Acórdão Nº 0303535-39.2019.8.24.0005 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 08-12-2022

Número do processo0303535-39.2019.8.24.0005
Data08 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0303535-39.2019.8.24.0005/SC

RELATOR: Desembargador LUIZ ZANELATO

APELANTE: NITRIX COMERCIO DE BEBIDAS LTDA (AUTOR) APELANTE: MARCELO GOMES DA SILVA SALLES (AUTOR) APELANTE: BANCO DO BRASIL S.A. (RÉU) APELANTE: SILVIA RAFAELA DE FRANCA (AUTOR) APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

NITRIX COMERCIO DE BEBIDAS LTDA e BANCO DO BRASIL S.A. interpuseram recursos de apelação contra a sentença proferida pelo magistrado de primeiro grau Osmar Mohr, nos autos da ação revisional bancária, em curso perante o juízo da Vara Regional de Direito Bancário da Comarca de Balneário Camboriú, que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na petição inicial, nestes termos:

NITRIX COMERCIO DE BEBIDAS LTDA, devidamente qualificado(s) e por procurador(es) habilitado(s), propôs(seram) a presente ação de revisão de contratos em desfavor de BANCO DO BRASIL S.A., na qual alega(m), em suma, que celebrou diversos contratos com o banco réu, os quais possuem inúmeras ilegalidades e abusividades que oneram demasiadamente o equilíbrio contratual. Apresentou os fundamentos jurídicos pertinentes e, após, requereu: a) a aplicação do Código de Defesa do Consumidor, com inversão do ônus da prova; b) a redução dos juros remuneratórios à taxa média de mercado divulgada pelo Bacen à época da contratação; c) o afastamento da capitalização de juros; d) o afastamento das tarifas indevidas; e) o afastamento da comissão de permanência cumulada e de sua cumulação com juros moratórios e multa de mora; f) a declaração de venda casada dos encargos de seguro, título de capitalização, previdência e consórcio; g) a descaracterização da mora pela cobrança de encargos ilegais e abusivos; h) a repetição do indébito. Ao final, postulou a citação do(s) réu(s) e a procedência dos pedidos, além da condenação do(s) demandado(s) ao pagamento das custas e despesas processuais, bem como honorários sucumbenciais. Requereu a produção de todas provas admitidas em direito. Indicou o valor da causa.

Recebida a petição inicial, foi deferida a inversão do ônus da prova e determinada a citação da parte ré para apresentar resposta e o(s) contrato(s) indicado(s) na exordial.

Citada(s), a parte ré apresentou resposta por meio contestação, na qual, em preliminar, a inépcia da inicial. No mérito, alega, em suma, que as pretensões da(s) parte(s) autora(s) não merecem acolhimento, uma vez que os contratos não possuem quaisquer abusividades ou nulidades, de modo que requereu a improcedência dos pedidos formulados pelo(s) demandante(s) e a condenação deste(s) ao pagamento das custas e despesas processuais, além de honorários sucumbenciais. Postulou a produção de provas.

Em réplica a(s) parte(s) autora(s) postulou(ram) a procedência dos pedidos realizados na exordial com a consequênte rejeição das teses defensivas ventiladas pela(s) parte(s) ré(s).

Por decisão interlocutória, fora determinada a intimação da parte autora para trazer prova da existência dos contratos que almeja revisar, o que cumpriu na petição do evento 41.

Na sequência, fora determinada a intimação do banco réu para apresentar todos os contratos indicados à inicial e que tiveram suas existências provadas pela parte autora (evento 48).

Em resposta, o banco réu informou que não localizou os contratos (evento 53), razão pela qual a parte autora postulou o julgamento do feito (evento 59).

Vieram-me os autos conclusos para sentença.

DECIDO.

Do julgamento antecipado do mérito

O feito comporta julgamento no estado em que se encontra, nos termos do artigo 355, I, do Código de Processo Civil, pois a questão dos autos é unicamente de direito e não há necessidade de produção de outros meios de prova além da documental constante dos autos para o convencimento do julgador acerca do conteúdo da lide.

A respeito, colhe-se da Corte Catarinense:

Não há cerceamento de defesa, em razão do julgamento antecipado da lide, quando os elementos constantes dos autos são suficientes para formar o convencimento do magistrado e a matéria a ser apreciada dispensa a produção da prova testemunhal. (Apelação cível n. 2010.049153-2, rel. Des. Janio Machado, j. 03.05.11).

Da(s) preliminar(es)

Da inépcia da inicial

O banco réu afirma que a petição inicial é inepta, pois a parte autora deve demonstrar cabalmente qual a abusividade presente na cláusula que pretende ver anulada ou reformada, requisito não atendido.

Nada obstante, o aventado não há de ser provido, pois a petição inicial preenche todos os requisitos necessários e permite o pleno exercício do direito de defesa.

Além do mais, os pedidos são específicos e não genéricos, pois a parte autora indicou precisamente os encargos que entende ilegais ou indevidos, não havendo que se falar em inépcia da inicial.

Do mérito

Da aplicação do Código de Defesa do Consumidor

Tendo em vista o disposto no art. 3º, § 2º, do Código de Defesa do Consumidor, segundo o qual serviço é "a atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista", consagrou-se entendimento de que o citado diploma legal é aplicável às instituições financeiras (Súmula 297 do STJ).

Outrossim, firmou-se entendimento no sentido de que a revisão dos contratos é possível, para afastar eventuais ilegalidades, ainda que tenha havido quitação ou novação, razão pela qual a alegação é afastada (STJ - REsp 332832/RS, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, Rel. p/ Acórdão Min. Ari Pargendler, 2ª Seção, j. em 28/05/2003; AgRg no REsp 790348/RS, Rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa, 4ª Turma, j. 5-10-2006; AgRg no REsp 623278/RS, Rel. Min. Castro Filho, 3ª Turma, j. 21-2-2006).

Da inversão do ônus da prova

Impõe-se, no caso, a inversão do ônus da prova em benefício da parte embargante, no intuito de facilitar sua defesa, face à evidente hipossuficiência em relação às instituições financeiras, à luz do disposto no art. 6º, VIII, do Código Consumerista.

A propósito do tema, colaciona-se aresto do e. TJSC:

APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO REVISIONAL - CONTRATO DE ABERTURA DE CRÉDITO EM CONTA CORRENTE (CHEQUE ESPECIAL) - AUSÊNCIA DESTE NOS AUTOS - APLICAÇÃO DAS NORMAS DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA (ART. 6º, VIII, DO CDC) - INCIDÊNCIA DOS ARTS. 130 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL E 116 DO REGIMENTO INTERNO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA - JUNTADA PELO ESTABELECIMENTO BANCÁRIO IMPRESCINDÍVEL À DEFINIÇÃO DA CAUSA - CONVERSÃO DO JULGAMENTO EM DILIGÊNCIA - DESNECESSIDADE DE BAIXA DOS AUTOS À ORIGEM. É cabível a inversão do ônus da prova, posto como direito básico do consumidor a revisão de cláusulas contratuais que se apresentem abusivas, impõe-se se lhe assegure a "facilitação da defesa de seus direitos" (art. 6º, V e VIII, do CDC), máxime não negado que os documentos probatórios indispensáveis encontram-se em poder da parte adversa (Apelação Cível n. 2003.019768-0, de Dionísio Cerqueira, relator Des. Subst. Paulo Roberto Camargo Costa, Terceira Câmara de Direito Comercial, j. 24-4-2008).

No mesmo trilhar: Apelação Cível n. 2006.005396-8, de Criciúma, relator Des. Salim Schead dos Santos, Primeira Câmara de Direito Comercial, j. 27-4-2006.

Da presunção de veracidade do alegado à inicial

De acordo com a decisão do evento 48, houve a inversão do ônus da prova e a determinação para o banco réu juntar os seguintes contratos firmados com a parte autora: a) BB Giro Rápido n. 41585; b) BB Giro Rápido n. 30506685; c) BB Giro Empresa n. 30511025; d) BB Giro Empresa n. 30511878; e) Ourocard Empres. n. 33934207; f) BB Giro Empresa n. 30509024; g) BB Giro Empresa n. 30510568; h) BB Crédito Empr. N. 30510871; i) BB Giro Empresa n. 30511046; j) n. 007.652.234; k) 008.707.519; l) 305.043.580; m) 30.510.018; n) Contrato de cartão de crédito 021443; o) Contrato BB Crédito veículo 944913; p) CDC emp. Elet. 027612; q) Contrato BB Veículo 433111 ou 841965906; r) Contrato de cartão de crédito 019049; s) Rescalonamento MPE; t) Contrato de cartão de crédito 020415.

Nada obstante, o banco réu não juntou os documentos e postulou o julgamento do feito apenas com os contratos até então juntados (evento 53).

Ocorre que o julgamento não pode ser limitado apenas às avenças constantes dos autos, mas deverá abranger todos os contratos postulados à revisão na petição inicial, independentemente de haver a exibição nos autos.

Não havendo a juntada de tais contratos, o julgamento de seus conteúdos se dá via presunção de veracidade do aventado à inicial, nos termos do artigo 400 do Código de Processo Civil.

Dos juros remuneratórios

No que diz respeito ao parâmetro utilizado para se verificar eventual abusividade dos juros remuneratórios contratados, cabe ressaltar que o Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de que, "no caso de previsão potestativa da taxa de juros remuneratórios ou sua inexistência, os juros devem ser aplicados consoante a média de mercado, e não limitados em 12% ao ano" (STJ - REsp 715.894/PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, 2ª Seção, j. em 26/04/2006; AgRg no Ag 793508/RJ, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, 3ª Turma, j. 26-10-2006; EDcl no Ag 610181, Rel. Min. Massami Uyeda, j. 1º-2-2007; EAg 744227, Rel. Min. Jorge Scartezzini, j. 11-10-2006) e "que a autorização do Conselho Monetário Nacional para a livre contratação dos juros remuneratórios só se faz necessária em hipóteses específicas, decorrentes de expressa exigência legal, tais como nas cédulas de crédito rural, industrial ou comercial", sendo desnecessária nos empréstimos bancários comuns (STJ - REsp 907562, Rel. Min. Massami Uyeda, j. 13-3-2007; REsp 890583, Rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa, j. 22-3-2007; AgRg no REsp 736393/RS, Rel. Min. Ari Pargendler, 3ª Turma, j. 23-11-2005; EDcl no AgRg no REsp 679211/RS, Rel. Min. Jorge Scartezzini, 4ª Turma, j. 13-12-2005).

Ademais, do verbete da Súmula 382 da Corte da Cidadania se retira que, a simples contratação dos juros remuneratórios à taxa percentual anual superior a 12%, não se caracteriza como abusividade, verbis...

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