Acórdão Nº 0304638-79.2019.8.24.0038 do Quarta Câmara de Direito Público, 06-10-2022

Número do processo0304638-79.2019.8.24.0038
Data06 Outubro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0304638-79.2019.8.24.0038/SC

RELATOR: Desembargador DIOGO PÍTSICA

APELANTE: MUNICÍPIO DE JOINVILLE APELANTE: ESTADO DE SANTA CATARINA APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA APELADO: SANTOS SILVEIRA CONSTRUTORA E INCORPORADORA LTDA

RELATÓRIO

Ministério Público do Estado de Santa Catarina e Município de Joinville interpuseram apelação contra sentença que, no mandado de segurança impetrado por Santos Silveira Construtora e Incorporadora Ltda, contra ato atribuído ao Secretário Municipal de Meio Ambiente, e, em acórdão, decidiu (Evento 54):

Nesse contexto, considerando que: a) o imóvel objeto do litígio está inserido em área urbana totalmente consolidada, que não se trata de área de interesse ecológico relevante e que o imóvel não está em área de risco (fl. 24); b) a Lei Estadual n. 16.342/14 (Código Estadual do Meio Ambiente) estabeleceu que não seriam consideradas áreas de preservação permanente "as faixas marginais de cursos d'água não naturais, devido à realização de atividades de canalização, tubulação ou incorporação de cursos d'água a sistemas produtivos ou de drenagem urbana ou rural; e c) os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, nego provimento aos recursos.

IV - Da conclusão

Por esses motivos, é de ser mantida a sentença que concedeu a segurança.

Irresignado, o Parquet lançou mão de recurso especial e recurso extraordinário, no qual alegou violação ao artigo 4º, I, "a", da Lei n. 12.651/2012 (Eventos 102-103).

Ato contínuo, a 2ª Vice-Presidência do TJSC ordenou a devolução dos autos a este órgão fracionário, por decorrência do julgamento do leading case atrelado ao Tema n. 1.010, conclamando, então, a realização do juízo de retratação em relação ao desfecho decidido anteriormente (Evento 124):

Não obstante esta 2ª Vice-Presidência, sob o prisma da segurança jurídica e da estabilidade das decisões judiciais tenha, via de regra, mas a depender do caso concreto, adotado o entendimento de aguardar o trânsito em julgado para fins de aplicação da proposição jurídica firmada em regime de repercussão geral ou de recursos repetitivos, deliberou-se, conjuntamente com os membros do Grupo de Câmaras de Direito Público, nos termos do autos n. 0017374-24.2022.8.24.0710 (SEI), por levantar o sobrestamento dos processos envolvendo os seguintes temas, diante da remota possibilidade de alteração das decisões:

Repercussão-Geral (STF):

- Tema 247;

- Tema 827;

Recursos Repetitivos (STJ):

- Tema: 862;

- Tema 911;

- Tema 1010 e;

- Tema 1044.

Por essa razão, determino o levantamento do sobrestamento e, antes de analisar eventual adequação do acórdão impugnado à tese firmada em regime de repercussão reconhecida e/ou recurso repetitivo, intimem-se as partes para se manifestarem, no prazo de 10 (dez) dias, a respeito de eventuais reflexos do julgamento do tema gerador do dessobrestamento na hipótese em apreço, em cumprimento ao disposto nos artigos 10 e 933 do Código de Processo Civil.

Após, retornem os autos conclusos.

Intimados os litigantes, o Ministério Público e a municipalidade se manifestaram (Eventos 134-135), já o impetrante sobejou silente (Evento 126).

Baixaram os autos para juízo de adequação.

É o relatório.

VOTO

A temática sub examine acomoda-se à intelecção do disposto no artigo 1.030, II, da lei adjetiva civil, tutelando procedimento a ser seguido em feitos que angularizam questões estatizadas pelas Cortes Superiores.

Anoto que a lide sobejou sobrestada até o Superior Tribunal de Justiça resolver o mérito dos REsp n. 1.770.760/SC, n. 1.770.808/SC e n. 1.770967/SC, irradiando efeitos para milhares de causas que aguardavam o julgamento definitivo do caso paradigmático.

Eis o deliberado no Tema Repetitivo n. 1.010 da Corte da Cidadania:

"Na vigência do novo Código Florestal (Lei n. 12.651/2012), a extensão não edificável nas Áreas de Preservação Permanente de qualquer curso d'água, perene ou intermitente, em trechos caracterizados como área urbana consolidada, deve respeitar o que disciplinado pelo seu art. 4º, caput, inciso I, alíneas a, b, c, d e e, a fim de assegurar a mais ampla garantia ambiental a esses espaços territoriais especialmente protegidos e, por conseguinte, à coletividade" (Tema n. 1.010/STJ).

A propósito, extraio do despacho que ordenou o retorno da actio a este Órgão Julgador:

O Recurso Especial versa sobre questão de caráter repetitivo afetada pelo Superior Tribunal de Justiça ao julgamento do TEMA 1.010/STJ, assim delimitado: "Extensão da faixa não edificável a partir das margens de cursos d'água naturais em trechos caracterizados como área urbana consolidada: se corresponde à área de preservação permanente prevista no art. 4°, I, da Lei n. 12.651/2012 (equivalente ao art. 2°, alínea 'a', da revogada Lei n. 4.771/1965), cuja largura varia de 30 (trinta) a 500 (quinhentos) metros, ou ao recuo de 15 (quinze) metros determinado no art. 4°, caput, III, da Lei n. 6.766/1979."

A proposta de afetação da matéria, apresentada por este Tribunal de Justiça com a formação do Grupo de Representativos n. 7, foi acolhida pela Primeira Seção do STJ, em acórdão relatado pelo Ministro Benedito Gonçalves, que ordenou a "a suspensão de todos os processos pendentes, individuais ou coletivos, que versem sobre a questão e tramitem no território nacional, nos termos do art. 1.037, II, do CPC/2015" (ProAfR no REsp 1.770.760/SC, j. 30.4.2019).

E, em 28.4.2021, foi assentada tese jurídica no sentido de que:

RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. AMBIENTAL. CONTROVÉRSIA A ESPEITO DA INCIDÊNCIA DO ART. 4º, I, DA LEI N. 12.651/2012 (NOVO CÓDIGO FLORESTAL) OU DO ART. 4º, CAPUT, III, DA LEI N. 6.766/1979 (LEI DE PARCELAMENTO DO SOLO URBANO). DELIMITAÇÃO DA EXTENSÃO DA FAIXA NÃO EDIFICÁVEL A PARTIR DAS MARGENS DE CURSOS D'ÁGUA NATURAIS EM TRECHOS CARACTERIZADOS COMO ÁREA URBANA CONSOLIDADA.

1. Nos termos em que decidido pelo Plenário do STJ na sessão de 9/3/2016, aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma nele prevista (Enunciado Administrativo n. 3).

2. Discussão dos autos: Trata-se de mandado de segurança impetrado contra ato de Secretário Municipal questionando o indeferimento de pedido de reforma de imóvel derrubada de casa para construção de outra) que dista menos de 30 (trinta) metros do Rio Itajaí-Açu, encontrando-se em Área de Preservação Permanente urbana. O acórdão recorrido negou provimento ao reexame necessário e manteve a concessão da ordem a fim de que seja observado no pedido administrativo a Lei de Parcelamento do Solo Urbano (Lei n. 6.766/1979), que prevê o recuo de 15 (quinze) metros da margem do curso d´água.

3. Delimitação da controvérsia: Extensão da faixa não edificável a partir das margens de cursos d'água naturais em trechos caracterizados como área urbana consolidada: se corresponde à área de preservação permanente prevista no art. 4°, I, da Lei n. 12.651/2012 (equivalente ao art. 2°, alínea "a", da revogada Lei n. 4.771/1965), cuja largura varia de 30 (trinta) a 500 (quinhentos) metros, ou ao recuo de 15 (quinze) metros determinado no art. 4°, caput, III, da Lei n. 6.766/1979.

4. A definição da norma a incidir sobre o caso deve garantir a melhor e mais eficaz proteção ao meio ambiente natural e ao meio ambiente artificial, em cumprimento ao disposto no art. 225 da CF/1988, sempre com os olhos também voltados ao princípio do desenvolvimento sustentável (art. 170, VI,) e às funções social e ecológica da propriedade.

5. O art. 4º, caput, inciso I, da Lei n. 12.651/2012 mantém-se hígido no sistema normativo federal, após os julgamentos da ADC n. 42 e das ADIs ns. 4.901, 4.902, 4.903 e 4.937.

6. A disciplina da extensão das faixas marginais a cursos d'água no meio urbano foi apreciada inicialmente nesta Corte Superior no julgamento do REsp 1.518.490/SC, Relator Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, DJe de 15/10/2019, precedente esse que solucionou, especificamente, a antinomia entre a norma do antigo Código Florestal (art. 2º da Lei n. 4.771/1965) e a norma da Lei de Parcelamento do Solo Urbano (art. 4º, III, da Lei n. 6.766/1976), com a afirmação de que o normativo do antigo Código Florestal é o que deve disciplinar a largura mínima das faixas marginais ao longo dos cursos d'água no meio urbano. Nesse sentido: Resp 1.505.083/SC, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, Dje 10/12/2018; AgInt no REsp 1.484.153/SC, Rel. Min. Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe 19/12/2018; REsp 1.546.415/SC, Rel. Min. Og Fernandes, Segunda Turma, DJe 28/2/2019; e AgInt no REsp 1.542.756/SC, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe 2/4/2019.

7. Exsurge inarredável que a norma inserta no novo Código Florestal (art. 4º, caput, inciso I), ao prever medidas mínimas superiores para as faixas marginais de qualquer curso d'água natural perene e intermitente, sendo especial e específica para o caso em face do previsto no art. 4º, III, da Lei n. 6.766/1976, é a que deve reger a proteção das APPs ciliares ou ripárias em áreas urbanas consolidadas, espaços territoriais especialmente protegidos (art. 225, III, da CF/1988), que não se condicionam a fronteiras entre o meio rural e o urbano.

8. A superveniência da Lei n. 13.913, de 25 de novembro de 2019, que suprimiu a expressão "[...] salvo maiores exigências da legislação específica." do inciso III do art. 4º da Lei n. 6.766/1976, não afasta a aplicação do art. 4º, caput, e I, da Lei n. 12.651/2012 às áreas urbanas de ocupação consolidada, pois, pelo critério da especialidade, esse normativo do novo Código Florestal é o que garante a mais ampla proteção ao meio ambiente, em áreas urbana e rural, e à coletividade.

9. Tese fixada - Tema 1010/STJ: Na vigência do novo Código Florestal (Lei n. 12.651/2012), a extensão não edificável nas Áreas de Preservação Permanente de qualquer curso d'água, perene ou intermitente, em trechos caracterizados como área urbana consolidada, deve respeitar o que...

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