Acórdão Nº 0306062-45.2017.8.24.0033 do Terceira Câmara de Direito Civil, 10-03-2020

Número do processo0306062-45.2017.8.24.0033
Data10 Março 2020
Tribunal de OrigemItajaí
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Cível n. 0306062-45.2017.8.24.0033

Relator: Desembargador Marcus Tulio Sartorato

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE RESCISÃO DE CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. RECURSO DA RÉ. SUSCITADA A PRELIMINAR DE SUSPENSÃO DO FEITO ANTE A ORDEM EXARADA PELO EGRÉGIO STJ EM VIRTUDE DA AFETAÇÃO INERENTE AO TEMA 970. TEMA APRECIADO PELA CORTE SUPERIOR EM 25.06.2019 COM TRÂNSITO EM JULGADO EM 08.11.2019. INEXISTÊNCIA DE MOTIVOS PARA SUSPENDER-SE O PROCESSO. SUSCITADA EM PRELIMINAR DE CONTRARRAZÕES A VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE. INSUBSISTÊNCIA. CLAREZA DAS RAZÕES E EXISTÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA À SENTENÇA. OBSERVÂNCIA DO DISPOSTO NO ART. 1.010, II, DO CPC. PROEMIAIS REJEITADAS. MÉRITO. ALEGAÇÃO DE QUE A AUTORA DEU CAUSA AO INADIMPLEMENTO CONTRATUAL AO DEIXAR DE CONTRATAR O FINANCIAMENTO PARA A QUITAÇÃO DO SALDO DEVEDOR. INSUBSISTÊNCIA. CLÁUSULA CONTRATUAL QUE EXPRESSAMENTE AUTORIZA A COMPRADORA A QUITAR O SALDO REMANESCENTE À VISTA, EM UMA ÚNICA PARCELA, QUANDO DA CONCLUSÃO DAS OBRAS E EXPEDIÇÃO DO HABITE-SE. AUSÊNCIA DE TÉRMINO DO EMPREENDIMENTO INCONTROVERSA. IMPOSSIBILIDADE DE EXIGIR-SE DA AUTORA O ADIMPLEMENTO TOTAL DO DÉBITO ANTES DA ENTREGA DO IMÓVEL. TESE RECHAÇADA. RESCISÃO CABIDA. NECESSIDADE DE RESTITUIÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS. ARRAS CONFIRMATÓRIAS QUE DEVERÃO SER RESTITUÍDAS EM DOBRO. EXEGESE DO ARTIGO 418 DO CÓDIGO CIVIL. DANOS MATERIAIS. INSURGÊNCIA DA RÉ QUANTO À CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO POR LUCROS CESSANTES DERIVADO DE CLÁUSULA PENAL PREVISTA NO CONTRATO. ACOLHIMENTO. IMPOSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO DE MULTAS MORATÓRIA E COMPENSATÓRIA QUANDO O FATO GERADOR É O MESMO, IN CASU, INADIMPLEMENTO POR ATRASO DA OBRA. PRECEDENTES DO STJ. PLEITO DE AFASTAMENTO DA INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PREVISÃO CONTRATUAL DE ENTREGA DA OBRA EM 01.10.2015. ENTREGA QUE JAMAIS OCORREU. DANO MORAL CARACTERIZADO ANTE O LONGO PERÍODO DE ATRASO (QUASE 2 ANOS ATÉ O AJUIZAMENTO DA AÇÃO). PEDIDO DE MINORAÇÃO DO QUANTUM INDENIZÁVEL FIXADO EM R$ 20.000,00 (VINTE MIL REAIS). POSSIBILIDADE. PECULIARIDADES DO CASO E PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE A SEREM CONSIDERADOS NO CÁLCULO. MINORAÇÃO PARA R$ 8.000,00 (OITO MIL REAIS). PRECEDENTES DESTA CORTE. PRETENDIDA A REDUÇÃO DOS HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS, FIXADOS EM 15% (QUINZE POR CENTO) SOBRE O VALOR DA CONDENAÇÃO. CABIMENTO. REDUÇÃO PARA 10% (DEZ POR CENTO) SOBRE O MESMO REFERENCIAL. FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS RECURSAIS. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0306062-45.2017.8.24.0033, da comarca de Itajaí 2ª Vara Cível em que é Apelante Alameda dos Ipês Incorporação de Empreendimentos Imobiliários Ltda e Apelada Maria Lucia Cardozo Ferreira.

A Terceira Câmara de Direito Civil decidiu, por unanimidade, afastar as preliminares e, no mérito, dar parcial provimento ao recurso e fixar honorários recursais nos termos do voto. Custas legais.

Participaram do julgamento, realizado nesta data, com votos vencedores, a Exma. Sra. Des.ª Maria do Rocio Luz Santa Ritta e o Exmo. Sr. Des. Saul Steil.

Florianópolis, 10 de março de 2020.

Desembargador Marcus Tulio Sartorato

Presidente e Relator


RELATÓRIO

Adota-se o relatório da sentença recorrida que é visualizado à fl. 186, por revelar com transparência o que existe nestes autos, in verbis:

Cuida-se de ação ajuizada por Maria Lucia Cardozo Ferreira em face de Alameda dos Ipês Incorporação de Empreendimentos Imobiliários Ltda., dizendo que o imóvel adquirido na planta através de contrato de promessa de compra e venda não foi entregue no prazo.

Em decorrência dos fatos mencionados, requereu a) a concessão de tutela de urgência; b) a declaração de rescisão do contrato celebrado entre as partes; c) a condenação da ré ao pagamento a título de lucros cessantes da multa mensal de 0,5% desde a data ajustada para entrega do imóvel; d) a condenação da ré a restituir em dobro a importância paga a título de arras; e) a condenação da ré ao pagamento de multa penal de 10% do valor pago, monetariamente corrigida e acrescida de juros; f) a condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais no importe de R$ 20.000,00.

Foi indeferida a tutela de urgência.

Citada, a parte demandada contestou, arguindo, preliminarmente, a suspensão do feito. No mérito, afirmou que a parte autora é que está inadimplente, uma vez que não efetuou o financiamento na modalidade contratualmente ajustada (imóvel em construção), de modo que não pode exigir da ré o implemento da obrigação enquanto não cumprir a sua.

Alegou também que a fixação de alugueres na forma postulada na inicial é incompatível com a rescisão contratual, pois sua natureza é indenizar o adquirente desde o atraso até a efetiva entrega do bem.

Por fim, rechaçou os danos morais, tratando do seu valor em caso de procedência do pedido.

Houve réplica.

O MM. Juiz de Direito, Dr. Tanit Adrian Perozzo Daltoé, decidiu a lide nos seguintes termos (fls. 193/194):

ANTE O EXPOSTO, julgo parcialmente procedentes os pedidos para:

a) declarar a rescisão do contrato.

b) condenar a demandada a restituir todos os valores pagos pela parte autora, sendo em dobro a devolução da quantia paga a título de arras, corrigidos monetariamente pelo INPC a partir da data de cada pagamento até a efetiva devolução e acrescidos de juros de mora de 1% ao mês desde a citação.

c) condenar a parte ré ao pagamento de:

c1) aluguel mensal de 0,5% do valor atualizado do contrato, devido desde a conclusão do prazo de tolerância para o término da obra constante na fundamentação até a data da resolução do contrato, com a devolução integral dos valores pagos.

O aluguel deve ser pago até o dia 5 de cada mês ou no dia útil subsequente, ficando as quantias vencidas sujeitas à correção monetária pelo INPC do vencimento, com juros simples de mora de 1% a.m., havidos da citação.

c2) da multa contratual de 10% sobre o valor pago pela parte autora, com correção monetária pelo INPC a contar da data prevista para o término da obra, com juros simples de mora de 1% a.m., havidos da citação.

d) condenar a parte ré ao pagamento de R$ 20.000,00 por danos morais, corrigidos monetariamente pelo INPC do arbitramento (Súmula 362 do STJ) e acrescidos de juros simples de mora de 1% a.m., a contar do dano (data prevista para o término da obra constante na fundamentação) (Súmula 54 do STJ).

Condeno a parte demandada ao pagamento das custas e dos honorários, estes fixados em 15% do valor atualizado da condenação (art. 85, §2º, do NCPC).

Interposta apelação, certifique-se a tempestividade, intime-se a parte recorrida para contrarrazoar e encaminhem-se os autos ao Tribunal de Justiça.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Oportunamente, arquivem-se.

Inconformada, a ré interpôs recurso de apelação (fls. 216/245), no qual requer, preliminarmente, a suspensão do feito, diante da ordem exarada pelo STJ em virtude da afetação inerente ao Tema 970. No mérito, alegou que inexiste inadimplemento contratual da sua parte, tendo em vista que era incumbência dos autores a obtenção do financiamento para a quitação do saldo devedor. Subsidiariamente, em caso de entendimento diverso, pleiteou que a devolução das arras se dê na forma simples, e não em dobro conforme determinado na sentença. Requereu a reforma da sentença também no tocante aos alugueres, para que sejam julgados improcedentes os pedidos dos autores. Pugnou, ainda, pelo afastamento da indenização por danos morais, ou sua minoração, e pela redução dos honorários advocatícios sucumbenciais fixados em primeiro grau para o percentual de 10% (dez por cento) do valor da condenação.

Em contrarrazões (fls. 246/264), a parte autora postulou pelo desprovimento do recurso.


VOTO

1. Em preliminar, o apelante pugna pela suspensão do feito, diante da ordem exarada pelo Egrégio Superior Tribunal de Justiça em virtude da afetação inerente ao Tema 970.

Ocorre que o referido tema já foi apreciado pela Corte Superior de Justiça em 25.06.2019, com trânsito em julgado em 8.11.2019. A tese firmada restou assim estabelecida: "A cláusula penal moratória tem a finalidade de indenizar pelo adimplemento tardio da obrigação, e, em regra, estabelecida em valor equivalente ao locativo, afasta-se sua cumulação com lucros cessantes."

Assim, não existindo mais motivos para a suspensão do feito, rejeita-se a preliminar.

2. Em preliminar de contrarrazões, pugna a parte ré pelo não conhecimento do recurso da autora por força da violação ao princípio da dialeticidade, na medida em que não impugnou especificamente os fundamentos da sentença.

Dispõe o art. 1.010 do Código de Processo Civil:

Art. 1.010. A apelação, interposta por petição dirigida ao juízo de primeiro grau, conterá:

I - os nomes e a qualificação das partes;

II - a exposição do fato e do direito;

III - as razões do pedido de reforma ou de decretação de nulidade;

IV - o pedido de nova decisão.

Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery, em comentário ao referido artigo, lecionam:

[...] O apelante deve dar as razões de fato e de direito, pelas quais entende deva ser anulada ou reformada a sentença recorrida. Sem as razões do inconformismo, o recurso não pode ser conhecido.

[...] Juntamente com a fundamentação, o pedido de nova decisão delimita o âmbito de devolutividade do recurso de apelação: só é devolvida ao Tribunal ad quem a matéria efetivamente impugnada (tantum devolutum quantum appellatum). Sem as razões e/ou pedido de nova decisão, não há meios de se saber qual foi a matéria devolvida. Não pode haver apelação genérica, assim como não se admite pedido genérico como regra. Assim como o autor delimita o objeto litigioso (lide) na petição inicial (CPC 128), devendo o juiz julgá-lo nos limites em foi deduzido (CPC 460), com o recurso de apelação ocorre o mesmo fenômeno: o apelante delimita o recurso...

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