Acórdão Nº 0304804-16.2019.8.24.0005 do Sexta Câmara de Direito Civil, 16-11-2021

Número do processo0304804-16.2019.8.24.0005
Data16 Novembro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSexta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0304804-16.2019.8.24.0005/SC

RELATOR: Desembargador ANDRÉ LUIZ DACOL

APELANTE: CCX EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS LTDA (RÉU) APELADO: DIVONEI NELSON BERNA (AUTOR)

RELATÓRIO

Em atenção aos princípios da celeridade e economia processuais, adota-se o relatório da sentença, transcrito na íntegra, por refletir com fidelidade o trâmite processual na origem (evento 59):

DIVONEI NELSON BERNA, devidamente qualificado, por procurador habilitado, ajuizou AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA em face de CCX EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA, também qualificada, alegando, em síntese, que:

1) firmou com a ré Instrumento Particular de Promessa de Compra e Venda de Bens Imóveis em 17.8.2016, tendo como objeto os apartamentos nº 206 da Torre "A" e nº 206 da Torre "B", e box de garagem nº G3-07 e nº G3-10 do Biguaçu Towers Condomínio Residencial e Comercial; 2) para tanto, pactuaram o valor de R$ 315.000,00, que foram quitados pelo autor no ato da assinatura da avença; 3) em contrapartida, a ré se comprometeu a concluir e entregar as unidades no dia 31.12.2016; 4) a ré, até o presente momento, não cumpriu com a sua obrigação; 5) é aplicável o CDC; 6) a ré deve ser compelida a cumprir o contrato conforme pactuado; 7) em razão do inadimplemento da ré, sofreu danos materiais, consistentes em lucros cessantes pela impossibilidade de fruição dos bens. Pleiteia a concessão da antecipação de tutela para determinar que a parte ré proceda a conclusão da obra no prazo máximo de 60 dias, sob pena de multa diária no valor de R$ 1.000,00, e determinar que a ré arque com o pagamento de um aluguel mensal de R$ 950,00 para cada apartamento, desde o dia 31.12.2016 até a efetiva entrega das chaves. Pede, ainda, a procedência do pedido para convalidar a liminar e condenar a parte ré ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios. Valorou a causa em R$ 315.000,00. Com a inicial, juntou os documentos de pp. 11-43. Indeferido o pedido de tutela de urgência, pp. 55-59.

Citada, p. 83, a ré compareceu à audiência de conciliação e apresentou contestação, pp. 97-109, alegando, em síntese, que: 1) vendeu os imóveis ao autor à preço muito inferior ao que vale hoje em dia, pois houve valorização dos bens; 2) o contrato deve ser rescindido por onerosidade excessiva, conforme art. 478 do CC; 3) o contrato firmado com o autor se trata de um contrato preliminar; 4) não há inadimplemento contratual por parte da ré; 5) além de existir previsão de prorrogação do prazo de entrega em 90 dias, o prazo de entrega das unidades foi postergado ante a ocorrência de chuvas e crise no ramo da construção civil; 6) a parte autora não comprova de que os imóveis adquiridos seriam efetivamente alugados à Requer a improcedência do pedido e a condenação da parte autora ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios.

Com a contestação, juntou os documentos de pp. 110-152.

Manifestação à contestação, pp. 157-162.

Os autos vieram-me conclusos.

É o relatório.

A sentença decidiu da seguinte forma:

Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido para:

1 - DETERMINAR que a ré proceda a entrega dos apartamentos nº 206 da Torre A e nº 206 da Torre B, e vagas de garagem nº G3-07 e nº G3-10, do Biguaçu Towers Condomínio Residencial e Comercial, no prazo de 90 (noventa) dias, sob pena de multa diária, que fixo em R$ 500,00 (quinhentos reais), limitada a R$ 315.000,00 (trezentos e quinze mil reais);

2 - CONDENAR a ré ao pagamento de indenização por lucros cessantes, equivalentes ao aluguel dos apartamentos de nº 206 da Torre A e nº 206 da Torre B, do Biguaçu Towers Condomínio Residencial e Comercial, cujo montante deve ser apurado em fase de liquidação de sentença, desde a data prevista para a entrega dos imóveis constante no instrumento (11.5.2017), até a data da efetiva entrega da posse direta dos bens ao autor. Os valores deverão ser acrescidos de juros de mora, na razão de 1% ao mês, desde a citação e correção monetária a contar a partir do mês de vencimento da obrigação pelos índices estabelecidos pela CGJ/SC.

Condeno a parte ré ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 10% sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, § 2º, do CPC.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Imutável, arquive-se.

A requerida opôs embargos de declaração (evento 64), os quais foram rejeitados (evento 67).

Inconformada, a demandada apelou (evento 78).

Inicialmente, pleiteou a concessão do benefício da justiça gratuita, haja vista não possuir, no momento, rendimentos suficientes para custear as despesas processuais.

Preliminarmente, defendeu que a sentença é nula pois carece de fundamentação. Em sede de embargos declaratórios, a parte apelante argumentou que ao decidir pela aplicabilidade do CDC, o magistrado deixou de se pronunciar sobre argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, reformar a conclusão adotada. E sustentou também que o juiz deixou de fixar os valores dos alugueis devidos, transferindo a questão à liquidação de sentença.

Afirmou que a sentença é nula em função do julgamento antecipado da lide. Disse que a instrução probatória poderia esclarecer se o apelado é consumidor, pois não restou esclarecido ser o destinatário final do bem; alegou também que há nos autos somente uma avaliação para cada imóvel, de modo que a jurisprudência pátria já esgotou a questão exigindo a apresentação de, no mínimo, uma segunda avaliação para fins de comparação. Que a decisão do juiz de determinar que o valor dos aluguéis serão apurados em liquidação de sentença prejudica a demandada porque a referida fase não é o momento para produção de prova e fixação do preço, e assim fica configurada a impossibilidade de discutir os valores de aluguel.

No mérito, deve ser afastada a aplicação do CDC pois a própria exordial, ao formular o requerimento de pagamento de alugueis, deixa a entender que o objetivo do apelada era a disponibilização dos imóveis para aluguel, ou seja, obter lucro.

Destacou que deve ser invertido o ônus da prova apenas quando ficar comprovada a hipossuficiência do consumidor, o que não é o caso. Não se observa a hipossuficiência técnica, eis que não há discussão acerca da qualidade do empreendimento.

Sustentou que se deve reconhecer que o instrumento firmado entre as partes nada mais é, ainda que de forma implícita, uma reserva de promessa de compra e venda de imóveis, ou seja, um contrato preliminar, sem força obrigatória.

Argumentou que inexiste inadimplemento contratual a ensejar a quebra do contrato, até porque, o prazo de entrega das unidades foi postergado com base nas próprias cláusulas contratuais que sequer foram objeto de questionamento na exordial. Aponta a ocorrência de diversos períodos de chuva acima do esperado, de modo que há de ser considerado postergado o prazo de conclusão, o que, por si, já afastaria qualquer inadimplemento. Ademais, é de notório conhecimento das partes que desde o ano de 2014, houve uma enorme recessão no âmbito da construção Civil.

Agregou que deve ser declarada a rescisão por onerosidade excessiva pelo desequilíbrio contratual, com fundamento no art. 478 do Código Civil de 2002, pois após a venda dos imóveis as situações mercadológicas e econômicas deram ao custo da obra um valor muito maior do que aquele anteriormente negociado.

Argumentou que deve ser reformada a sentença para afastar a condenação ao pagamento de alugueis a título de lucros cessantes, pois o apelado deixa de provar a efetiva probabilidade de perceber lucros. No que concerne à avaliação colacionada, afirma não haver duvidas de que a parte apelada deveria ter juntado 3 (três) avaliações de 3 (três) diferentes imobiliárias, de modo que a presença de somente uma avaliação não traria a segurança e razoabilidade necessárias para valoração de improvável acolhimento do pleito indenizatório.

Defendeu que deve ser dado provimento ao apelo no sentido de afastar a ordem de entrega dos imóveis no prazo de 90 dias, sob pena de multa diária no valor de R$ 500,00, porque a parte apelante já foi condenada ao pagamento de aluguéis sobre os imóveis até a data da efetiva entrega. Assim, tem-se que a parte apelada seria devidamente ressarcida pela impossibilidade de uso do imóvel.

Ao fim, requereu a reforma da sentença, preliminarmente, com o reconhecimento da nulidade da sentença por falta de fundamentação e por cerceamento de defesa e, no mérito, o afastamento da aplicação do CDC, o reconhecimento da ausência de inadimplemento contratual, a revogação da multa por obrigação de fazer, a declaração de rescisão contratual por onerosidade excessiva e a rejeição do pedido de lucros cessantes.

Foram apresentadas contrarrazões (evento 82).

Vieram conclusos.

VOTO

1. O conhecimento de um recurso demanda a conjugação dos diversos requisitos de admissibilidade (intrínsecos: cabimento, interesse recursal, legitimidade recursal, inexistência de fato extintivo do direito de recorrer; e extrínsecos: regularidade formal, tempestividade) previstos na lei, de forma implícita ou explícita.

Um destes requisitos é o pagamento do preparo recursal, obrigatoriedade que pode ser dispensada em caso de concessão da justiça gratuita. Isto ocorre no caso vertente, alegando a parte apelante não ter condições de arcar com as despesas do processo.

O artigo 98 do Código de Processo Civil prevê:

A pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios tem direito à gratuidade da justiça, na forma da lei.

No caso das pessoas jurídicas, a Súmula n. 481, do STJ dispõe que:

"faz jus ao benefício da justiça gratuita a pessoa jurídica com ou sem fins lucrativos que demonstrar sua impossibilidade de arcar com os encargos processuais".

Desse modo, para que seja concedido o benefício da justiça gratuita à pessoa jurídica, é necessária a demonstração da impossibilidade de adimplir as...

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