM n. 3.448/97 foi formulada por um determinado vereador na época de sua edição, o que perfectibilizaria a inconstitucionalidade da Lei criadora do benefício.

A Lei n. 3.448/97 "concede bolsa de estudo ou ajuda de custo a atletas do Município que se destacarem em competições Estaduais ou Nacionais e dá outras providências" (grifo meu).

Ora, sabendo-se a lei "não contêm palavras inúteis", e que o direito é uma ciência e como tal tem vocábulos técnicos que não comportam a interpretação vulgar das palavras, em momento algum referida norma diz respeito a subvenção ou auxílio, cuja conceituação técnico-científica é diametralmente oposta à pretendida pelo ora réu, que de forma equivocada dá ao benefício pretendido pela parte autora uma extensão interpretativa que o mesmo não possui.

Quando o Direito Administrativo refere a subvenções cuida especificamente das subvenções sociais, que segundo o douto CELSO ANTONIO BANDEIRA DE MELLO, "são transferências de recursos destinadas a acobertar despesas de custeio vale dizer, de manutenção efetuadas em prol de serviços essenciais de assistência social, médica e educacional prestados por entidades sem fins lucrativos" (CURSO DE DIREITO ADMINISTRATIVO, Malheiros, 33ª edição, p. 845).

Faz sentido a Lei Orgânica estabelecer que são de iniciativa privativa do Executivo as leis que criam subvenções sociais, na medida em que destina do erário despesas para manutenção de uma entidade sem fins lucrativos, por toda a complexidade que envolve a sua criação desde o planejamento e a consecução de projetos.

Nada pode ser mais distante da subvenção social (sob o prisma dogmático) que a singela bolsa de estudo ou ajuda de custo a atletas amadores.

Mas não é só.

O Município ainda pretende que a bolsa de estudo (ou ajuda de custo) constitui o "auxílio" de que cuida a Lei Orgânica.

Apanhando-se um dicionário comum, tem-se que os termos "auxílio" e "ajuda" tem de fato similitude lexicográfica.

Nosso mui querido e saudoso Professor Antônio Houaiss, mestre dos mestres da arte do dicionário confere ao termo "ajuda" a sinonímia de "auxílio" (vide DICIONÁRIO HOUAISS, Sinônimos e Antônimos, Editora Objetiva, p 32).

O mestre CARLOS MAXIMILIANO ensinava que "todas as ciências, e entre elas o Direito, têm a sua linguagem própria, a sua tecnologia; deve o intérprete leva-la em conta; bem como o fato de serem as palavras em número reduzido, aplicáveis, por isso, em várias acepções e incapazes de traduzir todas as gradações e finura do pensamento. No Direito Público usam mais dos vocábulos no sentido técnico" (HERMENÊUTICA E APLICAÇÃO DO DIREITO, Forense, 16ª edição, p. 109).

Com a mesma premissa, eis excerto de voto do eminente Ministro Marco Aurélio, da Suprema Corte:

"Sempre tenho presente a premissa de que o Direito é ciência e, como tal, possui institutos, expressões e vocábulos com sentido próprio, havendo de se presumir que o legislador, especialmente o constituinte, haja atuado com técnica, atentando para o fato de que o esmero da linguagem é essencial à revelação do sentido correto da disposição normativa" (Revista de Direito Administrativo n. 193, p. 228, RMS 21.514, STF).

Daí o porque não se poder confundir a simples "ajuda de custo" (ou mesmo uma bolsa de estudo) com o complexo instituto do auxílio, que no âmbito do Direito Público é a transferência para despesa de capital, tendo "por finalidade investimentos, obras, equipamentos e instalações, previstos genericamente na lei de orçamento" (BANDEIRA DE MELLO, op cit, p. 845).

Correto portanto que a Lei Orgânica condicione as leis que criam auxílios à iniciativa do alcaide, pela influência direta na qualidade da lei orçamentária, onde deverão estar previstos genericamente.

Em síntese, as subvenções e auxílios que se mostram previstos na alínea "d", do inciso II, do art. 31, da Lei Orgânica do Município, guardam contornos próprios e adequados ao seu complexo conteúdo técnico-administrativo,...

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