Acórdão Nº 0304479-81.2016.8.24.0058 do Sexta Câmara de Direito Civil, 20-10-2020

Número do processo0304479-81.2016.8.24.0058
Data20 Outubro 2020
Tribunal de OrigemSão Bento do Sul
ÓrgãoSexta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Cível n. 0304479-81.2016.8.24.0058, de São Bento do Sul

Relator: Desembargador André Carvalho

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. RECURSO DA RÉ REVEL.

PEDIDO DE CONCESSÃO DO BENEFÍCIO DA GRATUIDADE JUDICIÁRIA. ACOLHIMENTO. SOCIEDADE EMPRESÁRIA EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL. PRECARIEDADE FINANCEIRA DEMONSTRADA. BENESSE CONCEDIDA.

OPERADA A PRECLUSÃO COM RELAÇÃO À MATÉRIA FÁTICA EM RAZÃO DA REVELIA. ALEGAÇÃO DE QUE OS VALORES PERSEGUIDOS NA PRESENTE CONTENDA FORAM PARCIALMENTE ADIMPLIDOS NÃO CONHECIDA NESTA FASE PROCESSUAL. EVENTUAIS PAGAMENTOS QUE PODERÃO SER AFERIDOS NA FASE EXECUTIVA DO FEITO E ABATIDOS DO MONTANTE DEVIDO.

Operada a revelia com relação à matéria fática deduzida nos autos, somente questões de ordem pública ou matéria de direito contrária à pretensão autoral podem ser objetos de discussão, pelo réu, na instância recursal.

PRELIMINARES. PROPALADA A IRREGULARIDADE NA REPRESENTAÇÃO PROCESSUAL DA PESSOA JURÍDICA DEMANDANTE. INSUBSISTÊNCIA. PROCURAÇÃO ASSINADA PELO SÓCIO ADMINISTRADOR, INDICADO NO CONTRATO SOCIAL ACOSTADO AOS AUTOS. ADEMAIS, FALHA QUE, ACASO VERIFICADA, CONFIGURARIA ERRO SANÁVEL E NÃO ACARRETARIA NULIDADE PROCESSUAL.

ALEGADA INOBSERVÂNCIA À REGRA INSCULPIDA NO ART. 6º DA LEI DE FALÊNCIAS E RECUPERAÇÃO JUDICIAL. TESE RECHAÇADA. DESNECESSIDADE DE SUSPENSÃO.

PEDIDO DE CONDENAÇÃO DA APELADA NAS PENAS POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. INACOLHIMENTO.

APELO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESTA PORÇÃO, PARCIALMENTE PROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0304479-81.2016.8.24.0058, da comarca de São Bento do Sul 1ª Vara em que é Apelante Pavsolo Construtora Ltda. (em Recuperação Judicial) e Apelada Estabilize Engenharia Geotecnica e Fundações Ltda.

A Sexta Câmara de Direito Civil decidiu, em Sessão Extraordinária Virtual, por unanimidade, conhecer em parte do recurso e, nesta porção, dar-lhe parcial provimento, tão somente para deferir à apelante o benefício da justiça gratuita. Custas legais.

Participaram do julgamento, realizado nesta data, o(a)s Exmo(a)s. Sr. Des. André Luiz Dacol e Sra. Desa. Denise Volpato (presidente com voto).

Florianópolis, 20 de outubro de 2020

Desembargador André Carvalho

Relator


RELATÓRIO

Adoto, por economia processual, o relatório da sentença de fls. 97-98, da lavra do Magistrado Edson Luiz de Oliveira, in verbis:

Trata-se de ação de cobrança proposta por Estabilize Engenharia Geotecnica e Fundações Ltda. contra Pavsolo Construtora Ltda. - Em Recuperação Judicial, partes devidamente qualificadas nos autos. Alegou a autora ser credora da requerida, na importância atualizada de R$ 203.806,29 (duzentos e três mil, oitocentos e seis reais e vinte e nove centavos), decorrente de dois contratos de prestação de serviços. Por fim, requereu a citação da ré e a procedência do pedido, a fim de condená-la ao pagamento da referida quantia. Valorou a causa e juntou documentos.

Devidamente citada (f. 74/75), não apresentou a ré defesa, conforme certificado à f. 96.

Relato do indispensável. Decido. (grifos originais)

Segue parte dispositiva da decisão:

Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido formulado, e RESOLVO O MÉRITO, na forma do art. 487, inciso I, do Novo Código de Processo Civil.

Em consequência, CONDENO a ré ao pagamento da importância de R$203.806,29 (duzentos e três mil, oitocentos e seis reais e vinte e nove centavos), mês, ambas desde a propositura da demanda (art. 397, CC).

Condeno a ré, ainda, ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por cento) do valor da condenação, em observância ao disposto no § 2º do art. 85 do novo Código de Processo Civil.

Cientifique-se inclusive o Sr. Administrador Judicial.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Inconformada com a prestação jurisdicional entregue, a ré revel interpôs a apelação de fls. 102-117, requerendo, primeiramente, a concessão do benefício da gratuidade judiciária.

Preliminarmente, alegou: (a) a irregularidade da representação processual da requerida, pois inexistente qualificação, tampouco indicação do nome do representante da empresa que firmou o instrumento de procuração acostado aos autos; (b) o juízo a quo não observou o pedido prévio de recuperação judicial por si formulado e deferido, circunstância esta que ensejava a interrupção de todas as ações de cobrança e execução aforadas em seu desfavor, pelo prazo de 180 dias, motivos pelos quais a demanda merece ser anulada, a partir do despacho que determinou sua citação.

No mérito, aduziu que houve parcial quitação dos valores perseguidos na presente contenda.

Por fim, requereu a condenação da autora nas penas por litigância de má-fé.

Contrarrazões ofertadas pela autora às fls. 172-186, pugnando pelo desprovimento da insurgência, inclusive em relação ao pleito de justiça gratuita.

Vieram-me os autos conclusos.

É o necessário escorço do processado.

VOTO

Ab initio, convém assentar que a publicação da decisão objurgada ocorreu na vigência do novo Código de Processo Civil. Logo, o caso será analisado sob a égide do referido regramento, consoante preconiza o Enunciado Administrativo n. 3 do Superior Tribunal de Justiça.

Não obstante a ausência de recolhimento do preparo, oportuno salientar que, mesmo antes da vigência da novel legislação processual civil, esta Corte já entendia que seria "dispensado o preparo nos recursos em que o mérito verse acerca da concessão ou não da gratuidade, sem prejuízo de exigência posterior" (Ato Regimental TJ n. 84/2007).

Essa interpretação foi acolhida expressamente pelo novo codex, em seu art. 99, § 7º, o qual preconiza que: "requerida a concessão de gratuidade da justiça em recurso, o recorrente estará dispensado de comprovar o recolhimento do preparo, incumbindo ao relator, neste caso, apreciar o requerimento e, se indeferi-lo, fixar prazo para realização do recolhimento".

Com escólio em tais premissas, extrai-se da jurisprudência deste Sodalício:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C PERDAS E DANOS. JUSTIÇA GRATUITA. - INTERLOCUTÓRIO DE INDEFERIMENTO NA ORIGEM.

ADMISSIBILIDADE. (1) AUSÊNCIA DE PREPARO. JUSTIÇA GRATUITA. MÉRITO RECURSAL. POSSIBILIDADE.

- Sendo o pedido de concessão das benesses da gratuidade da Justiça objeto do mérito recursal, é dado ao recorrente, por ocasião da interposição do reclamo, deixar de recolher o preparo comumente devido.

MÉRITO. (2) JUSTIÇA GRATUITA. PRESSUPOSTOS AUSENTES. PRESUNÇÃO RELATIVA DE HIPOSSUFICIÊNCIA DERRUÍDA. INDEFERIMENTO DO BENEPLÁCITO. ACERTO.

- Os benefícios da gratuidade da Justiça não devem ser concedidos se os elementos constantes dos autos derruem a relativa presunção de veracidade da declaração de hipossuficência econômico-financeira legalmente prevista em favor do pleiteante da graça.

DECISÃO MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. (TJSC, Agravo n. 0031654-06.2016.8.24.0000, da Capital, rel. Des. Henry Petry Júnior, Quinta Câmara de Direito Civil, j. 14-3-2017, grifou-se).

Vê-se, portanto, que embora ausente o preparo, o recurso merece ser admitido, ainda que parcialmente, como se verá a seguir.

Fixada esta premissa, ocupo-me, inicialmente, da análise do pedido de gratuidade judiciária.

Pois bem. Acerca da matéria em discussão, é consabido que o beneplácito da gratuidade possui estatura constitucional, cujo dispositivo assim prescreve: "o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos" (art. 5º, inciso LXXIV, da Constituição Federal).

Na visão de Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery, o benefício em destaque confere maior "operatividade ao direito constitucional de ação", ao passo que franqueia o acesso dos hipossuficientes à prestação jurisdicional (in Comentários ao Código de Processo Civil. 1ª Edição. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015, p. 470).

Segundo ensinamento de Araken de Assis, desvela-se que a benesse da justiça gratuita insere-se no contexto das políticas públicas destinadas a remover os "obstáculos inibidores ou impeditivos do acesso à Justiça, a exemplo da desigualdade social e econômica, expressadas na situação de extrema pobreza" (in Processo Civil Brasileiro. Vol. I: parte geral. 2ª Edição. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016, p. 401).

Conveniente trazer à baila, igualmente, lição doutrinária do Ministro Alexandre de Moraes, que assim refere-se ao instituto:

A Constituição Federal, ao prever o dever do Estado em prestar assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos, pretende efetivar diversos outros princípios constitucionais, tais como igualdade, devido processo legal, ampla defesa, contraditório e, principalmente, pleno acesso à Justiça. Sem assistência jurídica integral e gratuita aos hipossuficientes, não haveria condições de aplicação imparcial e equânime de Justiça (in Constituição do Brasil Interpretada e Legislação Constitucional. 8ª Edição. São Paulo: Atlas, 2011, p. 404).

Com o advento do Código de Processo Civil de 2015, o tema ganhou nova roupagem, atualizando-se as antigas disposições previstas na Lei n. 1.060/1950, cujo fragmento pertinente reproduz-se a seguir:

Art. 99. O pedido de gratuidade da justiça pode ser formulado na petição inicial, na contestação, na petição para ingresso de terceiro no processo ou em recurso.

§ 1º Se superveniente à primeira manifestação da parte na instância, o pedido poderá ser formulado por petição simples, nos autos do próprio processo, e não suspenderá seu curso.

§ 2º O juiz somente poderá indeferir o pedido se houver nos autos elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais para a concessão de gratuidade, devendo, antes de indeferir o pedido, determinar à parte a comprovação do preenchimento dos referidos pressupostos.

§ 3º Presume-se verdadeira a...

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