Acórdão Nº 0305145-89.2018.8.24.0033 do Segunda Câmara de Direito Comercial, 26-07-2022

Número do processo0305145-89.2018.8.24.0033
Data26 Julho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0305145-89.2018.8.24.0033/SC

RELATORA: Desembargadora REJANE ANDERSEN

APELANTE: MARIA APARECIDA FREITAS (AUTOR) ADVOGADO: LUISE PETRY VAHLDICK (OAB SC050681) APELANTE: BANCO BRADESCO S.A. (RÉU) ADVOGADO: MURILO DEI SVALDI LAZZAROTTO (OAB SC024841) APELADO: OS MESMOS INTERESSADO: A APURAR (INTERESSADO)

RELATÓRIO

Maria Aparecida Freitas ajuizou "ação de revisão de contrato bancário" em desfavor de Banco Bradesco S/A, objetivando a limitação dos descontos em sua folha de pagamento, referentes a contratos de empréstimo consignado firmados e tarifas para 30% (trinta por cento) dos seus rendimentos líquidos. Pleiteia, ainda, a condenação das instituições por danos morais.

A tutela antecipada e o benefício da justiça gratuita foram deferidas (evento 3).

Contestação apresentada no evento 15.

Réplica (evento 20).

Sobreveio sentença (evento 47), da qual se extrai o seguinte dispositivo:

"Isso posto, com suporte nos arts. 487, I, e 355, I, ambos do Código de Processo Civil, resolvo o mérito e JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados pela parte autora, para:

a) manter a tutela antecipada deferida (Evento 3), e limitar o valor total para descontos de empréstimos consignados em 30% (trinta por cento), da renda bruta (art. 8º, I e Parágrafo único, do Decreto Municipal n. 9.631/2011), independente da quantidade de empréstimos e credores;

b) indeferir o pedido de indenização por danos morais;

c) havendo saldo credor em favor da parte autora, seja efetuada a repetição do indébito, de forma simples, acrescidos de juros de mora e correção monetária;

d) Face a sucumbência recíproca, condeno ambas as partes ao pagamento das custas processuais, na proporção de 50% para a parte autora e 50% para a ré;

e) Fixo em 15% (quinze por cento) do valor atualizado da causa (art. 85, § 2º, do Código de Processo Civil), os honorários advocatícios que serão pagos da seguinte forma: 50% deverão ser pagos pelo banco réu ao procurador da parte autora, e 50% pela parte autora em favor do procurador da instituição financeira ré, nos termos do art. 86, caput, do Código de Processo Civil, vedada a compensação (TJSC, AP 2010.026574-8, Lédio Rosa de Andrade, 31/05/2011).

f) Contudo, considerando que à parte autora foram deferidos os auspícios da justiça gratuita (Evento 3), a exigibilidade de tal verba ficará sobrestada até que demonstrada a alteração de sua situação econômica, no prazo prescricional de 05 (cinco) anos, nos termos do art. 98, § 3º, do Código de Processo Civil".

Irresignada, a casa bancária apelou (evento 53), requerendo o afastamento da limitação imposta.

A autora, por sua vez, pleiteou pela condenação da casa bancária ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) e a repetição do indébito em dobro (evento 55).

Contrarrazões do banco apresentada no evento 63.

É o relatório.

VOTO

Tratam-se de recursos de apelação contra sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais na ação em que a parte almeja a limitação dos descontos dos empréstimos consignados realizados com a requerida.

Recurso da casa bancária

Limitação dos descontos

Pretende a casa bancária recorrente o afastamento da limitação dos descontos referentes aos empréstimos consignados em 30% (trinta por cento) dos seus rendimentos.

É cediço que a natureza alimentar da remuneração do trabalhador é juízo pacífico tanto na doutrina quanto na jurisprudência, bem como constitui ponto incontroverso na lide, pois a parte apelante é aposentada pelo INSS. Essa qualidade reveste o benefício de algumas garantias que buscam assegurar o pagamento da dívida sem onerar demasiadamente a subsistência do devedor, em atenção ao princípio constitucional da dignidade da pessoa humana.

No caso, observa-se que o magistrado singular julgou procedente o pedido de limitação dos descontos no percentual de 30% (trinta por cento) dos rendimentos brutos da autora, conforme requerido na exordial.

Verifica-se que esse entendimento deve prevalecer, porque a parte é aposentada pelo INSS, parte hipossuficiente na relação com a casa bancária, merecendo proteção da Lei. No caso em tela, aplica-se o § 1°, do art. 1° da Lei n. 10.820/2003, que dispõe:

Art. 1o Os empregados regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, poderão autorizar, de forma irrevogável e irretratável, o desconto em folha de pagamento ou na sua remuneração disponível dos valores referentes ao pagamento de empréstimos, financiamentos, cartões de crédito e operações de arrendamento mercantil concedidos por instituições financeiras e sociedades de arrendamento mercantil, quando previsto nos respectivos contratos.

§ 1o O desconto mencionado neste artigo também poderá incidir sobre verbas rescisórias devidas pelo empregador, se assim previsto no respectivo contrato de empréstimo, financiamento, cartão de crédito ou arrendamento mercantil, até o limite de 35% (trinta e cinco por cento), sendo 5% (cinco por cento) destinados exclusivamente para:

I - a amortização de despesas contraídas por meio de cartão de crédito; ou

II - a utilização com a finalidade de saque por meio do cartão de crédito.

Nesse sentido, veja-se precedente deste Órgão Julgador:

De início, impende destacar que nenhum óbice há ao desconto da prestação oriunda de empréstimo contratado na folha de pagamento do empregado ou servidor, pois, sabidamente, implica vantagem ao consumidor, seja no tocante à necessidade de garantias ou relativamente aos custos do empréstimo, os quais, bem se sabe, são inferiores ao do mercado financeiro.[...].Não se olvida, também, que tanto a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça como a desta Corte vêm consolidando o entendimento de ser defeso coibir, por completo, o desconto automático em folha de pagamento após a perfeita pactuação. Entretanto, tal praxe deverá ater-se a um limite razoável, que não comprometa a subsistência do mutuário correntista, em respeito ao princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da Constituição Federal), à proteção do salário (art. 7º, X, da CF) e à impenhorabilidade salarial (art. 649, IV, do Código de Processo Civil/1973 - art. 833, IV, do CPC/2015).Inexistem razões jurídicas pelas quais estaria impedido o Poder Judiciário de avaliar a legalidade da contratação, principalmente quando há legislação expressa discorrendo acerca do tema em debate. Isso porque, como consagrado pela Súmula 297 do STJ, a legislação consumerista é aplicável às instituições financeiras e o Código de Defesa do Consumidor, em seu art. 6º, V, estabelece que é direito básico do consumidor a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas. Assim, é direito do consumidor obter provimento jurisdicional que declare a irregularidade de cláusula contratual que contrarie dispositivos do Código de Defesa do Consumidor, ou que não assegure o justo equilíbrio entre direitos e obrigações das partes, o que torna possível a avaliação da legalidade dos contratos, tendo em vista que a legislação consumerista relativiza o princípio pacta sunt servanda. Além disso, o Código Civil condiciona a liberdade de contratar em razão e nos limites da função social do contrato, obrigando que os contratantes guardem, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios da probidade e da boa-fé (arts. 421...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT