Acórdão Nº 0303432-11.2015.8.24.0025 do Quinta Câmara de Direito Público, 17-08-2021

Número do processo0303432-11.2015.8.24.0025
Data17 Agosto 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0303432-11.2015.8.24.0025/SC

RELATOR: Desembargador HÉLIO DO VALLE PEREIRA

APELANTE: JOSE DESCHAMPS APELADO: MUNICÍPIO DE GASPAR E OUTRO

RELATÓRIO

José Dechamps apela de sentença havida na 2ª Vara Cível da Comarca de Gaspar.

Impetrou mandado de segurança questionando ato praticado pelo Secretário de Planejamento e Desenvolvimento Urbano do Município de Gaspar, o qual indeferiu sua consulta de viabilidade para construção em seu imóvel ao argumento de possível intervenção em APP contígua ao terreno. Criticou, porém, esse encaminhamento ponderando que o espaço está localizado em área urbana consolidada do município, circunstância capaz de esvaziar as exigências dispostas no Código Florestal quanto aos espaços territorialmente protegidos. Nesses casos, deve incidir a Lei de Parcelamento do Solo, a qual prescreve um distanciamento de quinze metros dos cursos hídricos.

Em primeiro grau, foi pronunciada a extinção do feito sem resolução de mérito sob estes fundamentos:

Trata-se de mandado de segurança em que o impetrante objetiva, em síntese, a concessão da ordem para determinar que o impetrado emita consulta de viabilidade de seu imóvel consolidado em área urbana, atribuindo a área de APP os ditames da Lei de Parcelamento de Solo e Lei Orgânica do Município de Gaspar.

As alegações do impetrante, como visto, têm fundamento no fato do seu imóvel encontrar-se em área urbana absolutamente consolidada.

Todavia, observo que os documentos amealhados não demonstram com clareza a assertiva invocada pelo impetrante.

Note-se que não consta nas matrículas a averbação de construção de qualquer imóvel.

No mais, nenhum outro documento/foto foi juntado para comprovar as características da existência de área consolidada, como, por exemplo, intensa urbanização, iluminação pública e asfalto.

Nesse contexto, observo que a lei que disciplina o Mandado de Segurança é taxativa ao mencionar que tal instituto se presta à proteção de direito qualificado legalmente como "líquido e certo" e que não seja amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ouagente de pessoa jurídica investido no exercício de atribuições do Poder Público.

Ora, a constatação da existência desse alegado "direito líquido e certo" é questão prévia, sem a qual não é possível o legítimo exercício da ação de Mandado de Segurança.

Assim, o direito invocado deve ser comprovado de plano, sem o que o mérito da segurança não deverá ser apreciado.

Enfatizou, por outro lado, que o debate se ocupa puramente sobre a incidência de normas jurídicas, não demandando escrutínio aprofundado sobre as peculiaridades fáticas do imóvel. De todo modo, na documentação apresentada se constata a inserção do terreno na faixa urbana consolidada do município, especialmente a partir da resposta à consulta de viabilidade, na qual se observa fotografia por satélite expondo a localização exata do espaço controvertido. Há, então, condições para julgamento imediato da demanda.

O Município de Gaspar apresentou contrarrazões.

A Procuradoria-Geral de Justiça opinou pelo desprovimento do apelo.

Determinei o sobrestamento do feito pela afetação da matéria ao Tema 1.010 da Lista de Recursos Repetitivos do Superior Tribunal de Justiça.

Julgado o precedente paradigma, oportunizei manifestação pelas partes.

A Fazenda Pública defendeu a incidência da compreensão exposta pela Corte Superior. Já o Ministério Público insistiu no acerto da decisão terminativa havida na comarca.

VOTO

1. A extinção prematura da causa foi mesmo acertada.

É que o autor não especifica, com um mínimo de detalhamento, a situação ambiental do imóvel. Os escassos trechos da inicial em que se descreve a disposição do bem se limita a mencionar a titularidade da parte, a ausência de interesse ambiental relevante na localidade e relatar o posicionamento da Administração que considerou o recuo de cem metros a partir do rio Itajaí-Açu.

Depois, o que segue é um arrazoado sobre a irreversível desnaturação daquelas águas fluviais, o cenário de consolidação urbana em todo entorno do imóvel e a abordagem sobre os critérios jurídicos pelos quais se deva concluir pela inexistência de uma faixa de APP a se respeitar. Tudo, todavia, muito abstrato e sem o necessário entrosamento com a situação concreta.

Nessa linha, muito pouco se envereda - e isso para as pretensões da apelante seria crucial - sobre o exato contexto ecológico das faixas terrenas em que busca construir. Dos documentos que instruem a causa constam apenas a certidão da matrícula do imóvel, plantas do projeto de edificação e resposta à consulta de viabilidade. No indeferimento administrativo, porém, não constam informações sobre a inserção do local em zona urbana consolidada do município. Já a única fotografia presente no estudo não permite minimamente essa observação (Evento 1, Informação 6). Sintomaticamente apenas no recurso se trouxe imagem mais ampla do posicionamento do terreno (Evento 50, petição 60), mas é circunstância que apenas referenda tacitamente a escassez de informações pretéritas.

A parte se apega a uma, por assim dizer, notoriedade do enquadramento do imóvel no perímetro urbano. Devo insistir, contudo, nesse pressuposto: a análise sobre a área urbana consolidada é feita in loco e não a partir de inferências. Essa eventual edificação ostensiva próximo ao rio, ainda que seja verdadeira, não vale por fato notório, instituto por meio do qual se dispensa a instrução sobre circunstâncias de amplo conhecimento geral (art. 374, inc. I, CPC).

2. Agora, porém, sigo em obiter dictum.

Ainda que fosse o caso de se avaliar a questão de fundo, a pretensão não teria êxito.

O Superior Tribunal de Justiça, apreciando o Tema 1.010 da tabela de Recursos Repetitivos, firmou tese em sentido oposto ao entendimento doméstico: "Na vigência do novo Código Florestal (Lei n. 12.651/2012), a extensão não edificável nas Áreas de...

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