Acórdão Nº 0304677-96.2018.8.24.0075 do Quarta Câmara de Direito Comercial, 02-08-2022

Número do processo0304677-96.2018.8.24.0075
Data02 Agosto 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0304677-96.2018.8.24.0075/SC

RELATOR: Desembargador TULIO PINHEIRO

APELANTE: GHF COMERCIO DE COMBUSTIVEIS EIRELI (AUTOR) APELANTE: BANCO DO BRASIL S.A. APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

No Juízo da 2ª Vara Cível da Comarca de Tubarão, GHF COMERCIO DE COMBUSTIVEIS EIRELI ajuizou ação revisional em desfavor de BANCO DO BRASIL S.A., objetivando a revisão dos contratos vinculados à Conta Corrente n. 9277-0 da Agência n. 3540-8 (eventos 1 e 2).

Foram acostados ao feito o Contrato de Abertura de Crédito em Conta Corrente - Conta Garantida n. 354.002.302 (evento 2, documento 79), os Contratos de Abertura de Crédito BB Giro Empresa Flex ns 354.002.230 (evento 2, documento 73), 354.001.920 (evento 2, documento 75), 354.001.944 (evento 2, documento 77) 354.002.998 (evento 2, documento 81), 354.003.220 (evento 2, documento 84), 354.003.425 (evento 2, documento 85), e a Cédula de Crédito Bancário n. 354.003.369 (evento 2, documento 83).

Após emenda (evento 9), Sua Excelência recebeu a inicial e indeferiu a antecipação de tutela (evento 11).

Sobreveio contestação (evento 21), com a juntada de documentos, a saber, o Contrato de Adesão a Produtos de Pessoa Jurídica n. 354.001.563 (evento 21, documentos 107/108), a Cédula de Crédito Bancário n. 354.003.369 (evento 21, documento 109), os Contratos de Abertura de Crédito - BB Giro Empresa Flex ns. 354.001.944 (evento 21, documento 110), 354.002.230 (evento 21, documento 111), 354.002.998 (evento 21, documento 113), 354.003.220 (evento 21, documento 114) e 354.003.425 (evento 21, documento 116), e o Contrato de Abertura de Crédito em Conta Corrente - Conta Garantida n. 354.002.302 (evento 21, documento 112).

Houve réplica (evento 25).

Após, a MM.ª Juíza Lara Maria Souza da Rosa Zanotelli sentenciou o feito, de modo a julgar parcialmente procedente a demanda (evento 32), o que fez nos seguintes termos:

(...) Ante o exposto, com fulcro no art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados por KARLIN KONIG DA SILVA em face de BANCO ITAÚ UNIBANCO S/A, para tão somente promover as seguintes adequações:

(1) no tocante ao Contrato de Adesão a Produtos de Pessoa Jurídica nº 354.001.563 (ps. 1.255/1.256): (a) Mantenho as taxas de juros aplicadas pela casa bancária para cada mês em que efetivamente utilizado o cheque especial, salvo se a taxa aplicada for superior a três vezes o valor da taxa média de juros divulgada pelo Bacen para a operação cheque especial - pessoa física e para o efetivo mês de utilização do cheque especial, ocasião em que então esta última deverá prevalecer; (b) afasto a capitalização de juros; (c) afasto a aplicação da Tabela Price; (d) vedo a incidência cumulada da comissão de permanência com demais encargos de mora e (e) determino a aplicação do INPC como índice de correção monetária;

(2) no tocante aos contratos Abertura de Crédito - BB Giro Empresa Flex nº 354.002.230 (ps. 892-905); Abertura de Crédito - BB Giro Empresa Flex nº 354.001.944 (ps. 966-975); Abertura de Crédito em Conta Corrente Garantida nº 354.002.302 (ps. 1.002-1.012) e Abertura de Crédito - BB Giro Empresa Flex nº 354.003.369 (ps. 1.055-1.067): (a) afasto a aplicação da Tabela Price; (b) vedo a incidência cumulada da comissão de permanência com demais encargos de mora e (c) determino a aplicação do INPC como índice de correção monetária;

(3) no tocante aos contratos Abertura de Crédito - BB Giro Empresa Flex nº 354.001.920 (ps. 927-941); Abertura de Crédito - BB Giro Empresa Flex nº 354.002.998 (ps. 1.029-1.043); Abertura de Crédito - BB Giro Empresa Flex nº 354.003.220 (ps. 1.074-1.089) e Abertura de Crédito - BB Giro Empresa Flex nº 354.003.425 (ps. 1.098-1.117): (a) afasto a aplicação da Tabela Price e (b) determino a aplicação do INPC como índice de correção monetária.

Condeno o réu à devolução, de forma simples, dos valores eventualmente cobrados em excesso, calculados com base na presente decisão, após compensação com os débitos existentes.

Considerando a sucumbência recíproca, condeno as partes ao pagamento, pro rata, na proporção de de 60% (sessenta por cento) pela autora e 40% (quarenta por cento) pela ré, das custas e despesas processuais, além de honorários advocatícios de sucumbência, em igual proporção, e que fixo em 15% (quinze por cento) do valor atualizado da causa, com amparo no art. 85, § 2º, do Código de Processo Civil. (...) (destaques do original).

Irresignada, a financeira ré apelou. Nas razões do seu recurso, defendeu a impossibilidade de revisar contrato livremente pactuado. Sustentou, ainda, a legalidade da capitalização de juros, da tabela price e da comissão de permanência, bem como aduziu a impropriedade da condenação a ressarcir o indébito. Ao final, buscou a inversão do ônus sucumbencial e a redução dos honorários advocatícios, além de ter prequestionado dispositivos legais (evento 37).

Com as contrarrazões da parte autora (evento 41), subiram os autos a esta Corte.

Na sequência, a parte autora recorreu da sentença por apelação. Nas razões do seu reclamo, requereu a limitação dos juros remuneratórios à taxa média de mercado nos Contratos ns. 354.002.230, 354.001.944, 354.002.998, 354.003.369 e 354.003.220 e o expurgo da capitalização de juros nos Contratos ns. 354.002.230, 354.001.944, e 354.003.369. Sustentou, ainda, a necessidade de descaracterizar a mora e de devolver em dobro dos valores cobrados em excesso. Por fim, buscou a condenação da parte ré ao pagamento dos ônus sucumbenciais, bem como a majoração dos honorários advocatícios.

O prazo para oferta de contrarrazões pela parte acionada transcorreu in albis.

VOTO

O apelo será analisado por tópicos.

Da revisão das cláusulas contratuais.

Alega o banco apelante a impossibilidade de revisão do contrato diante da inexistência de abusividades no contrato.

Entretanto, em que pesem os argumentos despendidos pela casa bancária, não proceder à análise revisional significa afastar da apreciação do Poder Judiciário o exame da abusividades praticadas em desfavor do consumidor, implicando não só a violação aos direitos fundamentais de acesso à justiça (art. 5º, inc. XXXV, CF), como também à proteção ao consumidor (art. 5º, XXXII, CF).

Ademais, cumpre recordar que o advento do Código de Defesa do Consumidor (com incidência reconhecida na sentença e não recorrida pela parte ré), promulgado com espeque no art. 5º, inc. XXXII, da Constituição Federal, inseriu no ordenamento exceções ao princípio do pacta sunt servanda no intuito de oportunizar o reequilíbrio contratual entre consumidor e fornecedor.

Neste trilhar, preconiza o art. 6º, inc. V, do mencionado estatuto:

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

(...)

V - a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas;

No caso, cediço que os contratos bancários são tipicamente de adesão, sendo o consumidor obrigado a pactuar nos termos preestabelecidos pela instituição financeira se quiser usufruir dos serviços bancários. Bem por isso, referendou a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça a tese de que a intangibilidade contratual deve ser mitigada em cotejo aos princípios da função social do contrato, da boa-fé objetiva e do dirigismo contratual, inclusive para as avenças bancárias (Confira-se: AgRg no AREsp 32.884, rel. Min. Raul Araújo).

Neste quadro, todo e qualquer contrato caracterizado pela relação de consumo pode ser modificado pelo juiz, desde que as cláusulas avençadas estejam em confronto com as normas protetivas arroladas no Estatuto Consumerista.

Por oportuno, frisa-se que não há violação a direito adquirido ou ato jurídico perfeito perante a revisão de cláusulas abusivas ou ilegais, pois, "conforme a norma do art. 6º, inciso V, do Código de Defesa do Consumidor e a teoria moderna, devem ser relativizados para possibilitar a alteração ou declaração de nulidade das cláusulas contratuais abusivas ou ilegais que submetam alguma das partes ou que tenham sido impostas ao livre arbítrio do hipersuficiente sem a manifestação de vontade do adverso." (Apelação Cível n. 2010.012256-5, rel. Des. José Carlos Carstens Köhler).

Portanto, não há qualquer óbice à revisão judicial ora pleiteada.

Da aplicação da presunção de veracidade.

Compulsando os autos, verifica-se que, muito embora intimada a apresentar cópia do inteiro teor do Contrato de Adesão a Produtos de Pessoa Jurídica, consubstanciado (quanto à questão do mútuo vinculado) no Contrato de Abertura de Crédito em Conta Corrente - Cheque Especial (evento 11), a financeira ré quedou-se inerte à totalidade do comando.

Diante disso, não há qualquer comprovação nos autos quanto à contratação expressa da totalidade das cláusulas e dos encargos afirmados pelos litigantes no debate instaurado na lide.

Assim, a aplicação da presunção de veracidade estampada no art. 400, inc. I, do CPC (art. 359, inc. I, na codificação processual anteriormente vigente), naquilo que for pertinente, é a medida a se impor, sobretudo porque, como bem anotado pelo Exmo. Sr. Des. Paulo Roberto Camargo Costa, em acórdão de sua relatoria, em entendimento que continua plenamente válido a despeito de vazado ainda sob a égide da Lei Adjetiva Civil de 1973, "a falta da juntada do contrato de financiamento traz indícios de que o consumidor não tomou conhecimento do conteúdo de suas cláusulas e, por isso, não podem ser tidas como pactuadas nos parâmetros afirmados e não comprovados pelo [banco] Apelante" (Apelação Cível n. 2011.059248-0, j. em 6.12.2012).

Feita esta digressão, passa-se ao exame das teses recursais.

Dos juros remuneratórios.

Pleiteia o polo requerente a limitação dos juros remuneratórios às médias de mercado nos Contratos ns. 354.002.230, 354.001.944, 354.002.998, 354.003.369 e 354.003.220.

Sua pretensão não merece acolhida.

Com efeito, a jurisprudência vem admitindo variação acima da taxa média de mercado, desde que não iníqua ou abusiva, objetivando conservar a natureza...

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