Acórdão Nº 0304738-55.2014.8.24.0023 do Terceira Câmara de Direito Comercial, 26-11-2020

Número do processo0304738-55.2014.8.24.0023
Data26 Novembro 2020
Tribunal de OrigemCapital
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão


ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE JUSTIÇA


Apelação Cível n. 0304738-55.2014.8.24.0023, da Capital

Relator: Desembargador Tulio Pinheiro

APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS DE TERCEIRO. INSURGÊNCIA CONTRA PENHORA REALIZADA VIA BACENJUD SOBRE NUMERÁRIO (R$ 7.507,64 [SETE MIL, QUINHENTOS E SETE REAIS E SESSENTA E QUATRO CENTAVOS) DEPOSITADO EM CONTA CORRENTE DE TITULARIDADE DO CÔNJUGE DA EMBARGANTE. EXECUÇÃO DE NOTAS PROMISSÓRIAS VINCULADAS À INSTRUMENTO DE CONFISSÃO DE DÍVIDA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA.

RECURSO DA PARTE EMBARGANTE.

PRELIMINAR. ALEGADA NULIDADE DO DECISUM, POR CERCEAMENTO DE DEFESA. ANÁLISE DESPICIENDA. JULGAMENTO DE MÉRITO FAVORÁVEL À PARTE À QUAL APROVEITARIA EVENTUAL RECONHECIMENTO DE NULIDADE. EXEGESE DO ARTIGO 282, § 2º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL.

MÉRITO. ALEGADA NULIDADE DA FIANÇA PRESTADA PELO CÔNJUGE DA EMBARGANTE NO INSTRUMENTO DE CONFISSÃO DE DÍVIDA, POR AUSÊNCIA DE OUTORGA UXÓRIA, E, POR CONSEGUINTE, INEXIGIBILIDADE DAS NOTAS PROMISSÓRIAS VINCULADAS AO CONTRATO. TESE RECHAÇADA NA SENTENÇA COMBATIDA, AO FUNDAMENTO DE QUE OS TÍTULOS CAMBIAIS GOZAM DE AUTONOMIA EM RELAÇÃO AO NEGÓCIO JURÍDICO QUE LHES DEU CAUSA. REFORMA NECESSÁRIA. NOTAS PROMISSÓRIAS EMITIDAS COM O ESCOPO DE REPRESENTAR AS PARCELAS DA DÍVIDA RECONHECIDA NO INSTRUMENTO DE CONFISSÃO, BEM COMO DE GARANTIR O PAGAMENTO DO DÉBITO. DISPOSIÇÃO EXPRESSA NO INSTRUMENTO CONTRATUAL NESSE SENTIDO. VINCULAÇÃO DAS CAMBIAIS AO PACTO EVIDENCIADA. CIRCUNSTÂNCIA QUE EMBORA NÃO AFASTE, DE ANTEMÃO, A EXEQUIBILIDADE DAS NOTAS PROMISSÓRIAS, SUBTRAI-LHES OS ATRIBUTOS DE AUTONOMIA E ABSTRAÇÃO. SUJEIÇÃO DA EXIGIBILIDADE DAS CÁRTULAS À VERIFICAÇÃO DA HIGIDEZ DAS OBRIGAÇÕES RECONHECIDAS NO CONTRATO SUBJACENTE. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS. CASO DOS AUTOS EM QUE A OBRIGAÇÃO DO CÔNJUGE EXECUTADO CONSUBSTANCIA-SE EM FIANÇA PRESTADA NO INSTRUMENTO DE CONFISSÃO DE DÍVIDA. GARANTIA PESSOAL, NO ENTANTO, DESPROVIDA DE OUTORGA UXÓRIA. ATO NULO. EXEGESE DO ARTIGO 235, INCISO III, DO CÓDIGO CIVIL DE 1916, APLICÁVEL AO CASO, PORQUANTO VIGENTE À ÉPOCA, E DA SÚMULA N. 332 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. OBRIGAÇÃO SUBJACENTE ÀS NOTAS PROMISSÓRIAS INEXIGÍVEL. SITUAÇÃO QUE IMPLICA A INEXEQUIBILIDADE DOS TÍTULOS CAMBIAIS VINCULADOS À AVENÇA. PRECEDENTES. LEVANTAMENTO DO ATO CONSTRITIVO IMPUGNADO QUE SE IMPÕE. SENTENÇA REFORMADA, PARA SE JULGAR PROCEDENTES OS EMBARGOS, PREJUDICADAS AS DEMAIS TESES RECURSAIS. ÔNUS SUCUMBENCIAIS INVERTIDOS, SEM A FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS RECURSAIS, POR SER A SENTENÇA ANTERIOR À VIGÊNCIA DO CPC/2015.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0304738-55.2014.8.24.0023, da Comarca da Capital (6ª Vara Cível), em que é Apelante Ana Maria Brazil Silva, e Apelada Sidersul - Produtos Siderúrgicos Ltda.:

A Terceira Câmara de Direito Comercial decidiu, por unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe provimento, para reformar a sentença, de modo a julgar procedentes os embargos de terceiro, invertidos os ônus sucumbenciais. Custas legais.

Participaram do julgamento, realizado nesta data, os Exmos. Srs. Des. Sebastião César Evangelista e Des. Gilberto Gomes de Oliveira.

Florianópolis, 26 de novembro de 2020.



Desembargador Tulio Pinheiro

PRESIDENTE E RELATOR


RELATÓRIO

Perante o Juízo da 6ª Vara Cível da Comarca da Capital, Ana Maria Brazil Silva ajuizou embargos de terceiro em face de Sidersul - Produtos Siderúrgicos Ltda., objetivando, em suma, o levantamento de penhora efetivada, via Bacenjud, nos autos da ação de execução registrada sob o n. 023.99.039504-1, sobre o valor de R$ 7.507,64 (sete mil, quinhentos e sete reais e sessenta e quatro centavos), depositado em conta corrente de seu marido, Jarbas Ferreira da Silva Filho, com o qual é casada sob o regime de comunhão universal de bens.

Na peça inicial, alega, em síntese: a) nulidade do instrumento de confissão de dívida no qual foi reconhecido o débito executado, ante a falsidade material do documento (adulterações em assinaturas e no próprio teor do instrumento contratual); b) nulidade da fiança prestada por seu marido no contrato, em razão da ausência de outorga uxória; e c) invalidade das notas promissórias emitidas para o pagamento da dívida confessada, haja vista a vinculação dos títulos ao instrumento contratual.

Em impugnação aos embargos (fls. 40/46), a embargada confrontou as teses aventadas na inicial.

Na sequência, a MM.ª Juíza Daniela Vieira Soares sentenciou o feito de maneira antecipada (fls. 60/63), de modo a julgar improcedentes os embargos e condenar a embargante ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios de sucumbência, estes fixados em R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais).

Irresignada, a embargante interpôs o presente recurso de apelação.

Nas razões do inconformismo, sustenta, preliminarmente, nulidade da sentença, ante a ocorrência de cerceamento de defesa. Nesse passo, argumenta que não lhe foi oportunizada a produção de prova oral e pericial, com as quais pretendia demonstrar a inautenticidade do instrumento contratual questionado na inicial. No mérito, reitera, inicialmente, a tese de falsidade material do instrumento de confissão de dívida, o qual alega ter sido "montado" para instruir a ação de execução, além de apresentar divergências nas assinaturas apostas pelos devedores. De outra banda, reprisa, outrossim, a arguição de nulidade da fiança prestada por seu marido no contrato, em virtude da ausência de outorga uxória. Ainda nesse passo, defende a vinculação das notas promissórias sob execução ao instrumento de confissão de dívida e, por conseguinte, a inexigibilidade das cártulas, ante a nulidade da garantia pessoal prestada na avença. Com base nisso, pugna pela reforma da sentença, a fim de que sejam julgados procedentes os embargos, com o consequente levantamento do ato constritivo realizado via Bacenjud.

Contrarrazões da parte apelada às fls. 94/97.

Este é o relatório.


VOTO

Preambularmente, à luz do disposto no artigo 282, § 2º, da Lei Processual Civil, afigura-se desnecessária a análise da preliminar de nulidade da sentença por suposta ocorrência de cerceamento de defesa, pois, conforme se observará na sequência, o mérito deverá ser julgado de maneira favorável à parte à qual aproveitaria eventual declaração de nulidade (a propósito, v.g. Apelação Cível n. 2008.017483-5, rel. Des. Altamiro de Oliveira, j. em 9.10.2012).

Pois bem.

Cuida-se de embargos de terceiro pelos quais a esposa de um dos devedores demandados na execução autuada sob o n. 023.99.039504-1 pretende o levantamento de penhora realizada via Bacenjud sobre o numerário de R$ 7.507,64 (sete mil, quinhentos e sete reais e sessenta e quatro centavos), depositado em conta corrente de seu marido, Jarbas Ferreira da Silva Filho, com o qual é casada sob o regime de comunhão universal de bens.

Na decisão combatida, a douta magistrada de origem rechaçou a argumentação da embargante, de modo a julgar improcedentes os embargos.

Ab initio, oportuno registrar que embora a conta na qual foi realizada a constrição judicial impugnada seja de titularidade exclusiva do executado Jarbas, restou demonstrado nos autos que ele a embargante são casados desde 1970 em regime de comunhão universal de bens (certidão de casamento à fl. 16), o qual, lembra-se, importa a comunicação de todos os bens presentes e futuros dos cônjuges, a teor do que dispunha o artigo 262 do Código Civil de 1916, aplicável ao caso porquanto vigente à época da celebração do contrato e da emissão das notas promissórias, cuja redação foi mantida no art. 1.667 do CC/2002.

Evidentes, portanto, a legitimidade e o interesse jurídico da cônjuge prejudicada pela constrição judicial de seus bens.

Nesse viés:

APELAÇÃO CÍVEL. EXECUÇÃO. PENHORA. EMBARGOS DE TERCEIRO. RESERVA DA MEAÇÃO QUE MERECE ACOLHIDA, SENDO IRRELEVANTE O FATO DE A CONTA BANCÁRIA NÃO SER CONJUNTA DO CASAL. IMPORTA É O CASAMENTO PELO REGIME DA COMUNHÃO UNIVERSAL DE BENS. APELAÇÃO PROVIDA. (TJRS, Apelação Cível n. 70072660202, rel. Des. Irineu Mariani, j. em 25.10.2017).

E também:

Embargos de terceiro. Penhora de imóvel rural registrado em nome do executado. Ação aforada pela cônjuge do executado. Carência de ação. Inocorrência. (...) O regime de comunhão universal de bens adotado pelo casal importa a comunicação de todos os bens presentes e futuros, caracterizando o interesse e a legitimidade da embargante para discutir a penhora que recaiu sobre o imóvel. (...) (TJRS, Apelação Cível n. 70042147389, rel. Des. Carlos Cini Marchionatti, j. em 11.05.2011).

Quanto ao mérito, dentre as teses suscitadas na petição inicial e reiteradas nas razões do presente recurso encontra-se a arguição de nulidade da fiança prestada pelo marido da embargante no instrumento de confissão de dívida acostado à inicial da execução, em razão da ausência de outorga uxória, o que implicaria a inexigibilidade das notas promissórias vinculadas ao contrato.

A esse respeito, entendeu a magistrada sentenciante que tal questão seria irrelevante no caso, uma vez que a execução está embasada exclusivamente nas notas promissórias, as quais gozam de autonomia em relação ao negócio jurídico que lhes deu causa, sendo suficiente o aval prestado pelo executado Jarbas nas respectivas cambiais para legitimá-lo a responder pela dívida.

Data maxima venia, entendo ser o caso de reforma do decisum objurgado.

Analisando os autos, infere-se que as notas promissórias sob execução foram emitidas para representar os valores das parcelas do débito reconhecido no instrumento de confissão de dívida de fls. 21/23, bem...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT