Acórdão Nº 0303512-09.2018.8.24.0012 do Segunda Câmara de Direito Comercial, 26-07-2022

Número do processo0303512-09.2018.8.24.0012
Data26 Julho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0303512-09.2018.8.24.0012/SC

RELATORA: Desembargadora REJANE ANDERSEN

APELANTE: DORLEI JOSE DE SOUZA (AUTOR) ADVOGADO: EDUARDO SILVA NAVARRO (OAB SP246261) ADVOGADO: JOAO DALBERTO DE FARIA (OAB SP049438) APELADO: COMPANHIA DE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO RCI BRASIL (RÉU) ADVOGADO: AURÉLIO CÂNCIO PELUSO (OAB PR032521)

RELATÓRIO

Dorlei José de Souza ajuizou ação de revisão contratual em desfavor de Companhia de Crédito, Financiamento e Investimento RCI Brasil, tendo como objeto contrato de financiamento de veículo (evento 1, INF16), ao argumento de que estaria permeado de abusividades.

Pedido de justiça gratuita deferido (evento 3).

Contestação (evento 10).

Ato contínuo, sobreveio sentença (evento 36), da qual se extrai a seguinte parte dispositiva:

Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos.

CONDENO o autor ao pagamento das despesas processuais e de honorários equivalentes a 20% do valor da causa (arts. 82, § 2º, e 85, § 2º, do CPC).

DECLARO SUSPENSA a exigibilidade das verbas de sucumbência em virtude da gratuidade da justiça (art. 98, §§ 1º e 3º, do CPC).

ARQUIVEM-SE os autos após o trânsito em julgado.

P.R.I.

Inconformada com o decisum de primeiro grau, a parte autora apresentou recurso de apelação (evento 40), momento em que pugna a reforma da sentença no tocante da: 1) tarifa de cadastro; 2) taxa de juros remuneratórios; 3) tarifas de registro e parcela premiável; 4) seguro prestamista; 5) juros remuneratórios; 6) iof adicional. Por fim, requereu a repetição do indébito em dobro.

Contrarrazões (evento 47).

Após, ascenderam os autos a esta Corte de Justiça.

É o relatório.

VOTO

1 Tarifa de cadastro

Aduz o apelante que a cobrança da tarifa de cadastro é ilegal.

O recurso, neste particular, não merece provimento.

Isso porque, após inúmeras discussões acerca da legalidade da incidência da tarifa ora analisada, a controvérsia foi submetida ao regime dos recursos repetitivos, nos termos do art. 543-C do CPC/1973, a fim de pacificar o tema, conferindo-lhe a mais equânime e justa solução.

Para tanto, a eminente Ministra Maria Isabel Gallotti, relatora do REsp n. 1.251.331/RS, procedeu extensa análise das Resoluções do Conselho Monetário Nacional, bem como das Circulares emitidas pelo Banco Central do Brasil, conforme se extrai do corpo do voto, in verbis:

"Em cumprimento ao disposto no art. 3º acima transcrito, o BACEN editou a Circular 3.371, de 6.12.2007, definindo, na forma da Tabela I a ela anexa, os serviços prioritários relacionados a contas de depósitos, transferências de recursos, operações de crédito e cadastro e, na Tabela II, o pacote padronizado de serviços prioritários cujo oferecimento obrigatório é previsto no art. 6º da Resolução CMN 3.518/2007. Estabeleceu, ainda, a referida circular que a cobrança de tarifa por serviço prioritário não previsto nas Tabelas I e II depende de autorização do Banco Central.

Da referida Tabela I não consta a Tarifa de Abertura de Crédito (TAC) e nem a Tarifa de Emissão de Carnê (TEC), donde a conclusão de que deixou de ser permitida a estipulação de cobrança por tais serviços.

Foi, todavia, expressamente prevista na Circular 3.371/2007 a Tarifa de Cadastro, cujo fato gerador da cobrança foi definido como "exclusivamente, realização de pesquisa em serviços de proteção ao crédito, base de dados e informações cadastrais, e tratamento de dados e informações necessários ao início de relacionamento de conta-corrente de depósitos, conta de depósitos de poupança e operações de crédito e de arrendamento mercantil.

Constou, ainda, da Circular 3.371/2007 a Tarifa de Renovação de Cadastro, para remunerar a "atualização de dados cadastrais para atendimento da regulamentação acerca da política de "conheça seu cliente" cobrada no máximo duas vezes ao ano." A Tarifa de Renovação de Cadastro foi abolida pela Circular BACEN 3.466, de 11.9.2009.

Resolução CMN 3.693/2009

Como visto, desde a Circular BACEN 3.371/2007, que implementou a padronização preconizada pela Resolução CMN 3.518/2007, a pactuação da TEC deixou de ter amparo legal. A vedação tornou-se explícita com a edição da Resolução 3.693/2009, cujo art. 1º, § 2º, estabeleceu não ser admitido o ressarcimento "de despesas de emissão de boletos de cobrança, carnês e assemelhados."

Resolução CMN 3.919/2010

Posteriormente, a Resolução CMN 3.919/2010 revogou a Resolução CMN 3.518/2007, alterando e consolidando as normas sobre cobrança de tarifas pela prestação de serviços por parte das instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil.

Os serviços continuaram a ser classificados nas categorias de essenciais (não passíveis de cobrança), prioritários, especiais e diferenciados.

Os serviços prioritários foram definidos pelo art. 3º da Resolução CMN 3.919/2010 como "aqueles relacionados a contas de depósitos, transferências de recursos, operações de crédito e de arrendamento mercantil, cartão de crédito básico e cadastro". Dispôs, ainda, o art. 3º que a cobrança de tarifas pela prestação de serviços incluídos nesta categoria deve observar "a lista de serviços, a padronização, as siglas e os fatos geradores da cobrança estabelecidos na Tabela anexa à esta resolução."

Na Tabela anexa à resolução não consta a Tarifa de Abertura de Crédito (TAC) e nem de Tarifa de Emissão de Carnê (TEC), de forma que não mais é lícita a sua estipulação.

Continuou permitida a Tarifa de Cadastro, a qual remunera o serviço de "realização de pesquisa em serviços de proteção ao crédito, base de dados e informações cadastrais, e tratamento de dados e informações necessários ao inicio de relacionamento decorrente da abertura de conta de depósito à vista ou de poupança ou contratação de operação de crédito ou de arrendamento mercantil, não podendo ser cobrada cumulativamente".

Neste ponto, importante ressaltar a distinção feita pelo Banco Central entre a atual Tarifa de Cadastro e a antiga Tarifa de Abertura de Crédito (TAC) e demais tarifas no passado cobradas pela disponibilização ou manutenção de um limite de crédito ao cliente, ressaltando que a TAC "era usualmente cobrada sobre qualquer operação de crédito, mesmo que o tomador já fosse cliente do estabelecimento bancário"; a Tarifa de Cadastro, a seu turno, "somente pode incidir no inicio do relacionamento entre o cliente e instituição financeira, e se justifica pela necessidade de ressarcir custos com realização de pesquisas em cadastros, bancos de dados e sistemas".

A propósito da Tarifa de Cadastro, afirma a FEBRABAN que, em função de Autorregulação Bancária, conforme Normativo Sarb 005/2009, o consumidor não é obrigado a contratar o serviço de cadastro junto à instituição financeira, já que tem as alternativas de providenciar pessoalmente os documentos necessários à comprovação de sua idoneidade financeira ou contratar terceiro (despachante) para fazê-lo (e-STJ fl. 459-460). Em síntese, não estando listadas entre as tarifas passíveis de cobrança por serviços prioritários na Resolução CMN 3.518/2007 e respectiva Tabela I da Circular BACEN 3.371/2007, eficaz a partir de 30.4.2008, nem na Tabela anexa à vigente Resolução CMN 3.919/2010, com a redação dada pela Resolução 4.021/2011, a Tarifa de Abertura de Crédito (TAC) e a Tarifa de Emissão de Carnê (TEC) deixaram de ser legitimamente passíveis de pactuação com a entrada em vigor da Resolução CMN.518/2007.

Os contratos que as estipularam até 30.4.2008 não apresentam eiva de ilegalidade, salvo demonstração de abuso, em relação às práticas de mercado em negócios jurídicos contemporâneos análogos.

Por outro lado, o serviço de confecção de cadastro continua a ser passível de cobrança, no início do relacionamento, desde que contratado expressamente, por meio da 'Tarifa de Cadastro'."

Dessa forma, para efeitos do art. 543-C do Código de Processo Civil, ficou assim decidido:

"- 1ª Tese: Nos contratos bancários celebrados até 30.4.2008 (fim da vigência da Resolução CMN 2.303/96) era válida a pactuação das tarifas de abertura de crédito (TAC) e de emissão de carnê (TEC), ou outra denominação para o mesmo fato gerador, ressalvado o exame de abusividade em cada caso concreto.

- 2ª Tese: Com a vigência da Resolução CMN 3.518/2007, em 30.4.2008, a cobrança por serviços bancários prioritários para pessoas físicas ficou limitada às hipóteses taxativamente previstas em norma padronizadora expedida pela autoridade monetária. Desde então, não mais tem respaldo legal a contratação da Tarifa de Emissão de Carnê (TEC) e da Tarifa de Abertura de Crédito (TAC), ou outra denominação para o mesmo fato gerador. Permanece válida a Tarifa de Cadastro expressamente tipificada em ato normativo padronizador da autoridade monetária, a qual somente pode ser cobrada no início do relacionamento entre o consumidor e a instituição financeira. [...]. 10. Recurso especial parcialmente provido" (REsp n. 1.251.331/RS, Segunda Seção, rela. Mina. Maria Isabel Gallotti, j. 28-8-2013).

Conclui-se, assim, que o Superior Tribunal de...

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