Acórdão Nº 0306283-96.2017.8.24.0075 do Terceira Câmara de Direito Civil, 10-03-2020

Número do processo0306283-96.2017.8.24.0075
Data10 Março 2020
Tribunal de OrigemTubarão
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão


Apelação Cível n. 0306283-96.2017.8.24.0075, de Tubarão

Relator: Des. Fernando Carioni

APELAÇÃO CÍVEL E RECURSO ADESIVO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. TRANSPORTE AÉREO INTERNACIONAL. REGÊNCIA PELO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA EMPRESA. ATRASO NO VOO COM CONSEQUENTE PERDA DE CONEXÃO. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. PERDA DA COMEMORAÇÃO DO DIA DOS PAIS EM FAMÍLIA. DEMORA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. ABALO MORAL CONFIGURADO. DEVER DE COMPENSAR. MENSURAÇÃO DO QUANTUM. FIXAÇÃO EM R$ 5.000,00 (CINCO MIL REAIS) PARA CADA AUTOR. VALOR EM SINTONIA COM OS CRITÉRIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. SENTENÇA MANTIDA. RECURSOS DESPROVIDOS.

"Na específica hipótese de atraso ou cancelamento de voo operado por companhia aérea, não se vislumbra que o dano moral possa ser presumido em decorrência da mera demora e eventual desconforto, aflição e transtornos suportados pelo passageiro. Isso porque vários outros fatores devem ser considerados a fim de que se possa investigar acerca da real ocorrência do dano moral, exigindo-se, por conseguinte, a prova, por parte do passageiro, da lesão extrapatrimonial sofrida" (REsp 1796716/MG, rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 27-8-2019, DJe 29-8-2019).

"Para a fixação do quantum indenizatório, devem ser observados alguns critérios, tais como a situação econômico-financeira e social das partes litigantes, a intensidade do sofrimento impingido ao ofendido, o dolo ou grau da culpa do responsável, tudo para não ensejar um enriquecimento sem causa ou insatisfação de um, nem a impunidade ou a ruína do outro" (TJSC, Apelação Cível n. 0306928-58.2018.8.24.0020, de Criciúma, rel. Des. Marcus Tulio Sartorato, Terceira Câmara de Direito Civil, j. em 26-3-2019).

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0306283-96.2017.8.24.0075, da comarca de Tubarão (1ª Vara Cível), em que é Apelante/Recorrido Adesivo Emirates e Apelados/Recorrentes Adesivos Cassiano Coral Accordi e outros:

A Terceira Câmara de Direito Civil decidiu, por votação unânime, negar provimento aos recursos. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Marcus Tulio Sartorato, com voto, e dele participou a Exma. Sra. Desa. Maria do Rocio Luz Santa Ritta.

Florianópolis, 10 de março de 2020.


Desembargador Fernando Carioni

RELATOR





RELATÓRIO

Adota-se o relatório da sentença recorrida, de pleno conhecimento das partes, proferida na ação de indenização por danos morais, ajuizada por Cassiano Coral Accordi, Fernando Porto Larroyd, Murilo Goulart Moreira Maia, Rafael Schlickmann Júnior e Richard Schlickmann contra Emirates Airlines Brasil.

Ao sentenciar o feito, o MM. Juiz de Direito da 1ª Vara Cível da comarca de Tubarão, Dr. Edir Josias Silveira Beck, consignou na parte dispositiva:

JULGO PROCEDENTE EM PARTE o pedido inicial e, por consequência, condeno a ré a pagar a cada um dos autores ao autor R$ 5.000,00 a título de reparação moral, com correção monetária desde a presente data e com juros legais de mora a contar de 12 de agosto de 2017 (data do evento danoso). Recíproca a sucumbência, em distribuição proporcional dos ônus, condeno as partes ao pagamento pro rata das custas processuais, os autores dividindo entre si a metade que lhes toca. Em relação aos honorários de advogado, vão os autores solidariamente condenados a pagar em favor da ré a quantia correspondente a 10% sobre a diferença entre o valor atualizado da causa e o total da condenação, indo a ré condenada a pagar a eles 12,5% do valor da condenação.

Inconformada, Emirates interpôs recurso de apelação, no qual sustenta a ausência de responsabilidade pelo atraso da aeronave que transportaria os autores de Jakarta a Dubai, porquanto forçada a realizar pouso emergencial em Singapura em função de um de seus passageiros, recém operado, ter se queixado de dores na região do tórax.

Afirma, também, a plena prestação de auxílio aos autores, tendo esses recebido auxílio material, na forma de "alimentação, comunicação, hospedagem até o momento do voo, além da remarcação do voo com destino a Florianópolis".

Alega a inocorrência de danos morais, não possuindo os referidos eventos a capacidade de trazer aos apelados abalos anímicos substanciais, e a desproporcionalidade do valor dos danos morais auferidos (fls. 136-147).

Contrarrazões às fls. 156-160.

Igualmente irresignados, os autores Cassiano Coral Accordi e outros apresentaram recurso adesivo, pleiteando pela majoração dos danos morais para R$ 10.000,00 (dez mil reais), ou qualquer valor superior, bem como dos honorários advocatícios fixados em favor de seu procurador.

Após, ascenderam os autos a este egrégio Tribunal de Justiça.

Este é o relatório.





VOTO

Tratam-se de recurso de apelação e recurso adesivo com o desiderato de reformar a sentença que condenou a ré Emirates ao pagamento de danos morais em favor dos autores pelo atraso do voo que resultou na perda de uma conexão, e, por conseguinte, na impossibilidade da comemoração em família do dia dos país.

Cumpre pontuar que o presente deve ser analisado sobre a égide do Código de Defesa de Consumidor, tratando-se de evidente relação de consumo (arts. 2º e 3º do DC), uma vez pela qual deve responder objetivamente à prestadora de serviço (Emirates Airlines Brasil) pelos danos causados ao consumidor, segundo o art. 14 do Código de Defesa do Consumidor. No mesmo prisma, se-lhe incumbe o ônus probatório, por força do art. 6, VIII do mesmo Código.

Assim, o fato da ocorrência do pouso forçado da aeronave em Singapura, por ocasião de uma emergência médica, não é capaz de afastar a responsabilidade da Companhia Aérea pelos danos causados aos demais consumidores, no que deve a apelante Emirates provar a existência de alguma das excepcionalidades delineadas no art. 14, § 3º, I e II, do Código de Defesa do Consumidor:

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

§ 3.º O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar:

I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste

II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.

Nessa ótica, é inconteste a ausência da culpa do consumidor ou de terceiro, esse último supostamente acometido de emergência médica não enquadrável em nenhuma atribuição de culpabilidade, mesmo porque não trouxe a ré provas da aludida ocorrência ao momento do procedimento instrutório, arrolando nova documentação às fls. 141-142 em expressa violação aos arts. 435 e 1.014 do Código de Processo Civil.

Assim, preclusa a evidência comprovante do fato justificado, não há falar na exclusão de responsabilidade da empresa aérea por incidente em sede de força maior relacionado a um passageiro adoecido, afastando-se a aplicação do art. 14, § 3º, II do Código de Defesa do Consumidor.

Tampouco pode ser aplicado o art. 14, § 3º, I, do Código Consumerista, visto que o atraso do voo com destino a Dubai, o que culminou na perda da conexão Dubai–Guarulhos, é irrefutável; e, em que pese a companhia aérea sustentar que o devido atendimento ao consumidor foi prestado, com realocação destes em um hotel e a prestação de outros serviços, como alimentação e comunicação, a existência desse atendimento não é lastreada por qualquer material probatório, motivo pelo qual merece ser desconsiderada.

Quanto aos danos morais, faz-se preciso traçar algumas ponderações.

Sublinhou o Supremo Tribunal de Justiça em sua mais recente jurisprudência o entendimento de que não é mais possível a aplicação da doutrina dos danos morais in re ipsa a defeitos na prestação de serviços de transporte aéreo de passageiros, devendo o afligido trazer provas de um descontentamento extraordinário para que se configure dano moral indenizável. Sobre isso, confira-se:

DIREITO DO CONSUMIDOR E CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COMPENSAÇÃO DE DANOS MORAIS. CANCELAMENTO DE VOO DOMÉSTICO. DANO MORAL NÃO CONFIGURADO.

[...]

Na específica hipótese de atraso ou cancelamento de voo operado por companhia aérea, não se vislumbra que o dano moral possa ser presumido em decorrência da mera demora e eventual desconforto, aflição e transtornos suportados pelo passageiro. Isso porque vários outros fatores devem ser considerados a fim de que se possa investigar acerca da real ocorrência do dano moral, exigindo-se, por conseguinte, a prova, por parte do passageiro, da lesão extrapatrimonial sofrida (STJ, REsp n. 1796716/MG, rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, j. em 27-8-2019, DJe 29-8-2019).

Logo, a mera alegação do dano moral não enseja a sua presunção, dependendo da comprovação, por parte do consumidor, da existência de lesão extrapatrimonial que ultrapasse o mero dissabor.

Sem embargos, é o que se observa no presente caso.

Depreende-se da documentação arrolada na inicial que os passageiros afligidos retornavam a Florianópolis justamente à véspera do dia dos pais para comemorá-lo em família com seus filhos, planejamento esse que foi frustrado pelo atraso na prestação de serviço de transporte aéreo.

Similarmente, colhe-se da jurisprudência do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:

RECURSO INOMINADO. AÇÃO INDENIZATÓRIA. CONSUMIDOR. FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO DE TRANSPORTE AÉREO. CANCELAMENTO DE VOO DOMÉSTICO, APÓS ATRASO SUPERIOR A QUATRO HORAS. REQUERIDA QUE NÃO SE DESINCUMBIU DO ÔNUS DE COMPROVAR A OCORRÊNCIA DE FATO EXTERNO, ALHEIO À SUA...

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