Acórdão Nº 0305829-06.2015.8.24.0005 do Segunda Câmara de Direito Civil, 26-11-2020

Número do processo0305829-06.2015.8.24.0005
Data26 Novembro 2020
Tribunal de OrigemBalneário Camboriú
ÓrgãoSegunda Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão


Apelação Cível n. 0305829-06.2015.8.24.0005

Relator: Desembargador João Batista Góes Ulysséa

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL C/C INDENIZAÇÃO POR PERDAS E DANOS E REINTEGRAÇÃO DE POSSE. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA.

CONTRARRAZÕES. ALEGADA INOVAÇÃO RECURSAL. NÃO CARACTERIZAÇÃO. FUNDAMENTOS DA PEÇA RECURSAL QUE GUARDAM RELAÇÃO COM OS ARGUMENTOS DEDUZIDOS NA EXORDIAL. DECADÊNCIA DO DIREITO DA AUTORA. TESE ANALISADA E AFASTADA NA SENTENÇA. RECURSO CABÍVEL. APELAÇÃO CÍVEL. ART. 1.009, CAPUT E § 3º, DO CPC.

Não caracteriza inovação recursal quando os fundamentos da peça recursal estão em consonância com os argumentos deduzidos na exordial.

Nos termos do art. 1.009, caput e § 3º, do Código de Processo Civil, o capítulo da sentença que analisa e afasta temas previstos no art. 1.015, da mesma legislação, são atacáveis por meio de apelação cível, não devendo ser conhecida preliminar de contrarrazões.

PRELIMINARES SUSCITADAS EM CONTRARRAZÕES. DESNECESSIDADE DE EXAME. PRIMAZIA DO JULGAMENTO DO MÉRITO (CPC/2015, ART. 4º). PRONUNCIAMENTO FAVORÁVEL À PARTE SUSCITANTE. EXEGESE DO ART. 488 DO CPC/2015.

Nos termos da legislação processual civil, "desde que possível, o juiz resolverá o mérito sempre que a decisão for favorável à parte a quem aproveitaria eventual pronunciamento nos termos do art. 485" (art. 488). Assim, desnecessário o exame da preliminar de falta de interesse de agir e ausência de constituição e desenvolvimento válido e regular do processo suscitada pela Ré, em contrarrazões ao recurso, na hipótese de manutenção da sentença de improcedência do pedido.

APELO. OUTORGA DE PROCURAÇÃO PÚBLICA. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS INERENTES À COMPRA E VENDA NO DOCUMENTO. FALTA DE PERMISSÃO EXPRESSA PARA O MANDATÁRIO TRANSFERIR O BEM PARA SI. MANDATO EM CAUSA PRÓPRIA NÃO CONFIGURADO. MERA PROCURAÇÃO COM PODERES AMPLOS DE REPRESENTAÇÃO. ESCRITURA PÚBLICA DE COMPRA E VENDA POSTERIOR. NOVOS DIREITOS E OBRIGAÇÕES ENTRE AS PARTES. TRANSFERÊNCIA DO IMÓVEL EFETIVADA NA MATRÍCULA. NEGÓCIO PERFEITO E ACABADO. PREJUDICIALIDADE DA PROMESSA DE PERMUTA ANTERIORMENTE REALIZADA SOBRE O MESMO BEM. IMPOSSIBILIDADE DE RESCINDIR CONTRATO PARTICULAR DE PERMUTA PRECEDENTE EM RAZÃO DA SUBSTITUIÇÃO DAS OBRIGAÇÕES. MANUTENÇÃO DA IMPROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS INICIAIS.

Para configurar a hipótese do art. 685 do Código Civil, deve haver no instrumento público a cláusula de mandato "causa própria", bem como os requisitos da coisa, preço e consenso para que a procuração outorgada seja equivalente a um contrato de compra e venda ou cessão, tendo em vista que "[...] o mandato por si só não transmite a propriedade ao mandatário, em especial porque apenas autorizou este último a vender o bem. A procuração deveria conter todos os requisitos da compra e venda, o preço do negócio, assim com o pagamento do imposto de transmissão, podendo ser levada ao registro, diretamente [...]" (TJRS, Apelação Cível n. 70079094421, rel. Des. Giovanni Conti, j. 29-11-2018). Não preenchidos tais requisitos, o mandato outorgado não deixa de ser uma simples procuração de representatividade com poderes amplos.

A realização de uma escritura pública de compra e venda posterior ao contrato particular de promessa de permuta, sobre o mesmo objeto litigioso e envolvendo as mesmas partes, devidamente quitada e perfectibilizada com a transferência do domínio na matrícula do bem, extingue qualquer obrigação anterior existente entre os contratantes, diante da pactuação de novas direitos e deveres.

SENTENÇA REFORMADA EM PARTE. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0305829-06.2015.8.24.0005, da comarca de Balneário Camboriú (2ª Vara Cível) em que é Apelante Zarling Cardozo Negócios Imobiliários Ltda e é Apelada EMBRAED - Empresa Brasileira de Edificações Ltda.

A Segunda Câmara de Direito Civil decidiu, por votação unânime, conceder parcial provimento ao recurso, contudo, manter a improcedência dos pedidos iniciais. Custas legais.

O julgamento, realizado em 26 de novembro de 2020, foi presidido pelo Exmo. Sr. Desembargador Rubens Schulz, com voto, e dele participou a Exma. Sra. Desembargadora Rosane Portella Wolff.

Florianópolis, 29 de novembro de 2020.


[assinado digitalmente]

Desembargador João Batista Góes Ulysséa

Relator


RELATÓRIO

Zarling Cardozo Negócios Imobiliários Ltda. interpôs Apelação Cível contra a sentença que, proferida nos autos da Ação de Rescisão Contratual c/c Indenização por Perdas e Danos e Reintegração de Posse, proposta contra a Embraed - Empresa Brasileira de Edificações Ltda., julgou improcedentes os pedidos exordiais e condenou a parte autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, estes fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa.

Em suas razões, a Apelante sustentou, que: (a) pretende a rescisão do contrato particular firmado em 2005, com a Apelada, em razão do inadimplemento desta; (b) a procuração por si outorgada ao sócio da Apelada representa apenas um instrumento para concretizar o negócio jurídico firmado com a Recorrida; (c) a procuração pública em discussão é mero mandato de representação e confirmação do negócio jurídico principal; (d) a procuração não tem efeito de contrato de compra e venda, pois não preenche os requisitos legais de forma e conteúdo, já que ausente o preço, forma de pagamento e recolhimento de imposto devido; (e) o instrumento público não se presta para a transmissão do domínio e/ou direitos reais sobre o imóvel litigioso, uma vez que a Apelada figura como adquirente também; (f) a confessada inadimplência da Ré no contrato principal, como os argumentos da contestação para manutenção da avença ou conversão em perdas e danos, destitui da procuração pública a natureza de "em causa própria" exposta no art. 685 do Código Civil; (g) o pedido de perdas e danos decorre da utilização do imóvel litigioso pela Recorrida, por 13 anos, podendo ser cumulado com a cláusula penal derivada do inadimplemento contratual; e (h) merece ser indenizada pelos lucros que deixou de auferir com a exploração do imóvel permutado.

A Apelada apresentou contrarrazões e defendeu, preliminarmente, que: (a) não deve ser conhecido o argumento recursal dos requisitos legais (forma e conteúdo) da procuração pública, pois não foi suscitado durante o processo; (b) verifica-se falta de interesse de agir e ilegitimidade ativa em razão da outorga da procuração pública em causa própria e posterior alienação do bem por meio de escritura pública de compra e venda; (c) ocorre falta de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo por ausência de constituição em mora; (d) pertinente a decadência do direito da Apelante em anular a escritura pública de compra e venda em decorrência do pedido de rescisão do contrato particular de permuta e restituição do imóvel. E, no mérito, requereu a manutenção da sentença e, em caso de reforma, a análise das teses de defesa.

Intimada, a Recorrente defendeu o provimento do apelo.

Esse é o relatório.


VOTO

Objetiva a Apelante a reforma da sentença que julgou improcedentes os pedidos formulados na de rescisão contratual c/c indenização por perdas e danos e reintegração de posse promovida contra a Apelada.

1. Alegada inovação recursal.

Nas contrarrazões assevera a Recorrida que a tese recursal referente aos requisitos e forma da procuração pública outorgada para Rogério Rosa (fls. 25-26), a fim de desconstituir o entendimento de que se trata de mandato em causa própria (art. 485, CC), não foram levantados pela Recorrente, motivo pelo qual configurada a inovação recursal.

Sem razão. De uma análise dos argumentos expostos na petição inicial (fls. 1-14) e da réplica (fls.307-312), observa-se que a Autora/Apelante sempre asseverou que a procuração acima mencionada representava mera autorização geral ao mandatário para perfectibilizar o contrato particular de permuta de imóveis firmado com a Ré/Apelada.

Assim, se o julgador singular, em sede de julgamento dos embargos de declaração com efeitos infringentes, adotou o entendimento de que a procuração outorgada para Rogério Rosa representava um novo negócio jurídico, conforme previsto no art. 485 do CC, está autorizada a Recorrente tentar desconstituir tal conceito a fim de prevalecer seu argumento, ou seja, de que o documento tratava-se de uma mera procuração pública de representação.

Nesse passo, afasta-se a alegada inovação recursal.

2. Decadência do direito.

Também em sede de contrarrazões, a Embraed - Empresa Brasileira de Edificações Ltda. sustenta a decadência do direito da Apelante em reintegrar-se na posse do imóvel litigioso, por consequência do pedido de rescisão do contrato particular de permuta firmado em 2005.

Todavia, a tese recursal não deve ser conhecida. Isso porque, a prejudicial de mérito alegada na contestação não foi analisada na decisão saneadora (fls. 333-337), mas na sentença (fls. 410-414), motivo pelo qual, nos termos do art. 1.009, § 3º, do Código de Processo Civil, o capítulo da sentença deveria ter sido atacado por meio de apelação cível, e não em preliminar de contrarrazões:

Art. 1.009. Da sentença cabe apelação.

[...]

§ 3º O disposto no caput deste artigo aplica-se mesmo quando as questões mencionadas no art. 1.015 integrarem capítulo da sentença.


Não se conhece esta parte das contrarrazões.

3. Das preliminares de ausência de interesse de agir e ausência de constituição e desenvolvimento válido e regular do processo suscitadas em contrarrazões.

Ressalta-se que as prefaciais suscitadas pela...

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