Acórdão Nº 0305554-47.2018.8.24.0039 do Primeira Câmara de Direito Civil, 24-03-2022

Número do processo0305554-47.2018.8.24.0039
Data24 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0305554-47.2018.8.24.0039/SC

RELATOR: Desembargador FLAVIO ANDRE PAZ DE BRUM

APELANTE: CIDADE DAS ARAUCARIAS INCORPORACAO DE EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS LTDA ADVOGADO: MARCO VINICIUS VON PARASKI (OAB SC024475) ADVOGADO: ROGER CRISTIAN WACHHOLZ (OAB SC019590) APELADO: CRISTIAN ROBERTO ANTUNES DE OLIVEIRA ADVOGADO: DANIELA PEREIRA DE LIMA (OAB SC037861)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por Cidade das Araucárias Incorporação de Empreendimentos Imobiliários LTDA, contra sentença prolatada pelo juízo da 4ª Vara Cível da Comarca de Lages que, nos autos da "Ação de rescisão contratual, cumulada com cobrança de parcelas pagas e dano moral" n. 0305554-47.2018.8.24.0039, ajuizada por Cristian Roberto Antunes de Oliveira, julgou parcialmente procedentes os pedidos, nos seguintes termos (evento 34/E1):

Em face do exposto, [i] extingo o processo com relação aos réus ABRAMAR INCORPORADORA LTDA e PALAMAR EMPREENDIMENTOS E PARTICIPAÇÕES LTDA, nos termos do art. 485, VI, do CPC, reconhecendo a ilegitimidade passiva ad causam, condenando o autor ao pagamento de honorários advocatícios, arbitrados em R$ 1.000,00, conforme o art. 85, § 8°, do CPC, para cada litisconsorte passivo, cuja exigibilidade fica suspensa [art. 98, § 3°, do CPC]; e [ii] julgo parcialmente procedentes os pedidos formulados por CRISTIAN ROBERTO ANTUNES DE OLIVEIRA contra CIDADE DAS ARAUCÁRIAS INCORPORAÇÃO DE EMPREENDIMENTOS LTDA para [iii] declarar a rescisão do contrato particular de promessa de compra e venda de imóvel por culpa da ré, [iv] condenar a ré a devolução do montante pago pelo autor para aquisição do imóvel, ou seja, R$ 9.349,16, com correção monetária pelo INPC/IBGE a contar de cada ou único pagamento e juros de mora de 1% ao mês a contar da citação, montante esse que deve ser acrescido de multa contratual de 10%, [v] condenar a ré a restituir a taxa de reserva do imóvel de R$ 250,00, com correção monetária pelo INPC/IBGE a contar do pagamento e juros de mora de 1% ao mês a contar da citação, [vi] nulidade da cláusula décima, § 3º, rejeitados entretanto os pedidos de reparação pelo dano moral e de incidência da multa prevista na cláusula 12ª, § 3º do contrato.Pela sucumbência recíproca, condeno as partes ao pagamento das custas do processo, respectivamente, de 30% e 70%. No que toca com os honorários de advogado, condeno o autor ao pagamento dos honorários do advogado da ré, que são fixados em R$ 1.000,00, nos termos do art. 85, § 8º, do CPC, observada a regra do art. 98, § 3º, do CPC, bem como condeno a ré ao pagamento de honorários de advogado do autor, arbitrados em 15% sobre o valor corrigido da condenação, nos termos do art. 85, §§ 2º e 8º, do CPC.

Inconformada, a ré sustentou, inicialmente, a ausência de nulidades/abusividade no contrato firmado entre as partes, notadamente porque o autor sequer apontou de forma específica qualquer cláusula ilegal ou abusiva, razão por que, segundo aduz, a sentença recorrida é extra petita. Ademais, ressaltou que, "[...] não tendo o Apelado executado sua parte no contrato, mediante a contratação do financiamento na forma contratualmente prevista tanto quanto não tendo ao menos pago o valor integral de entrada do imóvel, não há como atribuir a Apelante inadimplemento contratual, o que acarreta na improcedência da quaestio". Pugnou, assim, pela reforma da sentença, para julgar improcedentes os pedidos formulados na inicial ou, em caso de entendimento diverso, a minoração da verba honorária arbitrada.

Contra-arrazoado o recurso (evento 52/E1), ascenderam os autos a esta Corte de Justiça.

Recebo os autos conclusos.

É o relatório.

VOTO

O recurso de apelação interposto é tempestivo e preenche os demais pressupostos de admissibilidade, razão por que dele se conhece.

Ultrapassada a quaestio, postula a parte apelante a reforma da sentença a fim de que seja a demanda julgada improcedente ou, subsidiariamente, a minoração dos honorários advocatícios fixados.

A parte apelada, de seu turno, apresentou contrarrazões rechaçando as teses debatidas no apelo.

Dito isso, o reclamo, adiante-se, não comporta provimento.

1. Da sentença extra petita

Sustenta a apelante a ocorrência de decisão extra petita, diante da declaração de abusividade da cláusula contratual que condiciona o início das obras a evento futuro e totalmente incerto, qual seja, a obtenção de recursos financeiros pela construtora (evento 1/INF8, ítem 4), sob o fundamento de que o autor não apontou especificamente a nulidade de qualquer disposição pactuada.

Razão, contudo, não lhe assiste.

De início, impende destacar que a denominação extra petita diz respeito à correlação entre a prestação pretendida e a decisão jurisdicional prolatada. Neste particular, admite-se flexibilização daquele instituto diante de interpretação lógico - sistemática que possibilite ao magistrado decidir de acordo com a conclusão extraída do conjunto da postulação.

Nesta perspectiva, nos termos da jurisprudência do Colendo Superior Tribunal de Justiça, "'[...] não há falar em julgamento extra petita quando o órgão julgador não afronta os limites objetivos da pretensão inicial, tampouco concede providência jurisdicional diversa da requerida, respeitando o princípio da congruência. Ademais, os pedidos formulados devem ser examinados a partir de uma interpretação lógico-sistemática, não podendo o magistrado se esquivar da análise ampla e detida darelação jurídica posta, mesmo porque a obrigatória adstrição do julgador ao pedido expressamente formulado pelo autor pode ser mitigada em observância aos brocardos da mihi factum dabo tibi ius (dá-me os fatos que te darei o direito) e iura novit curia (o juiz é quem conhece o direito)" (AgRg no REsp 1.385.134/RN, Rel. MinistroRICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 19/03/2015,DJe de 31/03/2015)" (AgInt no AREsp 556.695/SC, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 13/12/2021, DJe 16/12/2021).

No mesmo sentido, também, o art. 322, § 2º, do CPC, ao estabelecer que "a interpretação do pedido considerará o conjunto da postulação e observará o princípio da boa-fé".

Firmadas tais premissas, denota-se do processado que o autor narrou na inicial ter adquirido um apartamento da empresa ré no ano de 2014, contudo, até o momento da propositura da demanda em 2018 as obras sequer haviam sido iniciadas, motivo por que postulou a rescisão contratual por culpa exclusiva da requerida. A ré, de seu turno, apresentou defesa, oportunidade na qual afirmou que "[...] é simples perceber que não há qualquer inadimplemento contratual da Requerida, mormente porque o prazo da entrega da obra está condicionado à concretização do financiamento bancário na modalidade de imóvel na planta (crédito associativo) pelos Requerentes, o que não ocorreu. E, repisa-se, tal espécie de contratação nada tem de ilegal ou abusiva, tendo os Requerentes plena ciência de tal disposição contratual, desde a oferta do produto".

Note-se que a análise e respectivo reconhecimento quanto à abusividade da cláusula que condiciona o prazo de entrega do imóvel a evento futuro e incerto é decorrência lógica dos fatos noticiados nos autos, notadamente em razão da peça defensiva apresentada, na qual a demandada Cidade das Araucárias Incorporação de Empreendimentos Imobiliários LTDA rechaça a alegada culpa pela rescisão postulada, justificando que "o prazo da entrega da obra está condicionado à concretização do financiamento bancário na modalidade de imóvel na planta", motivo por que não há qualquer dúvida de que a causa de pedir remota (fatos) tem por objeto a resolução da avença por culpa da requerida, que acarreta a...

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