Acórdão Nº 0303636-60.2018.8.24.0054 do Segunda Câmara de Direito Civil, 15-07-2021

Número do processo0303636-60.2018.8.24.0054
Data15 Julho 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 0303636-60.2018.8.24.0054/SCPROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 0303636-60.2018.8.24.0054/SC



RELATOR: Desembargador RUBENS SCHULZ


APELANTE: JANAINA MANTOANELLI LICHTENFELZ (RÉU) ADVOGADO: IVAN CARLOS MENDES (OAB SC014928) APELADO: PATRICIA CLAUDINO (AUTOR) ADVOGADO: RUBENS SERGIO CZIECELSKI (OAB SC006735)


RELATÓRIO


Patrícia Claudino ajuizou a presente "ação ordinária de indenização por danos morais e estéticos causados por agressão física" contra Janaína Mantoanelli Lichtenfelz, aduzindo, em síntese, que na data de 24-7-2016, estava na casa noturna Fazenda Acustic Bar, quando foi abordada pela ré e surpreendida com uma mordida no nariz. Alegou que, em virtude da agressão, teve seu nariz cortado e precisou de tratamentos médicos e microcirurgias. Relatou que agressões, injúrias, difamações e demais lesões vem sendo rotineiras pela ré. Narrou que a ré reconheceu, em seu relato no boletim de ocorrência, não ter agido de maneira correta naquela ocasião. Afirmou que precisará passar por cirurgia reparadora, mas não despende de valores. Por essas razões, pleiteou pela condenação da ré ao ressarcimento dos danos materiais sofridos, no valor de R$ 11.204,82 (onze mil duzentos e quatro reais e oitenta e dois centavos) e ao pagamento de indenização pelos danos moral e estético causados. Requereu ainda o deferimento dos benefícios da justiça gratuita e a condenação da ré ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios. Por derradeiro, juntou documentos aos autos (Evento 1).
Os benefícios da justiça gratuita foram concedidos (Evento 6).
Citada, a ré apresentou contestação, sustentando, em síntese, que a agressão se deu por culpa concorrente, uma vez que a autora também teria dado causa para que o evento danoso acontecesse. Ademais, afirmou que a autora não comprovou devidamente o dano estético, requerendo, assim, a realização de perícia para apurá-lo. Defendeu ainda a inexistência do dever de indenizar, pugnando pela total improcedência da demanda, com a condenação da autora ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios (Evento 11).
Houve réplica (Evento 15).
Em decisão saneadora, foram delineados os pontos controvertidos da lide, deferida a justiça gratuita em favor da ré, corrigido o valor da causa e determinada a realização de exame pericial (Evento 17), o qual restou posteriormente juntado aos autos (Evento 62).
Na audiência de instrução e julgamento, foram ouvidas duas testemunhas arroladas pela autora. Na ocasião, as partes apresentaram razões finais de forma oral (Evento 140).
Sobreveio sentença prolatada pelo Magistrado a quo, nos seguintes termos (Evento 142):
[...] Por todo o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados na inicial, para CONDENAR a parte demandada ao pagamento de:
A) indenização por DANOS MATERIAIS no valor total de R$ 11.154,48 (onze mil cento e cinquenta e quatro reais e quarenta e oito centavos).
Sobre as despesas comprovadamente demonstradas nos autos deverá incidir correção monetária pelo INPC, desde cada desembolso, mais juros de mora de 1% (um por cento ao mês), contados da citação.
Já no que toca às despesas com a cirurgia reparadora ainda não realizada, o valor correspondente deve ser corrigido monetariamente pelo INPC desde a data de confecção do orçamento (ev. 1.8, p. 1) e acrescido de juros moratórios de 1% ao mês a partir da citação;
B) indenização por DANOS ESTÉTICOS no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), sobre a qual deverá incidir juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, a partir do evento danoso e correção monetária pelo INPC, a partir desta data;
B) indenização por DANOS MORAIS no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), sobre o qual deverá incidir juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, a partir do evento danoso e correção monetária pelo INPC, a partir desta data.
Em razão da sucumbência recíproca, mas majoritária da ré, arcará ela com 80% (oitenta por cento) das despesas processuais, mais honorários advocatícios fixados em 15% (quinze por cento) do proveito econômico obtido pela parte autora (CPC, art. 85, § 2º), ao passo que suportará esta com o restante das despesas processuais, mais honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) da parcela de que sucumbiu o pedido (parcialmente em relação ao pedido de indenização por danos morais e parcialmente em relação ao pedido de danos materiais), vedada a compensação (CPC, art. 85, §14) e ressalvada a suspensão da exigibilidade em relação a ambas as partes (CPC, art. 98, §3º), em razão da gratuidade já deferida (evs. 6.21 e 17.32).
Em consequência JULGO EXTINTO o feito com resolução do mérito, nos termos do art. 487, I, do Código de Processo Civil. [...]
Irresignada, a ré interpôs o presente recurso de apelação, objetivando, em suma, a reforma da sentença com o objetivo de que seja reconhecida a culpa concorrente pelo evento danoso, sob o argumento de que a autora teria proferido provocações. Aduz que não houve dano estético, vez que não existe nenhuma marca de cicatriz no nariz da autora. Impugna o valor pretendido a título de danos materiais, afirmando que a autora somente comprovou nos autos a quantia de R$704,82 (setecentos e quatro reais e oitenta e dois centavos) e não realizou a alegada cirurgia reparadora no valor de R$ 10.500,00 (dez mil e quinhentos reais). Afirma que a autora também não comprovou o abalo anímico. Requer, assim, a reforma da decisão para que seja reconhecida a culpa concorrente da autora, bem como sejam julgados improcedentes os pleitos de pagamento de verbas indenizatórias. Subsidiariamente, requer a minoração do quantum indenizatório referente aos danos materiais, morais e estéticos. Por fim, almeja a modificação do termo inicial dos consectários legais, a condenação da autora ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios e a concessão do benefício da justiça gratuita (Evento 148).
Apresentadas as contrarrazões (Evento 161), ascenderam os autos a esta eg. Corte de Justiça.
Este é o relatório

VOTO


Presentes os requisitos objetivos e subjetivos de admissibilidade, conhece-se do recurso e passa-se ao exame do seu objeto.
Destaca-se, ademais, que a apreciação do presente recurso, em detrimento de outros que estão há mais tempo conclusos neste gabinete, não afronta o critério cronológico de julgamento dos processos, previsto no artigo 12 do Código de Processo Civil. Ao revés, valendo-se da interpretação do parágrafo 2º do referido artigo, tratando-se de causa relativamente simples, antecipar o seu julgamento privilegia a celeridade e a economia processual e contribui para o desafogamento do Judiciário, uma das diretrizes da novel legislação.
1 CULPA CONCORRENTE
Inicialmente, a parte ré pleiteia o reconhecimento da culpa concorrente.
Alega que, no dia 24-7-2016, estava na casa noturna Fazenda Acustic Bar com seu ex-namorado, quando a autora, com o animus de causar desavenças, desferiu as seguintes afirmações à ré: "sua corna, chifruda eu estava dando para o seu namorado a tarde toda, você é uma coitada".
Afirma que solicitou que seu ex-namorado afastasse a autora, visto que ela estava visivelmente embriagada, contudo, ela se aproximou novamente com a intenção de abraçá-los, voltando a desferir ofensas verbais, oportunidade em que a ré, em seu estado de tensão elevado, devido às provocações reiteradas, efetuou as lesões que levaram a presente ação.
Ressalta que o evento danoso somente ocorreu por culpa concorrente da autora, que proferiu injustas provocações, levando a ré à um estado de violenta emoção.
No entanto, adianta-se, que razão não lhe assiste.
Conforme é cediço, para a configuração da responsabilidade civil subjetiva, é imprescindível o preenchimento dos seguintes pressupostos: a) ação ou omissão do agente; b) existência de dano causado à vítima; c) relação de causalidade; e d) dolo ou culpa do agente.
A esse respeito, o artigo 186 do Código Civil dispõe que "aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito". E, nesse viés, o artigo 927, caput, do mesmo Diploma prevê que "aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo".
Diante dessas premissas, reitera-se que, presentes o ato ilícito culposo, o dano e o nexo causal, impõe-se a obrigação de indenizar os danos causados, salvo quando comprovada a ocorrência de alguma excludente de responsabilidade.
Do conjunto probatório dos autos, extrai-se que o dano sofrido pela autora é evidente, sendo resultante das agressões físicas perpetradas pela ré, que confessou - na contestação e no apelo - ter desferido uma mordida no nariz da autora após supostas injustas provocações.
Contudo, as provas amealhadas demonstram que, na verdade, a ré investiu contra a autora sem ter havido qualquer insulto ou provocação, conforme se extrai dos depoimentos da informante Jéssica Rohling da Silva e da testemunha Aurélio Vanderlinde Schuelter.
Transcreve-se, no ponto, trecho da sentença que resumiu, de forma fidedigna, os depoimentos colhidos na audiência de instrução e julgamento, in verbis (Evento 124):
Sobre os fatos, a informante Jéssica Rohling da Silva (ev. 140, vídeo 4), ouvida em Juízo, disse que presenciou a agressão ocorrida no dia 24.07.2016, na casa noturna "Fazenda Acustic Bar", e relatou que "eu, o Jardel [irmão da informante] e a Janaína tínhamos combinado... O Jardel não namorava com ninguém na época, né, ele tinha... Ambas [autora e ré], eles ficavam, às vezes com uma, às vezes com a outra, e naquele dia a gente tinha combinado, eu, o Jardel e a Janaína, de irmos juntos pra Fazenda. Chegamos lá, encontramos outros amigos e estávamos tudo muito bem, até o presente momento. Aí, até aquela hora eu não tinha visto a Patrícia ainda, ela tava num outro canto, aí, quando eu vi, ela passou na nossa frente, a Janaína...

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