Acórdão Nº 0303665-52.2017.8.24.0020 do Primeira Câmara de Direito Civil, 27-02-2020

Número do processo0303665-52.2017.8.24.0020
Data27 Fevereiro 2020
Tribunal de OrigemCriciúma
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Cível n. 0303665-52.2017.8.24.0020

Relator: Des. Gerson Cherem II

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL. PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. RECURSO DO RÉU.

1) ADMISSIBILIDADE. JUSTIÇA GRATUITA PLEITEADA NA CONTESTAÇÃO. FALTA DE APRECIAÇÃO EM PRIMEIRO GRAU. DEFERIMENTO IMPLÍCITO PELO JUÍZO DE ORIGEM.

2) CERCEAMENTO DE DEFESA. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. PRETENDIDA PRODUÇÃO DE PROVAS. DESNECESSIDADE. EXISTÊNCIA NOS AUTOS DE ELEMENTOS SUFICIENTES À PLENA CONVICÇÃO DO MAGISTRADO. PRELIMINAR RECHAÇADA.

3) INVOCAÇÃO DO PRINCÍPIO DA EXCEPTIO NON ADIMPLETI CONTRACTUS, PREVISTO NO ART. 476, DO CÓDIGO CIVIL. ALEGADA EXISTÊNCIA DE DÍVIDAS DE IPTU ANTERIORES À ALIENAÇÃO. EXPRESSA PREVISÃO CONTRATUAL PARA O COMPRADOR QUITAR AS PRESTAÇÕES, COM POSTERIOR RESSARCIMENTO. AUSÊNCIA DE PROVAS DO PAGAMENTO E DE EVENTUAL NEGATIVA AO REEMBOLSO. ÔNUS DO ART. 373, II, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL/15. DESCUMPRIMENTO EXCLUSIVO DO RÉU.

4) ALEGADA AUSÊNCIA DE INADIMPLEMENTO DIANTE DE RENEGOCIAÇÃO VERBAL DA DÍVIDA. RESOLUÇÃO DO CONTRATO DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA QUE RECAÍA SOBRE O IMÓVEL, COM A CONSOLIDAÇÃO DA PROPRIEDADE EM NOME DO BANCO CREDOR. NÃO PAGAMENTO INCONTESTE. TESE RECHAÇADA.

5) AFASTAMENTO DA INDENIZAÇÃO POR ABALO ANÍMICO. DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL. MERO ABORRECIMENTO. INSCRIÇÃO DO AUTOR NOS ÓRGÃOS PROTETIVOS QUE NÃO DECORREU DA CONDUTA DO RÉU. INEXISTÊNCIA DO DEVER DE INDENIZAR. RECURSO ACOLHIDO NO PONTO.

"Em regra, o mero inadimplemento contratual não é bastante a provocar dano de ordem moral, não passando de mero dissabor. Somente é admissível falar em prejuízo desta ordem se do descumprimento resultam fatos que exacerbam o mero dissabor." (AC n. 2011.007300-7, rel. Des. Sérgio Izidoro Heil, j. em 21.11.2013).

6) HONORÁRIOS RECURSAIS DESCABIDOS DIANTE DO PARCIAL SUCESSO DO INCONFORMISMO.

RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0303665-52.2017.8.24.0020, da comarca de Criciúma 1ª Vara Cível em que é Apelante Wagner Savi Mondo e Apelado Reginaldo Cardoso.

A Primeira Câmara de Direito Civil decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e dar-lhe parcial provimento para afastar a condenação ao pagamento de indenização por danos morais. Custas na forma da lei.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido por este Relator, e dele participou o Exmo. Sr. Des. Raulino Jacó Brüning e o Exmo. Sr. Des. José Maurício Lisboa.

Florianópolis, 27 de fevereiro de 2020.

Gerson Cherem II

PRESIDENTE E RELATOR


RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível interposta por Wagner Savi Mondo, irresignado com a sentença prolatada pelo Juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Criciúma que, nos autos da ação de rescisão contratual aforada por Reginaldo Cardoso, julgou parcialmente procedentes os pleitos iniciais, nos seguintes termos (fls. 164/165):

Isto posto e concedendo a tutela de urgência postulada, julga-se PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos demandados por Reginaldo Cardoso na Ação de Resolução de Contrato cumulada com Indenização por DanosMorais e Materiais movida em face de Wagner Savi Mondo, para o fim de, resolvendo o contrato:

1) CONDENAR o réu:

a) à perda do valor de R$ 18.000,00 (dezoito mil reais), a título de multa contratual;

b) ao pagamento das perdas e danos, no equivalente ao valor da locação do imóvel, desde 10.12.2015 até a entrega do imóvel, com correção monetária pelo INPC do vencimento de cada parcela e juros de mora de 1% ao mês da citação.

c) ao pagamento das despesas do imóvel (energia elétrica, condomínio e IPTU), tudo a ser apurado em liquidação de sentença, na forma dos arts. 475 e 368, ambos do Código Civil e art. 269, inciso I, do Código de Processo Civil;

d) ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), acrescido de juros de mora desde a inscrição indevida e correção monetária da publicação da sentença.

2) DETERMINAR, em tutela de urgência, a desocupação do imóvel no prazo de 15 (quinze) dias, sob pena de desocupação forçada.

Condeno as partes ao rateio (10% ao autor e 90% ao réu) das custas e honorários, estes arbitrados em 10% (dez por cento) da condenação, ex vi do § 2º do art. 85 do CPC, observado o disposto no art. 98 do mesmo codex.

Os embargos de declaração opostos pelo réu (proc. n. 0007645-46.2017.8.24.0020) foram acolhidos pela decisão de fl. 09 daqueles autos:

Neste sentido, considerando que o retorno ao estado anterior implica, necessariamente, a devolução dos valores pagos, ACOLHO os embargos de declaração para acolher o pedido, restando condicionada a devolução a saldo existente após a liquidação do valor devido pelo réu.

Doutra banda, os aclaratórios manejados pelo autor (proc. n. 0008929-89.2018.8.24.0020) foram rejeitados pelo Juiz de primeiro grau (fl. 10).

Inconformado, o réu apelou, pleiteando primeiramente a gratuidade da justiça. Alegou, em preliminar, a nulidade do decisum por cerceamento de defesa. No mérito, sustentou estar configurado o inadimplemento do autor, invocando o princípio da exceção de contrato não cumprido, além de asseverar ter havido renegociação da dívida com o demandante. Pleiteou, ainda, o afastamento da indenização por abalo anímico (fls. 216/222).

Nas contrarrazões (fls. 227/232), o autor pugnou pela majoração dos honorários sucumbenciais.

Ato contínuo, ascenderam os autos a este Sodalício.

É o relatório.

VOTO

Presentes os requisitos legais, conhece-se do recurso.

1) Da gratuidade da justiça:

De pronto, frise-se que o réu efetuou requerimentos expressos para a concessão da justiça gratuita às fls. 69 e 76, os quais deixaram de ser apreciado pelo magistrado, conforme observa-se no despacho de fl. 135 e na sentença de fls. 156/165. Em decorrência, evidencia-se na espécie uma decisão implícita deferitória para conferir ao demandado o direito de litigar sem o recolhimento dos encargos processuais. Emerge que "não havendo indeferimento expresso, não se pode estabelecer uma presunção em sentido contrário ao seu deferimento, mas sim a seu favor." (STJ, AgRg no REsp n. 925.411, rel. Min. Sidnei Beneti, j. em 19.02.2009).

Constam precedentes:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORDINÁRIA DE COMPLEMENTAÇÃO DE AÇÕES. ALEGAÇÃO DE OMISSÃO E CONTRADIÇÃO QUANTO AO PEDIDO DE CONCESSÃO DO BENEFÍCIO DE JUSTIÇA GRATUITA. AUSÊNCIA DE MANIFESTAÇÃO EXPRESSA DO ÓRGÃO JURISDICIONAL. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO DA JUSTIÇA GRATUITA DE FORMA TÁCITA. EFEITOS INFRINGENTES ACOLHIDOS. DECISÃO CASSADA. RECURSO PROVIDO.

Requerido a concessão do benefício da justiça gratuita na exordial e ausente deferimento expressa nesse sentido, deve-se subentender concedida a benesse, se o magistrado a quo deferir a inicial e determinar a citação da Requerida. Ademais, "O sistema processual pátrio é informado pelo princípio da instrumentalidade das formas, que, no ramo do processo civil, tem expressão no art. 244 do CPC. Assim, é manifesto que a decretação da nulidade do ato processual pressupõe o não-atingimento de sua finalidade ou a existência de prejuízo manifesto à parte advindo de sua prática" (STJ, REsp 772648/PR, Ministro João Otávio de Noronha). (ED em AC n. 2011.023637-9, rel. Des. Paulo Roberto Camargo Costa, j. em 09.05.2013).

APELAÇÃO CÍVEL. CAUTELAR DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA REQUERIDA NA PETIÇÃO INICIAL. TRAMITAÇÃO DO FEITO SEM A EXIGÊNCIA DO PAGAMENTO DAS CUSTAS PROCESSUAIS. AUSÊNCIA DE QUALQUER IMPUGNAÇÃO. DEFERIMENTO IMPLÍCITO PELO JUÍZO DE PRIMEIRO GRAU. PROCESSAMENTO DO RECURSO INDEPENDENTEMENTE DE PREPARO. CONTRATO DE ABERTURA DE CRÉDITO ROTATIVO (CHEQUE NOBRE) E RESPECTIVOS DEMONSTRATIVOS. RECUSA QUE SE APRESENTA INJUSTIFICADA. DOCUMENTOS COMUNS ÀS PARTES. DESNECESSIDADE DE PRÉVIO ESGOTAMENTO DA VIA ADMINISTRATIVA. PAGAMENTO DE TARIFA PELO FORNECIMENTO DA 2ª VIA QUE NÃO SE FAZ DEVIDA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CAUSA DE PEQUENA COMPLEXIDADE. ARBITRAMENTO POR EQÜIDADE. CRITÉRIOS. ARTIGO 20, §§ 3º E 4º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. SENTENÇA MANTIDA. RECURSOS DESPROVIDOS.

1. Se o processo tramitou sem a exigência das custas processuais e sem qualquer impugnação, presume-se deferido o pedido de assistência judiciária gratuita, tal qual pleito que é encontrado na petição inicial. [...]. (AC n. 2006.012227-0, rel. Des. Jânio Machado, j. em 05.08.2010).

Dessa maneira, reconhece-se a inexigibilidade do preparo, haja vista o deferimento implícito do benefício ao recorrente no primeiro grau.

Passa-se, pois, à análise do recurso.

2) Do cerceamento de defesa:

Em proemial, o demandado indica que o julgamento antecipado da lide impediu-lhe de proceder à oitiva de testemunhas e também ao depoimento pessoal do autor. Por isto, clama pela anulação da sentença.

Razão não lhe assiste, contudo.

Inexiste cerceamento de defesa quando o julgador considera desnecessária a dilação probatória e resolve a lide, com base nos elementos então coligidos. Assim o determina o código instrumental de 2015, se "não houver necessidade de produção de outras provas" (art. 355, I, do CPC/15). Ainda, ao delimitar as provas necessárias, deverá o magistrado indeferir "as diligências inúteis ou meramente protelatórias" (art. 370, parágrafo único, do CPC/15).

O processo de conhecimento possui o escopo primacial de convencer o juiz acerca dos fatos alegados e dos fundamentos jurídicos aplicáveis ao caso. Logo, sendo a finalidade da prova justamente formar o convencimento do sentenciante, não basta que a parte apenas suscite a ocorrência de cerceio de defesa ante o julgamento antecipado. De fato, é preciso que ela demonstre a relevância e a pertinência do meio probatório que lhe foi suprimido, além de sua aptidão para alterar o posicionamento esposado.

O Superior Tribunal de Justiça assentou: "não ocorre o cerceamento de defesa na hipótese em que o magistrado entende que o feito está suficientemente instruído e julga a causa sem a...

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