Acórdão Nº 0306315-04.2016.8.24.0054 do Terceira Câmara de Direito Comercial, 03-11-2022

Número do processo0306315-04.2016.8.24.0054
Data03 Novembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0306315-04.2016.8.24.0054/SC

RELATOR: Desembargador GUILHERME NUNES BORN

APELANTE: FISIOSUL CLÍNICA DE FISIOTERAPIA E REABILITAÇÃO LTDA (EMBARGANTE) APELANTE: GABRIELA MARTINS KLEIN (EMBARGANTE) APELADO: BANCO BRADESCO S.A. (EMBARGADO)

RELATÓRIO

1.1) Da inicial.

FISIOSUL CLÍNICA DE FISIOTERAPIA E REABILITAÇÃO LTDA E OUTRA opuseram Embargos à Execução em face do BANCO BRADESCO S.A, alegando, preliminarmente, a concessão do efeito suspensivo, a inépcia da execução, a inversão do ônus da prova, a informação ao SCR, as consequências civis do ato ilícito praticado pelo banco.

No mérito, a aplicação do CDC, a limitação dos juros remuneratórios em 12% ao ano, a ilegalidade da capitalização de juros, a descaracterização da mora, afastar a comissão de permanência cumulada com demais encargos de mora, a ilegalidade de tarifas bancárias e honorários extrajudiciais, a ilegalidade de cláusula com vencimento antecipado, determinar a repetição de indébito dos valores pagos indevidamente, em dobro, determinando a compensação dos créditos/débitos.

Ao final, pugnaram pela procedência dos embargos.

Atribuíram valor à causa e juntaram documentos (evento 1, docs. 2/9).

1.2) Da impugnação

Devidamente intimado, o requerido apresentou impugnação, mencionando, a impossibilidade da concessão do efeito suspensivo, a inviabilidade dos embargos por parte do avalista. No mérito, a presença dos requisitos do título e da cédula de crédito, a presença de demonstrativo de débito, a legalidade dos juros remuneratórios pactuados, a possibilidade da capitalização de juros, a ausência de cumulação de comissão de permanência com demais encargos, a legalidade das tarifas administrativas, a impossibilidade da repetição de indébito, requerendo a improcedência dos pedidos.

1.3) Do encadernamento processual.

As embargantes requereram a concessão da gratuidade da justiça (evento 7), o que restou deferido (evento 9).

Manifestação à impugnação (evento 16).

1.4) Da sentença.

Prestando a tutela jurisdicional, o Dr. Giancarlo Rossi prolatou sentença resolutiva de mérito para julgar parcialmente procedente a pretensão inicial deduzida, para:

"[...] V- Diante do exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES (art. 487, I, do CPC) os Embargos à Execução opostos por FISIOSUL CLINICA DE FISIOTERAPIA E REABILITAÇÃO LTDA e GABRIELA MARTINS KLEIN DE MOURA contra BANCO BRADESCO S/A, para, no período de inadimplência, limitar a "taxa de remuneração - operações em atraso" à taxa de 1,21% ao mês e 14,50% ao ano, capitalizados, conforme juros remuneratórios previstos para o período de normalidade contratual, sendo vedada a cobrança de outros encargos moratórios.

O valor a ser restituído ao embargante deverá ser acrescido de correção monetária pelo INPC, desde a data de cada pagamento a maior, e juros de mora (1% ao mês) contados da intimação para impugnação. Os valores apurados deverão ser compensados/descontados do saldo devedor em aberto e, caso quitado o contrato, restituídos pela instituição financeira em parcela única.

Ante a sucumbência mínima, condeno a parte embargante ao pagamento das custas e despesas processuais, mais honorários de sucumbência de 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, na forma do artigo 85, §2º, do Código de Processo Civil, suspensa a exigibilidade de tais verbas, nos termos do art. 98, §3º, do CPC."

1.5) Do recurso.

Inconformado com a prestação jurisdicional, a parte embargante interpôs o presente recurso de Apelação Cível, aduzindo a obrigatoriedade de informação ao SCR, a possibilidade da repetição de indébito em dobro, a inversão do ônus da prova, a limitação dos juros remuneratórios em 12% ao ano, a ilegalidade da capitalização de juros, a ilegalidade da cobrança da TAC, a descaracterização da mora, a ilegalidade da cláusula de vencimento antecipado, a iliquidez do título por excesso de execução, a inversão da sucumbência, requerendo o provimento do recurso.

1.6) Das contrarrazões

Contrarrazões aportada (evento 36).

Este é o relatório.

VOTO

2.1) Do objeto recursal.

Compulsando os anseios recursais, observa-se que o cerne da celeuma em comento está atrelado à análise dos juros remuneratórios, capitalização de juros, mora, cláusula de vencimento antecipado, TAC, iliquidez do título, sucumbência.

2.2) Do juízo de admissibilidade.

Conheço do recurso porque presentes os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, eis que ofertado a tempo e modo, dispensado o devido preparo e evidenciado o objeto e a legitimação.

2.3) Das preliminares

2.3.1) Da impugnação ao pedido de justiça gratuita

Em sede de contrarrazões (evento 36), o banco impugna o deferimento da justiça gratuita.

Ocorre que tal benefício fora deferido durante a demanda, de modo que sua rediscussão, nos moldes trazidos pela parte apelada, deveria ser manejada em Apelação Cível.

Logo, não merece a análise tal insurgência.

2.3.2) Ofensa à dialeticidade

A parte apelada, em suas contrarrazões, sustenta a existência de ofensa ao princípio da dialeticidade.

Contudo, em que pese a identidade de parcela das razões, é possível extrair a irresignação da parte, razão pela qual o recurso é conhecido.

2.3.3) Da iliquidez do título

A embargante/apelante destaca que em razão do excesso de valores cobrados, restou caracterizada a iliquidez do título.

No caso, a cédula de crédito bancário possui força executiva, cujos pressupostos estão presentes, nos termos do art. 28 da Lei 10.931/04.

O simples fato de existirem valores a maior não retira a liquidez do título, mas apenas a limitação do excesso, realizo pelo pedido revisional, afastando-se assim, a preliminar.

2.4) Do mérito

2.4.1) Da aplicação do Código de Defesa do Consumidor.

Primeiramente, cabe ressaltar que o contrato realizado entre as partes é regido pelas regras do Código de Defesa do Consumidor, pois presentes os pressupostos consumeiristas (arts. e 3º, parágrafo 2º, CDC), configurando a parte apelante como consumidora e a parte apelada como fornecedora do serviço de natureza financeira/creditícia.

Inclusive, a matéria restou pacificada, nos termos da Súmula 297 do STJ, sendo aplicável a Lei 8.078/90 às instituições financeiras, conforme se depreende dos julgados abaixo:

PROCESSUAL CIVIL. CÉDULA DE CRÉDITO RURAL. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. DEFICIÊNCIA NA FUNDAMENTAÇÃO. SÚMULA 284/STF. PRESCRIÇÃO [...] INCIDÊNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. POSSIBILIDADE. SÚMULA 297/STJ. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE DE COBRANÇA. JUROS REMUNERATÓRIOS. LIMITAÇÃO A 12% AO ANO.[...] 3. A discussão acerca da incidência do Código de Defesa do Consumidor nos contratos celebrados por instituições financeiras ficou superada nesta Corte com a edição da Súmula 297/STJ, que assim dispõe: "O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras." [...]. (REsp 1570268/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 22/09/2016, DJe 11/10/2016)

E nesse sentido, o Tribunal Catarinense já decidiu:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATO DE FINANCIAMENTO PARA AQUISIÇÃO DE VEÍCULO. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. INCIDÊNCIA NAS RELAÇÕES ENVOLVENDO INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS. SÚMULA 297 DO STJ. REVISÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS. POSSIBILIDADE. É entendimento pacificado por esta Corte e pelo Superior Tribunal de Justiça, frente ao enunciado da Súmula 297, de que "O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras". [...] (TJSC, Apelação Cível n. 2013.061721-4, de São José, rel. Des. Paulo Roberto Camargo Costa, j. 12-06-2014).

E:

APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO REVISIONAL - CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO - SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA - RECURSO INTERPOSTO PELA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. REVISÃO CONTRATUAL - POSSIBILIDADE - MITIGAÇÃO DO PRINCÍPIO DO "PACTA SUNT SERVANDA" - INEXISTÊNCIA DE AFRONTA À BOA-FÉ OBJETIVA - INSURGÊNCIA INACOLHIDA NESTE ASPECTO. "O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras." (Súmula n. 297 do Superior Tribunal de Justiça). Estando a relação negocial salvaguardada pelos ditames desta norma, mitiga-se a aplicabilidade do princípio do pacta sunt servanda, viabilizando a revisão dos termos pactuados, uma vez que a alteração das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais, ou até mesmo as que se tornem excessivamente onerosas em decorrência de fato superveniente à assinatura do instrumento, configura direito básico do consumidor, nos moldes do inc. V do art. 6º da Lei n. 8.078/1990 [...]. (TJSC, Apelação Cível n. 0301047-49.2016.8.24.0092, da Capital, rel. Des. Robson Luz Varella, Segunda Câmara de Direito Comercial, j. 21-11-2017).

Por conseguinte, declara-se a mitigação das regras de direito privado aplicáveis ao contrato firmado, em razão da existência de uma relação de consumo, que se faz necessária a aplicação dos preceitos contidos no Código de Defesa do Consumidor, haja vista tratar-se de uma norma de ordem pública (art. 1º).

Por fim, destaca-se que a apreciação jurisdicional limitar-se-á aos pedidos expostos, pois, muito embora promova-se a aplicação do CDC, ao juiz é defeso promover a revisão ex officio de todas as cláusulas contratuais firmadas (Súmula 381 do STJ).

2.4.2) Da inversão ônus da prova.

A inversão do ônus da prova inserto no inciso VIII do art. 6º do CDC não remonta utilidade/necessidade na lide em debate, vez que as partes acostaram aos autos todos os documentos pertinentes às relações negociais estabelecidas.

2.4.3) Juros Remuneratórios.

Sustenta a parte apelante que a parte apelada, quando da vigência do contrato, praticou a cobrança de juros remuneratórios em patamar superior ao limite de 12% ao ano, ferindo disposição constitucional e se enquadrando na Lei de Usura.

Para facilitar o raciocínio a seguir estampado, convém registrar que é de conhecimento de todos os operadores jurídicos que o art. 192, § 3º da Constituição Federal, que outrora estabeleceu a limitação dos juros em 12% ao ano, restou revogado pela Emenda Constitucional n. 40 de 29/05/2003, ao argumento de que sua aplicabilidade estava...

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