Acórdão Nº 0305636-43.2015.8.24.0020 do Quinta Câmara de Direito Público, 06-10-2020

Número do processo0305636-43.2015.8.24.0020
Data06 Outubro 2020
Tribunal de OrigemCriciúma
ÓrgãoQuinta Câmara de Direito Público
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão


Apelação Cível n. 0305636-43.2015.8.24.0020 Criciúma

Relatora: Desembargadora Denise de Souza Luiz Francoski

APELAÇÃO CÍVEL.

AÇÃO ANULATÓRIA DE ATO ADMINISTRATIVO AJUIZADA POR INSTITUIÇÃO FINANCEIRA EM FACE DO MUNICÍPIO DE CRICIÚMA, A FIM DE DESCONSTITUIR MULTA APLICADA PELO PROCON, EM RAZÃO DE COBRANÇA DE VALOR RESIDUAL GARANTIDO (VRG) E TARIFA DE CADASTRO (TAC) SUPOSTAMENTE LEGAIS, ESTABELECIDAS EM CONTRATO DE ARRENDAMENTO MERCANTIL ("LEASING").

SENTENÇA QUE JULGOU PROCEDENTE O PEDIDO INICIAL ANTE A ILEGITIMIDADE DO PROCON EM APLICAR SANÇÕES EM RELAÇÕES INDIVIDUAIS.

INSURGÊNCIA DO MUNICÍPIO DE CRICIÚMA.

(A) ADUZIDA LEGITIMIDADE DO PROCON PARA APLICAR MULTAS, DE ACORDO COM A LEGISLAÇÃO PERTINENTE.

TESE ACOLHIDA, MAS QUE NÃO ALTERA O RESULTADO DA SENTENÇA.

ENTENDIMENTO ATUAL E ASSENTE NA JURISPRUDÊNCIA DE QUE O PROCON DETÉM LEGITIMIDADE PARA APLICAR MULTA ADMINISTRATIVA DIANTE DE OFENSA AO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR (CDC), POR FORÇA DO ART. 57 DE ALUDIDA LEGISLAÇÃO, INDEPENDENTEMENTE DE SE TRATAR DE RELAÇÃO INDIVIDUAL OU DE MASSA.

VEDAÇÃO, TODAVIA, DE EXTRAPOLAR AS PENAS PREVISTAS NO ART. 56 E FAZER AS VEZES DO PODER JUDICIÁRIO E DIRIMIR CONFLITOS, DIZER O DIREITO APLICÁVEL AO CASO, COAGIR AO CUMPRIMENTO DE ALGUMA OBRIGAÇÃO, COMO DETERMINAR O FORNECIMENTO DE PRODUTOS OU SERVIÇOS, A RESTITUIÇÃO DE VALORES ETC, O QUE NÃO É O CASO DOS AUTOS, EM QUE O PROCON SE RESTRINGIU A APLICAR A MULTA DE ACORDO COM A LEGISLAÇÃO PERTINENTE.

PRECEDENTES DO STJ E DO TJSC.

PROVIMENTO DO RECURSO NO PONTO QUE, ENTRETANTO, NÃO ALTERA O RESULTADO DE PROCEDÊNCIA DO PEDIDO INICIAL, UMA VEZ QUE, A MULTA NÃO PODE PREVALECER, ANTE A LEGALIDADE DAS TARIFAS COBRADAS (CONFORME ITEM "B").

(B) SUSTENTATA LEGALIDADE DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO, POIS O DEMANDANTE PRATICOU A INFRAÇÃO PREVISTA NO ART. 39, V, DO CÓDIGO DE PROTEÇÃO E DEFESA DO CONSUMIDOR, SUJEITA À MULTA CAPITULADA NO ART. 12, INCISO VI, DO DECRETO 2.181/97.

TESE AFASTADA.

TAC E VRG LIVREMENTE PACTUADAS E ACEITAS PELO ARRENDATÁRIO NO CONTRATO DE ARRENDAMENTO MERCANTIL.

ADEMAIS, REFERIDOS ENCARGOS SÃO LEGAIS, CONFORME ENTENDIMENTO CONSOLIDADO PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E PELO TRIBUNAL DE JUSTIÇA CATARINENSE.

"A COBRANÇA ANTECIPADA DO VALOR RESIDUAL GARANTIDO (VRG) NÃO DESCARACTERIZA O CONTRATO DE ARRENDAMENTO MERCANTIL" (SÚMULA N. 293/STJ).

"A COBRANÇA ANTECIPADA DO VALOR RESIDUAL GARANTIDO (VRG) NÃO DESCARACTERIZA O CONTRATO DE ARRENDAMENTO MERCANTIL" (ENUNCIADO N. VII DO GRUPO DE CÂMARAS DE DIREITO COMERCIAL).

TAC QUE SE REVESTE DE LEGALIDADE QUANDO COBRADA NO INÍCIO DA RELAÇÃO CONTRATUAL, ALÉM DE SER PREVISTA NA NA RESOLUÇÃO N. 3.919/2010 DO CMN.

AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO DIREITO CONSUMERISTA QUE JUSTIFIQUE A MULTA APLICADA AO DEMANDANTE.

PRECEDENTES.

RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL INTERPOSTA PELO MUNICÍPIO DE CRICIÚMA CONHECIDO E PROVIDO EM PARTE, PARA RECONHECER A LEGITIMIDADE DO PROCON PARA APLICAÇÃO DA MULTA EM APREÇO, MAS SEM ALTERAR O RESULTADO DE PROCEDÊNCIA DA SENTENÇA RECORRIDA.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0305636-43.2015.8.24.0020, da comarca de Criciúma 2ª Vara da Fazenda em que é Apelante Município de Criciúma e Apelado Banco GMAC S/A.

A Quinta Câmara de Direito Público decidiu, por unanimidade, conhecer do recurso de apelação interposto pelo Município de Criciúma e dar-lhe parcial provimento, para reconhecer a legitimidade do PROCON para a aplicação da multa em apreço, sem contudo alterar o resultado da sentença recorrida. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Hélio do Valle Pereira, e dele participou o Exmo. Sr. Des. Artur Jenichen Filho e o Exmo. Sr. Des. Vilson Fontana.

Funcionou como representante do Ministério Público o Exmo. Sr. Procurador de Justiça Guido Feuser.

Florianópolis, 06 de outubro de 2020.

Desembargadora Denise de Souza Luiz Francoski

Relatora


RELATÓRIO

Cuida-se de recurso de apelação cível interposto pelo demandante Banco GMAC S.A. contra sentença que julgou procedentes os pedidos formulados nos autos da ação anulatória n. 0305636-43.2015.8.24.0020, ajuizada contra o Município de Criciúma.

1.1 Desenvolvimento processual

Adota-se o relatório da sentença proferida pelo magistrado singular Pedro Aujor Furtado Júnior (fls. 223-225):

"Trata-se de ação anulatória ajuizada por Banco GMAC S.A. Em face do Município de Criciúma, requerendo, em apertada síntese, a anulação da multa aplicada pelo PROCON de Criciúma no processo administrativo n. 3582/2011, haja vista o mesmo não ter legitimidade para a aplicação deste tipo de penalidade, requerendo a procedência do pedido para declarar nula a multa aplicada, nos termos da inicial.

Citado, o réu apresentando resposta defendendo a atuação do PROCON, bem como a sua legitimidade para a aplicação da multa sub judice, requerendo a improcedência do pedido anulatório.

Após nova manifestação da autora e vista ao Ministério Público, os autos vieram conclusos.

É o breve relatório.

Decido".

A causa foi valorada em R$ 2.610,30 (dois mil seiscentos e dez reais e trinta centavos), quando do ajuizamento da ação, em 25-5-2015.

1.2 Sentença

O MM. Juiz Pedro Aujor Furtado Júnior (fls. 223-225) declarou a procedência dos pedidos formulados na inicial, cuja fundamentação foi lavrada nos seguintes termos:

"Julgo antecipadamente a lide por se tratar de matéria exclusivamente de direito, nos termos do inciso I, do artigo 330, do CPC.

Sem adentrar no mérito de ter havido ou não a resolução do problema administrativamente pela parte autora, o fato é que resta evidente a ilegalidade da multa, pois no caso em tela a atuação administrativa do PROCON extrapolou sua esfera de competência.

Isso porque a possibilidade de aplicação de multa pelo PROCON se restringe aos casos em que há violação dos direitos dos consumidores de forma coletiva, o que nem de perto se tem no caso vertente, o qual envolveu uma reclamação de um consumidor isoladamente.

Outro não é o objetivo das sanções previstas no Código de Defesa do Consumidor, reportando-me ao fato de que o exercício do poder de polícia não é irrestrito, "somente passível de ser exercitado, segundo a doutrina de HELY LOPES MEIRELLES, diante de atividade ou conduta 'contrária, nociva ou inconveniente ao bem-estar social [..] no interesse superior da coletividade' " (vide a propósito Apelação Cível n. 2012.039736-4, de Chapecó, Relator: Des. Subst. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva, j. 06.05.2014).

Destaco ainda que não é vedado ao PROCON intermediar a solução de um problema enfrentado por um consumidor isoladamente. O que não se permite, nesses casos, é a aplicação de sanções.

Já restou decidido pela Corte Catarinense em caso análogo:

"O Procon não tem legitimidade para impor penalidade administrativa em virtude do descumprimento de obrigação de natureza individual inter partes. A solução de litígio com a obrigatoriedade de submissão de um dos litigantes à decisão que favorece a outra parte é prerrogativa da jurisdição, cujo exercício incumbe exclusivamente ao Poder Judiciário. A não observância deste postulado implica obstáculo ao acesso à Justiça (CF, art. 35, inc. XXXV) e configura o exercício da autotutela fora dos casos autorizados em lei'. (RN n. 2012.016850-5, de Chapecó, rel. Des. Luiz Cézar Medeiros, Terceira Câmara de Direito Público, j. 16-4-2013) (TJSC, Apelação Cível n. 2012.038295-4, de Chapecó, rel. Des. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva, j. 27-08-2013)" (Apelação Cível n. 2013.067661-0, de Caçador, Relator: Des. Sérgio Roberto Baasch Luz, j. 02.07.2014).

É o caso dos autos, motivo pelo qual de rigor julgar procedente o pedido anulatório" (grifou-se).

A parte dispositiva foi assim lavrada:

"Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido para ANULAR os efeitos da decisão proferida no processo administrativo n. 3582/2011, no que concerne à multa aplicada, nos termos da inicial, tornando DEFINITIVA a liminar deferida nos autos.

Sem custas, CONDENO o réu ao pagamento de R$ 1.500,00, a título de honorários advocatícios, nos termos dos §§ 3º e 4º, do art. 20, do CPC.

P. R. I.".

1.3 Apelação cível interposta pelo demandado Município de Criciúma (fls. 230-243)

Inconformado, o ente público interpôs recurso de apelação, no qual alegou que:

(a) o PROCON é legitimado a aplicar multa de acordo com a legislação pertinente;

(b) ausente ilegalidade no procedimento administrativo, porquanto o demandante praticou a infração prevista no art. 39, V, do Código de Proteção e Defesa do Consumidor, sujeita à multa capitulada no art. 12, inciso VI, do Decreto 2.181/97.

Pugnou pelo conhecimento e provimento do recurso para reformar a sentença, mantendo-se hígidos o processo administrativo e a multa aplicada.

1.4 Contrarrazões

Contrarrazões foram ofertadas às fls. 246-258.

1.5 Decisão Monocrática que declinou competência

Pela decisão monocrática de fls. 262-268, da lavra desta Relatoria, ante o valor discutido na causa ser inferior a 60 (sessenta salários mínimos), o recurso não foi conhecido, e os autos foram redistribuídos para a Turma de Recursos competente:

"Da análise dos autos é possível observar que a ação foi protocolada em 05/06/2015, perante a 2ª Vara da Fazenda de Criciúma, ocasião em que o autor atribuiu à causa o valor de R$ 2.610,30 (dois mil seiscentos e dez reais e trinta centavos - fl. 20).

Logo, considerando que, à época do ajuizamento da ação, o valor do salário mínimo era de R$ 788,00, e que o montante pretendido pelo autor não ultrapassava o patamar de alçada de 60 (sessenta) salários mínimos - R$ 47.280,00 (60 x R$ 788,00), o não conhecimento da apelação, com o seu envio à Turma de Recursos competente, é a medida que se impõe.

Ressalta-se que não se está diante de uma das exceções previstas no § 1º do art. 2º da Lei n. 12.153/2009:

Art. 2º É de competência dos Juizados Especiais da Fazenda Pública processar, conciliar e julgar...

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