Acórdão Nº 0303427-44.2014.8.24.0018 do Quarta Câmara de Direito Público, 05-08-2021

Número do processo0303427-44.2014.8.24.0018
Data05 Agosto 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 0303427-44.2014.8.24.0018/SC



RELATORA: Desembargadora VERA LÚCIA FERREIRA COPETTI


APELANTE: MARCIO DE MELLO (AUTOR) APELANTE: MUNICIPIO DE PLANALTO ALEGRE (RÉU) APELANTE: ESTADO DE SANTA CATARINA (RÉU) APELADO: OS MESMOS


RELATÓRIO


Com fulcro nos princípios da celeridade e economia processuais, e por retratar com fidedignidade a tramitação do feito na origem, adota-se, a começar, o relatório elaborado pelo Juízo a quo na sentença apelada (Evento 102, Eproc 1º Grau), in verbis:
MÁRCIO DE MELLO, qualificado nos autos, ingressou com a presente AÇÃO COMINATÓRIA contra o ESTADO DE SANTA CATARINA e o MUNICÍPIO DE PLANALTO ALEGRE, também qualificado. Como fundamento de sua pretensão, alegou na inicial, em síntese, que: sofre de Psoríase em placas (CID L40.0); foi submetido ao tratamento com Adalimumabe; a não utilização do medicamento pode ocasionar piora nos sintomas, progressão da doença e piora na qualidade de vida; o fármaco em questão não é fornecido pelo Sistema Único de Saúde e o autor não dispõe de recursos financeiros suficientes para custeá-lo; os réus devem ser condenados a disponibilizar o fármaco gratuitamente ao autor; deve ser deferida a antecipação dos efeitos da tutela.
Antecipação de tutela deferida.
O Estado interpôs agravo na forma retida, sendo as contrarrazões apresentadas às pgs. 110-115.
Citado, o Estado réu apresentou contestação, aduzindo, em resumo, que: o fármaco pretendido pelo autor não é disponibilizado pela rede pública de saúde, que disponibiliza alternativas terapêuticas; é impossível o fornecimento de medicação distinta da padronizada nos programas oficiais; o médico prescritor não justificou tecnicamente a escolha por terapia não prevista no SUS; é necessário a realização da perícia médica; deve existir prova da hipossuficiência; em caso de procedência dos pedidos iniciais, a condenação deve adotar a Denominação Comum Brasileira (nome genérico da substância ativa). Por derradeiro, postulou a improcedência do pedido e anexou documentos.
Citado, o Município réu apresentou contestação, aduzindo preliminarmente a sua ilegitimidade passiva ad causam e a falta de interesse de agir por existir alternativas terapêuticas no SUS, e no mérito, em síntese, que: é impossível o fornecimento de medicação diversa das oferecidas pelo SUS; o medicamento é de alto custo sendo de responsabilidade do Estado o custeio. Por derradeiro, postulou a improcedência do pedido e anexou documentos.
O autor replicou.
Sobreveio manifestação Ministerial.
O autor informou o descumprimento da decisão, pugnando o sequestro de valores.
Sobreveio decisão interlocutória indeferindo o pedido de sequestro, designando perícia judicial e afastando as preliminares arguidas pelo réu.
Nova manifestação Ministerial pela não intervenção.
Foi realizada a perícia, com manifestação das partes.
É o relatório.
Após a fundamentação, o Juízo a quo julgou procedente o pedido, nos seguintes termos:
ANTE O EXPOSTO, com fundamento no art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PROCEDENTE o pedido inicial. Em consequência, CONDENO os réus solidariamente a disponibilizar ao autor o medicamento Adalimumab. A obrigação deverá ser cumprida inicialmente pelo Estado de Santa Catarina e, não havendo cumprimento, pelo Município de Planalto Alegre, sem prejuízo da substituição da tutela específica por providências que assegurem a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente (CPC, art. 497). Outrossim, CONFIRMO a decisão das pgs. 76-80.
Deverá a parte autora, administrativamente e a partir da publicação desta sentença, comprovar a cada 6 (seis) meses, mediante apresentação de atestados médicos e/ou receitas médicas, a persistência do seu estado de saúde e a necessidade dos medicamentos.
Deixo de condenar o Estado réu ao pagamento dos honorários advocatícios de sucumbência, nos termos da Súmula n. 421 do STJ: "os honorários advocatícios não são devidos à Defensoria Pública quando ela atua contra a pessoa jurídica de direito público à qual pertença."
Condeno o Município réu ao pagamento de 50% dos honorários advocatícios de sucumbência, estes que fixo em 10% (dez por cento) do valor da causa (CPC, art. 85, § 2º)
O Município é isento de custas (LC 156/1997). O Estado réu é isento de custas e despesas processuais.
Arcam os réus com os honorários periciais no valor fixado à p. 220, devidamente atualizado. Depositado o valor, expeça-se o alvará para liberação ao perito.
Publique-se.
Registre-se.
Intimem-se.
Transitada em julgado, arquive-se.
Inconformado, o Estado interpôs recurso de apelação. Alega, em síntese, que, após a propositura da demanda, que se deu em 2014, o medicamento inicialmente denegado administrativamente à parte autora foi padronizado pelo Sistema Único de Saúde (SUS), por meio da Política Nacional de Medicamentos (regulamentada atualmente pela Portaria de Consolidação n. 2/2017), assim como que é imperiosa a formação de litisconsórcio passivo necessário, com a inclusão da União na ação, de acordo com o decidido no Tema 793 de repercussão geral do Supremo Tribunal Federal (STF). Requereu o conhecimento e o provimento do recurso para anular a sentença, com a remessa do feito à primeira instância para que a parte autora seja intimada para incluir a União Federal no polo passivo da presente demanda, nos termos do art. 115 e art. 329 do Código de Processo Civil, com remessa dos autos para a Justiça Federal (Evento 100, Eproc 1º Grau)
Também irresignada, a Defensoria Pública Estadual (DPE) apelou, ao fundamento, em resumo, de que tem direito a honorários sucumbenciais em face de quaisquer entes públicos, porquanto a Lei Complementar Estadual n. 575/2012, editada após a Súmula 421 do Superior Tribunal de Justiça (STJ), não excetuou qualquer ente estatal do pagamento das verbas sucumbenciais devidas a ela. Requereu o conhecimento e provimento do recurso para que o Estado de Santa Catarina seja condenado ao pagamento de honorários ao Fundo de Aparelhamento da Defensoria Pública, com fundamento no art. 134, caput e §2º, da Constituição Federal e no art. 4º, XXI, da LC 80/94 (Evento 111, Eproc 1º Grau).
O Município de Planalto Alegre, por seu turno, interpôs recurso de apelação (Evento 122). Asseverou, em resumo, que a sentença não seguiu a orientação firmada no IRDR nº 0302355-11.2014.8.24.0054, pois não há no laudo pericial qualquer menção a risco de morte como decorrência da não utilização do medicamento, e violação ao princípio da reserva do possível, pois o custo anual do tratamento é um pouco inferior ao dispensado com a compra de medicamentos para toda a população local no ano de 2019.
Ofertadas contrarrazões (Eventos 110, 129, 131 e 136, Eproc 1º Grau), os autos ascenderam a este Tribunal.
A Douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer de lavra da Exma. Sra. Dra. Sonia Maria Demeda Groisman Piardi, deixou de se manifestar sobre recurso da DPE e manifestou-se pelo conhecimento e desprovimento dos recursos de Apelação Cível interpostos pelo Estado de Santa Catarina e pelo Município (Evento 4, Eproc 2º Grau).
É o relatório

VOTO


Quanto ao juízo de admissibilidade, inicialmente, não se conhece do agravo retido interposto pelo Estado de Santa Catarina (Evento 19, Eproc 1º Grau), direcionado à impugnação do prazo fixado para cumprimento da obrigação de fazer imposta na decisão que antecipou os efeitos da tutela, diante de atendimento ao disposto art. 523, §1º, do Código de Processo Civil (CPC) de 1973, vigente à época da prática do ato processual.
Verifica-se, ainda, que, apesar do silêncio da sentença, é caso de reexame necessário da sentença, de acordo com o art. 496 do CPC, em virtude do valor estimado da condenação não se enquadrar na exceção do parágrafo 3° desse dispositivo legal1.
Isso porque, considerando que o tratamento anual postulado, com 26 frascos, de acordo com a prescrição médica de 4 frascos no primeiro mês e 2 nos demais (Evento 1, INF3, Eproc 1° Grau), importa na quantia de R$ 210.838,94 (duzentos e dez mil, oitocentos e trinta e oito reais e noventa e quatro centavos), tem-se que o valor estimado da condenação, nele englobadas as prestações vencidas desde a data de deferimento da antecipação de tutela (17-07-2014) e mais um ano de vincendas (art. 292 do CPC), já ultrapassa R$ 1.500.000 (um milhão e meio de reais).
No mais, por serem tempestivos e próprios, os recursos de apelação merecem ser conhecidos.
O ente estadual apelante, em linhas gerais, sustenta a necessidade de inclusão da União no polo passivo da lide.
O Município argumenta, em resumo, a ausência de comprovação dos requisitos exigidos pelo IRDR nº 0302355-11.2014.8.24.0054, pois não há no laudo pericial qualquer menção a risco de morte, como decorrência da não utilização do medicamento, e violação ao princípio da reserva do possível.
A DPE, por seu turno, aduz ser inaplicável a Súmula 421 STJ, porquanto a Lei Complementar Estadual n. 575/2012 não excetuou qualquer ente estatal do pagamento das verbas sucumbenciais devidas à Defensoria Pública Estadual.
Adianta-se que os recursos voluntários não comportam acolhimento e sentença merece parcial reforma, em reexame necessário.
Inicialmente, não há falar em perda superveniente de interesse processual, pela padronização do medicamento requerido, porquanto, como sustentado pelo autor, nas contrarrazões, persiste a negativa administrativa. O ente estadual apelante, inclusive, sequer postula a extinção do feito no recurso manifestado.
Quanto ao pleito de chamamento da União, cumpre destacar que, à época do ajuizamento da ação (11-07-2014 - Evento 1, Eproc 1º Grau) e da prolação da sentença (17-01-2020 - Evento 92, Eproc 1° Grau), a jurisprudência sedimentada desta Corte entendia pela ampla solidariedade dos entes federativos na obrigação de fornecimento das prestações de saúde, em decorrência do disposto no art. 196 da Constituição Federal, sendo...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT