Acórdão Nº 0304512-69.2017.8.24.0015 do Sexta Câmara de Direito Civil, 20-10-2020

Número do processo0304512-69.2017.8.24.0015
Data20 Outubro 2020
Tribunal de OrigemCanoinhas
ÓrgãoSexta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Cível n. 0304512-69.2017.8.24.0015, de Canoinhas

Relator: Desembargador André Luiz Dacol

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE COBRANÇA C/C REPETIÇÃO DO INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. COBRANÇA INDEVIDA. SERVIÇO DE TELEFONIA. PARCIAL PROCEDÊNCIA. DANO MORAL REJEITADO.

INSURGÊNCIA DO AUTOR. PRETENSÃO AO RECONHECIMENTO DO ABALO ANÍMICO. INSUBSISTÊNCIA. COBRANÇA INDEVIDA QUE, PER SE, NÃO GERA OFENSA AOS DIREITOS DE PERSONALIDADE. AUSÊNCIA DE INSCRIÇÃO NO ROL DE INADIMPLENTES E DE COMPROVAÇÃO DE SOFRIMENTO EXTRAORDINÁRIO. SITUAÇÃO QUE NÃO CARACTERIZA DANO IN RE IPSA. ÔNUS DA PROVA DA EXISTÊNCIA DE SITUAÇÃO EXTRAORDINÁRIA QUE INCUMBIA AO REQUERENTE (ART. 373, I, DO CPC). MERO DISSABOR. ABALO ANÍMICO NÃO CONFIGURADO. DEVER DE INDENIZAR INEXISTENTE.

ALEGADA INADEQUAÇÃO QUANTO AO PRAZO PRESCRICIONAL, REFERENTE AOS VALORES INDEVIDAMENTE COBRADOS PELA COMPANHIA TELEFÔNICA RÉ. ACOLHIMENTO. PRECEDENTES DO STJ E DESTA CORTE RECONHECENDO A APLICAÇÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL DECENAL A CASOS COMO O PRESENTE, NOS TERMOS DO ART. 205 DO CC. SENTENÇA REFORMADA NO PONTO.

RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0304512-69.2017.8.24.0015, da comarca de Canoinhas 1ª Vara Cível em que é Apelante Jair Gonçalves da Silveira Batista e Apelado Oi S/A Em Recuperação Judicial.

A Sexta Câmara de Direito Civil decidiu, em sessão extraordinária virtual, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso.

Presidiu o julgamento, realizado nesta data, a Exma. Sra. Desa. Denise Volpato, com voto, e dele participou o Exmo. Sr. Des. André Carvalho.

Florianópolis, 20 de outubro de 2020.

Desembargador André Luiz Dacol

Relator


RELATÓRIO

Em atenção aos princípios da celeridade e economia processuais, adota-se o relatório da sentença, transcrito na íntegra, por refletir com fidelidade o trâmite processual na origem:

Trata-se de ação declaratória de inexigibilidade de cobrança c/c repetição do indébito, dano moral e responsabilidade civil dissuasória, com pedido de tutela de urgência ajuizada por Jair Gonçalves da Silveira Batista contra OI S.A.

Sustentou, em síntese, que a demandada está lhe cobrando serviços não contratados, citando como exemplo os denominados "OI FIXO FRANQUIA 200 MIN e 14 SOB MEDIDA DDD 30". Disse que ajuizou ação de produção antecipada de provas, sendo que a ré apresentou somente contrato de adesão genérico.

Requereu, em tutela de urgência, a interrupção imediata das cobranças indevidas e dos serviços não contratados, bem como que a ré se abstenha de suspender os serviços da linha telefônica e de inscrever seu nome em órgão restritivo de crédito. Ainda, postulou que a ré passe a cobrar pelo plano denominado Assinatura Básica Residencial. Ao final, pleiteou a procedência da ação, com a declaração da ilegalidade das cobranças referentes aos serviços não contratados, descritos no item 8, e a condenação da ré a devolver, em dobro, os valores cobrados de forma indevida. Pugnou, ainda, pela condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais. Com a inicial, juntou documentos (pp. 39/61).

O pedido de tutela de urgência foi deferido, em parte, determinando-se a suspensão da cobrança dos serviços descritos pela autora como não contratados, bem como que a ré cobre pelo plano de "assinatura básica residencial" (pp. 62/69).

Citada (p. 96), a parte ré apresentou contestação às pp. 113/138, impugnando, inicialmente, a concessão da justiça gratuita e o não comparecimento da autora na audiência de conciliação. No mérito, alegou, em suma, que não houve ilicitude nas cobranças efetuadas, pois correspondem a serviços solicitados e utilizados pela parte autora. Sustentou a inexistência de danos morais, bem como requereu a improcedência da demanda.

Intimadas para especificação das provas, as partes deixaram transcorrer o prazo in albis (143).

A sentença, lavrada às fls. 144-148, decidiu da seguinte forma:

Ante o exposto, confirmo a tutela provisória concedida às pp. 62/69 e JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados na inicial, o que faço com fundamento no art. 487, I, do Código de Processo Civil, para:

a) declarar a ilegalidade da cobrança dos valores correspondentes aos serviços de "OI FIXO FRANQUIA 200 MIN e 14 SOB MEDIDA DDD 30";

b) condenar a ré a restituir em dobro os valores efetivamente pagos pela parte autora, atualizados monetariamente pelo INPC, a contar de cada desembolso, e acrescidos de juros legais de 1% ao mês a partir da citação, com a incidência do prazo prescricional de cinco anos previsto no art. 27 do Código de Defesa do Consumidor (tais quantias deverão ser apuradas em liquidação de sentença).

Diante da sucumbência recíproca, arcam as partes com as custas (50% para cada parte), bem como honorários advocatícios que fixo em 15% (quinze por cento) sobre o valor atualizado da causa, com fulcro no art. 85, §2.º, do CPC, a serem arcados pelos litigantes na mesma proporção das despesas processuais. Suspensa a exigibilidade do pagamento com relação à parte autora em razão da gratuidade judiciária concedida à p. 66.

Inconformado com a prestação jurisdicional entregue, o autor apelou (fls. 157-187), alegando que, que ao contrário do entendimento prolatado pelo douto magistrado sentenciante, a situação narrada na exordial ensejou abalo anímico passível de ser indenizado, porquanto foi compelido a pagar pelos serviços contratados debitados em sua fatura telefônica. Asseverou que os valores exigidos indevidamente pela ré, poderiam ter sido destinados para aquisição de "alimentos, medicamentos, vestuário, etc" (fl. 163). Aduziu que, "provado o fato, não há que se exigir a prova do sofrimento, porque isso decorre das regras de experiência comum, por isso que o dano moral deverá ser considerado in re ipsa" (fl. 167).

Alternativamente, caso não reconhecido o dano moral puro, sustentou ser necessária a aplicação do dano moral como forma pedagógica, arbitrado na quantia mínima de R$ 5.000,00 (cinco mil reais).

Ainda, se insurge com relação à incidência do prazo prescricional para restituição dos valores pagos indevidamente, alegando que o entendimento jurisprudencial é pacífico no sentido de que o prazo é de 10 (dez) anos.

Por fim, pugnou pela adequação dos ônus sucumbenciais.

As contrarrazões foram apresentadas às fls. 192-212.

Este é o relatório.


VOTO

1. Compulsando os autos, observo a presença de todos os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade (intrínsecos: cabimento, interesse recursal, legitimidade recursal, inexistência de fato extintivo do direito de recorrer; e extrínsecos: regularidade formal, tempestividade), razão por que conheço do recurso.

2. Inicialmente, objetiva o apelante ver reconhecido o dever da parte ré em indenizar os danos de ordem moral sofridos em razão da cobrança de serviços de telefonia não contratados.

Adianto que, no ponto, razão não lhe assiste.

Com efeito, não se desconhece o texto esculpido no art. 39, III, do Código Consumerista, no sentido de que "é vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas: [...] enviar ou entregar ao consumidor, sem solicitação prévia, qualquer produto, ou fornecer qualquer serviço".

Referida norma visa a proteger o consumidor, vulnerável diante dos fornecedores de produtos e serviços, de excessos provenientes da atividade mercantilista, tais como a cobrança repentina de mercadoria não solicitada; a violação da privacidade, de forma a obter e expor dados pessoais sem autorização; o risco à honra subjetiva, em razão da iminência da utilização do produto por terceiros, entre outros.

No presente caso, restou incontroverso o fato de que o autor não contratou o plano de telefonia denominado "OI FIXO FRANQUIA 200 MIN e 14 SOB MEDIDA DDD 30", tendo recebido diversas faturas de cobrança. Forte nessa situação, o juízo a quo declarou os débitos inexistentes e condenou a empresa de telefonia ré à devolução, em dobro, dos valores cobrados indevidamente.

Contudo, malgrado o desconforto vivenciado, a situação encerra-se nesse limite.

Digo isso porque o autor não teve seu nome desabonado junto aos órgãos de proteção ao crédito, de modo que, não se tratando de dano in re ipsa, para caracterização do abalo moral é preciso que a situação transcenda o mero aborrecimento.

A rigor, tendo-se que a parte apelante liquidou todas as faturas que lhe foram remetidas, possivelmente, foi o que impediu que seu nome fosse negativado. No entanto, ao que parece, ficou à sorte da resolução do imbróglio na via judicial, posto não ter comprovado, minimamente, a sua alegada tentativa incessante em se livrar das cobranças, nem mesmo que estas tenham sido feitas pela ré de forma invasiva ou inoportuna.

Logo, não se verifica, na situação em comento, o exercício de outras condutas por parte da ré capazes de ensejar situação de constrangimento ou perturbação excessiva à parte autora/apelante, sendo cediço que para haver a configuração do abalo anímico, a parte autora deveria ter feito prova de que o fato causou grande repercussão e ofensa à sua imagem ou induziu algum prejuízo significativo, o que não está presente nos autos.

Mister considerar, aliás, que as partes já possuíam relação de consumo pelo mesmo produto (linha de telefonia fixa), embora por contrato diverso, o que de certa forma ameniza o desconforto vivenciado.

Repiso, em que pese se reconheça o dissabor vivido pela parte autora, bem como que a ré deveria ter agido com cautela, certificando-se dos valores cobrados, tais fatos, per se, não geram dano moral passível de reparação. É preciso dizer que a caracterização do dano moral exige a existência de agressão para além da naturalidade dos fatos cotidianos

Ora, é pacífico tanto na doutrina como na jurisprudência de que não é qualquer dissabor comezinho que acarreta o dever de indenizar, sob pena de fomentar-se...

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