Acórdão Nº 0306348-80.2016.8.24.0090 do Segunda Turma Recursal, 21-07-2020

Número do processo0306348-80.2016.8.24.0090
Data21 Julho 2020
Tribunal de OrigemCapital - Norte da Ilha
ÓrgãoSegunda Turma Recursal
Classe processualRecurso Inominado
Tipo de documentoAcórdão



ESTADO DE SANTA CATARINA

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SANTA CATARINA

Segunda Turma Recursal



Recurso Inominado n. 0306348-80.2016.8.24.0090, da Capital - Norte da Ilha

Relatora: Juíza Ana Karina Arruda Anzanello


RECURSOS INOMINADO E ADESIVO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. TRANSPORTE AÉREO. CANCELAMENTO UNILATERAL DE VOO NACIONAL. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DE AMBAS AS PARTES. RECURSO ADESIVO DO AUTOR. NÃO CONHECIMENTO. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL NA LEI 9.0999/95. EXEGESE DO ENUNCIADO CIVIL N. 88 DO FONAJE – Não cabe recurso adesivo em sede de Juizado Especial, por falta de expressa previsão legal. RECURSO PRINCIPAL DA COMPANHIA AÉREA. FALTA DE NEXO DE CAUSALIDADE E CULPA DE TERCEIRO, PELA SUPOSTA AUSÊNCIA DE REPASSE DO VALOR REFERENTE À COMPRA DA PASSAGEM, PELA OPERADORA DE CARTÃO DE CRÉDITO. TESES REJEITADAS. PASSAGEIRO QUE COMPROVOU A AQUISIÇÃO DO BILHETE, O QUAL FOI EMITIDO PELA RÉ, COM INDICAÇÃO DE LOCALIZADOR. CONSUMIDOR NÃO PODE SER PREJUDICADO, POR EVENTUAL FALHA NO REPASSE DOS VALORES ENTRE AS FORNECEDORAS. RESPONSABILIDADE OBJETIVA E SOLIDÁRIA DA RECORRENTE DIANTE DO VÍCIO DO SERVIÇO. EXEGESE DOS ARTS. E 20 DO CDC. AUSÊNCIA DE NEXO DE CAUSALIDADE DOS DANOS MATERIAIS. INSUBSISTÊNCIA. DESPESAS JUNTADAS AOS AUTOS, RELATIVAS A COMPRA DE PASSAGEM E HOSPEDAGEM ÀS EXPENSAS DO AUTOR E RELACIONADAS COM O DESCUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO DA COMPANHIA AÉREA RÉ. INEXISTÊNCIA DE DANOS MORAIS. NÃO ACOLHIMENTO. CONSUMIDOR ATRASOU O RETORNO DE SUA VIAGEM POR UM DIA EM RAZÃO DO CANCELAMENTO UNILATERAL DA PASSAGEM PELA RÉ, QUE DEIXOU DE PRESTAR QUALQUER ASSISTÊNCIA MATERIAL. SITUAÇÃO QUE ULTRAPASSOU O MERO DISSABOR. ABALO MORAL CONFIGURADO. REDUÇÃO DO QUANTUM FIXADO.TESE RECHAÇADA. VALOR ARBITRADO NA ORIGEM QUE SE MOSTRA ADEQUADO À SITUAÇÃO FÁTICA E QUE RESPEITA OS PRIMADOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. MODIFICAÇÃO DO TERMO INICIAL DOS JUROS DE MORA PARA DATA DO ARBITRAMENTO DA INDENIZAÇÃO. NÃO ACOLHIMENTO. INCIDÊNCIA A CONTAR DA CITAÇÃO, POR SE TRATAR DE ILÍCITO CONTRATUAL, CONFORME ARTIGO 405 DO CC. RECURSO ADESIVO NÃO CONHECIDO. RECURSO INOMINADO CONHECIDO E DESPROVIDO.


Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Inominado Criminal n. 0306348-80.2016.8.24.0090, da comarca da Capital - Norte da Ilha Juizado Especial de Santo Antônio de Lisboa, em que é Recorrente/Recorrida Gol Linhas Aéreas S/A e Recorrido/Recorrente Camilo de Andrade Oliveira e Silva.


A Segunda Turma Recursal decidiu, por unanimidade, não conhecer do recurso adesivo interposto pelo Autor; conhecer do recurso inominado interposto pela Ré, negar-lhe provimento e, por consequência, condenar a companhia aérea ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, estes fixados em 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do artigo 55 da Lei n. 9.099/95.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Juiz Marco Aurélio Ghisi Machado, com voto e dele participou o Exmo. Sr. Juiz Vitoraldo Bridi.


Florianópolis, 21 de julho de 2020.

Ana Karina Arruda Anzanello

Relatora










RELATÓRIO

Gol Linhas Aéreas S/A interpôs Recurso Inominado contra sentença proferida pelo Juizado Especial Cível do Norte da Ilha, que julgou procedente o pedido deduzido por Camilo de Andrade Oliveira e Silva, a fim de condená-la ao pagamento de indenização por danos materiais e morais, decorrente de cancelamento de voo nacional (fls. 150-155).

Em suas razões recursais (fls. 160-179) a companhia aérea alegou, em síntese, a ausência de responsabilidade pelo cancelamento da passagem, atribuindo a culpa à operadora do cartão de crédito e/ou instituição Financeira, que não lhe repassou o valor referente à compra do bilhete. Refere a sua ilegitimidade para responder por eventuais danos, já que inexiste nexo desses com sua conduta. Refuta ainda a sua condenação em danos materiais e que a situação narrada na exordial incapaz de ensejar abalo moral ao passageiro. Sucessivamente, em relação ao abalo anímico, requereu a redução do quantum e a readequação do dies a quo dos juros de mora para a data da sentença.

Por sua vez, o autor apresentou recurso adesivo, requerendo a majoração do valor arbitrado a título de danos morais (fls. 262-271) e contrarrazões (fls. 250-261).

Os autos ascenderam a esta Turma Recursal.

Este é o relatório.











VOTO

1. Da admissibilidade.

Inicialmente, deixo de conhecer do recurso adesivo de fls. 262/271, interposto pelo Autor, por ausência de previsão legal na Lei n. 9.099/95, nos termos do Enunciado Civil 88 do FONAJE:

ENUNCIADO 88 – Não cabe recurso adesivo em sede de Juizado Especial, por falta de expressa previsão legal.


Por outro lado, encontram-se presentes os pressupostos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade do recurso inominado interposto pela ré às fls. 160-179, razão pela qual, o reclamo merece ser conhecido.


2. Do mérito

2.1 Da falta de nexo e da culpa exclusivo de terceiro

A companhia aérea alega que não pode ser responsabilizada pelo cancelamento da passagem, atribuindo a culpa à operadora do cartão de crédito e/ou instituição Financeira, que não lhe repassou o valor referente à compra do bilhete. Sustenta também sua ilegitimidade para responder por eventuais prejuízos, já que inexiste nexo desses com sua conduta. Sob esses argumentos refuta sua condenação em danos morais e materiais.

Em que pese o esforço argumentativo, razão não lhe assiste.

No caso, o litígio tem como base relação de consumo, estando presentes os requisitos arrolados nos artigos e do Código de Defesa do Consumidor, que assim preceituam:

"Art. 2º Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produtos ou serviço como destinatário final."

"Art. 3º Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividades de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços."


Nos termos da Legislação Consumerista, o fornecedor responde pelos defeitos, relativos à prestação dos serviços e produtos colocados no mercado de consumo, estabelecendo no parágrafo único do artigo 7º, que todos respondem solidariamente pelos danos:


"Art. 7° [...]

Parágrafo único. Tendo mais de um autor a ofensa, todos responderão solidariamente pela reparação dos danos previstos nas normas de consumo. [...]


Ao explicar o dispositivo legal, a doutrina prevê que:


"[...] Esse dispositivo constitui a regra geral de responsabilidade solidária entre todos os fornecedores que participaram da cadeia de fornecimento do serviço ou produto perante o consumidor. A regra justifica-se pela responsabilidade objetiva adotada pelo CDC, que dispensa a culpa como elemento da responsabilidade dos fornecedores. Dessa maneira, independente de a culpa não ser do fornecedor demandado, ou não ser de todos os fornecedores demandados, haverá a condenação de quem estiver no polo passivo a indenizar o consumidor; assim, é inviável imaginar, em uma situação tratada à luz do dispositivo legal comentado, uma sentença terminativa por ilegitimidade de parte se for comprovado que a culpa não foi daquele fornecedor demandado.

Em razão da solidariedade entre todos os fornecedores e de sua responsabilidade objetiva, o consumidor poderá optar contra quem pretende litigar. Poderá propor a demanda para buscar o ressarcimento de seu dano somente contra um dos fornecedores, alguns, ou todos eles. A doutrina que já enfrentou o tema aponta, acertadamente, para a hipótese de litisconsórcio facultativo, considerando ser a vontade do consumidor que definirá a formação ou não da pluralidade de sujeitos no polo passivo e mesmo, quando se formar o litisconsórcio, qual a extensão subjetiva da pluralidade.

Nesse caso, portanto, de responsabilidade solidária e objetiva dos fornecedores, não será aplicável o instituto do litisconsórcio alternativo, pois, ainda que exista uma dúvida fundada por parte do consumidor sobre quem foi o causador direto de seu dano, a legislação consumerista, expressamente, atribui a responsabilidade a qualquer dos fornecedores que tenha participado da cadeia de produção do produto ou da prestação do serviço. Por ser inviável antever a ilegitimidade de qualquer deles, ainda que nenhuma culpa tenha no evento danoso, pouco importa, para os fins do processo, a individualização do fornecedor que tenha sido o responsável direto pelo dano, de modo que é inconcebível, nesse caso, falar em litisconsórcio alternativo.

Essa disposição do CDC, repetida em outras normas do diploma consumerista - como os arts. 18, caput, 19, caput, 25, §§ 1.º e 2.º, art. 28, § 3.º, e art. 34 -, é demonstração clara de proteção ao consumidor, que não poderia ser afetado por incertezas a respeito de qual dos fornecedores foi o responsável direto pela ofensa aos seus direitos. A ideia é que os fornecedores, solidariamente, respondam perante o consumidor independente de sua culpa no caso concreto; assim, é lícito àquele que pagou e que não teve culpa ingressar com ação de repetição de indébito contra o fornecedor causador direto do dano. A proteção do consumidor, ao criar um litisconsórcio facultativo entre os fornecedores, afasta, por completo, a necessidade do litisconsórcio alternativo. [...] (Manual de direito do consumidor: direito...

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