Acórdão Nº 0304651-31.2016.8.24.0023 do Terceira Câmara de Direito Civil, 20-09-2022

Número do processo0304651-31.2016.8.24.0023
Data20 Setembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0304651-31.2016.8.24.0023/SC

RELATOR: Desembargador SÉRGIO IZIDORO HEIL

APELANTE: PATRICK SELBACH ADVOGADO: MICHELE DO CARMO LAMAISON (DPE) APELADO: ELI TERESINHA LEAL ADVOGADO: JACKSON JOSE BLEIXUVEHL (OAB SC044172)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível interposta por PATRICK SELBACH contra a sentença proferida pelo MM. Juízo da 5ª Vara Cível da comarca da Capital que, no autos da "ação de obrigação de fazer" ajuizada por ELI TERESINHA LEAL, assim decidiu, verbis:

Ante o exposto, julgo procedente o pedido formulado por Eli Teresinha Leal em face de Patrick Selbach para reintegrar a autora na posse do imóvel descrito na inicial, localizado na Servidão Sargento Maurílio Gonçalves Cabral, n.º 157, neste Município e Comarca. Outrossim, resolvo o mérito da causa na forma do art. 487, I, do Código de Processo Civil.

Expeça-se mandado de reintegração de posse, com (trinta) dias para desocupação voluntária.

Condeno o réu ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios em favor do procurador da autora, que fixo em R$ 1.000,00 (mil reais), na forma do art. 85, §§ 2º e 8º, do Código de Processo Civil, suspensa a exigibilidade, já que o réu é assistido pela Defensoria Pública. (evento 63, grifos do original).

Nas razões sustenta, em sede de preliminar, sua ilegitimidade para compor o polo passivo da lide, assim como a inadequação da via eleita pela parte demandante. No mérito, defende que: o contrato particular de compra e venda de imóvel não é suficiente para provar a posse da autora; a mãe do réu foi ouvida na qualidade de informante, sem prestar compromisso legal de falar a verdade e seu depoimento carece de credibilidade; não há recibo, prova de transferência ou comprovante de depósito que deem conta do suposto acordo a que se refere a requerente; sempre esteve da posse do imóvel, detendo sua posse legítima. Subsidiariamente, pugna pelo recebimento das benfeitorias realizadas no imóvel (evento 75).

Contrarrazões ao evento 83.

É o relatório.

VOTO

De início, vale esclarecer que tanto a prolação da decisão recorrida quanto a interposição do recurso sucederam à entrada em vigor do Novo Código de Processo Civil (Lei n. 13.105/2015), de modo que os pressupostos de admissibilidade recursal devem observar o regramento disposto no novo diploma, consoante disposto no Enunciado Administrativo n. 3 do STJ.

Dito isso, porque preenchidos os requisitos os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso e passo a análise de suas razões.

Arguiu o recorrente, em sede de preliminar, a tese de inadequação da via eleita, defendendo que se trata a exordial de uma verdadeira ação de imissão na posse, faltando à autora o título de domínio do bem sub judice, motivo pelo qual o feito deve ser extinto sem julgamento do mérito. Além do mais, pugna o reconhecimento de sua ilegitimidade passiva.

Todavia, tais asserções não merecem guarida.

Isso porque, em análise aos autos denota-se que o contexto fático narrado na petição inicial revela de maneira clara a pretensão da parte autora que, defendendo seu direito de posse baseado no contrato de compra e venda entabulado com a genitora do demandado, busca obter o imóvel que o réu ocupa por posse injusta, sustentando que este não é seu verdadeiro possuidor.

Nesse sentido, oportuna a lição de Nelson Nery Júnior:

"7. Caráter possessório da ação. O que determina o caráter possessório de uma ação não é somente o pedido, mas a causa de pedir. Se o pedido for a posse, mas a causa de pedir for a propriedade, a ação é real. Somente será possessória a ação que tenha como fundamento (causa de pedir) e como pedido a posse (Nery. Proteção judicial da posse, RDPriv 7/106). Quando ambos os litigantes disputam a posse com fundamento na propriedade, a ação não é possessória, mas petitória. Daí a falsa polêmica que durante décadas grassou na doutrina e jurisprudência brasileiras sobre a disputa da posse com base na propriedade e a exceção de domínio, como se se tratasse de ação possessória. V., abaixo, coment. 16 CC 1210." (Nelson Nery Junior, Rosa Maria de Andrade Nery. 3. ed. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2019.)

Isto é, a demandante comprovou que, na data de 04/09/2015 entabulou contrato de compra e venda de bem imóvel com a genitora do ora recorrente, cujo objeto é a posse do imóvel situado na Servidão Sargento Maurílio Gonçalves Cabral, n.º 157, bairro Ingleses, nesta cidade e comarca (evento 1, OUT6).

Todavia, mesmo tendo ciência da alienação do bem e já tendo sido notificado extrajudicialmente, o réu recusa-se a desocupar o imóvel.

Ora, consoante dicção do art. 1.210 do Código Civil e do art. 560 do Código de Processo Civil, a ação de reintegração de posse possui natureza eminentemente possessória, não só em razão do pedido que lhe é inerente, mas também em razão da própria causa de pedir. Logo, em demandas dessa natureza, tanto a causa de pedir quanto o pedido estão calcados no fato jurídico posse.

Desta feita, no caso em apreço, verifica-se que o fato da presente ação ter sido denominada "ação de obrigação de fazer com pedido de tutela antecipada" é irrelevante, tendo em vista a possibilidade de conversão para ação possessória, como consignado pelo Juízo a quo, in verbis:

Considerando que o fim almejado pela autora é a obtenção da posse do imóvel adquirido e que, ademais, a exordial preenche os requisitos do art. 561 do Código de Processo Civil, analiso-a como ação possessória, pois consoante já consignado na decisão que saneou o feito (pág. 61-2), não há como se apegar ao excesso de formalismo defendido pelo réu, tanto que este reconhece que o que a autora busca é a proteção possessória.

Assim, não há falar em inadequação da via eleita, razão pela qual passo ao exame do mérito. (evento 63).

De mais a mais, o art. 554 do Código de Processo Civil é claro ao dispor que "A propositura de uma ação possessória em vez de outra não obstará a que o juiz conheça do pedido e outorgue a proteção legal correspondente àquela cujos pressupostos estejam provados.".

Nesse sentido, mutatis mutandis, extrai-se dos precedentes desta Corte de Justiça:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE IMISSÃO DE POSSE E RECONVENÇÃO. PROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS DA AÇÃO PRINCIPAL E IMPROCEDÊNCIA DOS PLEITOS DA LIDE SECUNDÁRIA. INSURGÊNCIA DOS DEMANDADOS/RECONVINTES. PRELIMINARES. 1) ALEGADO CERCEAMENTO DE DEFESA DECORRENTE DO JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. INSUBSISTÊNCIA. PRETENDIDA PRODUÇÃO DE PROVA TESTEMUNHAL QUE NÃO SE JUSTIFICA. ELEMENTOS DOS AUTOS SUFICIENTES À FORMAÇÃO DO LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO DO JUÍZO. PRELIMINAR AFASTADA. 2) ALMEJADA EXTINÇÃO SEM JULGAMENTO DE MÉRITO (ART. 267, VI, DO CPC) POR INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. ASSERÇÃO DE QUE DEVERIA TER SIDO AJUIZADA AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. INACOLHIMENTO. ANÁLISE DO CONTEXTO FÁTICO E PLEITOS EXORDIAIS EM QUE O DETENTOR DO DOMÍNIO DEFENDE SUA POSSE. NOMENCLATURA DADA À AÇÃO QUE NÃO VINCULA O JULGADOR. POSSIBILIDADE DE CONVERSÃO DA IMISSÃO EM OUTRA DEMANDA DE NATUREZA PETITÓRIA. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA INSTRUMENTALIDADE E CELERIDADE PROCESSUAIS. PRECEDENTES DESTA CORTE DE JUSTIÇA. MÉRITO. ASSERÇÃO DE QUE OS DEMANDADOS SÃO OS VERDADEIROS PROPRIETÁRIOS DO BEM LITIGADO E QUE A AUTORA...

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