Acórdão Nº 0306200-44.2015.8.24.0045 do Quarta Câmara de Direito Civil, 29-10-2020

Número do processo0306200-44.2015.8.24.0045
Data29 Outubro 2020
Tribunal de OrigemPalhoça
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Cível n. 0306200-44.2015.8.24.0045, de Palhoça

Relator: Desembargador Selso de Oliveira

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL C/C PERDAS E DANOS E RECONVENÇÃO. COMPRA E VENDA DE VEÍCULO ENTRE PARTICULARES. INADIMPLEMENTO E VÍCIO REDIBITÓRIO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA DA AÇÃO PRINCIPAL E DA RECONVENÇÃO.

RECURSO DO RÉU.

PRETENDIDO AFASTAMENTO DA CONDENAÇÃO EM PERDAS E DANOS. EXCEÇÃO DO CONTRATO NÃO CUMPRIDO. ALEGAÇÃO DE QUE A VENDEDORA TINHA PRÉVIA CIÊNCIA ACERCA DO VÍCIO REDIBITÓRIO E NÃO RESSARCIU A QUANTIA GASTA PARA CONSERTO DO DEFEITO. NÃO DEMONSTRAÇÃO DE COMUNICAÇÃO DO VÍCIO À VENDEDORA. DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL POR PARTE DESTA NÃO EVIDENCIADO. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DO DISPOSTO NO ARTIGO 476 DO CÓDIGO CIVIL. RÉU INADIMPLENTE. DEVER DE PAGAR ALUGUEL PELO LAPSO DE FRUIÇÃO DO BEM DE RESSARCIR VALORES ATINENTES A TRIBUTOS E MULTAS.

"A parte lesada pelo inadimplemento pode pedir a resolução do contrato, se não preferir exigir-lhe o cumprimento, cabendo, em qualquer dos casos, indenização por perdas e danos" (artigo 475, CC).

INSURGÊNCIA À COMPENSAÇÃO DE VALORES. ACOLHIMENTO. CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DE ALUGUEL PELO USO DO VEÍCULO QUE SE MOSTRA ILÍQUIDA. INVIABILIDADE DE COMPENSAÇÃO.

"A compensação efetua-se entre dívidas líquidas, vencidas e de coisas fungíveis" (artigo 369, CPC).

"Para que haja a compensação legal, é necessário identificar a expressão numérica das dívidas. Se elas ainda não foram reduzidas a valor econômico, não há como se imaginar a compensação" (GAGLIANO, Pablo Stolze. PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Manual de Direito Civil. São Paulo : Saraiva, 2017, p. 331-332).

DANOS MORAIS. AUTORA/RECONVINDA QUE INVADIU A RESIDÊNCIA DO RÉU/RECONVINTE. RETOMADA DO VEÍCULO. USO DAS PRÓPRIAS RAZÕES. CONFISSÃO FICTA. AUSÊNCIA DE MANIFESTAÇÃO SOBRE O FATO NA CONTESTAÇÃO À RECONVENÇÃO. INVASÃO DE DOMICÍLIO QUE CARACTERIZA ATO ILÍCITO. DEVER DE INDENIZAR. PRECEDENTES DESTE TRIBUNAL.

QUANTUM INDENIZATÓRIO. RÉU/RECONVINTE QUE NÃO COMPROVOU DANOS DE MAIOR EXTENSÃO. ADEMAIS, AUTORA QUE, APÓS RETOMAR O VEÍCULO, FOI INTERCEPTADA PELA POLÍCIA MILITAR. CAMINHÃO QUE RETORNOU À POSSE DO RÉU NO MESMO DIA. DANOS MORAIS FIXADOS EM R$ 5.000,00, CONSIDERADAS AS PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO.

REDISTRIBUIÇÃO DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS. RÉU/RECONVINTE QUE SE SAGROU VENCEDOR. ÔNUS DA RECONVENÇÃO QUE RECAEM INTEGRALMENTE À AUTORA/RECONVINDA.

"Na ação de indenização por dano moral, a condenação em montante inferior ao postulado na inicial não implica sucumbência recíproca" (Súmula 326, STJ).

HONORÁRIOS RECURSAIS. NÃO CABIMENTO. ORIENTAÇÃO DO STJ (EDcl no AgInt no REsp 1.573.573/RJ, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze).

RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0306200-44.2015.8.24.0045, da comarca de Palhoça 1ª Vara Cível em que é Apelante José Paulo Farias e Apelada Aneli de Almeida.

A Quarta Câmara de Direito Civil decidiu, por unanimidade, conhecer do recurso de apelação do réu e dar-lhe parcial provimento. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Excelentíssimo Senhor Desembargador Helio David Vieira Figueira dos Santos, com voto, e dele participou o Excelentíssimo Senhor Desembargador Luiz Felipe Schuch.

Florianópolis, 29 de outubro de 2020.

Desembargador Selso de Oliveira

Relator


RELATÓRIO

A bem dos princípios da celeridade e da economia processual, adoto o relatório elaborado na sentença, verbis (p. 189-190):

ANELI DE ALMEIDA ajuizou ação contra JOSÉ PAULO FARIAS, ambos devidamente qualificados e representados no feito.

Promoveu, inicialmente, ação cautelar de busca e apreensão do caminhão descrito na inicial, em razão do inadimplemento do réu.

Entretanto, entendeu-se que não era o caso de busca e apreensão, e determinou-se a emenda da inicial (ps. 38/39).

A demandante postulou, então, a resolução do contrato e a reintegração na posse do bem. Formulou pedido de tutela antecipada nesse sentido (ps. 26/36). Requereu, ainda, indenização por perdas e danos (inclusive morais).

O pedido de tutela antecipada foi indeferido às ps. 57/58, por decisão contra a qual não houve recurso.

Regularmente citado, o réu apresentou resposta sob a forma de contestação. Suscitou a preliminar de inépcia da inicial. No mérito, sustentou que pagou R$ 17.000,00 do preço combinado. Aduziu que poucos dias após a aquisição sofreu um acidente causado por falha mecânica no caminhão. Argumentou que a autora tinha conhecimento do vício redibitório quando vendeu o bem. Destacou que há cláusula contratual que responsabiliza a alienante pelo pagamento do conserto ou devolução dos valores pagos para reparo dos vícios redibitórios. Afirmou que a demandante tentou a retirada forçada do veículo, ocasião em que o para-brisas foi quebrado. Contrapôs-se ao pedido de indenização por perdas e danos. Asseverou que as dívidas da autora não têm nenhum vínculo com o negócio firmado entre as partes. Defendeu a inexistência de danos morais a serem indenizados. Postulou a improcedência da ação. Ofereceu também reconvenção, por meio da qual postulou a restituição dos valores pagos (R$ 17.000,00), mais a devolução do que gastou com o conserto dos vícios redibitórios (R$ 8.459,82) e indenização por danos morais. Requereu a gratuidade da justiça. Juntou documentos.

Houve réplica e contestação à reconvenção. A reconvinda suscitou as preliminares de inépcia e intempestividade da reconvenção. No mérito, argumentou que a reconvenção tem caráter protelatório e os fatos deduzidos pelo reconvinte não têm o condão de eximi-lo da sua responsabilidade contratual. Sustentou que o comprador nunca mencionou a existência de qualquer vício redibitório no caminhão. Postulou a rejeição dos pedidos articulados na reconvenção. Não juntou documentos.

Após impugnação à contestação, a reconvinda trouxe novos documentos (ps. 170/178), sobre os quais se manifestou o reconvinte.

O juiz Ezequiel Rodrigo Garcia assim decidiu (p. 195-196):

Ante o exposto:

I) Na ação principal, acolho em parte os pedidos articulados na petição inicial e, assim:

a) decreto a resolução do contrato de promessa de compra e venda firmado pelas partes (ps. 12/14);

b) determino a reintegração do caminhão na posse da autora;

c) condeno o réu a pagar à autora indenização por perdas e danos, correspondente aos aluguéis dos meses em que utilizou o veículo, a serem apurados em liquidação de sentença (por arbitramento), mais as despesas com licenciamento, DPVAT e multas, apuradas no respectivo período com atualização monetária pelo INPC.

d) rejeito o pedido de indenização por danos morais.

Considerando a sucumbência recíproca, condeno ambas as partes (a autora em 30% e o réu em 70%) ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios (CPC, art. 86, caput), que fixo em 15% do valor atualizado da condenação (CPC, art. 85, § 2.º), vedada a compensação destes (CPC, art. 85, § 14), observada a suspensão de que trata o § 3.º do art. 98 do CPC, ante a gratuidade da justiça que foi deferida à autora à p. 38 e ao réu nesta sentença.

II) Na reconvenção, julgo parcialmente procedentes os pedidos, para condenar a reconvinda a:

a) restituir ao reconvinte a soma atualizada de todos os valores pagos (R$ 17.000,00), com correção monetária pelo INPC desde cada pagamento, e juros de mora de 1% ao mês desde a citação.

b) indenizar o reconvinte os valores gastos para o conserto do caminhão (R$ 8.459,82), com correção monetária pelo INPC desde cada pagamento, e juros de mora de 1% ao mês desde a citação na reconvenção.

c) determino a compensação entre o montante a ser restituído ao réu/reconvinte e a indenização por perdas e danos que ele tem de pagar à autora/reconvinda.

d) rejeito o pedido de indenização por danos morais.

Considerando a sucumbência recíproca, condeno ambas as partes (o reconvinte em 30% e a reconvinda em 70%) ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios (CPC, art. 86, caput), que fixo em 15% do valor atualizado da condenação (CPC, art. 85, § 2.º), vedada a compensação destes (CPC, art. 85, § 14), observada a suspensão de que trata o § 3.º do art. 98 do CPC, ante a gratuidade da justiça que foi deferida à reconvinda à p. 92 e ao reconvinte nesta sentença.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Após o trânsito em julgado, arquive-se, com as devidas baixas.

Apelou o réu, às p. 200-207, alegando: "A apelada quem descumpriu o contrato, eis que além de ter vendido veículo sabidamente com vício redibitório não consertou às suas expensas e tampouco procedeu a devolução dos valores pagos a título de conserto. A cláusula 8ª do contrato pactuado entre os litigantes estabelece que 'caso o automóvel apresente algum vício redibitório, o VENDEDOR se responsabilizará pelo conserto ou pela devolução dos valores pagos a título de conserto pelo COMPRADOR'. Após o pagamento de R$ 17.000,00 (dezessete mil reais), conforme parcelas pactuadas na cláusula 5ª do referido contrato, no dia 31.01.2015 o apelante veio a sofrer um acidente quando dirigia o caminhão objeto do contrato sub judice. Conforme se pode demonstrar por meio do Boletim de Ocorrência n. 02115-2015-00094 anexo aos autos, referido acidente deu-se por falha mecânica do veículo, eis que devido a falta de freio 'estacionário' o apelante não teve outra alternativa a não ser a de direcionar o caminhão contra uma residência, no intuito de evitar uma tragédia ainda maior. Em virtude do acidente ocasionado por vício redibitório, apenas após 04 (quatro) dias de utilização do veículo pelo comprador, teve o apelante que pagar a importância de R$ 3.159,02 (três mil cento e cinquenta e nove reais e dois centavos), conforme comprovante anexo. Ainda, não bastando os inúmeros transtornos e prejuízos causados pela autora, que vendeu veículo ciente de que estava eivado de vícios redibitórios, o réu ainda foi surpreendido...

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