Acórdão Nº 0305577-93.2018.8.24.0038 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 28-07-2022

Número do processo0305577-93.2018.8.24.0038
Data28 Julho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0305577-93.2018.8.24.0038/SC

RELATOR: Desembargador GUILHERME NUNES BORN

APELANTE: VERISURE BRASIL MONITORAMENTO DE ALARMES S.A (AUTOR) APELADO: EDSON ARNOLDO HERZOG (RÉU) APELADO: VILMA BYLAARDT HERZOG (RÉU) APELADO: VILMA BYLAARDT HERZOG (RÉU)

RELATÓRIO

1.1) Da inicial

VERISURE BRASIL MONITORAMENTO DE ALARMES S.A ajuizou ação de obrigação de não fazer c/c indenização em face do VILMA BYLAARDT HERZOG - ME, VILMA BYLAARDT HERZOG e EDSON ARNOLDO HERZOG.

Relatou que: I) em 27-2-2015, firmou contrato de compra e venda de carteira de clientes, ativo imobilizado e outras avenças com a empresa TAJG Sistemas Eletrônicos de Segurança Ltda., que pertenciam aos requeridos pessoas físicas; II) restou acertado o encerramento das atividades da vendedora TAJG, ficando vedado, pelo período de cinco anos, seja pela empresa ou pelos sócios, de forma direta ou por interposta pessoa, a realização de atividades concorrenciais ao realizado pela parte autora (cláusula 13); III) o descumprimento implicaria na imposição de multa; IV) soube que os requeridos (pessoas físicas) criaram uma empresa denominada Seg Atak Distribuidora, primeira requerida, com o intuito de exercer as mesmas atividades da autora, o que violaria cláusula contratual; V) a vedação iria até 27-2-2020; VI) os requeridos passaram a cooptar clientes, inclusive já teve alguns pedidos de cancelamento; VII) teria notificado os requeridos, mas, apesar do recebimento, teria obtido de resposta que entrariam em contato para acordo.

Postulou liminar para que os requeridos interrompessem as medidas adotadas para angariar clientes do mesmo ramo de negócio.

Ao final: I) confirmação da liminar; II) a condenação ao pagamento de R$1.540.000,00 a título de cláusula penal (multa da Cláusula 13ª + multa da Cláusula 16ª) (evento 1).

1.2) Da resposta

Os requeridos contestaram alegando que: I) a parte autora não assumiu os débitos fiscais, trabalhistas e cíveis pretéritos, ao contrário do que prevê o art. 1.146 do Código Civil; II) o negócio não teria sido averbado à margem do registro da empresa e nem publicado na imprensa oficial (art. 1.144 do Código Civil); III) há evidente desequilíbrio; IV) com isso, não poderia invocar a regra do art. 1.147 do Código Civil; V) a cláusula que veda a concorrência perde a sua eficácia, porquanto estaria descaracterizada a aquisição do estabelecimento, tratando-se de um ajuste de contrato de compra e venda, não sujeita às regras do direito empresarial; VI) a multa não seria razoável; VII) não há prova a respeito da concorrência; VIII) não está proibilida de realizar venda de equipamentos, mas de serviços de monitoramento; IX) se imposta a multa, que seja reduzida o seu valor (art. 413 do Código Civil) (evento 173).

1.3) Do encadernamento processual

Liminar deferida (evento 4).

Réplica (evento 177).

Audiência de instrução (eventos 256 e 257).

Alegações finais (eventos 259 e 260).

1.4) Da sentença

Prestando a tutela jurisdicional (evento 268), o Juiz de Direito Fernando Speck de Souza prolatou sentença nos seguintes termos:

Pelo exposto, julgo improcedente o pedido (art. 487, I, do CPC).

Condeno a parte autora ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 10% sobre o valor da causa.

1.5) Do recurso

Inconformada, a parte autora apelou argumentando que: I) os fundamentos utilizados em sentença são extra petita, pois a defesa nada tratou da territorialidade ou da diferença de produtos ou know how; II) eventual possibilidade de invalidar cláusula teria decaído, que seria de dois anos (art. 179 do Código Civil); III) houve descumprimento à cláusula de não-concorrência (cláusula 13 do contrato de alineação); IV) os requeridos, em depoimento pessoal, teriam admitido a prestação de serviços de monitoramento, reconhecendo a ofensa à cláusula de não concorrência; V) apesar dos requeridos poderem comercializar equipamentos, não podiam prestar serviço de monitoramento; VI) tem em seu portfólio outros produtos e serviços que são idênticos ou equivalentes aos dos requeridos, tal como câmeras com sensor de movimento e atendimento presencial; VII) logo, não poderiam ter operado no mesmo segmento, porquanto pagos para assim não fazer; VIII) não formulou nenhuma pretensão indenizatória envolvendo o desvio de clientela, o que dispensa a produção de provas; IX) eventual divergência de equipamentos utilizados não tem relevância para aferir vioação ou não à cláusula 13ª, sendo irrelevante a questão geográfica; X) os requeridos admitiram o desenvolvimento de atividade de monitoramento. Postularam a interrupção de medidas que causem angariação de clientes e o pagamento de multa de R$1.540.000,00 (evento 277).

1.6) Das contrarrazões

Acostada (evento 284).

Este é o relatório.

VOTO

2.1) Do juízo de admissibilidade

Conheço do recurso porque presentes os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, pois ofertado a tempo, modo, recolhido o preparo e evidenciado o objeto e a legitimação.

2.2) Da preliminar

Com relação à alegação de que a sentença tenha sido extra petita, diante da inércia da defesa em tratar da territorialidade ou da diferença de produtos ou know how, tem-se duas ponderações.

A primeira, é que, com base nas regras dos arts. 282, §2º. e 488 do CPC, o juiz resolverá o mérito sempre que os termos da decisão for em prol da parte a quem aproveitaria o julgamento sem mérito.

A segunda, é que o Magistrado deve observar os pleitos almejados na petição inicial, estando vinculados a eles, não estando, porém, preso ao direito lá utilizado para fundamentar a pretensão em questão.

Trata-se da aplicação do brocardo latino da mihi factum dabu tibi jus. Ou seja, a parte traz os fatos e o magistrado diz o direito aplicável ao caso.

Outro pertinente ao caso é o jura novit curia, que permite ao juiz resolver a lide com base em preceito normativo não invocado ou diverso do que foi apresentado.

Nas palavras do Des. Saul Steil:

Trata-se de dar curso aos institutos do da mihi factum, dabu tibi jus, que, em tradução livre, quer dizer que a parte apresenta dos fatos com os quais pretende fundamentar o direito em que ela se respalda a fim de buscar a solução da lide, e o juiz decide com base nestes fatos; e jura novit curia, que traduz a possibilidade de o juiz decidir a lide com base em legislação diversa daquela invocada pela parte em seu arrazoado. (AC n. 0002812-75.2007.8.24.0050, j. 21-11-2017)

Do STJ:

Não há julgamento ultra petita se examinado o pedido e aplicado o direito com fundamentação diversa da apontada no pedido inicial. Aplica ação princípio jura novit curia. (AgRg no REsp n. 1.406.733/RJ, rel. Min. Benedito Gonçalves, j. 3-11-2015)

Ainda do STJ:

Decidida a lide nos limites em que foi proposta, não há falar em ofensa aos arts. 128 e 515 do CPC, tendo em vista que a fundamentação não é critério apto para a avaliação de julgamento extra petita. Aplicável ao caso o princípio do jura novit curia, o qual, dados os fatos da causa, cabe ao juiz dizer o direito. Não ocorre julgamento extra petita quando o juiz aplica o direito ao caso concreto sob fundamentos diversos aos apresentados pela parte. (AgRg no REsp n. 1.417.314/SC, rel. Min. Mauro Campbel Marques, j. 27-10-2015)

Deste Tribunal:

[...]

PRELIMINAR DE NULIDADE DE SENTENÇA POR AUSÊNCIA DE ANÁLISE DAS PROVAS E PEDIDO DE AFASTAMENTO DO SÓCIO RÉU SOB FUNDAMENTO DE INEXEQUIBILIDADE DA SOCIEDADE. INCIDÊNCIA DOS BROCARDOS NARRA MIHI FACTUM DABO TIBI JUS E JURA NOVIT CURIA. AUTOR QUE EXPRESSAMENTE REQUEREU A DISSOLUÇÃO PARCIAL DA SOCIEDADE, E NÃO A TOTAL. RAZÃO INSUBSISTENTE.

"O rigor da correção entre a sentença e a causa de pedir incide apenas sobre os fatos e não sobre os fundamentos da demanda. Estes, embora exigidos para a composição da petição inicial (art. 282, inc. III), podem ser legitimamente alterados pelo juiz. A chamada presunção de conhecimento da lei (LICC, art. 3º) conduz ao ônus, que tem o réu, de defender-se em relação aos fatos alegados, sabendo quais o efeitos jurídicos eles são capazes de produzir - e podendo inclusive contestar os efeitos desejados pelo autor, justamente...

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