Acórdão Nº 0303434-64.2017.8.24.0007 do Terceira Câmara de Direito Público, 22-11-2022

Número do processo0303434-64.2017.8.24.0007
Data22 Novembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0303434-64.2017.8.24.0007/SC

RELATOR: Desembargador SANDRO JOSE NEIS

APELANTE: ESTADO DE SANTA CATARINA APELADO: MATHEUS CARDOSO DA SILVA

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de Apelação Cível interposto pelo Estado de Santa Catarina contra a sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara Cível da Comarca de Biguaçu, nos autos da "Ação Indenizatória" n. 0303434-64.2017.8.24.0007, ajuizada por Matheus Cardoso da Silva em face do Departamento Estadual de Infra Estrutura (DEINFRA) (substituído pelo Estado de Santa Catarina), que julgou parcialmente procedentes os pedidos exordiais, condenando o Estado ao pagamento de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) a título de indenização por danos morais (incluindo os danos estéticos), de R$ 7.206,00 (sete mil, duzentos e seis reais) a título de indenização por danos materiais, e, honorários advocatícios (Evento 31, Eproc/PG).

Com o advento da Lei Complementar Estadual n. 741/2019, a qual extinguiu o DEINFRA, o Estado de Santa Catarina foi habilitado no polo passivo da demanda, nos termos dos arts. 91 e 96.

Em suas razões, o Estado defende a reforma da sentença ao argumento de que a responsabilidade civil imputada ao Estado, in casu, é subjetiva, porquanto os autos tratam de acidente de trânsito ocorrido, em tese, por eventual omissão relacionada a adequada conservação e manutenção de via pública, e não por ato comissivo estatal. Sendo assim, deve-se adotar a teoria da responsabilidade civil subjetiva, sendo necessária a comprovação da existência de culpa ou dolo, além do nexo causal. Assevera que não há provas que possam caracterizar a alegada omissão por parte do Estado e seu liame com o dano sofrido pelo Requerente, de modo que não se desincumbiu do ônus da prova que lhe competia, deixando de comprovar o nexo causal entre o alegado dano e a suposta omissão da Administração Pública, e, assim, deixando de cumprir o disposto no art. 373, inciso I, do Código de Processo Civil.

Considera, ainda, que "houve culpa exclusiva da vítima (o que afasta a responsabilidade civil) ou, quando menos, culpa concorrente sua (o que tem o efeito de diminuir a quantia indenizatória)", isso porque "a condução da motocicleta ocorreu de forma imprudente, pois o recorrido, no momento do acidente, não tinha CNH válida porque sua carteira de permissionário estava cassada em decorrência da prática de infração de trânsito gravíssima (avançar em sinal vermelho)". Assim, entende que a conduta imprudente e desatenta do Recorrido foi a causa direta e imediata da ocorrência do infortúnio, e, portanto, este foi o único responsável pelos danos sofridos, não havendo que se cogitar o dever reparatório estatal.

Quanto aos danos estéticos, o Recorrente aduz que não foram produzidas provas suficientes à sua comprovação, especialmente por não ter sido realizada prova pericial, e, dessa maneira, não deve ser acolhido o pleito de indenização por dano estético, já que este só poderia ser acatado em caso de devida comprovação. No que tange aos danos morais, visa a minoração da condenação por entender que o valor arbitrado se mostra desarrazoado, se comparado com outros casos assemelhados. Diz que os danos materiais não restaram comprovados nos autos, e, por esta razão, o pleito deve ser julgado improcedente. Pela eventualidade, pugna pela redução do quantum fixado.

Finalmente, insurge-se quanto ao índice de correção monetária aplicado na sentença, requerendo a incidência da Taxa Referencial-TR como índice de correção monetária, além de pugnar pela redução da verba honorária de sucumbência (Evento 38, Eproc/PG).

Contrarrazões acostadas (Evento 42, Eproc/PG).

Ausentes as situações previstas nos artigos 127 e 129 da Constituição Federal e no artigo 178 do Código de Processo Civil, o Ministério Público deixou de emitir opinião quanto ao mérito recursal (Evento 12, Eproc/SG).

Vieram os autos.

É o relatório.

VOTO

1. Admissibilidade.

O Estado é isento do pagamento de custas processuais, razão pela qual dispensa-se o recolhimento de preparo. No mais, os Recursos são tempestivos, adequados e preenchem os requisitos de admissibilidade, e, portanto, comportam conhecimento.

2. Mérito.

Na origem, o Autor ajuizou a demanda buscando ser indenizado pelo Estado em danos materiais, morais, estéticos e lucros cessantes, além de pensão mensal vitalícia no importe correspondente ao seu ultimo rendimento anterior aos fatos. Narrou que, em 11/05/2017, quando trafegava em sua motocicleta pela Rodovia SC-407, sentido Biguaçu/Antônio Carlos, no Município de Biguaçu, SC, perdeu o controle do veículo ao passar por uma "gigantesca poça de lama que encobria quase toda a via naquele momento", invadindo a pista contrária e colidindo frontalmente com um automóvel, sofrendo abrupta queda e sendo arremessado, o que lhe causou diversas lesões (Evento 1, Eproc/PG).

Afirmou que, na ocasião do infortúnio, a rodovia se encontrava em péssimas condições, sem a adequada manutenção, "cheia de barro, buracos, malconservada e sem sinalização adequada", expondo a risco aqueles que por ela trafegavam. Atendido pelo SAMU, foi encaminhado ao Hospital Regional de São José, onde foi atestada a gravidade das lesões sofridas, tais como "fratura do osso navicular da mão, entorse no tornozelo, trauma testicular, entre outros, sendo encaminhado a tratamento cirúrgico" (Evento 1, Eproc/PG).

Diante dos fatos narrados, ocorridos em razão da omissão Estatal, entende que foi impingido "indevido constrangimento e dor moral ao autor, lhe ferindo a honra e a dignidade, e enseja caracterizar de plano o dano moral, suscetível de reparação por quem lhe dá causa, até independentemente de se materializarem danos patrimoniais" (Evento 1, Eproc/PG).

Após o tramite regular do feito, sobreveio sentença de parcial provimento com o seguinte dispositivo (Evento 31, Eproc/PG):

Isso posto, com fulcro no art. 487, I, do CPC, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados pelo autor Matheus Cardoso da Silva, para:

a) CONDENAR o Estado de Santa Catarina ao pagamento ao autor da importância de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), a título de indenização por danos morais (nos quais se englobam os danos estéticos), acrescido de correção monetária e juros de mora, ambos a contar da presente sentença, na forma exata estabelecida na fundamentação supra;

b) CONDENAR o Estado de Santa Catarina ao pagamento ao autor da importância de R$ 7.206,00 (sete mil, duzentos e seis reais), a título de indenização por danos materiais, acrescida de correção monetária e juros de mora, ambos a contar do evento danoso;

c) INDEFERIR os pedidos de fixação de pensão mensal vitalícia e de lucros cessantes. Diante da sucumbência recíproca, condeno a parte autora ao pagamento de 50% (cinquenta por cento) das custas processuais. Sem custas pelo Estado de Santa Catarina (artigo 33 da LCE156/1997).

Condeno ainda as partes ao pagamento de honorários, na proporção de 50% cada. Fixo os honorários advocatícios em 15% do valor atualizado da condenação, nos termos do art. 85, § 3º, I, do Código de Processo Civil.

As obrigações decorrentes da sucumbência da parte autora, beneficiária da gratuidade judiciária, ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade, a teor do disposto no art. 98, § 3º, do CPC.

Publique-se.

Registre-se.

Intimem-se.

Ao trânsito, arquive-se com as devidas baixas

a) Da Responsabilidade pelo Evento Lesivo.

Sabe-se que "as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa", conforme disposto no artigo 37, § 6º, da Constituição da República.

A responsabilidade da Administração Pública, em regra, independe de sua culpa, posto que vige a teoria da responsabilidade objetiva, sendo necessária apenas a comprovação do dano e do nexo causal. O ponto de maior discussão, tanto na doutrina como na jurisprudência, ocorre em relação aos danos causados por conta de omissão do Poder Público, uma vez que a dicção da norma constitucional faz referência apenas à "ação" estatal.

De qualquer sorte, verifica-se que a orientação nesses casos é aplicar a teoria subjetiva. Nesse vértice, Celso Antônio Bandeira de Mello afirma:

Quando o dano foi possível em decorrência de uma omissão do Estado (o serviço não funcionou, funcionou tardia ou ineficientemente) é de se aplicar a teoria da responsabilidade subjetiva. Com efeito, se o Estado não agiu, não pode, logicamente, ser ele o autor do dano. E, se não foi o autor, só cabe responsabilizá-lo caso esteja obrigado a impedir o dano. Isto é: só faz sentido responsabilizá-lo se descumpriu dever legal que lhe impunha obstar ao evento lesivo.Deveras, caso o Poder Público não estivesse obrigado a impedir o acontecimento danoso, faltaria razão para impor-lhe o encargo de suportar patrimonialmente as consequências da lesão. Logo, a responsabilidade estatal por ato omissivo é sempre responsabilidade por comportamento ilícito. E, sendo responsabilidade por ilícito, é necessariamente responsabilidade subjetiva, pois não há conduta ilícita do Estado (embora do particular possa haver) que não seja proveniente de negligência, imprudência ou imperícia (culpa) ou, então, deliberado propósito de violar a norma que o consituía em dada obrigação (dolo). Culpa e dolo são justamente as modalidades de responsabilidade subjetiva. (Curso de Direito Administrativo. 26 ed. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 1002-1003)

Contudo, a mera constatação de uma conduta omissiva do Estado não é apto a ensejar a aplicação da teoria da responsabilidade subjetiva. Isto porque, faz-se necessário analisar a natureza da omissão, se específica ou genérica.

Acerca do assunto, Sérgio Cavalieri Filho explica que:

Haverá omissão específica quando o Estado, por omissão sua, crie a situação propícia para a ocorrência do evento em que tinha o dever de agir para impedi-lo. Assim, por exemplo, se o motorista embriagado atropela e mata pedestre que...

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