Acórdão Nº 0303344-31.2015.8.24.0038 do Sexta Câmara de Direito Civil, 23-08-2022

Número do processo0303344-31.2015.8.24.0038
Data23 Agosto 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSexta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0303344-31.2015.8.24.0038/SC

RELATOR: Desembargador CARGO VAGO

APELANTE: BANCO PSA FINANCE BRASIL S/A. APELANTE: PEUGEOT-CITROEN DO BRASIL AUTOMOVEIS LTDA APELADO: RONI SCHIER

RELATÓRIO

Tratam os autos de apelações cíveis interpostas em face de sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais.

Em atenção aos princípios da celeridade e economia processuais, adota-se o relatório da sentença, transcrito na íntegra, por refletir com fidelidade o trâmite processual na origem:

Trata-se de "ação de rescisão de contrato de compra e venda de veículo, anulação de contrato de financiamento e indenização por danos materiais e morais c/c antecipação dos efeitos da tutela" proposta por Roni Schier em face de Citroën do Brasil Ltda, Le Monde Comércio de Veículos Ltda e Banco PSA Finance Brasil S/A, todos qualificados.

Aduz, em síntese, que adquiriu em 27/02/2014 da segunda (Le Monde) demandada um veículo, fabricado pela primeira (Citroën) por meio de financiamento bancário junto à terceira (Banco PSA) ré. Discorre que após um mês da compra constatou vício de qualidade no produto (tampa traseira deformada; frisos da porta descolando; falta da bandeja), os quais até a propositura da ação não haviam sido sanados.

Com arrimo em tais argumentos requereu, em preliminar, que a demandada restituísse o valor da entrada e, no mérito, requereu a rescisão contratual coma consequente condenação das rés ao pagamento de danos materiais e morais.

Mandato e documentos instruem a exordial (págs. 13/41).

Decisão de págs. 50/52 indeferiu a concessão da tutela pleiteada.

Devidamente citadas (pág. 57, 59 e 61), as partes compareceram a audiência conciliatória (pág. 76). Proposta a conciliação, a mesma restou inexitosa. A terceira demandada (Banco) apresentou contestação (págs. 81/96), tendo alegado em preliminar sua ilegitimidade passiva e, no mérito, rechaçado os argumentos da inicial. A segunda demandada (Le Monde) apresentou contestação (págs. 159/180), tendo requerido em preliminar sua ilegitimidade passiva, como prejudicial a decadência e, no mérito, rechaçou os argumentos da inicial. A primeira demandada (Citroën) apresentou contestação (págs. 280/294), tendo arguido em preliminar sua ilegitimidade e, no mérito, rechaçou in totum os argumentos da inicial.

Réplica às págs. 313/336.

A decisão proferida restou assim redigida em seu dispositivo:

Ante o exposto, com fundamente no art. 487, I, do Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados por Roni Schier em face de Citroën do Brasil Ltda, Le Monde Comércio de Veículos Ltda e Banco PSA Finance Brasil S/A, para:

a) DECLARAR rescindido o contrato de compra e venda firmado entre a autora e a segunda ré (Le Monde);

b) DECLARAR rescindido o Contrato de Arrendamento Mercantil firmado entre o autor e o terceiro réu (Banco PSA), para que se volte ao status quo, ou seja, deverá o banco réu efetuar a devolução dos valores pagos pela parte autora, atualizada monetariamente desde a propositura da ação e acrescida de juros moratórios de 1% (um por cento) ao mês, a partir da citação;

d) condenar a segunda (Le Monde) a devolver o montante pago a título de entrada com juros de mora de 1% ao mês e correção monetária pelos índices da Corregedoria-Geral da Justiça, a contar do desembolso.

Em razão de ter decaído de parte significativa do pedido, arca o autor com 40% das despesas processuais (art.82, §2º do NCPC) e verba honorária fixada em R$2.500,00 (dois mil e quintos reais) e a rés pro rata com 60% das despesas processuais (art. 82,§2º do NCPC) e honorários no valor de 10% do valor da condenação.

Transitada em julgado, certifique-se e, após adotados os procedimentos para cobranças das custas, arquivem-se.

Irresignados com a sentença, os requeridos interpuseram apelações. Sustenta o BANCO PSA FINANCE BRASIL S/A (evento 65, da origem) sua ilegitimidade passiva, eis que atuou tão somente como instituição financeira intermediadora da negociação mediante contrato de arrendamento mercantil. Aponta, ainda, ausência de interesse processual do autor. No mérito, sustenta sua ausência de responsabilidade à medida que atuou tão somente na realização do contrato de arrendamento mercantil.

A seu turno, a PEUGEOT-CITROEN DO BRASIL AUTOMOVEIS LTDA (evento 70, da origem) sustentou, em apertada síntese, cerceamento de defesa diante da necessidade de realização de prova pericial e oral. No mérito, aponta que não há elementos aptos a indicar a existência de defeito de fabricação no veículo. Aponta, ainda, que o defeito deve ser de impossível reparação para que o desfazimento do negócio seja possível. Para além, discorre acerca da necessidade de, em caso de manutenção da sentença, que a restituição do valor seja equivalente à Tabela FIPE do automóvel.

Também irresignada, a LE MONDE COMÉRCIO DE VEÍCULOS LTDA também apelou (evento 9, da origem) sustentando cerceamento de defesa, nulidade processual diante da vedação à prolação de decisão surpresa em razão da inversão do ônus probatório deferida em sentença; no mérito, sustenta a não aplicação do CDC ao caso concreto bem como a impossibilidade de inversão do ônus da prova. Aponta, ainda, sua ilegitimidade passiva ad causam, eis que atuou tão somente na comercialização do veículo. Sustenta, para além, a ocorrência da decadência.

Pugna, ainda, pela improcedência da demanda diante da ausência de constatação dos alegados vícios bem como que seriam estes, em tese, sanáveis, o que não permite a resolução do contrato entabulado. Como teses sucessivas, sustenta que não há pedido expresso na inicial de condenação da loja à resolução do contrato. Aponta, também, que não há que se falar em resolução do contrato, mas sim e tão somente conserto do veículo. Por fim, sustenta que eventual devolução dos valores pagos deverá se dar com base na tabela FIPE, considerando a desvalorização do bem, e não com base nos valores pagos à época, devidamente corrigidos.

As contrarrazões foram oferecidas (eventos 76 e 77, da origem).

Vieram conclusos.

Este é o relatório.

VOTO

A sentença, adianto, deve ser mantida.

I) DO APELO DA REQUERIDA PEUGEOT-CITROEN DO BRASIL AUTOMOVEIS LTDA - AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL SUSCITADA EM CONTRARRAZÕES

Entendo, prima facie, que o recurso da requerida Peugeot-Citroen do Brasil pode ser conhecido. Isso porque, em que pese o recorrido sustente que a recorrente não possui legitimidade passiva, verifico que o dispositivo da sentença fez expressa menção à condenação também da Citröen, de modo que esta possui interesse em apelar a esta Colenda Câmara, in verbis:

Ante o exposto, com fundamente no art. 487, I, do Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados por Roni Schier em face de Citroën do Brasil Ltda, Le Monde Comércio de Veículos Ltda e Banco PSA Finance Brasil S/A, para: [...] (Grifo nosso).

Lembre-se que o dispositivo logra autoridade de coisa julgada (art. 502 e 504 do CPC); assim, estabelecidos os limites subjetivos da relação processual que se sujeitará à coisa julgada, patente o interesse recursal.

O recurso, portanto, por preencher os requisitos de admissibilidade, deve ser conhecido.

II) DA ADMISSIBILIDADE DO RECURSO INTERPOSTO PELA RÉ LE MONDE COMÉRCIO DE VEÍCULOS LTDA

Antes de ingressar nas demais teses suscitadas, esclareço que é o caso de admissão do recurso interposto pela ré Le Monde tão somente neste grau de jurisdição. Isso porque compulsando os autos dos ED's em primeiro grau interpostos em face da sentença (autos n. 0008156-87.2018.8.24.0038) verifico que, de fato, o procurador da requerida não foi devidamente intimado da sentença, motivo pelo qual não haveria o início do transcurso do prazo recursal.

A nulidade, no entanto, é sanável a partir da interposição do recurso diretamente perante este Egrégio Tribunal (já que o processo já estava remetido para o TJ). Entendo, assim, plenamente possível o recebimento do recurso, sanando a nulidade de intimação ocorrida em primeiro grau de jurisdição. Também não há que se falar em ausência de intimação do recorrido para se manifestar sobre o recurso, já que devidamente intimado nos termos da certidão de evento 16.

III) DA ILEGITIMIDADE PASSIVA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA E AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR DO DEMANDANTE

Em seu recurso, a instituição financeira ré argui sua ilegitimidade passiva para responder sobre eventuais defeitos do veículo. Sem razão, todavia! No caso dos autos, a lide diz respeito à existência de defeitos na aquisição de veículo novo mediante arrendamento mercantil junto ao banco da própria montadora. Da documentação acostada aos autos na origem (evento 1 - informação 5), verifico que o veículo foi financiado junto ao Banco Citroën (Banco PSA Finance), que pertence à própria montadora.

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